REl - 0600402-79.2024.6.21.0072 - Divirjo do(a) relator(a) - Sessão: 04/12/2025 às 16:00

VOTO DIVERGENTE

Acompanho o eminente Relator, Desembargador Eleitoral Francisco Thomaz Telles, no que concerne à rejeição da preliminar relativa à ilicitude das provas digitais. No ponto, sem qualquer reparo às considerações a respeito tecidas por sua excelência no sentido de que o material foi obtido por meio tecnicamente idôneo e sem padecer de qualquer vício de ilegalidade, inexistindo, desse modo, demonstração de prejuízo que justifique a nulidade suscitada.

Relativamente ao mérito, porém, após detido exame do processado e do conteúdo impugnado, rogando vênia ao ilustrado colega, cheguei à conclusão de que razão não assiste à coligação recorrente. Em outras palavras, há ser integralmente mantida a douta sentença impugnada que, na visão deste julgador, apreciou detidamente o conjunto probatório e concluiu, com acerto, pela insuficiência de provas para caracterizar conduta vedada e abuso de poder, na mesma linha, aliás, do douto parecer do Ministério Público Eleitoral de primeiro grau que oficia junto à 72ª Zona Eleitoral de Viamão, culminando por opinar pela improcedência da demanda por entender ausentes elementos robustos e incontestes para a condenação.

De fato, ao que se depreende do processado, o evento realizado em 14.9.2024 no Parque Saint Hilaire teve por finalidade primordial comemorar o aniversário do Município, com reabertura ao público de área ainda em obras e disponibilização paulatina de estruturas que estavam sendo recuperadas. Não houve e não se cogitou, portanto, de inauguração formal de obra público ou de clara e deliberada simulação.

Isto porque, não se tem notícia de "ato solene", descerramento de placa, corte de fita inaugural, condução de cerimonial ou formalização administrativa correlata. A mera referência, em divulgações de apoiadores, à entrega de espaços não é suficiente para enquadrar o episódio na vedação do art. 77 da Lei n. 9.504/97, que em tese alcançam eventos assemelhados. Mas, apenas e tão somente, quando efetivamente simulam inauguração, o que, volto a repetir, no meu modo de ver não restou comprovado.

A presença dos candidatos no local, por outro lado, não se deu de forma ativa ou com protagonismo institucional. Não há provas de discursos proferidos, subidas em palcos ou condução de ato oficial, aspectos, como sabido, inerentes a inaugurações de obras públicas.

A jurisprudência do egrégio Tribunal Superior Eleitoral admite, em situações análogas, a aplicação do princípio da proporcionalidade para afastar a tipicidade do art. 77 quando a presença do candidato é discreta e sem atuação ativa, pois, nessas hipóteses, não há quebra da igualdade de chances entre concorrentes. Vale dizer, há ser mitigado o ato festivo e aplicado o princípio referido (da proporcionalidade) para afastar a configuração do ilícito previsto no art. 77 da Lei n. 9.504/97 quando, por exemplo, a presença dos candidatos se dá de forma discreta e sem participação ativa no evento, por não implicar, vale ser enfatizado, em quebra da igualdade de chances entre os concorrentes.

Nesse sentido e à guisa de exemplo, trago à colação ementa de venerando aresto da Corte Superior mencionada (TSE):

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. CONDUTA VEDADA. COMPARECIMENTO À INAUGURAÇÃO DE OBRA PÚBLICA. ART. 77 DA LEI Nº 9.504/97. PARTICIPAÇÃO ATIVA DA CANDIDATA DURANTE O EVENTO. NÃO DEMONSTRAÇÃO. PROPORCIONALIDADE. REEXAME. SÚMULA Nº 24/TSE. NÃO PROVIMENTO. (...) 3. A jurisprudência desta Corte Superior admite a aplicação do princípio da proporcionalidade na representação por conduta vedada descrita no art. 77 da Lei nº 9.504/97, para afastar a sanção de cassação do diploma, quando a presença do candidato em inauguração de obra pública ocorre de forma discreta e sem participação ativa no evento, pois não resulta na quebra da igualdade de chances entre os concorrentes na disputa eleitoral. 4. Inalterável a premissa fática constante do aresto regional de que ausente protagonismo da candidata durante o evento, por força da Súmula nº 24/TSE, conclui-se que a decisão recorrida está alinhada à jurisprudência deste Tribunal Superior. Agravo regimental não provido. (AgR-REspe nº 171064/SP, Rel. Min. Rosa Weber, julgamento em 28/06/2018, publicação em 03/08/2018).

O cenário dos autos, eminentes colegas, a meu ver se amolda como uma luva à orientação da nossa Corte Superior, como também bem destacado no parecer ministerial de primeiro grau já referido.

No que se refere ao show artístico, igualmente não há qualquer elemento que indique custeio com recursos públicos. O art. 75 da Lei das Eleições veda a contratação paga com verbas públicas, o que no caso dos autos não restou demonstrado. Ao revés, o espetáculo teria sido prestado de forma gratuita, sem impugnação eficaz ou demonstração em sentido contrário.

Por fim, relativamente ao alegado abuso de poder político, no mesmo passo não se constata a presença de elementos que autorizem a condenação. Isto porque, mais uma vez, não há prova escorreita no sentido de que o ato tenha sido planejado ou executado com finalidade eleitoral, nem de que tenha produzido repercussão política suficiente para comprometer a paridade de armas entre os concorrentes. Os elementos carreados aos autos, no ponto, não ultrapassam o campo de meros indícios e presunções, insuficientes para ensejar a aplicação das severas penalidades previstas no art. 22 da LC n. 64/90, que implicam, como no caso dos autos, na cassação de mandatos legitimamente obtidos pelo voto popular, além da drástica medida de imposição de inelegibilidade pelo período de oito anos.

Como sabido, a aplicação das severas sanções do art. 22 da LC n. 64/90 exige gravidade qualificada e, sobretudo, demonstração inequívoca e irrefutável de desvio institucional visando favorecer candidaturas, circunstância uma vez mais não demonstrada no acervo probatório.

Para arrematar, tomo a liberdade de ponderar que inadmissível seria impor aos recorridos, a partir de meros indícios e presunções, as drásticas consequências decorrentes de uma eventual procedência da ação, o que redundaria na supressão da vontade da maioria dos eleitores do Município de Viamão, que nas urnas os escolheram como seus representantes no Executivo local, mais precisamente para os relevantes cargos de Prefeito e Vice-Prefeito.

Eventuais dúvidas quanto à configuração das condutas tipificadas, como em diversas oportunidades tem recentemente decidido este colegiado, levam à aplicação do surrado brocardo in dubio pro sufragio. Vale dizer: na dúvida, deve ser preservada a vontade popular, o que, de quebra, empresta estabilidade e maior confiabilidade ao processo eleitoral.

Em suma, sempre que possível, salvo naturalmente configuradas as graves infrações previstas na legislação eleitoral, há de ser preservada a vontade da maioria do eleitorado manifestada por meio do voto, tal como aqui ocorre.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela rejeição da preliminar e, no mérito, pelo desprovimento do recurso, mantendo hígida, portanto, a sentença impugnada.