REl - 0600150-70.2024.6.21.0074 - Voto Relator(a) - Sessão: 10/12/2025 00:00 a 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Cuida-se de examinar recurso de DEISE CRISTIANE PERES, candidata à vereadora no Município de Alvorada, contra sentença proferida pelo juízo da 074ª Zona Eleitoral, que julgou desaprovadas as suas contas de campanha referentes às Eleições 2024, determinando o recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 1.750,00, nos termos do art. 79, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, em razão da contratação de parente para  serviços de militância (filha – Gladis Tais Peres Machado).

Pois bem.

Conforme consolidado na jurisprudência, a contratação de familiares para a prestação de serviços em campanha não é vedada pela legislação eleitoral e somente caracteriza irregularidade na prestação de contas na hipótese de haver prova de: a) valores dissonantes às práticas comuns do mercado; b) ausência de tecnicidade suficiente à prestação do serviço contratado; ou c) fraude na contratação do serviço.

Nesses termos, colho os seguintes julgados do TSE:

 

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. GOVERNADOR E VICE-GOVERNADOR. DESPESAS DE CAMPANHA. CONTRATAÇÃO DE EMPRESA CUJOS SÓCIOS POSSUEM RELAÇÃO DE PARENTESCO COM OS CANDIDATOS. IRREGULARIDADE AFASTADA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

[...].

3. A contratação de parentes não constitui falha per se a justificar a desaprovação das contas. Para tanto, é indispensável a prova de a) valores dissonantes às práticas comuns do mercado; b) ausência de tecnicidade suficiente à prestação do serviço contratado; c) fraude na contratação do serviço etc., todas condicionantes que evidenciam a má-fé, a intenção de lesar o patrimônio público, o privilégio na contratação. Precedentes.

4. Não constam dos autos elementos que corroborem o ilícito, ficando claro que o Tribunal de origem reputou a falha apenas pela circunstância de que as empresas possuem como sócios parentes dos candidatos, tese inclusive rechaçada pelo Plenário desta Casa. Irregularidade afastada.

5. Recurso especial parcialmente provido.

(AREspE n. 0601221-21.2018.6.22.0000/RO, Acórdão, Relator Min. Mauro Campbell Marques, Relator designado Min. Alexandre de Moraes, Publicação: DJE, Tomo 66, Data 13.4.2023)  (grifo nosso)

ELEIÇÕES 2018. RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DEPUTADO FEDERAL. DESAPROVAÇÃO. GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO E DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA. CONTRATAÇÃO DE PARENTES. SÚMULA Nº 13/STF. INAPLICABILIDADE. AUSÊNCIA DE EXPERTISE E EXCESSOS. NÃO COMPROVAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 24/TSE. LIMITES. CONTRATAÇÃO. NORMATIZAÇÃO. INEXISTÊNCIA. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. INCIDÊNCIA. PECULIARIDADES DO CASO. DESPROVIMENTO.

1. In casu, as contas do candidato foram desaprovadas em função da existência de dívidas de campanha que representaram 22% do total de despesas realizadas e da ausência dos documentos de autorização do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão regional, bem como do acordo de assunção de dívidas formalizado, devidamente assinado pelo representante do partido em Alagoas. 2. O apontamento feito pelo Parquet quanto à irregularidade na realização de despesas com recursos públicos mediante a contratação de parentes foi afastado pela Corte de origem em virtude da ausência de vedação legal e da inaplicabilidade da Súmula Vinculante nº 13/STF, a qual proíbe a nomeação de parentes, até o terceiro grau, para cargos comissionados de natureza administrativa.

3. Segundo o STF, o nepotismo alcança nomeação "para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada" na administração direta e indireta.

4. A Resolução CNJ nº 7/2005 e o instrumento sumular nº 13/STF convergem para reprimenda de delimitação clara e precisa, ostentando o inequívoco sentido de que a proibição não atinge outros cargos que não aqueles cuja natureza foi especificamente referida, certo que, nos moldes de conhecida regra de hermenêutica, a norma não traz palavras e expressões inúteis.

5. Ainda que a referida súmula vinculante não traga, em si, rol exaustivo de situações passíveis de, em tese, caracterizar o nepotismo, até por impossibilidade material de se anteverem todas as possibilidades fáticas possíveis, não menos verdadeiro é que ela se volta aos cargos de natureza administrativa, não guardando, assim, relação com o presente caso.

6. Correta a interpretação adotada pelo TRE/AL de que a situação posta nos autos escapa à regra geral de aplicação da Súmula nº 13/STF, porquanto o próprio STF, no AgR-Rcl nº 28024, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, 1ª Turma, DJe de 25.6.2018, ao decidir sobre sua extensão, "restringiu sua aplicação para excluir de sua incidência as hipóteses de nomeação de parentes de autoridades públicas em cargos públicos de natureza política, sob o fundamento de que tal prática não configura nepotismo" (ID nº 23048638).

7. A Suprema Corte definiu que tal restrição somente deve ser afastada quando presente inequívoca falta de razoabilidade ou por evidente ausência de qualificação técnica ou inidoneidade moral.

8. Na hipótese dos autos, não se encontram presentes os requisitos autorizadores para apartar a restrição definida pelo STF quanto à incidência da Súmula nº 13/STF na medida em que não foram identificados pela Corte de origem elementos suficientes para aferir excessos nos montantes despendidos ou ausência de expertise por parte das beneficiárias. A reforma de tal conclusão esbarra no vedado reexame de fatos e provas em sede extraordinária (Súmula nº 24/TSE).

9. A matéria é bastante instigante, porquanto se discutem os limites de contratação por candidato de serviços fornecidos por parentes, tendo em vista que os recursos do Fundo Partidário e do Fundo Especial de Financiamento de Campanha são, por natureza, públicos.

10. Ante a inexistência de regulamentação específica sobre o tema, mister discutir caso a caso, segundo as peculiaridades consignadas nos autos, observando-se as regras de hermenêutica e os princípios constitucionais.

11. Na hipótese, dadas as peculiaridades assinaladas no voto condutor e considerando o cenário vertido nos presentes autos, a situação descrita não afetou a transparência da transação entre as partes nem se mostrou eivada de má-fé, fatos que não afrontam a legislação que norteou a prestação de contas relativa às eleições de 2018, não havendo, portanto, falar em devolução dos valores despendidos ao Tesouro Nacional.

12. Recurso especial desprovido.

(REspEl n. 0600751-45.2018.6.02.0000/AL, Acórdão, Relator Min. Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, Publicação: DJE, Tomo 214, Data 23.10.2020) (Grifo nosso)

 

Nessa direção, este Tribunal tem reafirmado, consoante julgado de minha relatoria, que: "A contratação de parente como prestador de serviços deve evidenciar elevado grau de transparência, a fim de que sejam, de forma satisfatória, demonstradas as peculiaridades da transação, as atividades efetivamente desenvolvidas e a compatibilidade dos custos com os valores de mercado, em atenção ao art. 35, § 12, da Resolução TSE 23.607/19" (REl n. 060042679, Publicação: DJe - Diário de Justiça Eletrônico, 22.8.2025).

Na hipótese, de acordo com o instrumento contratual (ID 45990553), a candidata contratou Gladis Tais Peres Machado, sua filha, para "serviços de panfletagem e distribuição de material gráfico", no período de 16/08 a 06/10, 8 horas por dia, com remuneração diária de R$ 56,66. Em anexo ao contrato, consta a folha de ponto, com os dias e horários trabalhados, na qual se registra a jornada diária de 8 horas.

O valor pago se mostra compatível com as atividades exercidas e com o tempo de trabalho, não havendo indicativos de sobrepreço ou extrapolação da média de mercado.

O contrato e seus anexos atendem aos requisitos previstos na Resolução TSE n. 23.607/19, sem quaisquer apontamentos quanto aos seus aspectos intrínsecos, e o pagamento também ocorreu de forma regular.

Não há evidências nos autos que apontem para a existência de fraude na contratação, inidoneidade técnica ou supervalorização do trabalho, de forma que o parentesco representa o único elemento utilizado pela sentença para concluir que o gasto eleitoral foi irregular.

Assim, observando os critérios assentados na jurisprudência do TSE e deste Tribunal para a hipótese, deve ser afastada a irregularidade, sem a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso, para aprovar as contas de campanha de DEISE CRISTIANE PERES, nos termos do art. 74, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19, e afastar o dever de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.