REl - 0600637-05.2024.6.21.0021 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/12/2025 às 16:00

VOTO

A sentença de desaprovação fundamentou-se no exame técnico que verificou a irregularidade na comprovação de despesas com pessoal custeadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), no valor total de R$ 2.500,00, bem como inconsistências na comprovação de material gráfico de campanha supostamente utilizado em propaganda conjunta com o candidato majoritário.

A candidata contratou serviços de militância (distribuição de santinhos, panfletos e volantes) de terceiro identificado, mediante dois contratos, nos valores de R$ 2.000,00 e R$ 500,00, ambos pagos com recursos do FEFC, mas os instrumentos não detalham, na forma do § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19, a identificação dos locais de trabalho, das horas trabalhadas e a justificativa do preço ajustado.

Os dois contratos foram firmados pelo mesmo prestador. Um deles indica o trabalho de 13.8.2024 a 30.9.2024 na cidade de Estrela, em horário comercial, para serviços de entregador(a) de "santinhos", panfletos, volantes eleitorais e visitas às famílias, no valor de R$ 2.000,00. No outro, indica-se o trabalho “a partir da data da campanha”, sem especificação do período de trabalho, na cidade de Estrela, em horário comercial, para serviços de entregador(a) de "santinhos", panfletos, volantes eleitorais e visitas às famílias. Ao lado das atividades, de forma manuscrita consta “e mídias digitais”, no valor de R$ 500,00.

Os dois contratos têm a mesma forma, com rasura manuscrita em um deles para incluir “e mídias digitais” no objeto.

No curso da análise, a candidata apresentou prestação de contas retificadora, declarando receita estimável em dinheiro consistente em material de propaganda proveniente do candidato ao cargo majoritário, instruída com nota fiscal emitida por gráfica, na qual consta apenas “material gráfico para campanha majoritária”, sem referência a cargo proporcional.

Entendeu a unidade técnica que a documentação não comprova a existência de material impresso a ser distribuído na campanha da recorrente, por ausência de descrição detalhada e, sobretudo, por não ter sido apresentada amostra de propaganda impressa com indicação de CNPJ/CPF do responsável pela confecção e tiragem, em desacordo com o art. 21, § 1º, e com o art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Com base nessas irregularidades, a sentença julgou desaprovadas as contas da candidata, com fundamento no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 2.500,00, correspondente aos gastos com pessoal custeados com recursos do FEFC considerados não comprovados, nos termos do art. 79, § 1º, da mesma resolução, os quais representam 94% da receita arrecadada (R$ 2.642,16).

A recorrente argumenta que todas as diligências foram atendidas.

A tese não procede. Como visto na sentença, a desaprovação decorreu essencialmente da ausência de comprovação idônea dos gastos custeados com recursos FEFC, no montante de R$ 2.500,00, valor que corresponde à quase totalidade das receitas arrecadadas na campanha da recorrente.

Ainda que se admita a utilização de outros documentos para reforçar a comprovação das despesas, a disciplina específica do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19 para gastos com pessoal custeados com recursos públicos não é facultativa. O detalhamento mínimo legalmente exigido é instrumento essencial de transparência e de controle sobre a correta aplicação de verbas provenientes do FEFC.

No caso concreto, não há discriminação da quantidade de horas efetivamente trabalhadas e as rasuras manuscritas em um dos instrumentos, sem ressalva, para acrescer “mídias digitais” ao objeto contratado, agravam o quadro de insuficiência documental.

Além disso, não ficou clara a confecção de propaganda impressa para a recorrente.

O recurso invoca a existência de material gráfico de campanha supostamente custeado pelo candidato majoritário, com veiculação conjunta, para justificar a contratação de militância.

Consta dos autos prestação de contas retificadora com nota fiscal emitida em favor do candidato ao cargo de prefeito, na qual se lê apenas “material gráfico para campanha majoritária”, sem referência a cargo proporcional. Foi ainda apresentada, no corpo de manifestação, imagem tida como amostra de propaganda impressa conjunta.

Contudo, como ressaltado na origem e no parecer ministerial, a nota fiscal não comprova a produção de material específico da recorrente, tampouco de peças efetivamente utilizadas de forma conjunta, a autorizar o enquadramento na hipótese de uso comum prevista no art. 7º, §§ 6º e 7º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e no art. 38, § 2º, da Lei n. 9.504/97.

A mera indicação, na descrição do documento fiscal, de “campanha majoritária” não permite inferir, por si, que determinado material impresso tenha servido à divulgação da candidatura proporcional.

Ademais, a imagem juntada como amostra não traz qualquer menção a CNPJ ou CPF do responsável pela confecção nem à tiragem, em descompasso com o art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, circunstância que conduz, com acerto, à conclusão de que se trata de conteúdo digital, e não de material impresso submetido à disciplina própria da propaganda física o qual teria sido, na tese da recorrente, distribuído pelo prestador do serviço de panfletagem. Não há, portanto, como utilizar essa peça para suprir a deficiência na comprovação da despesa com militância custeada com recursos do FEFC.

A jurisprudência deste Tribunal e do Tribunal Superior Eleitoral tem admitido a flexibilização de formalidades quando presentes elementos suficientes de materialidade e rastreabilidade do gasto, mas não dispensa, especialmente em se tratando de recursos públicos, o atendimento de padrões mínimos de documentação que permitam aferir a efetiva contraprestação e o razoável nexo entre o serviço e o valor pago.

A recorrente ainda invoca os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, postulando, subsidiariamente, a aprovação das contas com ressalvas, com ou sem devolução de valores. Aqui também a irresignação não procede.

A irregularidade verificada não é pontual nem de pequena monta: recai sobre a quase totalidade das receitas declaradas e incide exatamente sobre a aplicação de recursos públicos em despesas cuja efetiva contraprestação não se consegue aferir de modo minimamente seguro.

O montante de R$ 2.500,00 perfaz 94% dos recursos arrecadados (R$ 2.642,16), extrapolando os parâmetros da jurisprudência das Cortes Eleitorais para aplicação dos princípios de proporcionalidade e de razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas, tendo em vista que está acima de 10% do total de recursos arrecadados e é superior ao valor nominal de R$ 1.064,10. De acordo com a jurisprudência:  “Em prestação de contas cuja irregularidade envolver valores reduzidos, inferiores a R$ 1.064,10 ou a 10% da arrecadação, é admitida a aprovação com ressalvas, em observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.” (TRE-RS, REl n. 0600724-60.2024.6.21.0085, Relator Des. El. Nilton Tavares da Silva, DJe 13.02.2025).

Quanto à devolução ao erário, a sentença aplicou o art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que prevê o recolhimento ao Tesouro Nacional dos valores oriundos do Fundo Partidário ou do FEFC cuja utilização não tenha sido devidamente comprovada.

No ponto, a argumentação recursal colide com o próprio escopo da disciplina dos recursos públicos de campanha, que é assegurar não só a licitude da origem, mas também a transparência e a aderência da destinação ao fim público que justifica a transferência. Se a candidata recebeu R$ 2.500,00 de FEFC e não logrou demonstrar, com a documentação exigida, a efetiva prestação dos serviços contratados, mostra-se correta a determinação de devolução integral dessa quantia ao Tesouro Nacional.

Em suma, como bem delineado pela Procuradoria Regional Eleitoral, permanecem não comprovados, nos moldes exigidos pela Resolução TSE n. 23.607/19, os gastos com pessoal custeados com recursos do FEFC, no montante de R$ 2.500,00.

Em face do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.