REl - 0600085-61.2024.6.21.0111 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/10/2025 00:00 a 03/10/2025 23:59

VOTO

Irresignado, Lucas Duarte Siqueira recorre da sentença que determinou o recolhimento de R$ 6.245,00 ao Tesouro Nacional, em virtude do recebimento de recursos de origem não identificada.

A falha é relativa à emissão da nota fiscal n. 24, em 19.9.2024, no valor total de R$ 6.245,00, pela empresa fornecedora Victoria Emmanuelle Martins Kossmann, a qual não foi declarada nesta prestação de contas e cujo pagamento não transitou nas contas bancárias de campanha.

Sublinho, inicialmente, que não há controvérsia de que a nota foi emitida contra o CNPJ da candidatura, de que não houve pagamento da despesa por intermédio de recursos que não transitaram pelas contas bancárias específicas de campanha e de que não há registro contábil do valor na prestação de contas.

O recorrente apresentou, perante a unidade técnica da Zona Eleitoral, declaração da sócia administradora da empresa, narrando ter sido emitida, por erro, a nota fiscal n. 24, e que não cancelou o referido documento fiscal (ID 45884402, p. 4).

No corpo do recurso, apresentou novo documento, referente à impressão de tela (print screen) de requerimento eletrônico de cancelamento da nota fiscal, efetuado pela empresa ao fisco municipal.  

O documento juntado após a sentença pode ser conhecido neste grau de jurisdição, ainda que apresentado intempestivamente, pois, conforme entendimento deste Tribunal: “É possível a juntada de documento em sede recursal, desde que não haja necessidade de nova análise técnica.” (TRE-RS, REl n. 0600712-46.2024.6.21.0085, Relator Desembargador Eleitoral Volnei dos Santos Coelho, DJe, 06.5.2025).

Portanto, conheço o novo documento.

Todavia, não há possibilidade de aferir a exatidão do requerimento por lhe faltar endereço eletrônico para a conferência de sua autenticidade.

De igual forma, não veio aos autos a decisão sobre o cancelamento da nota.

Ao contrário, ao acessar a consulta pública das notas fiscais eletrônicas, não há informação de que o documento fiscal tenha sido cancelado pelo órgão fazendário (https://www.nfse.gov.br/consultapublica; acesso em 23.5.2025; chave n. 43149022255351924000124000000000002424094461237810).

Ao mesmo tempo, na declaração, a empresa fornecedora reconhece que não cancelou a nota fiscal número 24 junto à autoridade tributária competente (ID 45884402, p. 4).

Quanto à tese recursal de que a nota fiscal n. 25, emitida no valor de R$ 2.000,00, teria substituído integralmente a nota fiscal 24, no valor de R$ 6.245,00, constato que não há qualquer indicativo no corpo da nota fiscal n. 25 da referida operação de substituição (ID 45884346). Além disso, conforme já consignado, não houve comprovação do cancelamento da nota anterior.

Observo igualmente que não há, no corpo das notas fiscais, a descrição detalhada dos serviços prestados, e que não é possível a comparação das datas, das quantidades, dos locais e da qualidade das atividades realizadas pela empresa em favor da candidatura.

Portanto, não houve prova suficiente do cancelamento da nota fiscal emitida em nome do candidato no valor de R$ 6.245,00, na medida em que se referem a notas fiscais com numeração distinta e registram valores distintos, inexistindo outra informação adicional no corpo dos documentos fiscais capaz de demonstrar eventual identidade dos serviços prestados.

Logo, não prospera a tese do recorrente de que a nota fiscal posterior, número 25, tenha sido emitida em substituição para o cancelamento da nota n. 24.

Por sua vez, a declaração unilateral da empresa fornecedora de que emitiu a nota n. 24 por equívoco não é suficiente para afastar a conclusão da irregularidade da nota.

Aliás, este Tribunal tem posicionamento consolidado de que: “A juntada de declaração unilateral da empresa fornecedora não substitui as providências para o cancelamento da nota fiscal junto ao órgão fazendário.” (TRE-RS, PCE n. 0603134-26.2022.6.21.0000, Relator Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, DJe, 29.01.2024).

A esse respeito, uma vez emitida a nota fiscal, compete ao candidato prestador de contas a responsabilidade de comprovação da inexistência da despesa e do cancelamento da nota fiscal junto a respectiva autoridade fazendária, como exigem os arts. 59 e 92, §§ 5º e 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nesse sentido, anoto que este Tribunal firmou o entendimento de que, havendo o registro do gasto nos órgãos fazendários, “o ônus de comprovar que a despesa eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas” (TRE-RS, REl n. 0603413-12.2022.6.21.0000, Relator Desembargador Eleitoral Francisco Thomaz Telles, DJe, 24.01.2025; TRE-RS, Prestação de Contas Eleitoral n. 0602944-63.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, publicado em sessão em 01.12.2022).

E não há, nos autos, qualquer comprovação da origem dos recursos utilizados para pagamento da nota fiscal.

Por conseguinte, a sentença está em sintonia com a atual jurisprudência: “Utilização de recursos de origem não identificada – RONI. Emissão de notas fiscais em favor do CNPJ de campanha, omitidas na prestação de contas. Violação ao art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19. Ausentes provas do efetivo cancelamento, retificação ou estorno. Dever de recolhimento.” (TRE-RS, REl n. 0602912-58.2022.6.21.0000, Relator Desembargador Mario Crespo Brum, DJe 22.01.2025).

Destarte, realizado o pagamento da fatura sem trânsito dos recursos em conta de campanha, correta a conclusão da sentença de que o montante de R$ 6.245,00 caracteriza recursos de origem não identificada, devendo ser mantida a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, conforme arts. 14, § 2º; 32, § 1º, inc. VI; todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

Na hipótese dos autos, a infração à norma é objetiva, não cabe analisar a existência de boa-fé ou de má-fé, pois representa embaraço ao controle efetivo da real arrecadação e da correta destinação dos dispêndios na promoção da candidatura.

A propósito, o entendimento consolidado deste Tribunal indica que: “A boa-fé não afasta o dever de apresentar documentos para justificar os gastos.” (TRE-RS, REl n. 0600601-27.2020.6.21.0142, Relatora Desembargadora Eleitoral Patrícia da Silveira Oliveira, DJe, 14.11.2024). No mesmo sentido: “Alegação de boa-fé e de ausência de movimentação financeira insuficiente para elidir falha. Nota fiscal emitida não cancelada. Fiscalização e controle das contas prejudicados. Recolhimento.” (TRE-RS, PC-PP n. 0600278-94.2019.6.21.0000, Relator Desembargador Eleitoral Gerson Fischmann, DJe 19.10.2021).

A falha corresponde ao montante de R$ 6.245,00 e representa o percentual de 13,08% do total de recursos arrecadados (R$ 47.725,00).

O valor não se encontra dentro dos parâmetros de aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas, tendo em vista que o percentual da irregularidade é superior a 10% e representa nominalmente importância maior do que R$ 1.064,00.

De acordo com a jurisprudência: “Em prestação de contas cuja irregularidade envolver valores reduzidos, inferiores a R$ 1.064,10 ou a 10% da arrecadação, é admitida a aprovação com ressalvas, em observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.” (TRE-RS, REl n. 0600724-60.2024.6.21.0085, Relator Desembargador Eleitoral Nilton Tavares da Silva, DJe, 13.02.2025).

Dessa forma, em linha com o parecer ministerial, a sentença deve ser mantida.

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.