REl - 0600401-54.2024.6.21.0053 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/09/2025 00:00 a 19/09/2025 23:59

VOTO

Na impugnação, o PP indicou omissão de gastos, referentes à realização de comício de campanha sem que houvesse correspondente registro na prestação de contas.

Em resposta à impugnação, os candidatos confirmaram a existência de despesas não lançadas no valor total de R$ 4.600,00, justificando que os gastos foram custeados por terceiros, sendo R$ 600,00 relativos ao aluguel de palco, em nome do coordenador de campanha, Sr. Diego Batista da Silva, e R$ 4.000,00 referentes à sonorização do evento, pagos pelo patrocinador Diego da Silva Andrés.

Por essas razões, a sentença concluiu pela aprovação com ressalvas, com a consequente classificação da quantia não declarada como recursos de origem não identificada (RONI), e determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional, na forma do art. 21, § 1º, e art. 32, § 1°, inc. IV, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Relativamente aos argumentos recursais, suscitam os recorrentes, em preliminar, a inconstitucionalidade do art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, sob o argumento de que a norma, ao exigir a realização de doações financeiras em valor igual ou superior a R$ 1.064,10 exclusivamente por meio de transferência eletrônica entre as contas bancárias do doador e do beneficiário da doação, ou por cheque nominal e cruzado, extrapolaria o poder regulamentar da Justiça Eleitoral, violando os princípios da legalidade (art. 5º, inc. II, da Constituição Federal) e da separação dos Poderes (art. 2º da CF).

A preliminar, no entanto, não merece acolhida.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral já pacificou o entendimento de que a exigência constante do art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19 não extrapola o poder regulamentar conferido à Justiça Eleitoral. Trata-se de norma editada com base na competência do TSE para regulamentar instruções com vistas à execução da legislação eleitoral, nos termos do art. 23, inc. IX, do Código Eleitoral e do art. 105 da Lei n. 9.504/97.

A exigência de rastreabilidade das doações tem como finalidade garantir a segurança na movimentação dos recursos eleitorais, permitindo o controle efetivo pela Justiça Eleitoral e o combate ao abuso do poder econômico.

Nesse sentido: “A regra contida no art. 21, inc. I e § 1º, da Res.–TSE n. 23.607/19 não extrapola o poder regulamentar conferido à Justiça Eleitoral e tem por objetivo conferir maior transparência às doações financeiras” (TSE, AREspE n. 0600552–14.2020.6.15.0025, Rel. Min. Sérgio Banhos, DJe 28.9.2020).

De modo semelhante, já foi decidido pelo TSE em casos anteriores, inclusive com base em norma de conteúdo equivalente: "a aceitação de doações eleitorais em forma diversa da prevista compromete a transparência das contas de campanha, dificultando o rastreamento da origem dos recursos" (AgR– REspe n. 313–76, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, DJe de 03.12.2018). “A exigência de que doações acima de R$ 1.064,10 sejam feitas por meio de transferência eletrônica não é meramente formal e o seu descumprimento enseja, em tese, a desaprovação das contas” (TSE, REspe n. 529-02, Rel. Min. Tarcísio Vieira de Carvalho Neto, DJe 19.12.2018).

Concluindo, a norma impugnada não inova no ordenamento jurídico de forma ilegítima, mas detalha e regulamenta mecanismos de controle da legalidade e rastreabilidade das doações, revelando-se compatível com o ordenamento constitucional e legal.

Assim, rejeito a alegação de inconstitucionalidade do art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, por inexistência de extrapolação do poder normativo do TSE.

No mérito, a controvérsia posta diz respeito à determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 4.600,00, considerado pela sentença como recurso de origem não identificada (RONI), em razão da omissão de despesas custeadas por terceiros no comício de encerramento da campanha.

Conforme reconhecido pelos próprios recorrentes, as despesas foram realizadas por pessoas físicas apoiadoras da campanha (Diego Batista da Silva e Diego da Silva Andrés), que adimpliram, respectivamente, os valores de R$ 600,00 (palco) e R$ 4.000,00 (sonorização), sem registro da prestação de serviços nas contas, sem emissão de nota fiscal em nome dos candidatos, sem trânsito dos recursos utilizados para pagamento pelas contas bancárias de campanha e sem demonstração da origem dos valores.

O procedimento viola todos os princípios que norteiam a prestação de contas, em especial os da transparência e da confiabilidade das contas, e impede de modo insanável o controle e a fiscalização da Justiça Eleitoral sobre a arrecadação e os gastos financeiros.

De acordo com o art. 21, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, as doações em valor igual ou superior a R$ 1.064,10 deverão ser feitas obrigatoriamente por meio de transferência bancária identificada ou cheque cruzado e nominal, sob pena de serem consideradas recursos de origem não identificados, nos termos do art. 32.

Ainda que os doadores tenham sido identificados posteriormente, a irregularidade persiste mesmo nesses casos, justamente porque o descumprimento da forma imposta impossibilita o controle antecipado da legalidade dos recursos e abre margem a simulações ou desvios de finalidade.

A ausência de trânsito bancário qualifica o recurso como RONI, ainda que o doador seja posteriormente identificado, com a necessidade de recolhimento integral do valor irregularmente recebido, conforme o art. 32, § 4º, da Resolução TSE n. 23.607/19, que estabelece: “No caso da utilização das doações financeiras recebidas em desacordo com este artigo, ainda que identificado o doador, os valores devem ser recolhidos ao Tesouro Nacional.”

Na hipótese, a irregularidade atingiu o valor de R$ 4.600,00, o que representa aproximadamente 5,77% da receita total da campanha (R$ 79.600,00), estando correta a decisão pela aprovação das contas com ressalvas, por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, e pelo recolhimento do valor ao Tesouro Nacional. De acordo com a jurisprudência: “Em prestação de contas cuja irregularidade envolver valores reduzidos, inferiores a R$ 1.064,10 ou a 10% da arrecadação, é admitida a aprovação com ressalvas, em observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.” (TRE-RS, REl n. 0600724-60.2024.6.21.0085, Relator Desembargador Eleitoral Nilton Tavares da Silva, DJe, 13.02.2025).

Assim, ainda que seja possível aprovar as contas com ressalvas, a determinação de recolhimento ao erário é obrigatória.

Com essas considerações, rejeito a matéria preliminar e mantenho a sentença.

Em face do exposto, rejeito a matéria preliminar e VOTO pelo desprovimento do recurso.