REl - 0600488-14.2024.6.21.0084 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/12/2025 às 16:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, MARIA REGINA DE OLIVEIRA SCHMIDT, candidata ao cargo de vereadora no Município de Tapes/RS, recorre contra a sentença que desaprovou suas contas em razão de divergências entre os lançamentos no SPCE e os extratos bancários, com omissão do registro integral da movimentação financeira de campanha, além da não comprovação de despesas custeadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC, no montante de R$ 1.468,14, com determinação de recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.

Em suas razões recursais, a recorrente não apresenta esclarecimentos específicos ou impugnação direta às irregularidades reconhecidas na sentença, limitando-se a alegar genericamente tratar-se de falhas formais, estornos bancários e omissões materiais sem dolo, defendendo, por isso, a reforma da decisão para que as contas sejam aprovadas com ressalvas.

Todavia, ao compulsar os autos, constata-se que não houve a juntada de qualquer documento comprobatório da aplicação dos recursos do FEFC, conforme exigido pelo art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

 

A sentença consignou que a candidata, embora regularmente intimada, deixou de apresentar documentos e esclarecimentos capazes de sanar as inconsistências apontadas, notadamente a ausência de registros contábeis e a falta de comprovação da aplicação dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). Tal inércia inviabilizou a correção das falhas, obstou a atuação fiscalizatória da Justiça Eleitoral e comprometeu o controle da legalidade e da transparência na utilização de recursos públicos, em afronta aos arts. 53 e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nesse sentido, a manifestação da Procuradoria Regional Eleitoral é elucidativa e bem reflete a gravidade das irregularidades constatadas, nos seguintes termos:

 

Ressalte-se que a ausência de documentos comprobatórios relativos a despesas custeadas com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) configura vício substancial, pois compromete a regularidade e a transparência na aplicação de recursos públicos, conforme dispõe o art. 60 da Resolução TSE nº 23.607/2019.

Dessa forma, a existência de divergências entre a movimentação financeira declarada e aquela verificada nos extratos bancários impede a aferição da veracidade das informações prestadas, conforme art. 53 da referida norma. Assim, ainda que não se comprove dolo ou má-fé, o conjunto das falhas configura irregularidade de natureza grave, apta a justificar a desaprovação das contas.

 

Conforme o § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, a ausência de comprovação da aplicação de recursos do FEFC enseja o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor correspondente. Transcreve-se o dispositivo:

 

Art. 79. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 31 e 32 desta Resolução.

§ 1º Ausente a comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário (FP) e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou comprovada a utilização indevida, a execução da decisão que julgar as contas, após o seu trânsito em julgado, determinará a devolução do valor correspondente na forma estabelecida pela Res.-TSE nº 23.709/2022. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

 

Nesse contexto, destaca-se o precedente do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul:

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. SUPLENTE. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO RELATIVOS ÀS ELEIÇÕES GERAIS DE 2018. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS ORIUNDOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA  FEFC. OMISSÃO DE DESPESA. FALHAS QUE REPRESENTAM PERCENTUAL SIGNIFICATIVO DA TOTALIDADE DAS RECEITAS AUFERIDAS . RECOLHIMENTO DA QUANTIA IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Persistência de irregularidades sem que o prestador de contas tenha vindo aos autos para esclarecer, ou sequer contestar, os apontamentos técnicos realizados pela Secretaria de Controle Interno e Auditoria (SCI) deste Tribunal . 2. Ausência de comprovação de aplicação de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha. A natureza pública dos recursos oriundos do Fundo Partidário e do FEFC impõe ao prestador o dever de demonstrar sua correta aplicação, com obediência aos ditames legais e regulamentares, os quais exigem, dentre outras prescrições, a identificação específica do beneficiário por intermédio do meio de pagamento e da apresentação da documentação fiscal. Não tendo sido juntado qualquer comprovante, não há como amparar a licitude dos gastos declarados pelo candidato com a aludida verba pública, devendo o valor correspondente ser recolhido ao Tesouro Nacional . 3. Omissão do registro de despesas. Emitidas notas fiscais contra o CNPJ do prestador que não foram declaradas na prestação de contas. Gastos adimplidos com recursos que, da mesma maneira, deixaram de ser consignados na movimentação contábil, transitando ao largo dos registros oficiais e da sindicância da Justiça Eleitoral, comprometendo a transparência da contabilidade . Caracterizada a utilização de recursos de origem não identificada, o que acarreta, na dicção do art. 34 da Resolução TSE n. 23.553/17, o dever de recolhimento ao Tesouro Nacional . 4. Falhas que representam 26,76% do total de despesas de campanha, ensejando a desaprovação das contas.

(TRE-RS - PC: 060286526 PORTO ALEGRE - RS, Relator.: GUSTAVO ALBERTO GASTAL DIEFENTHÄLER, Data de Julgamento: 15/10/2019, Data de Publicação: DEJERS-, data 21/10/2019) Grifei.

 

A alegação da recorrente de que as falhas seriam meramente formais, decorrentes de estornos bancários e erros materiais, não se sustenta, pois o valor de R$ 1.468,14 representa a totalidade dos recursos públicos movimentados na campanha, extrapolando com folga tanto o limite de R$ 1.064,10 quanto o parâmetro de 10% do total arrecadado, usualmente adotados pela jurisprudência como limites de irrelevância para fins de aprovação com ressalvas.

Assim, não se mostra viável a aprovação das contas com ressalvas, como pretendido, uma vez que a irregularidade atinge a integralidade dos recursos públicos utilizados e compromete substancialmente a transparência e a confiabilidade das contas eleitorais.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.