ED no(a) APEl - 0600237-59.2021.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/03/2025 00:00 a 21/03/2025 23:59

VOTO

Trata-se de embargos de declaração opostos pelos embargantes contra o acórdão que condenou Ricardo Miguel Klein, Vilson Antônio Saturno de Oliveira, Acleton Ortiz Guimarães, Aldair Soares Guimarães e Silvia Maria Veiga da Silva pela prática dos crimes de associação criminosa (CP, art. 288), concussão (CP, art. 316, caput) e falsidade ideológica com finalidade eleitoral (CE, art. 350, caput), e absolveu Diva Lúcia Meinerz.

Sustentam a ocorrência de omissões, contradições e obscuridades no julgado, e postulam o prequestionamento de dispositivos legais.

Os embargos serão analisados ponto a ponto.

 

a) Omissão quanto ao prequestionamento do art. 35, inc. III, do Código Eleitoral

Os embargantes alegam que o acórdão é omisso quanto ao prequestionamento do art. 35, inc. III, do Código Eleitoral, pois o caso em questão não se trataria de crime eleitoral, mas sim de crime comum, e postulam o prequestionamento do dispositivo legal.

Embora tenha sido invocado o inc. III, é certo que a intenção de prequestionamento se refere ao inc. II do art. 35 do Código Eleitoral, pois o feito trata de ação penal, e não de mandado de segurança ou habeas corpus:

Art. 35. Compete aos juízes:

(...)

II - processar e julgar os crimes eleitorais e os comuns que lhe forem conexos, ressalvada a competência originária do Tribunal Superior e dos Tribunais Regionais;

 

III - decidir habeas corpus e mandado de segurança, em matéria eleitoral, desde que essa competência não esteja atribuída privativamente a instância superior.

(...)

 

O acórdão embargado não menciona expressamente o art. 35, inc. II, do Código Eleitoral, mas isso não implica em sua ausência de apreciação, pois para fins de prequestionamento não é necessária a citação expressa do dispositivo legal, bastando o exame da questão federal ou constitucional nele contido.

No caso em análise, o acórdão examinou extensamente a questão da competência da Justiça Eleitoral para o julgamento dos crimes imputados aos embargantes, reportando-se às razões expostas quando do recebimento da denúncia. O aresto fundamenta-se na conexão entre crimes comuns e eleitorais, conforme previsto no art. 35 do Código Eleitoral.

Assim, ainda que o dispositivo específico não tenha sido citado expressamente, a matéria nele contido foi apreciada, preenchendo o requisito do prequestionamento.

Ademais, o art. 1.025 do CPC acolheu a tese do prequestionamento ficto, de forma que a simples oposição dos embargos de declaração é suficiente para prequestionar a matéria, ainda que sejam inadmitidos ou rejeitados os declaratórios.

 

b) Contradição por consideração de “elementos informativos repetitivos colhidos na investigação policial e que a luz do disposto no artigo 155 do CPP não se trata de provas cautelares não repetitivas e antecipadas” e formação da convicção com base exclusiva ou preponderante em elementos investigativos coletados no inquérito policial

Nos embargos afirma-se que o acórdão é contraditório ao considerar elementos informativos colhidos na investigação policial, que não se enquadram como provas cautelares não repetitivas e antecipadas, conforme previsto no art. 155 do CPP, e que não foram corroborados por provas judiciais.

Argumenta-se que a decisão se baseou em depoimentos colhidos na fase investigativa, sem que houvesse confirmação desses elementos em juízo, o que viola o princípio do contraditório e da ampla defesa.

Contudo, a alegação reflete inconformismo dos embargantes com a justiça da decisão e não se amolda à contradição passível de ser sanada pela via estreita dos embargos de declaração.

A decisão embargada é expositiva e considerou os elementos de prova na fase judicial, incluindo depoimentos colhidos sob contraditório, e não exclusivamente as provas oriundas do inquérito policial; e a alegação de contradição quanto à valoração da prova é matéria a ser discutida em recurso dirigido à instância superior recursal, pois o julgado não apresenta contradição interna entre seus fundamentos.

O julgado baseou-se no conjunto probatório contido nos autos, descrevendo e especificando as provas que fundamentam a conclusão do julgamento; e as alegações de ausência de provas ou de ofensas ao contraditório e à ampla defesa devem ser igualmente levadas a conhecimento da instância recursal superior.

 

c) Obscuridade por violação da cadeia de custódia da prova digital referente a “conversas degravadas” e violação aos arts. 158-A e 158-B do CPP, uma vez que as transcrições “não foram feitas por perito judicial ou por perito do Instituto de Criminalista”

Os embargantes argumentam que houve obscuridade na decisão embargada devido à violação da cadeia de custódia das provas digitais, em especial as “conversas degravadas”, e que as transcrições das conversas não foram realizadas por perito judicial ou do Instituto de Criminalística, o que viola os arts. 158-A e 158-B do CPP.

A alegação de falta de transcrição de prova oral por perito criminalista ou judicial, além de não se adequar a quaisquer das hipóteses previstas no art. 619 do CPP (ambiguidades, obscuridades, contradições ou omissões), foi apresentada somente nos embargos de declaração e realizada sem apresentação de mínimos indícios de adulteração ou comprometimento da autenticidade da prova. 

Nesse ponto, entendo que o recurso não comporta conhecimento dada a manifesta inovação recursal, circunstância incompatível com o apelo integrativo e descaracterizadora do vício de omissão.

De acordo com o TSE, “‘é inviável inovar tese recursal na via dos embargos declaratórios, ainda que se aleguem matéria de ordem pública e intuito de prequestionamento’ (AgR–AI 3–19, Rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, DJE de 14.11.2019)” (AgR–REspEl n. 0603101–97, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJE de 15.3.2022).

Assim, não conheço dos embargos de declaração quanto à presente tese.

 

d) Omissão e contradição porque a “decisão embargada não aponta, com base na prova produzida, os fundamentos que levaram à conclusão adotada”

Os embargantes alegam que a decisão embargada é omissa e contraditória, pois não aponta, com base nas provas produzidas no processo, os fundamentos que levaram à conclusão adotada. Afirmam que a decisão menciona que a exigência de pagamento de contribuições mensais atingiu um “número expressivo de servidores públicos”, mas não indica quais provas sustentam essa conclusão. Além disso, referem que a decisão não foi fundamentada de forma clara e coerente, violando o princípio da motivação das decisões judiciais.

Contudo, os fundamentos do acórdão foram amplamente embasados em diversas provas documentais, testemunhais e periciais, depoimentos de vítimas, testemunhas e réus, interceptações telefônicas e telemáticas autorizadas judicialmente, processos judiciais, documentos apreendidos e demais provas eletrônicas e documentais juntadas aos autos, tendo sido devidamente especificadas as provas que ampararam a conclusão do acórdão.

A afirmativa de que a decisão menciona a existência de um "número expressivo de servidores públicos" sem indicar as provas que sustentam essa afirmação também não se sustenta, pois o aresto faz referência direta às provas que indicam a extensão da prática ao longo das razões de decidir.

Além dos depoimentos individuais, há registros de listas e documentos encontrados em diligências, como nomes de servidores e valores pagos, demonstrando a abrangência do esquema criminoso, com análise pericial dos materiais apreendidos, os quais demonstraram que os pagamentos eram controlados sistematicamente, com registros internos da exigência.

O acórdão observou o princípio da motivação, dado que apresenta fundamentação clara e consistente, embasada no conjunto probatório colhido ao longo da instrução; e o simples fato de os embargantes discordarem da conclusão não caracteriza omissão ou contradição, especialmente quando a decisão detalha os elementos que levaram ao acolhimento parcial da denúncia.

Da leitura do julgado verifica-se que a decisão explicitou as provas que amparam a condenação, detalhando os depoimentos, documentos e interceptações que comprovaram a prática dos crimes.

Com essas razões, verifica-se que não há omissão ou contradição a ser sanada.

 

e) Nulidade por cerceamento de defesa, violação ao devido processo legal, ao art. 10 do CPC e ao art. 3º do CPP, na medida em que a contratação de servidores temporários e o recebimento de recursos de fontes vedadas não seriam objeto da acusação

Os embargantes alegam que houve nulidade na decisão embargada por cerceamento de defesa, violação ao devido processo legal, ao art. 10 do CPC e ao art. 3º do CPP. Afirmam que a decisão utilizou como fundamento a contratação de servidores temporários e o recebimento de recursos de fontes vedadas, que não eram objeto da acusação. Além disso, sustentam que não tiveram a oportunidade de se defender sobre esses pontos, o que violaria o princípio do contraditório e da ampla defesa.

Da mesma forma como referido nos itens anteriores, as alegações de nulidade por cerceamento de defesa, violação ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa não consistem em hipóteses de cabimento de embargos de declaração.

No ponto, importa referir que o acórdão embargado não condenou os réus pela contratação de servidores temporários ou pelo recebimento de recursos de fontes vedadas, mas tão somente fez referência a esses elementos de prova como parte do contexto fático amplamente documentado nos autos, derivado do inquérito policial e demais provas que fundamentaram a denúncia.

Essa abordagem está em total consonância com o dever do julgador de analisar toda a prova produzida nos autos, ainda que parte dela não configure, isoladamente, o núcleo da imputação penal, pois a análise da prova pelo Tribunal deve ser ampla para a formação do convencimento sobre a materialidade e autoria dos crimes imputados.

As referências à contratação de servidores temporários e ao recebimento de recursos de fontes vedadas não configuram inovação, mas sim fatos apurados no inquérito policial que deram suporte à denúncia e foram acessíveis à defesa durante toda a instrução.

A defesa teve amplo acesso a esses elementos probatórios, pôde ser plenamente exercida e não há cerceamento quando os elementos utilizados para a formação do convencimento constam dos autos e foram submetidos ao contraditório

Ademais, a condenação dos réus não se baseou na contratação de servidores temporários ou no recebimento de recursos de fontes vedadas, e sim na prática de associação criminosa, concussão e falsidade ideológica eleitoral, conforme descrito na denúncia e devidamente comprovado pelas provas apresentadas ao longo da instrução processual.

 

f) Omissão, nulidade e ilicitude da gravação ambiental realizada em ambiente fechado e sem o conhecimento e anuência dos demais participantes

Os embargantes alegam que a decisão embargada utilizou como prova uma gravação ambiental clandestina, ilícita, realizada em ambiente fechado, sem o conhecimento e anuência dos demais participantes, e sustentam violação ao direito à privacidade e à intimidade, destinas são ilícitas.

Esta tese de nulidade foi também suscitada perante esta Corte local apenas em embargos de declaração.

Neste aspecto, entendo que o recurso não deve ser conhecido, uma vez que os embargantes introduzem questão nova e inédita, que não foi suscitada anteriormente nos autos, configurando flagrante inovação recursal. Tal circunstância se revela incompatível com a finalidade dos embargos de declaração, que possuem caráter integrativo e aclaratório, não sendo meio adequado para veicular novos argumentos ou reformular teses defensivas.

Além disso, a inovação recursal descaracteriza a alegação de omissão, pois o vício que se busca corrigir deve decorrer de efetiva ausência de fundamentação ou exame de questão previamente debatida no processo, o que não se verifica na hipótese dos autos. Os embargos de declaração não podem ser utilizados como meio de reabrir a discussão de mérito, tampouco para suscitar matéria nova, sob pena de desvirtuar sua função e comprometer a segurança jurídica das decisões judiciais.

Dessa forma, impõe-se o não conhecimento do recurso neste ponto.

 

g) Omissão quanto aos fundamentos da desclassificação da acusação de prática do crime de organização criminosa para o crime de associação criminosa

Os embargantes alegam que a decisão embargada é omissa quanto aos fundamentos da desclassificação do crime de organização criminosa para o crime de associação criminosa, e argumentam que a decisão não indicou quais provas judiciais levaram à conclusão de que os fatos configuram associação criminosa.

Entretanto, a decisão embargada não padece de omissão quanto aos fundamentos da desclassificação do crime de organização criminosa para associação criminosa, a qual foi realizada a partir da análise e do valor dado às provas colhidas durante a instrução processual. A mera leitura do acórdão demonstra que o entendimento está devidamente fundamentado:

(…)

Com efeito, ao contrário do que argumenta a defesa, as provas produzidas demonstram que os réus Ricardo, Vilson, Acleton e Silvia, entre os anos de 2017 e 2019, ou seja, durante o primeiro mandato de Ricardo à frente do Executivo de São Nicolau/RS, associaram-se de forma estável e permanente para a prática do crime de concussão em face dos servidores públicos municipais, mediante a elaboração de um esquema de “rachadinha” que visava exigir e cobrar contribuições mensais, correspondente a 5% de suas respectivas remunerações, cujo valor foi destinado ao Diretório Municipal do Progressistas (PP).

A dinâmica criminosa, consistente na forma de agir do grupo e a conduta praticada individualmente por cada um dos réus, restou exaustivamente descrita acima, quando da análise dos crimes de concussão praticados em face dos funcionários públicos de São Nicolau/RS, podendo ser resumida da seguinte forma: o réu Ricardo Miguel Klein, aproveitando-se do cargo de Prefeito de São Nicolau/RS, contando com auxílio de Vilson, Acleton e Silvia, que à época ocupavam cargos de Secretários Municipais, passaram a exigir dos servidores ocupantes de cargos de confiança ou temporários no Executivo municipal, o pagamento mensal de contribuições ao diretório municipal do Progressistas (PP).

Foi demonstrada a estabilidade e permanência, mas não foi comprovada a presença de uma cadeia hierárquico-piramidal, não podendo se confundir o crime de organização criminosa, previsto art. 2º, da Lei n. 12850/13, com o de associação criminosa, previsto do art. 288, do CP. A despeito de alguns dos elementos caracterizadores de uma organização criminosa também servirem para caracterizar as associações criminosas, é consabido que tais delitos são distintos, a associação criminosa, tipificada no art. 288 do CP, é menos sofisticada, enquanto a organização criminosa, assim como numa organização militar, civil, comercial, industrial, não se constata uma subordinação fechada entre os integrantes, pois a exigência de valores era realizada por todos os denunciados.

Tanto é assim que na denúncia a Procuradoria Regional Eleitoral afirma que Ricardo exigia a contribuição financeira mensal para a manutenção do Partido Progressista, e que Vilson, Acleton e Silvia reiteravam essas cobranças. A ausência de divisão específica de tarefas afeta a uma organização criminosa fica mais evidente no ponto em que acusação narra que Vilson, Acleton e Silvia igualmente promoviam a cobrança dos valores e controlavam os pagamentos por meio de planilhas.

Houve clara prova do ajuste prévio entre os membros com a finalidade de cometerem crimes, mas não foi colhida nenhuma evidência de que exista uma cadeia de comando entre Vilson, Acleton e Silvia, com possibilidade de transição hierárquica e funcional entre os seus integrantes, ou seja, a ascensão no âmbito interno da própria organização, à semelhança do que ocorre em uma estrutura empresarial, ainda que organizada de maneira informal.

Portanto, considero que a atuação dos denunciados seguiu o padrão de uma associação criminosa entre indivíduos sem estrutura organizada e hierárquica, não tendo sido preenchidos os requisitos necessários à configuração de eventual ORCRIM.

Muito embora o acervo probatório não permita a condenação dos réus pelo crime do art. 2º da Lei n. 12.850/13, entendo suficientemente comprovada a existência de uma associação criminosa, tal qual tipificado no art. 288, do CP, razão pela qual desclassifico a conduta para esse crime, nos termos do art. 383, do CPP.

(…)

 

Dessa forma, a decisão aplicou corretamente o instituto da emendatio libelli (art. 383 do CPP), readequando a tipificação penal sem modificar os fatos narrados na denúncia e sem violar o direito de defesa dos réus, não se vislumbrando omissão a ser sanada porque foi devidamente apresentado o raciocínio percorrido para tal conclusão.

Por fim, ressalto que a tese de que “toda a suposta prova utilizada para confirmar a suposta materialidade delitiva encontra-se fundamentada APENAS EM ELEMENTOS INFORMATIVOS, não confirmados em sede judicial, o que acarreta em nulidade da decisão por violação ao art. 155 do CPP”, demanda reanálise do mérito, procedimento vedado no âmbito de embargos de declaração.

 

h) Violação ao art. 489, § 1º, inc. IV, do CPC por desconsideração dos depoimentos das testemunhas de defesa

Os embargantes alegam que a decisão embargada violou o art. 489, § 1º, inc. IV, do CPC ao desconsiderar os depoimentos das testemunhas de defesa. Eles sustentam que as testemunhas de defesa apresentaram depoimentos que contradizem a tese acusatória, mas a decisão não analisou ou valorou esses depoimentos, o que configura omissão e violação ao princípio da ampla defesa.

Tal argumento reflete novamente a conclusão de injustiça com o resultado do julgamento e a pretensão de que se reexaminem fatos e provas, pois os depoimentos das testemunhas defensivas foram referidos no acórdão, expressamente considerados, e não constitui omissão a valoração das provas de forma diferente daquela pretendida pela parte.

Devem ser desprovidos os embargos de declaração se as suas razões demonstram que se cuida de mero inconformismo com o resultado do julgamento, sendo esse o caso dos autos, pois os depoimentos das testemunhas de defesa foram devidamente apreciados e valorados, constando expressamente do aresto as razões de convencimento sobre o valor da prova.

 

i) Omissão quanto à ausência de dolo, à existência de dúvida razoável e à declaração do contador Marcelo

Alegam os embargantes que a declaração extrajudicial do contador Marcelo não foi enfrentada. Contudo, tal documento foi expressamente considerado, revelando a inexistência de qualquer omissão, conforme seguinte trecho do acórdão:

(…)

Assim, considero que a declaração extrajudicial prestada pelo contador Marcelo Moura Fiess em nada interfere no raciocínio até aqui exposto e que sequer carece de confiabilidade.

A prova de que a declaração não é fidedigna e de que Marcelo foi verdadeiro no depoimento judicial é o fato de que, no celular de Vilson, apreendido pela Polícia Civil quando do cumprimento dos mandados de busca e apreensão deferidos por este Tribunal, logrou-se identificar conversa com representante da empresa AUDITEC, responsável pela elaboração das contas partidárias, por meio do qual o denunciado confirma que o partido político sequer possuía conta bancária para a movimentação de recursos financeiros, a evidenciar que toda arrecadação e dispêndio era realizada de forma paralela pelos dirigentes (ID 41223283, fl. 3):

(…)

A alegação de ausência de dolo deve ser submetida à instância recursal superior, não sendo matéria passível de ser aclarada pela via dos embargos de declaração.

 

j) Omissão, obscuridade, violação ao princípio da legalidade, e existência de decisão ultra petita porque não há pedido na denúncia de aplicação de efeito da condenação previsto no art. 92, CP

Os embargantes alegam que a decisão embargada é omissa, obscura e viola o princípio da legalidade, pois aplicou efeitos da condenação previstos no art. 92 do CP sem que houvesse pedido expresso na denúncia. Asseveram que a decisão foi ultra petita, dado que o Ministério Público não solicitou a aplicação desses efeitos na denúncia, e que a decisão extrapolou os limites do pedido, violando o princípio da congruência e da correlação entre o pedido e a decisão.

Contudo, quanto à necessidade de requerimento, "a possibilidade de perda do cargo público não precisa vir prevista na denúncia, posto que decorre de previsão legal expressa, como efeito da condenação, nos termos do artigo 92 do Código Penal”. Cito precedentes:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENAL. CONCUSSÃO. VIOLAÇÃO AOS ARTS. 5.º, INCISO XXXV, E 93, INCISO IX, DA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA. RECURSO ESPECIAL: RECURSO ESPECIAL: RECURSO NO QUAL NÃO CABE DISCUSSÃO SOBRE OFENSA A DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. REAPRECIAÇÃO DA CONCLUSÃO DAS INSTÂNCIAS ANTECEDENTES ACERCA DOS FATOS E FUNDAMENTOS QUE ENSEJARAM A CONDENAÇÃO DO RECORRENTE. EXAME VEDADO. ENTENDIMENTO SEDIMENTADO NA SÚMULA N.º 07 DESTA CORTE. ALEGAÇÃO DE QUE AS TESES VENTILADAS NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NÃO FORAM APRECIADAS. NÃO OCORRÊNCIA. EMBARGOS DECLARATÓRIOS: VIA DE IMPUGNAÇÃO PRÓPRIA PARA SANAR CONTRADIÇÃO, OMISSÃO OU OBSCURIDADE. ACÓRDÃO NO QUAL SE ESCLARECEU QUE TAIS VÍCIOS NÃO OCORRERAM. CRIME COMETIDO EM RAZÃO DA FUNÇÃO DO RECORRENTE. PERDA DO CARGO DE POLICIAL MILITAR. ART. 92, INCISO I, ALÍNEA A, DO CÓDIGO PENAL. POSSIBILIDADE. EFEITO DA CONDENAÇÃO. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. PERDA DO CARGO PÚBLICO. DESNECESSIDADE DE PEDIDO EXPRESSO NA DENÚNCIA. EFEITO EXTRAPENAL DA CONDENAÇÃO PREVISTO NO ART. 92, DO CÓDIGO PENAL. AGRAVO DESPROVIDO. 1. No recurso especial não cabe discussão sobre ofensa a dispositivos constitucionais. 2. A incursão no âmbito probatório também é vedada no recurso especial, conforme entendimento sedimentado na Súmula n.º 07 desta Corte. 3. Os embargos de declaração destinam-se a sanar omissão, contradição ou ambigüidade de atos judiciais. Não servem, porém, para reapreciação da controvérsia. 4. Não há ofensa ao art. 41, do Código de Processo Penal, quanto à perda de cargo público, se devidamente fundamentado, nas instâncias antecedentes, o elemento objetivo necessário para tal efeito (quantidade da pena privativa de liberdade a que o Paciente fora condenado) e as razões subjetivas que indicam a necessidade da medida . 5. "A possibilidade de perda do cargo público não precisa vir prevista na denúncia, posto que decorre de previsão legal expressa, como efeito da condenação, nos termos do artigo 92, II, do Código Penal" (STJ, HC 81954/PR, 6ª Turma, Relatora Ministra Maria Thereza, DJ de 17/12/2007). 6. Tal consequência ocorre sempre que configurada a hipótese prevista no art. 92, inciso I, alínea a, do Código Penal, não fazendo a lei qualquer ressalva no sentido de que, se a pena privativa de liberdade for substituída por reprimendas restritivas de direito, não haverá a perda do cargo. 7. Agravo regimental desprovido.

(STJ, AgRg no AREsp 46266/SP, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 26/06/2012, DJe 01/08/2012).

 

HABEAS CORPUS. PECULATO. PERDA DO CARGO PÚBLICO. ART. 92, I, A, DO CP. POSSIBILIDADE. EFEITO DA CONDENAÇÃO. MOTIVAÇÃO CONCRETA. PEDIDO EXPLÍCITO NA DENÚNCIA. DESNECESSIDADE. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. IRRELEVÂNCIA. MANIFESTO CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. WRIT NÃO CONHECIDO. 1. Inexistência de patente ilegalidade a justificar a concessão da ordem de habeas corpus de ofício, tendo em vista que o Tribunal de origem, por ocasião do julgamento da apelação interposta pela defesa, bem explicitou os motivos para manter o decreto de perda do cargo público, como efeito da condenação. 2. Não é imprescindível que a possibilidade de perda do cargo público conste da denúncia, porquanto decorrente de previsão legal expressa, como efeito da condenação, nos termos do art. 92 do CP. Precedentes. 3. A substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não impede a decretação da perda do cargo ou da função pública, desde que apresentada a devida fundamentação. 4. Habeas corpus não conhecido.

(STJ - HC: 305500 SP 2014/0251121-1, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 04/10/2016, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/10/2016)

 

Assim, o recurso não comporta conhecimento, por indevida inovação recursal, quanto às teses de violação da cadeia de custódia da prova digital (c) e de nulidade e ilicitude da gravação ambiental (f).

Quanto aos demais pontos, os embargos de declaração merecem ser rejeitados.

DIANTE DO EXPOSTO, conheço em parte dos embargos de declaração; e, na parte conhecida, os rejeito nos termos da fundamentação.