REl - 0600161-83.2024.6.21.0047 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/02/2025 às 14:00

VOTO

Admissibilidade

O recurso é tempestivo e preenche os demais requisitos processuais, razão pela qual dele conheço.

 

Mérito

Como relatado, a COLIGAÇÃO "POR AMOR A SÃO BORJA" interpôs recurso em face de sentença que extinguiu Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) por ela ajuizada contra a COLIGAÇÃO "COMPROMISSO COM O FUTURO", EDUARDO BONOTTO, JOSE LUIZ MACHADO RODRIGUES e JEFERSON OLÉA HONRICH, ao entendimento de que não demonstrada a prática de abuso de poder político a autorizar o prosseguimento do feito.

Em apertada síntese, a recorrente sustenta que a inicial preenche os requisitos para a instauração da investigação judicial, porquanto demonstrado o abuso de poder político em decorrência do uso da máquina pública pelo então prefeito, Eduardo Bonotto, em favor dos candidatos José Rodrigues e Jeferson Honrich, ora também recorridos, durante vídeo postado em rede social.

Todavia, à luz dos elementos que informam os autos, como igualmente conclui a douta Procuradoria Regional Eleitoral, não assiste razão à recorrente.

Com efeito.

Não se desconhece que a legislação busca a proteção da normalidade e legitimidade do pleito e, especialmente, que reste resguardada a vontade do eleitor. Em outras palavras, que essa liberdade de escolha não seja afetada ou alcançada pela prática nefasta do abuso.

Todavia, para que se reconheça configurado o abuso de poder, deve ser analisada a gravidade da conduta, prescindindo da demonstração de prejuízo ou não ao resultado das urnas.

É o que preconiza o art. 22, inc. XVI, da Lei Complementar n. 64/90:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

(...)

XVI - para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam. (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)

(...). (Grifei.)

Com igual norte, a lição do festejado tratadista Rodrigo Lopez ZILIO:

O relevante, in casu, é a demonstração de que o fato teve gravidade suficiente para violar o bem jurídico que é tutelado, qual seja, a legitimidade e a normalidade das eleições. Vale dizer, é bastante claro que a gravidade como critério de aferição do abuso de poder apresenta uma característica de correlação com o pleito, ou seja, tem-se por necessário examinar o fato imputado como abuso de poder e perscrutar a sua relação com a eleição, ainda que essa análise não seja realizada sob um aspecto puramente matemático. (Manual de Direito Eleitoral. São Paulo: JusPodivm, 10ª ed. 2024, p. 756). (Grifei.)

Sob tal prisma, cabe analisar se a conduta atribuída aos recorridos ostentou, ou não, gravidade a repercutir na legitimidade e normalidade do pleito eleitoral.

No caso concreto, o material inquinado contempla vídeo postado em rede social, filmado em frente ao prédio do posto de saúde ESF 5: Ricardo Pinheiro.

Durante a gravação, o recorrido, à época chefe do executivo da municipalidade, faz alusão aos feitos promovidos durante sua gestão no campo da saúde, indicando, ao final, que os demais candidatos recorridos, caso eleitos, dariam continuidade a tais préstimos em favor da população da histórica São Borja.

Da moldura apresentada, tenho que ausente até mesmo indícios de utilização de bem público pelo então prefeito em proveito dos representantes da coligação recorrida, mormente porque filmado em via pública, em frente a posto de saúde local e, friso, não em suas dependências.

Neste, cenário, inviável atribuir a gravidade almejada pela recorrente, porquanto não demonstrada repercussão a macular a legitimidade da eleição.

O vetor da repercussão, saliento, é utilizado em precedentes do e. Tribunal Superior Eleitoral, seara na qual se demanda a existência de prova inequívoca de fatos que tenham a dimensão bastante para desigualar a disputa eleitoral.

Veja-se:

"Eleições 2020. [...] Inexistência de gravidade das condutas. Abuso do poder econômico e político. Não configurado. [...] 8. Na linha do que foi afirmado pela Corte de origem, não há, na espécie, prova robusta que demonstre a configuração do abuso de poder, porquanto, embora esteja comprovado nos autos que os candidatos se utilizaram da máquina pública para divulgar sua candidatura, não ficou demonstrada a repercussão das condutas (ainda que em seu conjunto) no âmbito do pleito e sua influência perante o eleitorado, para fins de albergar a configuração do abuso de poder, mediante a imposição das graves sanções de cassação de diploma e de inelegibilidade. 9. Consoante remansosa jurisprudência desta Corte Superior, não se admite reconhecer o abuso de poder com fundamento em meras presunções acerca do encadeamento dos fatos, porquanto 'a configuração do abuso de poder demanda a existência de prova inequívoca de fatos que tenham a dimensão bastante para desigualar a disputa eleitoral' [...] 11. O entendimento desta Corte Superior é no sentido de que, 'para se caracterizar o abuso de poder, impõe-se a comprovação, de forma segura, da gravidade dos fatos imputados, demonstrada a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). A mensuração dos reflexos eleitorais da conduta, não obstante deva continuar a ser ponderada pelo julgador, não constitui mais fator determinante para a ocorrência do abuso de poder, agora revelado, substancialmente, pelo desvalor do comportamento' [...]".(Ac. de 11.5.2023 no AgR-AREspE nº 060055782, rel. Min. Sérgio Banhos.) (Grifei.)

Cabe lembrar, por outro lado, que sob a ótica das condutas vedadas aos agentes públicos, cujo escopo é assegurar a isonomia entre os candidatos, não é defeso aos detentores de mandados eletivos expor apoiamento a outros candidatos, aliás, é prática usual durante a corrida eleitoral, desde que feito em obediência aos limites previstos no art. 73 da Lei das Eleições.

Nessa ordem de ideias, destaco que as postagens ocorreram em perfis pessoais, desvinculados da esfera da Administração Pública, sem qualquer indício de subvenção pública a sua realização, ou de uso de bem público que demande cessão da Municipalidade. Vale dizer, não há demonstração do uso da máquina pública em prol dos candidatos recorridos de forma a macular a paridade de armas entre os candidatos.

Em suma, ausente demonstração da prática de abuso de poder ou conduta vedada, há ser mantida a bem-lançada sentença por seus próprios fundamentos.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso para manter hígida a sentença que extinguiu a Ação de Investigação Judicial Eleitoral.

É o voto.