ED no(a) REl - 0600350-56.2024.6.21.0081 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/09/2025 00:00 a 19/09/2025 23:59

VOTO

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

A alegação é de contradição. Vejamos.

A posição adotada no voto recorrido não destoa de alguns outros julgados já proferidos pelo Colegiado. É o caso, por exemplo, do REL 0600293-57.2024.6.21.0107, em que, na mesma situação de cheque não cruzado, teve seu beneficiário comprovado por endosso, assim se decidiu: "3.4. Ainda que afastada a devolução dos valores, subsiste falha formal, justificada a manutenção da desaprovação das contas, ante o percentual significativo da irregularidade (41,55% dos recursos arrecadados)". Também com tal dispositivo foi o precedente produzido no REL 0600233-76.2024.6.21.0142, em que, em situação idêntica, concluiu-se que "3.6. A irregularidade representa 69,82% da arrecadação de campanha, superando o valor nominal de R$ 1.064,1 e 10% do total arrecadado, afastando a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovação das contas com ressalvas, impondo sua desaprovação".

Ainda assim, a argumentação trazida pelo embargante mostra-se consistente.

O juízo de reprovação das contas mostra-se adequado quando, ao vício formal, corresponde situação não esclarecida e justificada, de modo que não se tenha como afirmar a regularidade material. Nesses casos, a menos que a inconsistência diga respeito a valores diminutos, impõe-se a reprovação das contas.

Mas o caso dos autos é distinto. O entendimento acolhido no voto, no sentido de reconhecer que os documentos trazidos foram suficientes para comprovar a adequada aplicação dos recursos de campanha, com o afastamento da determinação de recolhimento aos cofres públicos, mostra-se contraditório com a conclusão final pela reprovação das contas. Isso porque a existência de vício formal que, em tese, poderia comprometer a rastreabilidade e a transparência da aplicação dos recursos, no caso, acabou sendo compensado com documentação que permitiu tal apuração e que demonstrou a correta aplicação. Reprovar contas que demonstram a correta aplicação dos recursos é contraditório.

Com efeito, comprovada a adequação material e remanescendo tão somente o vício formal, mais consentânea com a situação é a conclusão de aprovação com ressaltas: aprovação porque a aplicação dos recursos foi adequada; ressalvas porque houve vícios formais.

Aliás, este Colegiado já decidiu exatamente desse modo recentemente, dando as contas por aprovadas com ressalvas:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CANDIDATA. UTILIZAÇÃO DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA (FEFC). CHEQUE NÃO CRUZADO. DESTINAÇÃO COMPROVADA. CONTAS APROVADAS COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AFASTADO. RECURSO PROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso interposto por candidata eleita ao cargo de vereadora contra sentença que desaprovou suas contas de campanha, referentes às Eleições Municipais de 2024, em razão da emissão de cheque não cruzado para pagamento de despesa com verba do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), determinando o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2.1. Verificar se a emissão de cheque não cruzado, embora contrária ao art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, compromete a regularidade das contas, notadamente quando comprovada a destinação dos recursos públicos.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. Nos termos do art. 38 da Resolução TSE n. 23.607/19, é obrigatória a utilização de cheques nominais e cruzados, a fim de permitir a aferição, por esta Justiça Especializada, do real destino dos valores despendidos durante a campanha eleitoral.

3.2. No caso, verifica-se que foi consignado o nome e o CPF do prestador do serviço no verso do cheque, conforme consta do corpo do recurso, a indicar a ausência de posterior endosso da ordem de pagamento. Embora persista a falha, é possível extrair com segurança a conclusão de que a beneficiária do pagamento é a pessoa física contratada.

3.3. Este Tribunal, em julgamento recente, deu por superado o vício formal concernente ao não cruzamento de cheque, quando identificado o destinatário da ordem de pagamento.

3.4. Reforma da sentença. Mera falha formal não pode acarretar o recolhimento do valor, pois, em última análise, motivaria o enriquecimento sem causa do erário e, em contrapartida, o injusto empobrecimento da recorrente.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso provido. Aprovação das contas com ressalvas. Afastada a ordem de recolhimento ao erário.

Tese de julgamento: "A emissão de cheque não cruzado para pagamento com recursos do FEFC configura falha formal, que não compromete a transparência das contas, quando possível identificar com segurança o destinatário final da ordem de pagamento, hipótese em que deixa de ser necessário o recolhimento da quantia ao erário."

Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts. 38 e 74, inc. II.

Jurisprudência relevante citada: TRE-RS, PCE n. 0602661-40.2022.6.21.0000, Rel. Des. Volnei dos Santos Coelho, j. 27.6.2024, DJE n. 129, publ. 05.7.2024.

(REL 0600300-67.2024.6.21.0004, Des. Eleitoral Nilton Tavares da Silva, julgado em 25.07.2025). (grifo nosso)

Consigno, entretanto, que, ao contrário do afirmado pelo embargante, da desaprovação das contas não resulta impedimento de expedição de certidão de quitação eleitoral e inelegibilidade para o próximo pleito.

Com efeito, conforme dicção do art. 11, § 7º, da Lei 9.504/97, apenas a falta de apresentação das contas é capaz de repercutir negativamente na capacidade eleitoral passiva do candidato.

Contudo, é possível atribuir efeitos infringentes aos aclaratórios, para aprovar as contas com ressalvas, na medida em que, de fato, a irregularidade é única e não afetou os princípios da transparência, fiscalização e rastreabilidade da contabilidade do embargante. Com efeito, seria contraditório reconhecer a regularidade material, afastar o recolhimento dos valores e, ainda assim, reprovar as contas. 

Assim, reconhecendo a contradição, VOTO pelo acolhimento dos embargos declaratórios, com efeitos infringentes, para aprovar, com ressalvas, as contas do embargante.