REl - 0600632-32.2024.6.21.0037 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/09/2025 00:00 a 26/09/2025 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso mostra-se tempestivo, visto que a publicação da intimação da sentença recorrida no DJe se deu em 01.4.2025 e o recurso fora interposto em 03.4.2025.

Mostrando-se adequado, e preenchidos os demais pressupostos recursais, conheço do apelo e passo a analisar o mérito do recurso.

 

PRELIMINAR

Antes de adentrar no mérito do recurso, deve-se considerar a admissão dos documentos apresentados após a interposição do recurso eleitoral. Nesse ponto, consigno que, no âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal Regional Eleitoral tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura, primo ictu oculi, pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica.

In casu, tem-se por privilegiar o direito de defesa, de forma a prestigiar o julgamento pela retidão no gerenciamento dos recursos empregados no financiamento da campanha, como denota-se das ementas oriundas deste TRE-RS, colacionadas a título exemplificativo:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. CONHECIDOS OS DOCUMENTOS JUNTADOS NA FASE RECURSAL. DOAÇÃO ESTIMÁVEL DE SERVIÇOS CONTÁBEIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUITAÇÃO. DIVERGÊNCIA DE VALORES ENVOLVENDO TARIFAS BANCÁRIAS. MERAS IMPROPRIEDADES. REFORMA DA SENTENÇA. AFASTADA A MULTA E A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de diretório municipal de partido político, referente ao exercício financeiro de 2020, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, acrescido de multa. 2. Conhecidos os documentos juntados na fase recursal. No âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura, ictu primo oculi, pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica. Na hipótese, juntadas fotografias de cheques, de simples constatação e com aptidão para, em tese, conduzirem ao saneamento das irregularidades. 3. Ausência de comprovação de quitação de despesa. Apresentação de recibo de pagamento para comprovação de doação estimável de serviços contábeis, em desacordo com o prescrito pelo art. 9º da Resolução TSE n. 23.604/19. Entretanto, sendo inequívoco que o serviço doado se origina da atividade laboral da própria doadora e que o valor arbitrado não destoa de outros praticados para trabalhos semelhantes no município de origem, a falha é meramente formal, pois não prejudica a fiscalização sobre os contornos essenciais da doação estimável em questão, sendo suficiente a aposição de ressalvas. Inexistência de fundamento legal para a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da doação estimável de serviço, fruto do trabalho da doadora, declarada em valor razoável relativamente aos parâmetros do mercado local e não envolvendo recursos públicos ou de origem não identificada. 4. Divergência detectada entre o valor registrado como despesas com tarifas bancárias e o valor realmente apurado em análise. Reduzido montante da falha. Mera impropriedade, ensejadora de ressalvas às contas. 5. Reforma da sentença. As falhas identificadas constituem meras impropriedades, pois, alcançando montante módico, não impediram o exame técnico das contas e não resultam em dano ao erário, possibilitando a aprovação com ressalvas da contabilidade, na esteira de julgados desta Corte e do TSE (TRE–RS – PC 060028875, Relator.: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, Data de Julgamento: 15/06/2020, DJE de 23/06/2020). 6. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a multa e a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. (TRE-RS - REl: 06000458320216210079 MANOEL VIANA - RS, Relator: Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Data de Julgamento: 31/10/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 202, Data 07/11/2023) Grifei.

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. JUNTADA DE DOCUMENTAÇÃO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. DOCUMENTAÇÃO SIMPLES. DESNECESSIDADE DE NOVA ANÁLISE TÉCNICA. MÉRITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. JUNTADA DE NOTA FISCAL IDÔNEA. DESPESA DEMONSTRADA. AFASTADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas anuais do partido, exercício 2020, em razão de ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional e aplicada multa de 5% do valor irregular. 2. Conhecidos os documentos juntados com o recurso. Conforme pacífica jurisprudência desta Corte, a apresentação de novos documentos com o recurso, sobretudo na classe processual das prestações de contas, não apresenta prejuízo à tramitação do processo quando se trata de documentos simples, capazes de esclarecer, primo ictu oculi, as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. O posicionamento visa, sobretudo, salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha e a celeridade processual e afastar excessivo formalismo. 3. Ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. A nota fiscal indicada é documento idôneo a demonstrar a despesa - a diferença é de ordem insignificante, um centavo, e foi emitida pela mesma empresa cujo pagamento parcial foi acolhido pela sentença. Existência apenas de falhas formais e de comprovações extemporâneas, de forma que as contas devem ser aprovadas com ressalvas. 4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional. (TRE-RS - REl: 06000861020216210060 PELOTAS - RS, Relator: Des. Afif Jorge Simoes Neto, Data de Julgamento: 20/07/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 135, Data: 26/07/2023.) [Grifei]

Por essas razões, conheço dos documentos acostados no IDs 45949804 e seguintes, consistentes em recibo firmado pela prestadora de serviços Nádia Melo Henriques e extratos bancários, de simples constatação e com aptidão para, em tese, conduzirem ao saneamento, ao menos em parte, das irregularidades apontadas.

 

MÉRITO

A controvérsia refere-se à regularidade de gastos realizados com recursos públicos, especificamente do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), cujo uso e comprovação estão sujeitos à estrita observância das regras da Resolução TSE n. 23.607/19.

No caso em análise, a sentença reconheceu a ausência de comprovação adequada dos gastos com atividades de militância e mobilização de rua, visto que não há nos autos contrato ou documento fiscal a sustentar a despesa com a prestadora Nádia Melo Henriques.

O recorrente sustenta que os valores discutidos são baixos e que os documentos comprobatórios foram posteriormente anexados, incluindo transferências bancárias e recibos referentes à contratação de cabo eleitoral. Defende que não houve prejuízo ao controle da Justiça Eleitoral nem abuso econômico, e que sequer foi requerida aplicação de multa.

Pois bem. A partir da análise dos documentos juntados pelo recorrente, de cognoscibilidade simples, tenho que o recurso merece provimento, já adianto.

Para que seja considerado regular o gasto, deve haver a comprovação tanto da contratação, quanto do pagamento das despesas, o qual deve ser realizado à luz do art. 38 da norma de regência. Veja-se:

Art. 38. Os gastos eleitorais de natureza financeira, ressalvados os de pequeno vulto previstos no art. 39 e o disposto no § 4º do art. 8º, ambos desta Resolução, só podem ser efetuados por meio de:

I - cheque nominal cruzado;

II - transferência bancária que identifique o CPF ou CNPJ da beneficiária ou do beneficiário;

III - débito em conta;

IV - cartão de débito da conta bancária; ou 

V - Pix.

Nesse sentido, como bem decidido pela sentença, a contratação não havia sido foi comprovada, eis que não veio aos autos nota fiscal ou recibo de pagamento emitidos pela fornecedora Nádia.

Ocorre que, com a apresentação dos recibos de pagamento (ID 45949804) e dos comprovantes bancários de transferências dos valores da conta mantida pelo candidato para a da prestadora de serviços (IDs 45949805 e 45949806), tenho por satisfatoriamente comprovados os gastos glosados, a teor do que prescreve o art. 60, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23 .607/19, que assim institui:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

§ 1º Além do documento fiscal idôneo, a que se refere o caput, a Justiça Eleitoral poderá admitir, para fins de comprovação de gastos, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos, tais como:

[...]

III - comprovante bancário de pagamento; ou

[...]

§ 2º Quando dispensada a emissão de documento fiscal, na forma da legislação aplicável, a comprovação da despesa pode ser realizada por meio de recibo que contenha a data de emissão, a descrição e o valor da operação ou prestação, a identificação da destinatária ou do destinatário e da(o) emitente pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ, endereço e assinatura da prestadora ou do prestador de serviços.

§ 3º Havendo dúvida sobre a idoneidade do documento ou sobre a execução do objeto, a Justiça Eleitoral poderá exigir a apresentação de elementos probatórios adicionais que comprovem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços declarados. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

Não obstante, cumpre destacar que as despesas ora apreciadas decorrem da contratação de indivíduo, pessoa física, que, por razões óbvias, não emite nota fiscal pelo desempenho das atividades de militância.

Com efeito, os citados §§ 1º, 2º e 3º do art. 60 cuidam exatamente de prever outros documentos aptos à comprovação de despesas eleitorais, ampliando as possibilidades de cumprimento das exigências. Nesse sentido, destaco entendimento trazido de julgado do TRE-DF em que se admite a apresentação de comprovantes de transferências bancárias como meio idôneo de comprovação da regularidade de despesas com militância. Vejamos:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO ELEITO. RELATÓRIO FINANCEIRO. INTEMPESTIVIDADE. APRECIAÇÃO DAS CONTAS. POSSIBILIDADE. DESPESAS COM PESSOAL. RECURSOS DO FEFC. IRREGULARIDADE AFASTADA. SOBRAS DO FUNDO PARTIDÁRIO. ESCRITURAÇÃO EQUIVOCADA. ERRO FORMAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. 1. A apresentação intempestiva de relatório financeiro enseja apenas aposição de ressalva quando não comprometer a análise e a regularidade das contas do candidato, conforme entendimento firmado por este egrégio TRE–DF. 2. Os instrumentos contratuais e os comprovantes de transferências bancárias constituem meios de prova idôneos da regularidade de despesas com militância, nos termos do art. 53, II, c, e do art. 60, §§ 1º e 2º, ambos da Resolução TSE nº 23 .607/2019, bem como da jurisprudência do colendo TSE. 3. A incorreção da escrituração de sobra financeira (art. 50, § 2º, da Resolução TSE 23 .607/2019) consiste em falha formal incapaz de macular a integridade das contas. 4. Contas aprovadas com ressalvas.

(TRE-DF - PCE: 0601880-08 .2022.6.07.0000 BRASÍLIA - DF 060188008, Relator.: MÁRIO-ZAM BELMIRO ROSA, Data de Julgamento: 16/12/2022, Data de Publicação: PSESS-145, data 16/12/2022)

Assim, havendo prova do efetivo pagamento dos gastos com pessoal, tenho que a documentação trazida é suficiente para comprovar a regularidade da despesa.

Deste modo, o atraso na apresentação da documentação exigida consiste em falha que não compromete a regularidade das contas, comportando o juízo de ressalvas, contudo, estando a despesa comprovada, deve-se afastar a ordem de recolhimento.

Diante do exposto, VOTO por DAR PROVIMENTO ao recurso de FRANCISCO CESAR RODRIGUES HENRIQUES, ao efeito de aprovar as contas com ressalvas e afastar a ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.