REl - 0600439-69.2024.6.21.0149 - Voto Relator(a) - Sessão: 02/10/2025 00:00 a 03/10/2025 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso interposto por JESSICA HANNA FARIAS CORREA, candidata ao cargo de vereadora de Igrejinha/RS, nas Eleições 2024, contra a sentença que desaprovou suas contas de campanha e determinou o recolhimento de R$ 1.850,00 ao Tesouro Nacional, em virtude da aplicação irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) na contratação de pessoal para atividades de militância e mobilização de rua.

No item 4.1 do parecer conclusivo (ID 46043103), integralmente acolhido na decisão recorrida, a unidade técnica registrou que a documentação apresentada para comprovação das despesas de pessoal não atendeu integralmente às exigências do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, porquanto deixou de especificar os locais de trabalho, as horas trabalhadas e a justificativa do preço pago, conforme tabela inserida no referido parecer:

A matéria é disciplinada pelo art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, que dispõe:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

[...].

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

 

No tocante aos locais de trabalho, os contratos estabelecidos com Ailton Alexandre dos Santos (ID 46043079) e com Jonathan H. Silveira (ID 46043078) estipulam, na cláusula primeira, a prestação do serviço de “coordenador de campanha e cabos eleitorais”, “com foco de atuação em Igrejinha”, também o Município de residência de ambas as partes contratantes e circunscrição em que disputado o cargo eletivo.

Em circunstâncias semelhantes, este Tribunal tem assentado que “a ausência de referência a bairros de atuação não compromete a transparência do ajuste, especialmente considerando o porte reduzido do município” (REl n. 060085280, Acórdão, Relator Des. Nilton Tavares Da Silva, Publicação: DJe - Diário de Justiça Eletrônico, 20.6.2025), bem como que “por ser um município de pequeno porte, afigura–se desarrazoado exigir do trabalho da militância demonstrativo por ruas ou bairros” (REl n. 060086510, Relator: Des. Volnei dos Santos Coelho, Acórdão de 25.7.2025, Publicado no Diário de Justiça Eletrônico n. 139, data 30.7.2025).

Assim, embora o contrato não especifique os bairros ou as ruas de atuação, tal nível de detalhamento já foi relativizado por este Tribunal, especialmente em se tratando de município de pequeno porte, como no presente caso, não havendo qualquer indicativo de que as atividades se estenderam para além da circunscrição eleitoral de Igrejinha.

Quanto à especificação das horas trabalhadas, embora os instrumentos contratuais consignem, de forma aberta, uma “carga horária diária ajustável”, também está estipulado o controle de frequência mediante folha de controle como parte integrante dos contratos (cláusula quarta).

De fato, conjuntamente com os contratos apresentados por ocasião da entrega de contas finais, foram oferecidas “tabelas de controle de atividades”, contemporâneas à elaboração das contas e assinadas pelos contratados, nos quais estão anotadas as horas diárias trabalhadas (IDs 46043079, fl. 3, e 46043078, fl. 3).

Nesses termos, nossa jurisprudência tem admitido a complementação das informações contratuais por meio de “folhas de ponto, referentes à totalidade do período contratado” (Recurso Eleitoral n. 060040267/RS, Relatora: Des. Caroline Agostini Veiga, Acórdão de 13.8.2025, publicado no Diário de Justiça Eletrônico n. 151, data 18.8.2025) e “aditivos contratuais” (Recurso Eleitoral n. 0600280-76, Relator Des. Nilton Tavares Da Silva, Acórdão de 27.5.2025, publicado no Diário de Justiça Eletrônico n. 98, data 02.6.2025), desde que idôneos e elaborados ao tempo dos fatos, tal como ocorre no caso em análise.

Embora os documentos silenciem sobre os horários de trabalho, a informação contida no contrato e em seus anexos é suficiente para definir “as horas trabalhadas” a cada dia, nos exatos termos da norma de regência, permitindo a aferição da compatibilidade do preço pago com o trabalho prestado e com o tempo empregado para tanto.

Este Tribunal tem enunciado que “eventuais lacunas nos requisitos do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19 não possuem o condão, por si sós, de macular a regularidade das contas, quando presentes outros elementos que permitam inferir tais informações, sem obstar a fiscalização da Justiça Eleitoral” (Recurso Eleitoral n. 0600854-50, Relator: Des. Francisco Thomaz Telles, Acórdão de 22.8.2025, publicado no Diário de Justiça Eletrônico n. 158, data 27.8.2025).

Assim, entendo que as horas trabalhadas podem ser extraídas do controle diário de frequência anexado ao contrato. Desse modo, não subsiste a irregularidade, havendo falha meramente formal na confecção do documento, suprível pelos demais elementos disponíveis nos autos.

Em relação ao preço ajustado, os documentos comprobatórios revelam que Ailton Alexandre recebeu o total de R$ 1.060,00, por 24 dias de trabalho, à razão de 4 horas de trabalho a cada dia. Desse modo, o contratado foi retribuído com pouco mais de R$ 10,00 por hora de serviço, ou menos de um salário mínimo por uma quantidade de dias equivalente aos dias úteis de um mês. Tais valores são consideravelmente diminutos e compatíveis com os parâmetros de mercado, o que reforça a plausibilidade da contratação.

Por outro lado, o reconhecimento de irregularidade deve ser mantido em relação ao contrato firmado com Jonathan H. da Silva, que, conforme o cronograma de trabalho anexado ao contrato, atestou haver laborado apenas 4 horas totais, em um único dia, 16.9.2024, mas auferiu a retribuição de R$ 790,00, sem qualquer justificativa ou lastro documental para preço maior creditado ao contratado.

O conjunto probatório não permite que se estabeleça a compatibilidade da quantia paga com a diminuta jornada de trabalha informada, impossibilitando que se considere regular e razoável o gasto eleitoral em questão.

Destarte, está configurada a irregularidade na comprovação da contratação de Jonathan H. da Silva ante a incompatibilidade das horas trabalhadas com o preço pago, em desatendimento ao art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Portanto, a única irregularidade ora mantida alcança o valor de R$ R$ 790,00, cifra nominal inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10 que autoriza a aprovação das contas com ressalvas por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, na esteira do entendimento sedimentado na jurisprudência do TSE (Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral n. 060542160/SP, Relator: Min. Edson Fachin, Acórdão de 25.02.2021, publicado no Diário de Justiça Eletrônico n. 48, data 17.3.2021).

A aprovação das contas com ressalvas, porém, não afasta o dever de restituição da quantia irregular ao Tesouro Nacional, que decorre tão somente da malversação das verbas de natureza pública, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo parcial provimento do recurso, para aprovar com ressalvas as contas de JESSICA HANNA FARIAS CORREA, nos termos do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19, reduzindo o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional para R$ 790,00.