PC-PP - 0600122-33.2024.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/09/2025 às 16:00

VOTO

O Diretório Estadual do REPUBLICANOS apresentou contas relativas ao exercício financeiro do ano de 2023, disciplinado pela Resolução TSE n. 23.604/19.

A Secretaria de Auditoria Interna deste Tribunal identificou irregularidades quanto ao recebimento de recurso de fontes vedadas, utilização de valores de origem não identificada - RONI e aplicação irregular de verbas do Fundo Partidário.

Passo à análise.

1. Recursos de Fonte Vedada

A matéria está disciplinada na Lei 9.096/95 e regulamentada pelo Tribunal Superior Eleitoral na Resolução TSE n. 23.604/19:

 

Lei 9.096/1995

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de: (…)

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações referidas no art. 38 desta Lei e as proveniente do Fundo Especial de Financiamento de Campanha;

(...)

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

 

Resolução TSE nº 23.604/2019

Art. 12. É vedado aos partidos políticos receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, doação, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

II - entes públicos e pessoas jurídicas de qualquer natureza, ressalvadas as dotações orçamentárias do Fundo Partidário e do FEFC;

(...)

IV - autoridades públicas.

§ 1º Consideram-se autoridades públicas, para fins do inciso IV do caput, pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político.

§ 2º As vedações previstas neste artigo atingem todos os órgãos partidários, observado o disposto no § 1º do art. 20.

§ 3º Entende-se por doação indireta, a que se refere o caput, aquela efetuada por pessoa interposta que se inclua nas hipóteses previstas nos incisos.

 

Foram verificadas duas espécies de fontes vedadas.

1.1. Fonte Vedada - pessoa jurídica

Identificou-se, por meio dos extratos bancários disponíveis no banco de dados do Tribunal Superior Eleitoral, o recebimento de contribuição de LUCIO JANES, CNPJ n. 41.426.194/0001-79, e JULIANE SANTOS BRITO PADILHA, CNPJ n. 32.744.399/0001-01, na quantia de R$ 90,00 cada doação, em afronta à legislação de regência. À míngua de elementos probatórios, os quais deixaram de ser oferecidos pelo REPUBLICANOS, a quantia equivalente, R$180,00 (cento e oitenta reais), deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, conforme o art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

1.2. Fonte Vedada - não filiado ocupante de cargo público ad nutum

A unidade contábil verificou o recebimento de contribuições oriundas de pessoas físicas não filiadas ao partido político em exame, as quais exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2023, em inobservância à vedação prevista no art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95, regulamentado pelo Tribunal Superior Eleitoral na Resolução TSE n. 23.604/19, art. 12, inc. IV, § 1º, já reproduzidos.

Nomeadamente, as contribuições foram realizadas pelos seguintes doadores, conforme quantias e datas consignadas na tabela abaixo:

Sublinho que nenhum dos doadores elencados teve a sua filiação comprovada, de forma que à situação não aproveita a alteração produzida pela Lei n. 13.488/17 no art. 31 da Lei n. 9.096/95, a qual prevê que as pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, podem realizar contribuições a campanhas eleitorais desde que filiadas a partido político.

Irregulares, assim, as doações realizadas pelos ocupantes de função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, pois não comprovada a filiação ao partido político, no total de R$5.097,70 (cinco mil e noventa e sete reais com setenta centavos).

2. Recursos de Origem Não Identificada - RONI

O exame das contas detectou o ingresso de recursos de origem não identificada na conta-corrente 1290134, da agência 1889, do Banco do Brasil, cujo extrato bancário não apresenta a contraparte depositante, nas seguintes datas e valores:

A operação está nitidamente em desacordo com o art. 5º, inc. IV, c/c o art. 7º e art. 14, todos da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 5º Constituem receitas dos partidos políticos:

(...)

IV - doações de pessoas físicas e de outras agremiações partidárias, destinadas ao financiamento de campanhas eleitorais e das despesas ordinárias do partido, com a identificação do doador originário;

(...)

Art. 7º As contas bancárias somente podem receber doações ou contribuições com identificação do respectivo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF) do doador ou do contribuinte ou no CNPJ, no caso de recursos provenientes de outro partido político ou de candidatos.

(…)

Art. 14. O recebimento direto ou indireto dos recursos previstos no art. 13 sujeita o órgão partidário a recolher o montante ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito em qualquer das contas bancárias de que trata o art. 6º, sendo vedada a devolução ao doador originário.

Como referido, não houve manifestação por parte do ente partidário. A identificação das fontes de receita dos partidos está vinculada à possibilidade de fiscalização e verificação da lisura da contabilidade. Havendo óbice a essa identificação, impõe-se o reconhecimento da irregularidade e a determinação de devolução do valor equivalente, R$ 3.583,20 (três mil quinhentos e oitenta e três reais com vinte centavos), ao Tesouro Nacional.

3. Aplicação irregular de verbas do Fundo Partidário

No ano de 2023, a agremiação recebeu o montante de R$ 261.063,30, na conta n. 1290142, da agência n. 1889, do Banco do Brasil, em recursos do Fundo Partidário. No mesmo período, os gastos efetuados com verbas preexistentes, somadas às recebidas no exercício, alcançaram R$ 515.044,54 (quinhentos e quinze mil quarenta e quatro reais com cinquenta e quatro centavos) e foram sintetizados pelo órgão de auditoria conforme segue:

À analise individualizada das irregularidades atinentes à aplicação das verbas do Fundo Partidário.

3.1. Ausência de regular comprovação dos gastos

Mediante análise, verificou-se a realização de gastos em desacordo com o art. 18, art. 29, inc. V, e art. 36, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 18. A comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, sem emendas ou rasuras, devendo dele constar a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação do emitente e do destinatário ou dos contraentes pelo nome ou pela razão social, o CPF ou o CNPJ e o endereço, e registrados na prestação de contas de forma concomitante à sua realização, com a inclusão da respectiva documentação comprobatória.

(…)

Art. 29. O processo de prestação de contas partidárias tem caráter jurisdicional e deve ser composto das informações declaradas no sistema SPCA e dos documentos juntados nos autos da prestação de contas.

V - Demonstrativo de Recursos Recebidos e Distribuídos do Fundo Partidário;

(...)

Art. 36. Constatada a conformidade da apresentação de conteúdos e peças, nos termos do art. 29, §§ 1º e 2º, as contas devem ser submetidas à análise técnica para exame de sua regularidade, que compreende:

(…)

§ 2º A regularidade de que trata o inciso II do caput abrange, além do cumprimento das normas previstas no art. 2º, a efetiva execução do serviço ou a aquisição de bens e a sua vinculação às atividades partidárias.

Enumeradas as irregularidades no quadro abaixo:

A ausência de comprovação das despesas através dos documentos exigidos pela legislação de regência, como notas fiscais, contratos, recibos, et cetera, bem como omissão dos beneficiários dos correspondentes pagamentos - de regra, em virtude da não utilização das formas previstas para quitação, as quais resultariam na devida identificação do recebedor da verba pública -, comprometem irremediavelmente a transparência das contas e reclamam o recolhimento dos valores impropriamente gastos, no caso, R$ 64.589,06 (sessenta e quatro mil quinhentos e oitenta e nove reais com seis centavos), conforme determinação do art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

3.2. Destinação legal à criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres

A Lei n. 9.096/95, art. 44, inc. V determina aos partidos políticos, quanto à aplicação dos recursos recebidos do Fundo Partidário, a destinação mínima de 5% à criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, criados e executados pela Secretaria da Mulher ou, a critério da agremiação, por instituto com personalidade jurídica própria presidido pela Secretária da Mulher, em nível nacional.

No quesito, o órgão técnico verificou diversas irregularidades.

3.2.1. Destinação à cota de gênero das verbas auferidas no exercício 2023

Com efeito, a agremiação prestadora recebeu no exercício de 2023 o total de R$ 261.063,30 (duzentos e sessenta e um mil sessenta e três reais com trinta centavos), cabendo-lhe destinar à cota de gênero, no mínimo, R$ 13.053,17 (treze mil cinquenta e três reais com dezessete centavos, 5% do total de recursos referidos). No entanto, conforme parecer conclusivo, não foram transferidos valores para a conta bancária específica do Fundo Partidário Mulher.

Dessa forma, o REPUBLICANOS está sujeito a transferir para a conta bancária específica o montante de R$ 13.053,17 (treze mil reais com cinquenta e três reais com dezessete centavos) no exercício subsequente, vedada a aplicação para finalidade diversa, sob pena de acréscimo de 12,5% (art. 44, § 5º, da Lei n. 9.096/95).

3.2.2. Aplicação à cota de gênero dos recursos de exercícios anteriores com documentação comprobatória irregular

Efetivamente, a agremiação aplicou R$ 24.973,11 (vinte e quatro mil novecentos e setenta e três reais com onze centavos) com valores oriundos de saldo de exercícios anteriores, aos programas de incentivo à participação feminina, cujas despesas restaram regulamente comprovadas.

De outra banda, relativamente ao mesmo saldo, a SAI consignou que gastos no montante de R$ 70.003,48 (setenta mil três reais com quarenta e oito centavos) foram realizados em desacordo com a legislação de regência, segundo especificado no demonstrativo abaixo:

Nos termos da legislação referida, a comprovação dos gastos deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, que atenda aos requisitos especificados na resolução e sejam registrados na prestação de contas de forma concomitante à sua realização. Ainda, tratando-se de aplicação de verbas públicas, há possibilidade de ser exigida documentação complementar e, para que a despesa seja considerada regular, é igualmente exigível a comprovação da efetiva execução do serviço ou a aquisição de bens e a sua vinculação às atividades partidárias.

Como já apontado, o órgão partidário e os responsáveis foram intimados a complementar a documentação, deixando de fazê-lo, de modo a se impor a devolução da quantia irregularmente utilizada, qual seja, R$ 70.003,48 (setenta mil reais com três reais e quarenta e oito centavos).

3.2.3. Gastos declarados como à cota de gênero com finalidade não comprovada

O órgão técnico contábil aponta que os documentos relativos aos gastos com TREM MARKETING DIRETO LTDA., R$ 14.690,00 (quatorze mil seiscentos e noventa reais), e MARCIO GERVAZON, R$ 3.090,00 (três mil e noventa reais), não são hábeis a comprovar a efetiva aplicação em programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, pois a operação afronta o art. 22, caput, e § 5º, todos da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 22. Os órgãos partidários devem destinar, no mínimo, 5% (cinco por cento) do total de recursos do Fundo Partidário recebidos no exercício financeiro para criação ou manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres.

(…)

§ 5º A aplicação de recursos a que se refere este artigo, além da contabilização em rubrica própria do plano de contas aprovado pelo TSE, deve estar comprovada mediante a apresentação de documentos fiscais em que conste expressamente a finalidade da aplicação, vedada a comprovação mediante o rateio de despesas ordinárias, tais como água, luz, telefone, aluguel e similares.

Ausentes esclarecimentos por parte do partido prestador, o total de R$ 17.780,00 (dezessete mil setecentos e oitenta reais) deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, em decorrência da falha do presente tópico.

Em linha de conclusão, quanto aos aludidos recursos públicos, em síntese, são irregulares as quantias de R$ 64.589,06 (sessenta e quatro mil quinhentos e oitenta e nove reais com seis centavos), proveniente da conta do Fundo Partidário, e de R$ 87.783,48 (oitenta e sete mil setecentos e oitenta e três reais com quarenta e oito centavos - R$ 70.003,48 + R$ 17.780,00), proveniente da conta Fundo Partidário mulher.

4. Cominações Legais

Destaco que foram verificadas irregularidades graves, as quais comprometem a lisura da contabilidade. A desaprovação é medida que se impõe, com base no art. 45, inc. III, al. "a", da Resolução TSE n. 23.604/19.

Passo aos efeitos legais e à dosimetria.

4.1. Presente o recebimento e a utilização de recursos de fonte vedada, impõe-se a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 5.277,70, nos termos do art. 46, inc. I, da Resolução TSE n. 23.604/19.

Observo que a suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário é consequência específica do recebimento de recursos de fonte vedada. A jurisprudência deste Tribunal utiliza os parâmetros da razoabilidade e da proporcionalidade da sanção, com dosimetria de período de um a doze meses e, inclusive, tem entendido pela possibilidade de afastar a sanção de suspensão do repasse de quotas do Fundo Partidário quando o percentual da irregularidade mostrar-se irrisório (PC-PP n. 0600251-09, Rel. Des. RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Ac. de 25.6.2024, DEJERS de 03.7.2024).

No caso, a irregularidade implica o montante de R$ 5.277,70 (cinco mil duzentos e setenta e sete reais com setenta centavos) e representa 1,48% da movimentação em exame, circunstância pela qual entendo aplicável o paradigma e afasto a penalidade de suspensão.

4.2. Presente o recebimento e a utilização de recursos de origem não identificada - RONI, impõe-se a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 3.583,20 (três mil quinhentos e oitenta e três reais com vinte centavos), nos termos do art. 46, inc. I, da Resolução TSE n. 23.604/19.

4.3. Constatada a aplicação irregular de recursos oriundos do Fundo Partidário, impõe-se a devolução ao Tesouro Nacional da quantia de R$ 152.372,54 (cento e cinquenta e dois mil trezentos e setenta e dois reais com cinquenta e quatro centavos - R$ 64.589,06 + R$ 87.783,48).

4.4. Ocorridas irregularidades em diversos graus de gravidade e no total de R$ 161.233.44 (R$ 5.277,70+R$ 3.583,20+R$ 152.372,54), 45,35% dos recursos recebidos no exercício, R$ 355.497,72, fixo a multa prevista pelo art. 48, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19 (art. 37 da Lei n. 9.096/95) no patamar de 10%, ou seja, R$ 16.123,34 (dezesseis mil cento e vinte e três reais com trinta e quatro centavos). A aplicação da multa obedecerá o disposto no art. 48, § 2º e § 3º.

 

5. Dispositivo

Diante do exposto, VOTO pela desaprovação das contas do REPUBLICANOS, exercício financeiro 2023 e, nos termos da fundamentação, determino:

a) o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor total de R$ 161.233.44, dos quais (i) R$5.277,70 configuram recursos provindos de fontes vedadas; (ii) R$ 3.583,20, recursos de origem não identificada, e (iii) R$ 152.372,54, aplicação irregular da verba do Fundo Partidário, com fulcro no art. 46, incs. I e II, e art. 58, § 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

b) o pagamento de multa de 10% sobre o montante irregular, quantia de R$ 16.123,34, com fundamento no art. 37 da Lei n. 9.096/95 e art. 48, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19;

c) a transferência de R$ 13.053,17 à conta do Fundo Partidário Mulher, observada a necessidade de acompanhamento pela unidade técnica quanto à efetiva aplicação destes recursos, sob pena de acréscimo de 12,5% do valor previsto no caput do art. 22 da Resolução TSE n. 23.604/19, a ser aplicado no mesmo fim, nos termos do seu § 3º.