PC-PP - 0600181-55.2023.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/12/2025 às 16:00

VOTO

1. Mérito.

O Diretório Estadual do MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO apresenta contas relativas ao exercício financeiro do ano de 2022, disciplinado quanto ao mérito pela Resolução TSE n. 23.604/19.

A Secretaria de Auditoria Interna (SAI) deste Tribunal examinou a movimentação financeira e identificou impropriedade e irregularidades nas contas, das quais passo ao exame.

2. Impropriedade.

O exame verificou que o partido apresentou os comprovantes de gastos sem manter a cronologia da movimentação financeira e a individualização por conta bancária, em descumprimento ao disposto no § 6º do art. 29 da Resolução TSE n. 23.604/19.

No ponto, julgo suficiente que a agremiação observe a recomendação consignada pelo examinador no sentido de observar o regramento, colaborando na clareza das informações a serem analisadas.

3. Irregularidades.

Ao proceder ao exame das verbas públicas oriundas do Fundo Partidário recebidas e distribuídas pela grei partidária, verificou-se irregularidades remanescentes no total de R$ 3.412,11, concernentes a gastos efetuados em desacordo com o art. 17, § 2º, art. 18 e art. 29, inc. V, c/c o art. 36, § 2º, todos da Resolução TSE n. 23.604/19, que transcrevo:

Art. 17. Constituem gastos partidários todos os custos e despesas utilizadas pelo órgão do partido político para a sua manutenção e para a consecução de seus objetivos e programas.

§ 2º Os recursos do Fundo Partidário não podem ser utilizados para a quitação de multas relativas a atos infracionais, ilícitos penais, administrativos ou eleitorais ou para a quitação de encargos decorrentes de inadimplência de pagamentos, tais como multa de mora, atualização monetária ou juros.

Art. 18. A comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo dele constar a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou pela razão social, o CPF ou o CNPJ e o endereço, e registrados na prestação de contas de forma concomitante à sua realização, com a inclusão da respectiva documentação comprobatória.

Art. 29. O processo de prestação de contas partidárias tem caráter jurisdicional e deve ser composto das informações declaradas no sistema SPCA e dos documentos juntados nos autos da prestação de contas.

V - Demonstrativo de Recursos Recebidos e Distribuídos do Fundo Partidário;

Art. 36. Constatada a conformidade da apresentação de conteúdos e peças, nos termos do art. 29, §§ 1º e 2º, as contas devem ser submetidas à análise técnica para exame de sua regularidade, que compreende:

II - a regularidade na distribuição e na aplicação de recursos oriundos do Fundo Partidário, especificando o percentual de gastos irregulares em relação ao total de recursos;

§ 2º A regularidade de que trata o inciso II do caput abrange, além do cumprimento das normas previstas no art. 2º, a efetiva execução do serviço ou a aquisição de bens e a sua vinculação às atividades partidárias.

 

As despesas irregulares estão discriminadas na tabela abaixo:

 

TabelaO conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

 

Como se nota, subdividem-se em (i) ausência de comprovação de gastos com os fornecedores Hotelar Hotel e Turismo Ltda.; (ii) ausência de comprovação de gastos com Fernanda Ferreira Bravo; e (iii) pagamento de multas e juros.

Vejamos.

3.1. Do gasto com fornecedor Hotelar Hotel e Turismo Ltda.

Relativamente à despesa de hospedagem, o prestador informa que o referido hotel foi diligenciado diversas vezes sem sucesso. Portanto, infelizmente, não há documentos para serem juntados.

Ou seja, não foram trazidos, aos autos, esclarecimento ou documentos aptos a afastar o apontamento, devendo ser reconhecida a irregularidade na quantia de R$ 229,00.

3.2. Do gasto com Fernanda Ferreira Bravo.

No tocante à despesa com o pagamento a Fernanda Ferreira Bravo, alega a agremiação que

(...) no dia 01/12/2022 foi efetivado o pagamento de salário da funcionária Fernanda. O total a ser pago era de R$2.118,68, contudo, por um equívoco contábil, foi pago o valor de R$2.069,60.

Trata-se de um mero erro material, um equívoco, conforme dito acima, que não foi percebido, nem pela colaboradora, nem pelo responsável peplo pagamento, até a emissão da diligência. Foi feito, então, um pagamento de complementação no valor de R$49,08, no dia 16 de julho do corrente ano de 2024, para que o ajuste contábil fosse efetivado e para que a colaboradora não fosse prejudicada. O comprovante do complemento foi anexado como resposta ao item 77 da diligência retro (ID45664908)

Compulsando os documentos dos autos, verifico, no ID 4566490, contracheques referentes aos meses de novembro e dezembro de 2022, os quais apresentam mesmo valor líquido a receber: R$ 2.118,68.

Em contrapartida, no mesmo ID referenciado, documentos de transferências bancárias, datados de 01.12.2022 (R$ 2.069,60) e 02.01.2023 (R$ 2.118,68). No documento de ID 45664908, fora colacionado o comprovante de transferência bancária na quantia exata para cobrir a diferença verificada entre o pagamento e o valor devido para o mês de novembro, qual seja, R$ 49,08.

Julgo comprovada a despesa, de modo a afastar a sugestão de recolhimento do valor de R$ R$ 2.069,60.

3.3 Pagamento de multas e juros com verbas do Fundo Partidário.

Por fim, quanto aos valores dispendidos com quitação de multas e juros, a Seção de Auditoria das Contas Anuais anotou a possibilidade de ser considerada a EC n. 133 e, neste caso, a quantia de R$ 1.113,51 não estaria sujeita a recolhimento ao Tesouro Nacional

Contudo, este Tribunal tem firmado entendimento no sentido da inviabilidade de o instituto retroagir para abrigar irregularidades havidas em exercícios anteriores. Neste sentido:

   DIREITO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2023. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTES VEDADAS. APLICAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. PERCENTUAL DE IRREGULARIDADES INFERIOR A 10% DA ARRECADAÇÃO. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

     I. CASO EM EXAME

     1.1 Prestação de contas anual apresentada por diretório estadual de partido político e seus dirigentes partidários, referente ao exercício financeiro de 2023.

     II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

     2.1. Definir se as irregularidades relativas ao recebimento de recursos de fontes vedadas e à aplicação irregular do Fundo Partidário comprometem a regularidade das contas a ponto de ensejar sua desaprovação.

     2.2. Estabelecer se é possível aplicar retroativamente o art. 6º da EC n. 133/24 para afastar o dever de devolução de recursos utilizados para pagamento de juros, multas e encargos.

     III. RAZÕES DE DECIDIR

     3.1. Mantida a falha relativa ao recebimento de recursos de fonte vedada, pois devidamente demonstrado que o partido recebeu contribuições de pessoa jurídica, o que é expressamente vedado pelo art. 12, inc. II, da Resolução TSE n. 23.604/19. A contribuição espontânea não afasta a irregularidade.

     3.1.2. Contribuições de detentores de cargos comissionados. O motivo da falta de filiação não importa na análise da irregularidade (militantes, filiados antigos com transferência de domicílio eleitoral), pois a possibilidade de recebimento de contribuições de detentores de funções comissionadas está excepcionada apenas aos casos de filiação regular, a qual não foi comprovada.

     3.2. Realização de despesas irregulares com recursos do Fundo Partidário, em desacordo com os arts. 18, 29, inc. V, e 36, § 2º, todos da Resolução TSE n. 23.604/19, em razão da ausência de documentação fiscal comprobatória dos gastos.

     3.2.1. Os gastos relativos ao pagamento de juros, multas e encargos foram realizados em 2023, em desacordo com o art. 17, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19, e o art. 6º da Emenda Constitucional n. 133 não prevê a aplicação retroativa do instituto a exercícios anteriores, devendo ser mantido o dever de recolhimento da quantia, conforme entendimento deste Tribunal.

     3.2.2. A ausência de documentos fiscais hábeis, como notas fiscais com a devida descrição dos serviços prestados ou das mercadorias entregues, apólices de seguro em nome da agremiação e documentos que comprovem de forma idônea o vínculo da despesa com a atividade partidária, compromete a regularidade das operações e impede o controle da correta aplicação dos recursos públicos repassados por meio do Fundo Partidário.

     3.2.3. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral tem sido firme no sentido de que a falta apresentação de documentos formais, sem lastro em comprovações mínimas de execução e vinculação com as atividades partidárias, caracteriza-se como irregularidade, devendo-se exigir grau razoável de detalhamento e autenticidade na documentação acostada.

     3.2.4. Irregularidade na aplicação de recursos do Fundo Partidário, especificamente vinculados à promoção da participação política das mulheres, em razão da ausência de documentação fiscal hábil capaz de demonstrar a regularidade da operação financeira e a vinculação do gasto à finalidade legal prevista.

     3.2.5. A Resolução TSE n. 23.604/19 exige, para a comprovação regular da aplicação de recursos vinculados à promoção da participação feminina na política, não apenas a menção genérica ao objetivo da despesa, mas a apresentação de documentação fiscal válida, compatível com a natureza do gasto. No caso, as despesas não foram comprovadas com nota fiscal válida ou documentação equivalente.

     3.3. As irregularidades representam 4,29% do montante de recursos recebidos, percentual inferior a 10%, o que autoriza a aprovação das contas com ressalvas, segundo os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade e a jurisprudência consolidada do TSE e do TRE-RS.

     3.4. A multa de 20% não é cabível, pois tal penalidade só incide em hipóteses de desaprovação das contas, conforme jurisprudência.

     IV. DISPOSITIVO E TESE

     4.1. Contas aprovadas com ressalvas. Determinada a devolução de valores ao Tesouro Nacional.

  Teses de julgamento: “1. O recebimento de recursos de fontes vedadas impõe o recolhimento integral ao Tesouro Nacional, independentemente da intenção do doador, e a aplicação irregular de recursos do Fundo Partidário, sem comprovação fiscal idônea ou nexo com atividades partidárias, caracteriza irregularidade sujeita à devolução. 2. O art. 6º da EC n. 133/24 não retroage para alcançar irregularidades em exercícios financeiros anteriores à sua vigência.”

  Dispositivos relevantes citados: CF/88, art. 926 (CPC, por remissão); Lei n. 9.096/95, art. 31, inc. V; Resolução TSE n. 23.604/19, arts. 11, § 5º; 12, inc. II; 14, § 1º; 17, § 2º; 18; 29, V; 36, incs. II, VI e § 2º; 44, § 5º; 58, § 2º. EC n. 133/24, art. 6º.

  Jurisprudência relevante citada: TRE-RS, PC-PP n. 0600240-77.2022.6.21.0000, Rel. Des. Mario Crespo Brum, DJe 18.12.2024; TSE, PC-PP n. 0600386-40.2021.6.00.0000, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, DJe 04.4.2025; TSE, PC-PP n. 16922/DF, Rel. Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, DJe 02.02.2021; TRE-RS, PC n. 0600084-60.2020.6.21.0000, Rel. Desa. Kalin Cogo Rodrigues, DJe 02.5.2023; TRE-RS, REl nº 0600724-60.2024.6.21.0085, Rel. Des. Nilton Tavares da Silva, DJE 13.02.2025.

  PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL nº060022370, Acórdão, Relator(a) Des. Caroline Agostini Veiga, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 11/09/2025. (Grifei.)

Por fim, consigno que as irregularidades, nos valores de R$ 229,00 e R$ 1.113,51, totalizam R$ 1.342,51 e estão sujeitas à devolução ao erário na forma do art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

De outra banda, representam ínfimos 0,04% dos recursos recebidos (R$ 2.885.130,97), admitindo a aprovação das contas com ressalvas, conforme pacífica jurisprudência desta Corte.

Diante do exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas da prestação de contas do Diretório Estadual do MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO, para determinar o recolhimento do valor de R$ 1.342,51 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.