REl - 0600738-09.2024.6.21.0032 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/09/2025 00:00 a 26/09/2025 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE 

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço. 

 

PRELIMINAR

Antes de adentrar no mérito do recurso, imperioso é analisar da possibilidade de conhecimento dos documentos apresentados com a peça recursal.

É consabido que o processo eleitoral é regido por prazos exíguos e pelo princípio da preclusão, de modo que, em regra, não se admite a apresentação extemporânea de documentos que já estavam disponíveis ao prestador quando da fase instrutória, mormente em processos de prestação de contas onde a juntada de documentos após o momento oportuno (geralmente após a intimação para suprir a falha) será barrada por força da perda da faculdade de realização de tal ato, a não ser que se demonstre uma justa causa para a apresentação documental tardia. 

Assim, somente se admite, como orientação geral, a juntada de documentos em grau recursal quando se tratar de documentos novos, cuja produção ou acesso tenha ocorrido em momento posterior. 

Ainda, em consonância com a jurisprudência desta Corte, a juntada de documentos em sede recursal, especialmente no âmbito das prestações de contas, não compromete a regular tramitação do feito quando se trata de elementos probatórios simples, aptos a esclarecer de forma imediata as irregularidades apontadas, sem necessidade de reexame técnico ou diligências adicionais. Esse entendimento busca resguardar o interesse público na transparência da contabilidade eleitoral, garantir a celeridade processual e evitar formalismos excessivos.

Portanto, ainda que a regra geral nos presentes autos aponte para a ocorrência do fenômeno da preclusão, tanto em seu aspecto temporal quanto consumativo, cabe referir a possibilidade de admissão, em caráter excepcional, da juntada de documentos em sede de recurso, desde que estes sejam de simples compreensão e aptos a sanar as irregularidades de plano, sem a necessidade de novas diligências ou complexa análise técnica, com fundamento nos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da busca pela verdade material, a fim de garantir que a finalidade precípua da prestação de contas — a transparência e a fiscalização da movimentação financeira — seja alcançada, sem incorrer em formalismo excessivo que possa levar à sanção desproporcional. 

Com efeito, o art. 266, caput, do Código Eleitoral, assim preleciona: 

 Art. 266. O recurso independerá de termo e será interposto por petição devidamente fundamentada, dirigida ao juiz eleitoral e acompanhada, se o entender o recorrente, de novos documentos. 

[...] 

 Nesse diapasão, a jurisprudência do Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul tem reiteradamente reconhecido que, quando a documentação apresentada em sede recursal demonstra, de forma clara e inequívoca, a regularidade das despesas realizadas, e não há indícios de má-fé por parte do candidato, é legítima a sua aceitação, ainda que intempestiva, em homenagem aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da transparência das contas públicas eleitorais. 

Vale citar, a título ilustrativo, julgados desta Corte, cujas ementas acham-se assim insculpidas: 

 DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS APROVADA COM RESSALVAS. CONHECIDOS OS NOVOS DOCUMENTOS JUNTADOS NA FASE RECURSAL. AFASTADA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.1. Recurso interposto por candidata contra sentença que aprovou com ressalvas suas contas de campanha, relativas ao pleito eleitoral de 2024, e determinou o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. 1 .2. A recorrente alegou impossibilidade técnica de retificar a nota fiscal no sistema da municipalidade, tendo, no entanto, juntado o documento, corrigido, em sede recursal. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2 .1. Há três questões em discussão: (i) verificar a admissibilidade de juntada de nota fiscal retificada em sede recursal; (ii) avaliar os efeitos da regularização documental na prestação de contas; (iii) decidir sobre a manutenção da ressalva e da ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional. III. RAZÕES DE DECIDIR 3 .1. Conhecidos os novos documentos juntados após a sentença, por serem simples, capazes de suprir a omissão sem a necessidade de realização de diligências ou de exames complementares. Aceitação com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral e na jurisprudência deste Tribunal. 3.2. Os novos documentos fiscais preenchem os requisitos exigidos pela Resolução TSE n. 23 .607/19, contendo as dimensões dos materiais de campanha produzidos, o que sana integralmente a única irregularidade que embasou a ressalva na prestação de contas e afasta a determinação de recolhimento de quantias ao erário. 3.3. Afastado o comando de recolhimento ao Tesouro Nacional. Mantida a ressalva nas contas, devido à impropriedade formal referente à intempestividade da regularização do apontamento, na linha do entendimento deste Tribunal para o pleito de 2024. IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1. Recurso parcialmente provido. Afastada a determinação de recolhimento ao erário. Mantida a aprovação das contas com ressalvas. Tese de julgamento: "A apresentação de documento em sede recursal pode sanear irregularidade remanescente em prestação de contas de campanha, afastando ordem de recolhimento ao erário, mantendo a ressalva pelo atraso na correção." Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, art. 60, § 8º. Jurisprudência relevante citada: TRE–RS, RE n.0600539–72.2020.6 .21.0049, rel. Des. Caetano Cuervo Lo Pumo; TRE–RS, RE n. 0601134–53.2020.6.21 .0055, rel. Des. Luís Alberto D’Azevedo Aurvalle. 

(TRE-RS - REl: 06002652720246210063 BOM JESUS - RS 060026527, Relator.: Mario Crespo Brum, Data de Julgamento: 21/02/2025, Data de Publicação: DJE-37, data 26/02/2025) 

  

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. CONHECIDOS OS DOCUMENTOS JUNTADOS NA FASE RECURSAL. DOAÇÃO ESTIMÁVEL DE SERVIÇOS CONTÁBEIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUITAÇÃO. DIVERGÊNCIA DE VALORES ENVOLVENDO TARIFAS BANCÁRIAS. MERAS IMPROPRIEDADES. REFORMA DA SENTENÇA. AFASTADA A MULTA E A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de diretório municipal de partido político, referente ao exercício financeiro de 2020, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, acrescido de multa. 2. Conhecidos os documentos juntados na fase recursal. No âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura, ictu primo oculi, pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica. Na hipótese, juntadas fotografias de cheques, de simples constatação e com aptidão para, em tese, conduzirem ao saneamento das irregularidades. 3. Ausência de comprovação de quitação de despesa. Apresentação de recibo de pagamento para comprovação de doação estimável de serviços contábeis, em desacordo com o prescrito pelo art. 9º da Resolução TSE n. 23 .604/19. Entretanto, sendo inequívoco que o serviço doado se origina da atividade laboral da própria doadora e que o valor arbitrado não destoa de outros praticados para trabalhos semelhantes no município de origem, a falha é meramente formal, pois não prejudica a fiscalização sobre os contornos essenciais da doação estimável em questão, sendo suficiente a aposição de ressalvas. Inexistência de fundamento legal para a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da doação estimável de serviço, fruto do trabalho da doadora, declarada em valor razoável relativamente aos parâmetros do mercado local e não envolvendo recursos públicos ou de origem não identificada. 4. Divergência detectada entre o valor registrado como despesas com tarifas bancárias e o valor realmente apurado em análise. Reduzido montante da falha. Mera impropriedade, ensejadora de ressalvas às contas. 5. Reforma da sentença. As falhas identificadas constituem meras impropriedades, pois, alcançando montante módico, não impediram o exame técnico das contas e não resultam em dano ao erário, possibilitando a aprovação com ressalvas da contabilidade, na esteira de julgados desta Corte e do TSE (TRE–RS – PC 060028875, Relator.: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, Data de Julgamento: 15/06/2020, DJE de 23/06/2020). 6. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a multa e a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. 

(TRE-RS - REl: 0600045-83 .2021.6.21.0079 MANOEL VIANA - RS 060004583, Relator: CAETANO CUERVO LO PUMO, Data de Julgamento: 31/10/2023, Data de Publicação: DJE-202, data 07/11/2023) 

 Nessa senda, impende observar que os documentos colacionados pelo recorrente, ainda que não se enquadrem na categoria de “documentos novos” em sentido estrito, são plenamente aptos a demonstrar a regularidade das despesas anteriormente questionadas, consistindo em notas fiscais, comprovantes de transferência bancária, contratos e declarações idôneas. 

A explicação para a ausência de juntada oportuna — equívoco técnico da contabilidade responsável — encontra respaldo em declaração expressa da própria empresa de assessoria contábil, afastando qualquer presunção de má-fé do candidato. 

Assim, não se vislumbra óbice à juntada dos novos documentos com o presente recurso.

Portanto, conheço dos documentos anexados ao recurso e passo à análise do apelo.

 

MÉRITO 

A controvérsia central reside na possibilidade de valoração de documentos comprobatórios juntados nesta na fase recursal. 

Corrobora essa linha de raciocínio o parecer da douta Procuradoria Regional Eleitoral, que opina pela análise da documentação, ressaltando a ausência de má-fé e a aparente solução das pendências, revelando-se oportuno transcrever excerto de sua manifestação, que, vindo ao encontro do entendimento jurisprudencial deste TRE-RS, assim assevera: 

 Inexistem elementos nos autos a infirmar que que o recorrente não agiu de boa-fé, já detinha em mãos os documentos necessários à comprovação das contas por ocasião do ajuizamento da ação, só não o fazendo por equívoco da empresa contratada para esse fim, consoante declaração que fez juntar aos autos junto com os demais documentos, em fase de recurso. 

De acordo com a unidade técnica - Parecer Conclusivo (ID 45899875), as irregularidades apontadas são: 

1. Ausente comprovante das despesas com a empresa A3 Propaganda no valor de R$ 1.910,00, R$ 198,00 e R$ 45,00; 

2. Ausente comprovação das despesas (conforme art. 35, § 12 da Res. TSE 23.607/19) com Eloir Nardelli Muller no valor de R$ 2,290,00; 

3. Comprovação parcial da despesa com Erico Verissimo de Almeida, comprovado R$ 6.685,00 de um pagamento de R$ 8.685,00. 

Nessa toada, admitida a juntada, mesmo que extemporânea, da documentação pelo recorrente, passo à análise do seu mérito e da sua capacidade de sanar as irregularidades que levaram à desaprovação das contas em primeira instância, à luz da Resolução TSE n. 23.607/2019. 

Desse normativo, que "Dispõe sobre a arrecadação e os gastos de recursos por partidos políticos e candidatas ou candidatos e sobre a prestação de contas nas eleições", destaco a seguinte disciplina: 

 Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26): 

[...] 

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado. 

[...] 

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço. 

§ 1º Além do documento fiscal idôneo, a que se refere o caput, a Justiça Eleitoral poderá admitir, para fins de comprovação de gastos, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos, tais como: 

I - contrato; 

II - comprovante de entrega de material ou da prestação efetiva do serviço; 

III - comprovante bancário de pagamento; ou 

[...] 

 Assim, analiso as irregularidades apontadas no caso em tela, considerando que:

 

1. Despesas com a empresa A3 PROPAGANDA:

A sentença apontou a ausência total de comprovantes. Com o recurso, o prestador acostou as respectivas notas fiscais e os comprovantes de pagamento eletrônico, originados da conta de campanha.

Tais documentos atendem às exigências do art. 60, da Resolução TSE n. 23.607/19, demonstrando de forma transparente o vínculo entre os recursos do FEFC e as despesas declaradas, pois o documento fiscal detalha o serviço prestado, com as devidas dimensões e quantidades dos materiais publicitários adquiridos (adesivos, panfletos e “santinhos”) e os respetivos comprovantes de transferências bancárias indicam a efetiva quitação com recursos da conta oficial, garantindo a rastreabilidade e a transparência da operação.

Afastada a irregularidade.

 

2. Despesa com Eloir Nardelli Muller:

A decisão recorrida acoimou a ausência de comprovação nos termos do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19. O recorrente apresentou o contrato de prestação de serviços e o comprovante de transferência bancária, documentos que, em conjunto, demonstram a natureza do serviço contratado, o vínculo com a campanha e sua efetiva quitação, sanando a irregularidade apontada.

O contrato apresentado, apesar de trazer cláusulas genéricas, estabelece satisfatoriamente a identificação integral da prestadora de serviço, dos locais e períodos de execução do trabalho no Município de Palmeira das Missões, e da especificação das atividades executadas (atividades de militância e mobilização, com entrega de material de campanha produzido, visitação a potenciais eleitores e participação em eventos de campanha).

Portanto, regular a despesa.

 

3. Comprovação parcial da despesa com Erico Verissimo de Almeida:

Foi comprovado o dispêndio de R$ 6.685,00 de um pagamento total de R$ 8.685,00. O adendo ao contrato de prestação de serviços advocatícios trazido pelo recorrente aos autos dirime as inconsistências antes constatadas, abarcando a totalidade dos valores pagos a título de honorários advocatícios. 

Dessarte, a documentação apresentada, embora tardiamente, demonstra de forma cabal a regularidade das despesas, a origem dos recursos e a sua correta destinação. 

As falhas, por conseguinte, revelam-se meramente formais e foram devidamente supridas, não havendo prejuízo à fiscalização exercida por esta Justiça Eleitoral.

Isso posto, em linha com o parecer da diligente Procuradoria Regional Eleitoral, comprovada a origem e a regularidade dos gastos por meio da documentação acostada, a reforma da sentença para aprovar as contas do recorrente e o consequente afastamento da determinação de recolhimento de R$ R$ 4.443,00 (quatro mil, quatrocentos e quarenta e três reais) ao Tesouro Nacional é medida que se impõe.

Ante o exposto, VOTO por acolher os documentos apresentados pelo recorrente e, no mérito, DAR PROVIMENTO ao recurso interposto por JOEL ALEXANDRE RUBERT, para efeito de aprovar a prestação de contas relativas às Eleições de 2024, bem como para afastar a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.