REl - 0600163-53.2024.6.21.0047 - Voto Relator(a) - Sessão: 28/11/2024 00:00 a 23:59

VOTO

1. Da Tempestividade dos Recursos

Tratando-se de representação que versa sobre propaganda eleitoral irregular, o prazo para recurso, conforme o art. 96, § 8º, da Lei n. 9.504/97, é de 24 horas, que, nos termos regulamentados pelo art. 22 da Resolução TSE n. 23.608/19, corresponde a um dia a partir da intimação:

Art. 22. Contra sentença proferida por juíza ou juiz eleitoral nas eleições municipais é cabível recurso, nos autos da representação, no Pje, no prazo de 1 (um) dia, assegurado à recorrida ou ao recorrido o oferecimento de contrarrazões em igual prazo, a contar da sua intimação para tal finalidade (Lei nº 9.504/1997, art. 96, § 8º).

 

Na hipótese, a sentença foi publicada no Mural Eletrônico no dia 23.10.2024 (ID 45767637), de modo que o recurso deveria ter sido apresentado até as 23h59min do dia 24.10.2024.

PAULO JESUS NEVES DORNELES interpôs recurso de forma tempestiva, no dia 24.10.2024 (ID 45767639)

Por outro lado, JONAS ADAIR RODRIGUES SARTURI somente protocolou o seu recurso após escoado do prazo legal, em 25.10.2024 (ID 45767641), impondo o não conhecimento do seu apelo.

Assim, não conheço do recurso interposto por JONAS ADAIR RODRIGUES SARTURI, em razão da sua intempestividade, e conheço do recurso interposto por PAULO JESUS NEVES DORNELES, uma vez que atendidos todos os requisitos de admissibilidade.

 

2. Do Mérito

No mérito, de acordo com a narrativa contida na peça inicial, em 04.08.2024, na Igreja Assembleia de Deus em São Borja/RS, o pastor PAULO JESUS NEVES DORNELES, em uma cerimônia religiosa presidida por ele, realizou propaganda eleitoral em favor do então candidato a vereador JONAS ADAIR RODRIGUES SARTURI, nos termos da fala, reproduzida abaixo, proferida por Paulo, no púlpito do templo e sem intervenção de terceiros (ID 45767593):

Jonas Sarturi, um dos candidatos a vereador da nossa cidade!

Chegou agora de campanha, de trabalho, muito esforço, muita dedicação.

Vamos orar pelo irmão Jonas, pelo irmão Nilson, irmãos que estão tentando aí né.

E tem que tentar mesmo, tem que fazer alguma coisa, alguém tem que fazer alguma coisa!

Se eu não me animo, o Jonas se anima!

Então está aí o Jonas. Te levanta irmão Jonas!

Fica de pé!

Olha lá pra igreja para o pessoal olhar bem para tua cara ai ó!

Esse é o cara, tá bom! Quiserem votar nele aí, depois ele vai dar o nomezinho pra vocês, o numerozinho dele aí!

Tá bom!

O regramento sobre a realização de propaganda eleitoral em “bem de uso comum” está disposto nos §§ 1º e 4º do art. 37 da Lei n. 9.504/97:

Art. 37. Nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam, e nos bens de uso comum, inclusive postes de iluminação pública, sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de ônibus e outros equipamentos urbanos, é vedada a veiculação de propaganda de qualquer natureza, inclusive pichação, inscrição a tinta e exposição de placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e assemelhados. (Redação dada pela Lei nº 13.165, de 2015)

§ 1º A veiculação de propaganda em desacordo com o disposto no caput deste artigo sujeita o responsável, após a notificação e comprovação, à restauração do bem e, caso não cumprida no prazo, a multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 8.000,00 (oito mil reais). (Redação dada pela Lei nº 11.300, de 2006)  

[…].

§ 4º Bens de uso comum, para fins eleitorais, são os assim definidos pela Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil e também aqueles a que a população em geral tem acesso, tais como cinemas, clubes, lojas, centros comerciais, templos, ginásios, estádios, ainda que de propriedade privada.(Incluído pela Lei nº 12.034, de 2009).

 

Por conseguinte, indubitável que o dispositivo do art. 37 da Lei n. 9.504 /97 veda a realização de qualquer tipo de propaganda eleitoral no interior de bens de uso comum, dentre os quais se equiparam os templos religiosos, local onde ocorreu o fato da hipótese em tela.

Nesses termos, o Tribunal Superior enuncia que “a veiculação de propaganda eleitoral em templos encontra óbice no art. 37, § 4º, da Lei 9.504/97, o qual veda tal prática nos bens de uso comum, quais sejam, os assim definidos pelo Código Civil e aqueles a que a população em geral tem acesso, ainda que de propriedade privada” (Recurso Especial Eleitoral n. 61867, Acórdão, Relator: Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 86, Data 13.5.2021).

In casu, o discurso do pastor é no sentido de enaltecer a candidatura de Jonas, elogiando sua dedicação e vontade de “fazer alguma coisa”, inclusive solicitando que se apresente em pé ao público, “para o pessoal olhar bem para a tua cara”.

É incontroverso, ainda, que a propaganda em questão ocorreu durante a celebração religiosa, em um evento aberto à comunidade.

Logo, é certo que ocorreu propaganda eleitoral dentro de templo religioso, induzindo o eleitor, no caso, a comunidade que acompanhava a celebração, a votar no candidato indicado na manifestação, resultando em afronta às regras que visam o equilíbrio do jogo eleitoral democrático.

Em suas razões recursais, o recorrente PAULO JESUS NEVES DORNELES alega que “não tinha conhecimento acerca das vedações e exigências legais acerca da forma de condução quando algum candidato a cargo político estivesse na igreja onde preside os cultos, em período eleitoral. Aduz, ainda, que “haja vista ser leigo em relação às normas legais exigidas pela justiça eleitoral durante a cerimônia, não pode ser condenado a algo que tampouco tinha conhecimento”.

Portanto, sustenta o recorrente em sua defesa, concisamente, que proferiu aquele discurso no contexto exposto por desconhecer a lei eleitoral vigente no Brasil.

Todavia, a alegação de desconhecimento da legislação eleitoral sucumbe diante do princípio da obrigatoriedade da lei, contido no art. 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, cuja redação é clara ao dispor que "ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece".

Dessa forma, o fundamento utilizado pelo recorrente mostra-se descabido. Além disso, o preceito que veda a propaganda eleitoral em templos religiosos não é recente ou controvertido, de modo que nada justifica a inadequação do comportamento aos termos legais.

Ainda, considerando que a sanção pecuniária foi aplicada no patamar mínimo previsto no art. 37, § 1º, da Lei n. 9.504/97, não há reparos fazer à sentença, em conformidade com a jurisprudência dominante da Corte Superior, no sentido de que não se aplicam os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade com o fim de reduzir a multa para valor inferior ao mínimo legal (TSE; REspEl n. 0601004-57.2020.6.16.0199/PR, relator: Min. Mauro Campbell Marques, julgado na sessão de 11.5.2021).

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo não conhecimento do recurso de JONAS ADAIR RODRIGUES SARTURI, em razão da sua intempestividade, e pelo conhecimento e desprovimento do recurso de PAULO JESUS NEVES DORNELES.