REl - 0600015-66.2023.6.21.0018 - Voto Relator(a) - Sessão: 25/09/2025 00:00 a 26/09/2025 23:59

VOTO

Trata-se de recurso eleitoral interposto pelo DIRETÓRIO MUNICIPAL DO PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA – PDT de DOM PEDRITO contra a sentença que desaprovou as suas contas relativas ao exercício financeiro de 2022 e determinou o recolhimento de R$ 24.401,83 ao Tesouro Nacional, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada, bem como aplicou multa de 10% sobre o montante irregular.

A sentença recorrida reconheceu o recebimento e utilização do somatório de R$ 24.401,83, creditados na conta do partido político por meio de depósitos em espécie sem a correta identificação do CPF do suposto doador na operação bancária, configurando, assim, o recebimento de recursos de origem não identificada, tecendo a seguinte fundamentação (ID 45950647):

A legislação eleitoral veda expressamente o recebimento de recursos de origem não identificada pelos partidos políticos, conforme dispõe o art. 13 da Resolução TSE nº 23.604/2019. Consideram-se como tais os recursos cuja identificação do doador (nome/razão social e CPF/CNPJ) não seja informada, seja inválida ou não permita a confirmação da origem lícita da doação (art. 13, parágrafo único).

No caso concreto, a análise técnica identificou o ingresso de R$ R$24.401,83 (vinte e quatro mil, quatrocentos e um reais e oitenta e três centavos) na conta bancária do partido por meio de  depósitos via boleto bancário, bem como depósitos com receita identificada nos extratos bancários com o CNPJ zerado do Diretório Municipal, sem que fosse possível identificar, em ambos os casos, o CPF ou CNPJ dos respectivos doadores originários nos extratos bancários eletrônicos ou na documentação apresentada pelo partido (conforme detalhado no Relatório Técnico ID 126908933). Essa falha viola o disposto nos artigos 7º e 8º da Resolução TSE nº 23.604/2019, que exigem a identificação do doador.

O art. 14 da mesma Resolução determina que os recursos de origem não identificada devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU) até o último dia útil do mês subsequente ao crédito. O § 3º do art. 14 classifica a não realização desse recolhimento ou a utilização desses recursos como irregularidade grave.

O partido, embora intimado, não logrou êxito em comprovar a identificação da origem dos referidos recursos nem demonstrou o seu recolhimento voluntário ao Tesouro Nacional no prazo legal, pois quedou-se inerte.

 

De fato, os documentos produzidos durante a instrução em primeira instância são insuficientes para a superação do apontamento, uma vez que, nos extratos bancários, todos os depósitos glosados registram como contraparte um CNPJ inválido, padronizado como: “00.000.000/0000-01” (ID 45950627).

Ainda que a legislação eleitoral admita doação em espécie de valor inferior a R$ 1.064,10, é sempre obrigatória a identificação do CPF do doador no momento da transação bancária. A ausência dessa informação essencial caracteriza o valor como de origem não identificada, sujeitando-o ao recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 8º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19:

Art. 8º. (...).

§ 1º As doações em recursos financeiros devem ser, obrigatoriamente, efetuadas por cheque cruzado em nome do partido político, transferência eletrônica, depósito bancário diretamente na conta do partido político, mecanismo disponível em sítio do partido na internet que permita o uso de cartão de crédito, cartão de débito, emissão on-line de boleto bancário ou, ainda, convênios de débitos em conta e outras modalidades, desde que atenda aos requisitos previstos no art. 7º, § 1º, desta Resolução, devendo ser registradas na prestação de contas de forma concomitante à sua realização com a inclusão da respectiva documentação comprobatória.

§ 2º O depósito bancário previsto no § 1º deve ser realizado na conta "Doações para Campanha" ou na conta "Outros Recursos", conforme sua destinação, sendo admitida a efetivação por qualquer meio de transação bancária no qual o CPF do doador ou do contribuinte ou o CNPJ, no caso de partidos políticos ou candidatos, seja obrigatoriamente identificado.

§ 3º As doações financeiras de valor igual ou superior a R$ 1.064,10 (mil e sessenta e quatro reais e dez centavos) só poderão ser realizadas mediante transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação ou cheque cruzado e nominal.

Com esse posicionamento, colho julgados deste Tribunal:

DIREITO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO ESTADUAL. EXERCÍCIO 2023. OMISSÃO DE CONTAS BANCÁRIAS INATIVAS. RECEBIMENTO DE RECURSO DE FONTE VEDADA. INGRESSO DE VALORES DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. TRANSFERÊNCIA DE COTA DE GÊNERO A DIRETÓRIO MUNICIPAL. REGULARIZAÇÃO PARCIAL. RECOLHIMENTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

[...].

3.3. Ingresso de recursos de origem não identificada. Ausência de identificação do doador no momento da transação. É obrigatória a identificação do CPF do doador no momento da transação bancária. Caracterizada a falha. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

[...].

(TRE-RS; PRESTAÇÃO DE CONTAS ANUAL nº060016215, Acórdão, Relator(a) Des. Maria De Lourdes Galvao Braccini De Gonzalez, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 31/07/2025) Grifei.

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. PARTIDO POLÍTICO. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2017. DESAPROVAÇÃO. AFASTADA A PRELIMINAR DE NULIDADE DA SENTENÇA. MÉRITO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE DESAPROVAÇÃO DE CONTAS E RECOLHIMENTO DO MONTANTE IRREGULAR AO TESOURO NACIONAL. REDUÇÃO DO PERCENTUAL DA MULTA APLICADA PELO JUÍZO DE PISO PARA 10%. PARCIAL PROVIMENTO. [...]. 2. Mérito. Arrecadação de recursos de origem não identificada. Recebimento de recursos, mediante depósitos bancários em espécie, na conta-corrente da agremiação. Em que pese à alegação de que houve a anotação, por equívoco, no momento da efetivação das operações bancários, do número do CNPJ da grei ao invés do número do CPF do suposto doador, o registro do partido como doador no extrato bancário impede a identificação da real origem dos recursos (doador originário), impondo-se, por consequência, o recolhimento do numerário ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 13, c/c o art. 14, caput, da Resolução TSE n. 23 .464/15. [...].

(TRE-RS - RE: 2126 SANTA ROSA - RS, Relator.: DESEMBARGADOR MARILENE BONZANINI, Data de Julgamento: 06/02/2019, Data de Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 24, Data 08/02/2019, Página 3) Grifei.

 

Embora o partido político tenha produzido uma listagem de supostos filiados que teriam contribuído para a agremiação ainda durante a instrução em primeira instância (ID 45950515), não foram acostados quaisquer documentos que corroborem a relação de eventuais pessoas físicas doadoras, bem como inexistem mínimos esclarecimentos sobre como teria se dado o mesmo registro equivocado de CNPJ em diversos depósitos, realizados por diferentes contribuintes, em datas variadas.

De seu turno, nas razões recursais, a agremiação limitou-se a afirmar que, “conforme documentação anexa, comprobatória da regularidade das doações recebidas, todas as doações recebidas pela entidade partidária tem origem de fontes autorizadas pela legislação eleitoral, razão pela qual deve ser revertida a decisão que julgou desaprovadas as contas partidárias”, bem como postulou “prazo de cinco dias para juntada dos documentos comprobatórios ao feito” (ID 45950651).

Entretanto, a despeito da indicação de documentação adicional, nada foi oferecido, seja concomitantemente ou após o recurso, mesmo após o parecer ministerial e transcorridos mais de quatro meses desde o ato de interposição.

Não foram apresentados extratos, comprovantes ou documentos bancários que validassem o argumento de regularidade das operações “conforme documentação anexa”, permitindo vincular cada crédito bancário a uma fonte lícita de contribuições partidárias.

Ainda que este Tribunal tenha sedimentado a aceitação de novos documentos juntados com o recurso, quando dispensável a análise técnica, no caso em exame, o recorrente limitou-se a formular genericamente um pedido de prazo adicional, sem indicar qualquer óbice concreto que justificasse a ausência de juntada oportuna dos documentos alegadamente comprobatórios com as razões recursais.

O próprio art. 266, caput, do Código Eleitoral, ao facultar a juntada de novos documentos com o recurso, não mitiga o requisito formal de que a prova complementar seja trazida com as razões recursais em uma peça única, concomitantemente ao ato de interposição.

O pedido de complementação posterior do recurso, sem justificativa plausível, torna-se, de imediato, manifestamente infundado, pois o sistema recursal não admite a prática sucessiva de atos recursais dissociados de causa idônea para a excepcionalidade, sob pena de afronta aos princípios da preclusão consumativa e da singularidade recursal.

Assim, o recurso apresenta vício formal e não enfrenta, de modo específico e fundamentado, os pilares da decisão recorrida, uma vez que está ancorado em uma referência vaga a uma suposta documentação adicional que nunca foi especificada, debatida ou juntada aos autos.

Nessa direção, a Procuradoria Regional Eleitoral bem pontuou que o recurso não deve ser conhecido por inobservância da dialeticidade recursal, conforme considerações que agrego às razões de decidir:

Conforme lição de Elpídio Donizetti, “ao interpor recurso, a parte deverá expor as razões do seu inconformismo, indicando-as de forma clara e com a devida fundamentação.” Nesse sentido, também é a jurisprudência do e. STJ, o qual entende que “o princípio da dialeticidade recursal impõe que a parte recorrente impugne todos os fundamentos da decisão recorrida e demonstre, de forma oportuna, congruente, concreta e específica, seu eventual desacerto” (AgRg no AREsp n. 2.601.347/CE, DJe de 27/9/2024 - g. n.). Ora, o recorrente fundamentou seu argumento de “regularidade das doações recebidas” exclusivamente em supostos documentos que não foram juntados aos autos, o que corresponde, obviamente, à completa falta de fundamentação, impossibilitando a demonstração de eventual desacerto da sentença.

 

Dessa forma, inobservado o princípio da dialeticidade recursal, não se pode conhecer do apelo, na forma do art. 932, inc. III, do CPC.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo não conhecimento do recurso, com fundamento no art. 932, inc. III, do CPC.