REl - 0600532-52.2024.6.21.0110 - Voto Relator(a) - Sessão: 20/02/2025 00:00 a 21/02/2025 23:59

VOTO

Antes de adentrar no caso concreto, convém trazer breves apontamentos sobre as condutas vedadas aos agentes públicos.

A Lei n. 9.504/97 traz capítulo específico sobre as condutas proibidas aos agentes públicos durante a campanha eleitoral, na formulação trazida nos arts. 73 a 78.

O bem jurídico tutelado é a isonomia entre os concorrentes ao pleito. As hipóteses relativas às condutas vedadas são taxativas e de legalidade restrita, sendo que “a conduta deve corresponder ao tipo definido previamente” (Recurso Especial Eleitoral n. 24.795, Rel. Luiz Carlos Madeira).

Para o reconhecimento da conduta vedada é suficiente a demonstração da sua prática e respectiva tipificação legal. Significa dizer, sua caracterização tem natureza objetiva, independentemente de sua influência no pleito ou mesmo a potencialidade lesiva ou a gravidade da conduta realizada.

Na espécie, o recorrente, na qualidade de prefeito de Imbé, à época dos fatos, negou a solicitação de afastamento remunerado de agente comunitário de saúde, para o fim de concorrer nas Eleições Municipais de 2024.

A conduta acima descrita configura violação à regra que proíbe aos agentes públicos agir de forma a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos consubstanciada no ato de dificultar ou impedir o exercício funcional, nos termos do art. 73, inc. V, da Lei n. 9.504/97:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

 

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

 a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança;

 b) a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do Ministério Público, dos Tribunais ou Conselhos de Contas e dos órgãos da Presidência da República;

 c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos homologados até o início daquele prazo;

 d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo;

 e) a transferência ou remoção ex officio de militares, policiais civis e de agentes penitenciários;

 

A doutrina de Rodrigo Lopez Zílio (2024, p. 359) nos ensina que:

A expressão servidores tem sentido largo, explica Pedro Decomain (2004a, p.277), significando “não apenas os servidores ou funcionários públicos propriamente ditos, isto é, os que prestam serviço ao ente estatal central (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), ou às suas autarquias, em regime estatutário, segundo o previsto na Constituição, mas também aos empregados públicos, tanto do ente central, quanto das suas autarquias, empresas públicas e sociedades de economia mista, e também das fundações mantidas pelo Poder Público, ainda que legalmente sejam consideradas pessoas jurídicas de Direito Privado […], cujo vínculo com seus empregadores (e aqui o termo é mais adequado) seja regido pelo estatuto dos funcionários públicos civis, mas sim pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, e mais diplomas relativos ao contrato de trabalho e à relação de emprego”.

 

Quanto ao ponto, é posição consolidada pelo TSE que o agente comunitário de saúde equipara-se a servidor público para fins de desincompatibilização, de modo que deve se desincompatibilizar três meses antes do pleito para concorrer (RO-EI n. 0601360-80/MG – j. 25.10.2022 – PSESS).

No mesmo sentido o julgado da Corte Superior que segue:

 

ELEIÇÕES 2022. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ORDINÁRIO ELEITORAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. INDEFERIMENTO. DEPUTADO ESTADUAL. AGENTE COMUNITÁRIO DE SAÚDE. EQUIPARAÇÃO A SERVIDOR PÚBLICO. DESINCOMPATIBILIZAÇÃO. NECESSIDADE. ART. 1º, II, L, E VI, DA LC 64/1990. MANUTENÇÃO DO DECISUM. DESPROVIMENTO DO AGRAVO.

1. Na condição de agente comunitária de saúde, a candidata se equipara a servidor público para fins eleitorais, devendo se desincompatibilizar no prazo estabelecido em lei, independentemente do regime jurídico a que é submetida.

2. Agravo desprovido. (TSE - RO-El: 06013166120226130000 BELO HORIZONTE - MG 060131661, Relator: Min. Ricardo Lewandowski, Data de Julgamento: 09/12/2022, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão)

 

Assim, se o pretenso candidato a cargo eletivo atua como agente comunitário de saúde é equiparado a servidor público para fins eleitorais, igualmente deve se desincompatibilizar nos moldes previstos pelo art. 1º, inc. II, letra “l”, da Lei Complementar n. 64/90, com direito ao recebimento de vencimentos integrais:

l) os que, servidores públicos, estatutários ou não, dos órgãos ou entidades da Administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e dos Territórios, inclusive das fundações mantidas pelo Poder Público, não se afastarem até 3 (três) meses anteriores ao pleito, garantido o direito à percepção dos seus vencimentos integrais;

 

Ademais, como regra, o afastamento exigido não é definitivo, bastando a licença do cargo, com posterior retorno, sendo a exoneração apenas incidente para os casos de cargos de livre nomeação (Súmula 54 do TSE).

Como bem pontuou a Procuradoria Regional Eleitoral em seu parecer (ID 45766673):

Assim, LUIS HENRIQUE VEDOVATO (Prefeito Municipal), afetando a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais, dificultou o exercício funcional do agente de saúde ao – na contramão da ordem jurídica – apresentar sua exoneração como único meio para que fosse levada adiante a pretensa candidatura

 

Dessa forma, não há o que reparar na sentença de origem, pois demonstrada a imposição de dificuldades ou impedimentos por parte do agente público, Luis Henrique Vedovato ao exercício funcional de pretenso candidato a cargo eletivo.

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.