RCED - 0600779-92.2024.6.21.0058 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/03/2025 às 10:00

VOTO

Eminentes Colegas.

1. Considerações Iniciais.

O Recurso Contra a Expedição de Diploma – RCED, ao contrário do que a nomenclatura faz entender, consubstancia autêntica ação de competência originária da segunda instância da Justiça Eleitoral, ainda que se trate de diplomação relativa a eleições municipais. Apresentado perante o magistrado de 1º grau, a este incumbe apenas o processamento inicial da demanda e a remessa dos autos ao Tribunal para instrução e julgamento.

Nessa linha, as lições de ZILIO (Direito Eleitoral, 10ª Ed. São Paulo, Editora JusPodivm, 2024, p. 718 e 727):

Descabido classificar o RCED como recurso, pois o recurso – ao contrário do remédio previsto no art. 262 do CE – é aforado, em regra, pelo sucumbente do feito dentro de uma relação processual já existente e, in casu, inexiste qualquer relação processual formada a partir da expedição do diploma. Desse modo, malgrado a denominação empregada pelo legislador, perceptível que o RCED é ação autônoma de impugnação do diploma, ou, na dicção do Ministro Sepúlveda Pertence, ‘o chamado recurso contra a expedição de diploma (C. Eleit. Art. 262), antes de ser recurso, é, na verdade, uma ação constitutiva negativa do ato administrativo da diplomação.

(…)

Nas eleições municipais (Prefeito e Vereador), o RCED é interposto e processado pelo Juiz Eleitoral e julgado pelo TRE (…)

 

2. Tempestividade.

O prazo decadencial para a apresentação de Recurso Contra Expedição de Diploma é de 3 dias, contados da data da cerimônia de diplomação dos eleitos, sendo eventualmente suspenso no período compreendido entre os dias 20 de dezembro e 20 de janeiro, inclusive, conforme preceitua o art. 220 do Código de Processo Civil, pois é comum que as diplomações ocorram nos últimos dias do ano forense.

No caso dos autos, a apresentação do RCED ocorreu em 20.12.2024, de maneira que foi observado o tríduo legal. Sublinho que a diplomação dos eleitos de 2024 no Município de Vacaria se deu em 17.12.2024, de modo que o último dia para ajuizamento, sem a ocorrência de decadência do direito de agir, seria 21.01.2021.

3. Síntese dos fatos.

Em síntese, os fatos ensejadores da demanda são os seguintes: em junho de 2024 o Presidente da Executiva Estadual do Partido Liberal no Rio Grande do Sul, sr. Giovani Cherini, destituiu a Comissão Executiva do Partido Liberal de Vacaria. Na sequência, o Diretório Estadual designou uma Comissão Provisória Municipal, a qual realizou os procedimentos eleitorais para escolha dos candidatos a vereador e para a chapa majoritária nas Eleições de 2024, e, em convenção, restaram escolhidos os candidatos ora recorridos.

De outra banda, a Comissão destituída ingressou com Mandado de Segurança, autuado sob o n. 0600248-83.2024.6.21.0000, de relatoria do Des. Mário Crespo Brum, julgado em 01.10.2024, cuja ementa da decisão deste Tribunal transcrevo:

Direito eleitoral. Eleições 2024. Mandado de segurança. Destituição de comissão provisória municipal. Ausência de contraditório e ampla defesa. Nulidade do ato. Concessão da segurança.

I. CASO EM EXAME

1.1. Mandado de segurança contra ato do presidente da executiva estadual do partido, que destituiu a comissão provisória municipal de forma unilateral e sem observância do contraditório e da ampla defesa. Indeferida a tutela liminar.

1.2. Os impetrantes alegam que a destituição ocorreu de forma arbitrária e sem observância das normas internas do partido, o que violou os princípios do contraditório e do devido processo legal.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. Saber se o ato de destituição da comissão provisória municipal do partido violou os princípios do contraditório e da ampla defesa, tornando-o nulo.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. As comissões provisórias são representações temporárias e precárias dos partidos, nomeadas pelo órgãos diretivos superiores no modo e tempo previstos nas normas internas da agremiação, e subsistem até que, eventualmente, haja a constituição regular de um diretório, mediante eleição interna no âmbito da agremiação.

3.2. O TSE somente admite a destituição de comissões provisórias pelas esferas superiores quando a medida observar o contraditório e a ampla defesa, bem como as normas estatutárias que disciplinam o procedimento.

3.3. No caso concreto, a destituição ocorreu de forma sumária, não havendo nenhum tipo de notificação prévia, procedimento administrativo ou abertura de espaço para manifestação, contraditório ou ampla defesa, ainda que de modo diferido, bem como de decisão que consigne expressamente os motivos fáticos e jurídicos que dão suporte à destituição.

3.4. Normas estatutárias da organização partidária não suplantam as normas constitucionais do devido processo legal, as quais impõem, em qualquer hipótese, que a destituição de órgãos de direção partidária ocorra por meio de um processo interno que respeite a garantia do contraditório, sob pena de nulidade.

3.5. Não atendidos os requisitos exigidos pela jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral. Inobservância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Concessão da segurança.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Concessão da segurança para anular a decisão que destituiu a comissão provisória municipal, restituindo a sua vigência.

Tese de julgamento: “A destituição de Comissões Provisórias somente se afigura legítima se atender às diretrizes e aos imperativos normativos, constitucionais e legais, notadamente a observância das garantias fundamentais do contraditório e da ampla defesa.”

Dispositivos relevantes citados: Lei n. 12.016/09, art. 1º, § 1º.

Jurisprudência relevante citada: TSE; Referendo no Mandado de Segurança Cível n. 060074468, Acórdão, Min. Ricardo Lewandowski, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 11/10/2022; TSE; Agravo Regimental em REspe n. 060024842, Rel. Min. Sérgio Banhos, Publicação: 04/12/2020; Petição Cível n. 060062706, Acórdão, Min. Raul Araujo Filho, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 07/02/2023.

Frente a decisão deste Regional, de um lado, o Diretório Estadual interpôs Recurso Ordinário (não conhecido pelo E. TSE); de outro, o Presidente da Comissão restituído ao cargo convocou nova convenção, em 03.10.2024, a qual ratificou os nomes dos candidatos para concorrerem ao cargo de vereador, e deliberou que o partido não teria candidato para concorrer aos cargos de Prefeito e Vice-Prefeito.

Repiso: os candidatos recorridos, eleitos, foram diplomados em 17.12.2024, e a agremiação recorrente ingressou com o presente feito em 20.12.2024.

4. Interesse de agir e via eleita.

Entendo que o presente tópico tem papel fundamental para o desfecho da demanda.

Como dito, o UNIÃO BRASIL de Vacaria sustenta o pedido de cassação dos diplomas de ANDRE LUIZ ROKOSKI e FERNADO LUCENA MACIEL, ao entendimento de ser nula de pleno direito a escolha na convenção partidária dos candidatos eleitos, em decorrência da decisão do Mandado de Segurança n. 0600248-83.2024.6.21.0000, supratranscrita, a qual teria gerado o fato superveniente apto a ensejar a procedência do presente RCED.

Adianto não ser possível acolher o pedido, pois inadequada a via eleita.

Explico.

Os termos legais do RCED encontram-se no art. 262 do Código Eleitoral:

Art. 262. O recurso contra expedição de diploma caberá somente nos casos de inelegibilidade superveniente ou de natureza constitucional e de falta de condição de elegibilidade. (Redação dada pela Lei n. 12.891, de 2013)

Reproduzo entendimento jurisprudencial concernente às inelegibilidades que admitem a espécie de ação, em excerto de acórdão do e. TSE:

(…) inelegibilidades que lastreiam a interposição do Recurso Contra a Expedição de Diploma (RCED) são de duas ordens: em primeiro lugar, as inelegibilidades de caráter constitucional, constituídas a qualquer momento, não sujeitas ao instituto da preclusão; e, em segundo lugar, as inelegibilidades de natureza infraconstitucional que surgirem após a formalização do registro de candidatura. As inelegibilidades infraconstitucionais constituídas antes do pedido de registro não podem ser suscitadas em RCED, porquanto a sede própria é a Ação de Impugnação de Registro de Candidatura (AIRC), sob pena de preclusão. A vexata quaestio cinge-se em saber se o reconhecimento de causa de inelegibilidade ocorrida após a eleição (no caso, a revogação da decisão liminar que suspendia os efeitos da decisão de rejeição de contas) pode (ou não) ser veiculada em sede de Recurso Contra a Expedição de Diploma, com espeque no art. 262, I, do Código Eleitoral, em sua redação primeva.

BRASIL. Tribunal Superior Eleitoral, Agravo de Instrumento n. 3037, Ac., Rel. Min. Luiz Fux, DJE 06.4.2017.

Ainda, conforme os termos da Súmula n. 47 do TSE, a inelegibilidade superveniente que autoriza a interposição de recurso contra expedição de diploma, fundado no art. 262 do Código Eleitoral, é aquela de índole constitucional ou, se infraconstitucional, superveniente ao registro de candidatura, e que surge até a data do pleito.

Ou seja, as hipóteses de cabimento do recurso contra expedição de diploma estão especificadas na legislação de regência, em numerus clausus, nos quais não se enquadra a irregularidade em comento. Nesse sentido, decisões, monocrática e colegiada, do E. TSE e do TRE-ES:

AGRAVO REGIMENTAL. NEGATIVA DE SEGUIMENTO A AGRAVO. RCED. INELEGIBILIDADE SUPERVENIENTE.

1. Hipótese em que, o acórdão recorrido, encontra-se em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior, reafirmada em julgamento relativo as eleições de 2012, no sentido de que a inelegibilidade superveniente, para fins de ajuizamento do recurso contra expedição de diploma, deve ser aquela que surge apos o registro e antes da eleição. Precedentes: AgR-REspe n° 35.997[42743-07]/BA, rel. Mm. ARNALDO VERSIANI, We de 3.10.2011; AgR-REspe n° 903-40ISP, rel. Min. Dias Toffoli, DJE de 2.6.2014. [...] (Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 41223, Acórdão de 25/06/2015, Relator(a) Min. MARIA THEREZA ROCHA DE ASSIS MOURA, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Data 15/10/2015 )

 

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. ELEIÇÕES 2012. PREFEITO. IRREGULARIDADE EM CONVENÇÃO. CONDIÇÃO DE ELEGIBILIDADE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. INOVAÇÃO EM SEDE DE AGRAVO.IMPOSSIBILIDADE. DESPROVIMENTO.

1. Não é cabível recurso contra expedição de diploma para discutir eventuais irregularidades em convenção partidária para escolha de candidato, tendo em vista que esse fato não se enquadra em nenhuma das hipóteses de cabimentoprevistas no art. 262 do Código Eleitoral.2. A configuração de dissídio jurisprudencial pressupõe a demonstração de divergência de entendimento entre o acórdão recorrido e os julgados paradigmas, mediante a realização de cotejo analítico entre os casos confrontados, a teordoenunciado Sumular 291/STF. Além disso, não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida (Súmula 83/STJ).3. É incabível a inovação de teses em sede de agravo regimental.4. Agravo regimental desprovido.Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº6907, Acórdão, Min. João Otávio De Noronha, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 06/10/2014.

 

ELEIÇÕES 2016. RECURSO CONTRA EXPEDIÇÃO DE DIPLOMA. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.1 - O art. 262, do Código Eleitoral estabeleceu as hipóteses, numerus clausus, de cabimento do RCED. Nesse passo, somente em se tratando de inelegibilidade de natureza constitucional, de inelegibilidade superveniente - entendida comoaquela ocorrida entre a data do registro de candidatura e a data do pleito - ou de falta de condição de elegibilidade é que será possível questionar a situação do candidato que teve seu registro deferido, por meio do recurso contra expedição dediploma,a ser interposto nos termos do art. 262 do Código Eleitoral.2 - No caso dos autos, os fundamentos do presente RCED residem em suposta falta de condição de elegibilidade dos recorridos decorrente de nulidade da constituição da comissão provisória e da convenção partidária do PRP que escolheuosrecorridos como candidatos da agremiação. Todavia, tais alegações não se amoldam às hipóteses de cabimento do Recurso Contra Expedição de Diploma, previstas no art. 262, do Código Eleitoral. Com efeito, a jurisprudência do TSE é firme no sentido de quenão cabe recurso contra expedição de diploma para análise de nulidade de convenção partidária. Precedentes.3 - De fato, a fase processual adequada para se discutir irregularidade e/ou nulidade de convenção partidária é na impugnação ao DRAP. Logo, não há dúvidas acerca da ausência de interesse de agir (adequação) do recorrente.4 - Por fim, destaco que a matéria aventada nos presentes autos foi objeto da ação nº 300-06, que visou a declaração da nulidade da convenção partidária e tramitou na 22ª Zona Eleitoral, sendo certo que eventual julgamento da demandasem análise de mérito acarretaria tão somente a interposição da peça recursal cabível sem, contudo, autorizar o manejo do presente RCED, cujas hipóteses taxativas são aquelas previstas no art. 262, do Código Eleitoral, conforme já explanado5 - Extinção do feito sem resolução do mérito.RECURSO CONTRA EXPEDICAO DE DIPLOMA nº33733, Acórdão, Des. CRISTIANE CONDE CHMATALIK_1, Publicação: DJE - Diário Eletrônico da Justiça Eleitoral do ES, 23/06/2017.

Nessa linha de raciocínio, diz o D. Procurador Regional Eleitoral que os argumentos e fatos trazidos pelo recorrente não são suscetíveis de produzir o efeito jurídico pretendido, sendo certo que as hipóteses ensejadoras do recurso contra a expedição de diploma são arroladas em numerus clausus, dentre os quais não se inclui a irregularidade em convenção partidária ou a invalidade de órgão partidário municipal.

Por fim, destaco que a matéria aventada no presente feito foi objeto da Ação de Impugnação de Registro de Candidatura n. 0600761-71.2024.6.21.005, da qual reproduzo excerto da sentença, por pertinente:

No caso concreto, de plano, verifica-se a completa impertinência da ação proposta, demonstrada em breves apontamentos cronológicos.

Isso porque a Comissão do Partido Liberal presidida pelo Sr. ANDRÉ LUIZ ROKOSKI, que foi eleito Prefeito de Vacaria pela coligação HUMANIZA VACARIA[PL/PDT], possuía vigência pelo prazo de 11 de junho de 2024 até 09 de fevereiro de 2025, em virtude de decisão do Presidente Estadual do Partido Liberal, Sr. Giovani Cherini, que destituiu a Comissão até então vigente do PL de Vacaria/RS.

A Res. 23.609/19 já mencionada, por sua vez, determina que para participar do pleito deve o partido estar vigente e ter órgão constituído na respectiva circunscrição até a data da convenção (art. 2, I)

O que se verifica preenchido.

Ademais, o art. 6º dispõe que a convenção para escolha de candidatos deverá ser realizada entre o período de 20 de julho e 05 de agosto do ano da eleição.

O que também se verifica preenchido, já que fora realizada a convenção na data de 29 de julho de 2024.

Ainda que em 01 de outubro de 2024 tenhamos decisão do TRE/RS destituindo a Comissão que realizou a convenção acima, naquela época tratou-se de ato jurídico perfeito, uma vez que era, de fato, a Comissão legitimada a responder pelo Partido Liberal de Vacaria/RS.

Em acréscimo, há de se mencionar que a decisão do tribunal em nenhum momento determinou a anulação da convenção ou de qualquer ato realizado pela comissão atacada, talvez justamente por reconhecer que se tratava de ato jurídico perfeito:

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela concessão da segurança para anular a decisão que destituiu a Comissão Provisória Municipal do Partido Liberal PL de Vacaria, integrada pelos impetrantes, restituindo a sua vigência (MS 060024883.2024.6.21.0000).

Observa-se, dessa forma, que seus efeitos são ex nunc e não se irradiam para o pleito já realizado no município.

Fixada a legitimidade da primeira convenção realizada, forçoso reconhecer que a segunda convenção partidária realizada pela agora Comissão restituída, ocorrida em 03 de outubro de 2024, não possui validade jurídica, vez que flagrantemente intempestiva.

Isso posto, não merece prosperar a alegação de que ambas convenções devem ser consideradas nulas e, consequentemente, indeferido o registro de candidatura do candidato ANDRÉ LUIZ ROKOSKI, por suposta falta de requisito de elegibilidade.

Dessa forma, julgo improcedente e extingo de ofício a presente Ação de Impugnação de Registro de Candidatura proposta, nos termos do art. 485, inc. IV do Código de Processo Civil c/c § 3º do mesmo código. (ID 45886207 - g.n.)

 

Com apoio nessas premissas, considerando que as causas de inelegibilidade e as condições de elegibilidade devem ser interpretadas de forma restritiva e a causa de pedir não se alinha as hipóteses previstas na espécie, julgo que a ação deve ser extinta sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC.

ANTE O EXPOSTO, VOTO por julgar extinto o processo sem julgamento do mérito.