REl - 0600510-64.2024.6.21.0022 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/02/2025 às 14:00

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso mostra-se tempestivo, visto que interposto no tríduo recursal estabelecido. Também se mostra adequado à espécie, comportando conhecimento.

Passo à análise do mérito.

 

MÉRITO

Conforme relatado, trata-se de recurso ANDRE MORESCHI relativamente à sentença que desaprovou suas contas, referentes às eleições municipais de 2024, e determinou o recolhimento da importância de R$ 1.543,00 ao Tesouro Nacional, em razão do recebimento de recursos considerados como de origem não identificada. A quantia imputada como irregular refere-se a três depósitos bancários realizados na mesma data, em espécie, nos valores de R$ 43,00, R$ 500,00 e R$ 1.000,00, respectivamente, identificados com o CPF do próprio candidato, configurando autofinanciamento.

Em que pese as alegações trazidas no recurso, tenho não assistir razão ao recorrente.

A controvérsia dos autos consiste na realização de doação financeira em valor superior a R$ 1.064,10, em desacordo com o art. 21, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual prevê que “as doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias da doadora ou do doador e da beneficiária ou do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal”.

A principal alegação do ora recorrente - de que houve, de sua parte, uma má interpretação da norma, ao entender que o teto de valores para doações em espécie deveria ser considerado por operação realizada, e não pelos montantes globais envolvidos, não merece prosperar. O § 2º do art. 21 da citada resolução estabelece que tal restrição se aplica também à hipótese de doações sucessivas realizadas por um mesmo doador em um mesmo dia. Tem-se, portanto, que o procedimento adotado pelo candidato descumpre norma expressa de contabilidade eleitoral e impacta diretamente a confiabilidade das contas.

 Observância da norma nesse particular não constitui mero rigorismo formal, visto que o trânsito dos valores de forma integral pelo sistema bancário dá maior rastreabilidade quanto ao doador e mostra-se requisito fundamental da transparência que deve permear todo o processo de prestação de contas eleitorais. Os mecanismos de registro de origens e destinos dos valores empregados nas campanhas asseguram, em última análise, maior legitimidade ao processo eleitoral. Esse é o sentido que se extrai do posicionamento do Tribunal Superior Eleitoral, que destaco no seguinte julgado:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE VERBA SEM A CORRETA IDENTIFICAÇÃO DO DOADOR. FALHA GRAVE. COMPROMETIMENTO DA TRANSPARÊNCIA DO AJUSTE CONTÁBIL. DESPROVIMENTO.

1. Não há falar em ofensa ao art. 36, § 6º, do RITSE, uma vez que o julgamento monocrático observou a legislação aplicável à espécie e a jurisprudência deste Tribunal.

2. O art. 21, § 1º da Res.–TSE 23.607/2019 exige que as doações acima de R$ 1.064,10 (um mil, sessenta e quatro reais e dez centavos) sejam feitas mediante transferência eletrônica, requisito objetivo não observado na hipótese dos autos.

3. A transparência deve estar presente em todo ‘o caminho do dinheiro’, incluindo o meio utilizado para formalizar a doação, a partir da transferência eletrônica dos recursos, que confere maior segurança à comprovação da saída e respectiva entrada dos valores empregados. Não se pode perder de vista que grande parte das transações irregulares realizadas no país envolve dinheiro em espécie, justamente pela dificuldade de rastreamento dos valores.

4. A inobservância da norma regulamentar com a utilização de recursos transferidos em espécie à conta de campanha, quando não identificado o respectivo doador, enseja o seu recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme previsto no parágrafo 3º, do mesmo art. 21 da norma.

5. A "invisibilidade" de doações no financiamento de campanhas prejudica a transparência do sistema eleitoral, afetando a plena aplicabilidade dos princípios de sustentação do sistema democrático de representação popular.

6. Nos termos da jurisprudência do TSE, o cometimento de falhas que comprometam a lisura do balanço contábil afasta a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, diante do comprometimento da transparência do ajuste.

7. Agravo Regimental desprovido. (AgR–REspEl n. 0600257–22.2020.6.25.0017/SE, ministro Alexandre de Moraes, DJe de 21 de março de 2022) Grifei.

 

Portanto, tais valores não deveriam ser utilizados no financiamento de campanha e, no caso de utilização, como na hipótese dos presentes autos, devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto nos arts. 21, §§ 1º, 2º, 3º, 4º, 5º; 32, caput; e 79, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 21. As doações de pessoas físicas e de recursos próprios somente poderão ser realizadas, inclusive pela internet, por meio de:

(...)

§ 1º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias da doadora ou do doador e da beneficiária ou do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

§ 2º O disposto no § 1º aplica-se também à hipótese de doações sucessivas realizadas por uma mesma doadora ou um mesmo doador em um mesmo dia.

§ 3º As doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo não podem ser utilizadas e devem, na hipótese de identificação da doadora ou do doador, ser a ela ou a ele restituídas ou, se isso não for possível, devem ser consideradas de origem não identificada e recolhidas ao Tesouro Nacional, na forma prevista no caput do art. 32 desta Resolução.

§ 4º No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificada(o) a doadora ou o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional, na forma do disposto caput do art. 32 desta Resolução.

§ 5º Além da consequência disposta no parágrafo anterior, o impacto sobre a regularidade das contas decorrente da utilização dos recursos recebidos em desacordo com este artigo será apurado e decidido por ocasião do julgamento.

(…)

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatas ou candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

(…)

Art. 79. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 31 e 32 desta Resolução.

(...)

Por fim, levando-se em consideração o total de recursos declarados pelo candidato (R$ 2.018,00), as falhas apontadas correspondem a 76,46% dos valores manejados, o que não comportaria a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para aprovação das contas com ressalvas. Nesse sentido, a sentença prolatada pelo Juízo a quo merece ser mantida nos seus exatos termos, com o juízo de desaprovação das contas e a determinação de recolhimento do valor de R$ 1.543,00 ao Tesouro Nacional.

Ante o exposto, VOTO por NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto por ANDRE MORESCHI.