REl - 0600551-04.2024.6.21.0031 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/10/2025 00:00 a 03/10/2025 23:59

VOTO

1. Admissibilidade. 

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento. 

2. Mérito. 

No mérito, LILIANE DE FÁTIMA MELO NUNES recorre da sentença que desaprovou suas contas de candidata a vereadora de Montenegro, nas Eleições 2024, e determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor R$ 5.240,38 (cinco mil duzentos e quarenta reais e trinta e oito centavos), em virtude de (1) ausência de devolução de créditos de impulsionamento não utilizados, e  (2) irregularidades na aplicação de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 

Ao exame. 

2.1.  Ausência de devolução de créditos de impulsionamento não utilizados. 

A sentença apontou que a candidata adquiriu um total de R$2.030,75 de créditos para impulsionamento de conteúdo no Facebook ao tempo em que foram emitidas a nota fiscal n. 93933347, no valor de R$ 20,00, e a nota fiscal n. 94606473, no valor R$ 1.091,75, no total de R$ 1.111,75,

Restaram R$ 919,00 (R$ 2.030,75 - R$ 1.111,75) em créditos não utilizados. Foi determinado o recolhimento do valor de R$ 40,00 ao órgão partidário e o restante (R$ 879,00) ao Tesouro Nacional, conforme a origem dos recursos, na forma do art. 35, § 2º, incs. I e II, da Resolução TSE n. 23.607/19. 

A recorrente nada opôs quanto ao ponto. Permanece a glosa. 

2.2. Despesas com pessoal não comprovadas, com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. 

A decisão hostilizada entendeu não comprovados gastos com pessoal, ao fundamento de que os documentos apresentados pela prestadora omitem os locais em que desenvolvidos os trabalhos, não havendo, também, o detalhamento das horas efetivamente trabalhadas. 

Ou seja, os quesitos entendidos como ausentes ou insuficientes referem-se à indicação de locais e horas trabalhadas. 

Pois bem. 

No relativo ao local de exercício das atividades, sublinho que os documentos estabelecem que o contratado(a) prestará serviços em comitê de campanha do contratante ou, em atividades de rua executadas no município de Montenegro, no estado do Rio Grande do Sul.

Entendo desnecessária maior especificação de locais. A campanha prestadora ocorreu no Município de Montenegro, e este Tribunal tem posicionamento no sentido de que a ausência de detalhamento quanto aos locais de trabalho da militância é falha superável em se tratando de pequenos municípios:  

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. USO DO Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). DESPESAS COM MILITÂNCIA. PAGAMENTO DE GASTO PESSOAL E TARIFA BANCÁRIA. DESAPROVAÇÃO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.  

I. CASO EM EXAME  

1.1. Recurso eleitoral, interposto por candidata ao cargo de vereadora nas Eleições Municipais de 2024, contra sentença que desaprovou as contas de campanha, determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, em razão de irregularidades na aplicação de recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).  

1.2. A recorrente defendeu a regularidade da contratação de assistente de campanha e de militantes, afirmando que foram apresentados documentos comprobatórios suficientes.  

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO  

2.1. Há duas questões em discussão: (i) verificar se os contratos de pessoal atenderam aos requisitos da norma aplicável, incluindo detalhamento de atividades, local e compatibilidade de valores; (ii) definir se as irregularidades permitem mitigação, pelo princípio da proporcionalidade, para aprovação com ressalvas.  

III. RAZÕES DE DECIDIR  

3.1. O art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19 exige, para gastos com pessoal custeados com recursos públicos, contrato contendo a descrição das atividades, período, local de execução e fundamento do preço.  

3.2. O contrato com militante contém dados essenciais e vem acompanhado de comprovantes de pagamento, sendo a omissão quanto ao local de execução irrelevante em município de pequeno porte, de acordo com precedentes do TRE-RS. Superada a falha no ponto.  

3.3. Entretanto, a contratação de assistente de campanha, sem detalhamento das atividades ou justificativa para valor superior a outros contratos da mesma natureza, configura irregularidade, em afronta aos princípios da moralidade, economicidade e transparência. Da mesma forma, pagamentos a diversos colaboradores de militância, respaldados apenas por recibos, sem contratos ou informações essenciais, violando os arts. 35, § 12, e 53 da Resolução TSE 23.607/19, impondo restituição.  

3.4. Despesa pessoal não prevista no rol taxativo do art. 35 da Resolução TSE 23.607/19. Exigência de devolução ao erário.  

3.5. Pagamento de tarifa bancária com recursos do FEFC. Ausente qualquer esclarecimento ou documentação que demonstre a natureza do serviço bancário. Mantida a falha apontada e a determinação de recolhimento da quantia ao Tesouro Nacional.  

3.6. Desaprovação. Irregularidades que correspondem a 90,6% das receitas, inviabilizando a aplicação de proporcionalidade ou razoabilidade para aprovação com ressalvas, conforme jurisprudência do TSE.  

IV. DISPOSITIVO E TESE  

4.1. Recurso parcialmente provido. Redução da quantia a ser recolhida ao Tesouro Nacional. Mantida a desaprovação das contas. Tese de julgamento: "As irregularidades na aplicação de recursos do FEFC, especialmente em contratações sem a formalização mínima exigida e em gastos pessoais ou vedados pela legislação eleitoral, quando representem a maior parte das receitas de campanha, conduzem à desaprovação das contas e a restituição ao erário." Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts. 12, inc. I; 35, § 12; 53; 79, § 1º. Jurisprudência relevante citada: TSE, REspEl n. 060116394/MS, Rel. Min. Sérgio Silveira Banhos, julgado em 29.9.2020, publicado em 27.10.2020; TRE-RS, PCE n. 0602453-56/RS, Rel. Des. Kalin Cogo Rodrigues, julgado em 13.12.2022, DJe 15.12.2022; TRE-RS, PCE n. 0602912-58/RS, Rel. Des. Mário Crespo Brum, julgado em 16.12.2024, DJe 22.01.2025. 

RECURSO ELEITORAL nº060067179, Acórdão, Relator(a) Des. Maria De Lourdes Galvao Braccini De Gonzalez, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 28/08/2025. 

 

Relativamente às horas trabalhadas, o contrato estipula a carga horária diária de oito horas, alusão semelhante a "horário comercial", expressão já acolhida para sanar apontamento da espécie (PCE n. 060274019/RS, Rel. Des. Voltaire De Lima Moraes, Acórdão de 26.9.2023, Diário de Justiça Eletrônico n. 179 de 29.9.2023). 

Desta forma, ainda que as contas devam receber ressalva em razão da ausência da formalidade, a ordem de recolhimento da quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) deve ser afastada, pois comprovada a despesa. 

2.3. Emprego de recursos do FEFC em benefício de candidaturas masculinas, sem comprovação de benefício à candidata doadora. 

O parecer conclusivo verificou gasto com impressos realizado junto a Alziemir O. Fernandes & Antonio Carlos Lima de Oliveira Ltda. (nome fantasia VT PROPAGANDA), CNPJ n. 44.691.407/0001-88, no valor de R$ 413,00, que teria se realizado em favor de candidaturas masculinas sem a indicação de benefício para a campanha da candidata. Parte do pagamento, qual seja, R$ 361,38, teria sido realizado com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

Impende destacar, conforme o extrato bancário disponível no DivulgaCand, que o pagamento integral (R$ 413,00), em benefício de VT PROPAGANDA, foi provido por recursos públicos, e não somente parte (R$ 361,38), como entendido no parecer conclusivo adotado pela sentença hostilizada. No entanto, não há possibilidade de correção da quantia, em respeito ao não prejuízo da recorrente. 

A recorrente, em suas razões, sustenta ter custeado apenas sua cota-parte em despesa coletiva, no que lhe assiste razão. A despesa consta da Nota Fiscal n. 659 (ID 45988411), da qual, por elucidativo, reproduzo a descrição do produto e os dados adicionais: 

 

 

Ou seja, merece reforma a sentença.

Como é possível extrair das informações constantes no documento fiscal, houve a confecção de 16.000 panfletos de propaganda eleitoral para os candidatos Everton Gimenez, Clairton da Fe, Gabriel Constantino, Enio Brizola, Jorge Tiba, Beto Loco, Paulinho dos Santos e para a recorrente, destinando-se 2.000 impressos para cada concorrente ao pleito.

A quantia de R$ 413,00 cobre somente a cota-parte da candidata. 

Com a finalidade de confirmar a efetiva cotização do valor total da despesa, verifiquei, exemplificativamente, na prestação de contas de candidato participante do gasto coletivo - Gabriel Constantino (PCE 0600407-12) - documento fiscal referente à contratação em questão, consistente na Nota Fiscal 656, com idêntica descrição dos produtos e idênticos dados adicionais. Resta evidenciado que a despesa está abrigada pela previsão dos §§ 6º e 7º do art. 17 da Resolução do TSE n. 23.607/19, verbis: 

Art. 17. O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) será disponibilizado pelo Tesouro Nacional ao Tribunal Superior Eleitoral e distribuído aos diretórios nacionais dos partidos políticos na forma disciplinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (Lei nº 9.504/1997, art. 16-C, § 2º) .  

(...) 

§ 6º A verba do Fundo Especial de Financiamento das Campanhas (FEFC) destinada ao custeio das campanhas femininas e de pessoas negras deve ser aplicada exclusivamente nestas campanhas, sendo ilícito o seu emprego no financiamento de outras campanhas não contempladas nas cotas a que se destinam. (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021) 

§ 7º O disposto no § 6º deste artigo não impede: o pagamento de despesas comuns com candidatos do gênero masculino e de pessoas não negras; a transferência ao órgão partidário de verbas destinadas ao custeio da sua cota-parte em despesas coletivas, desde que haja benefício para campanhas femininas e de pessoas negras. (Redação dada pela Resolução nº 23.665/2021) 

 

Portanto, a despesa é regular e deve ser reduzida a ordem de recolhimento em R$ 361,38, do total determinado na sentença. 

A irregularidade remanescente (impulsionamento), no valor nominal de R$ 919,00, admite a aplicação do princípio constitucional da razoabilidade para aprovar com ressalvas as contas, conforme pacífica jurisprudência deste Tribunal, pois inferior ao valor de R$ 1.064,50. 

Diante do exposto, VOTO para dar parcial provimento ao recurso de LILIANE DE FÁTIMA MELO NUNES, aprovar com ressalvas as contas, afastar a quantia de R$ 4.361,38 (R$ 4.000,00 + R$ 361,38) e manter a ordem de recolhimento de R$ 919,00.