ED no(a) REl - 0600774-78.2024.6.21.0023 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/09/2025 00:00 a 19/09/2025 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

Os embargos são tempestivos e formalmente cabíveis, na forma do art. 275 do Código Eleitoral, c/c o art. 1.022 do Código de Processo Civil, razão pela qual deles conheço.

 

MÉRITO

Consoante ressai das razões apresentadas na petição de embargos declaratórios, a recorrente aponta omissão no acórdão deste Eleitoral por, supostamente, não ter analisado os precedentes do Tribunal Superior Eleitoral colacionados em suas razões recursais.

Argumenta que tal vício impede o prequestionamento da matéria para fins de interposição de recurso à instância superior.

Todavia, não assiste razão à embargante.

Ocorre que os embargos de declaração, nos termos do art. 275 do Código Eleitoral e do art. 1.022 do Código de Processo Civil, são um recurso de fundamentação vinculada, cabível apenas para sanar omissão, contradição, obscuridade ou erro material na decisão judicial e, de tal forma, não se prestam à rediscussão do mérito da causa ou à reforma do julgado por mero inconformismo da parte com o resultado que lhe foi desfavorável.

Além disso, a fundamentação das decisões deve ser suficiente para resolver os pontos do recurso, mas não exige que o tribunal adote a interpretação defendida pela parte.

A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral é pacífica nesse sentido:

ELEIÇÕES 2020. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU ERRO MATERIAL NOS PRIMEIROS EMBARGOS. REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. EFEITOS INFRINGENTES. IMPOSSIBILIDADE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO REJEITADOS. 1. Os embargos de declaração são cabíveis, nos termos do art. 1.022 do CPC/2015, quando na decisão recorrida estiver presente omissão, contradição, obscuridade ou erro material. 2. São manifestamente incabíveis os embargos quando exprimem apenas o inconformismo da parte embargante com o resultado do julgamento, sem lograr êxito em demonstrar a presença de um dos vícios previstos no art. 1.022 do CPC/2015.3. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE - REspEl: 06001656620206130150 JOÃO MONLEVADE - MG 060016566, Relator.: Min. Ricardo Lewandowski, Data de Julgamento: 26.05.2022, Data de Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 107.)

 

No caso em apreço, verifica-se que a embargante insiste na tese de que o acórdão ignorou a jurisprudência do TSE sobre a natureza objetiva da conduta vedada do art. 73, inc. V, da Lei n. 9.504/97 - Lei das Eleições - e a interpretação restritiva do conceito de "serviço essencial".

No entanto, a decisão colegiada não negou tais premissas, mas concluiu que os fatos se amoldavam às exceções expressamente previstas na própria norma de regência.

O voto condutor foi explícito ao assentar que as contratações questionadas se enquadravam em duas hipóteses legais previstas pela Lei das Eleições: Nomeação para cargos em comissão, ressalvada pela al. "a" do inc. V do art. 73; e Execução de programa social ("Frentes de Trabalho"), instituído pela Lei Municipal n. 1.182/99, em conformidade, portanto, com a exceção do § 10 do mesmo art. da Lei n. 9.504/97:

Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

[...]

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir, demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e designação ou dispensa de funções de confiança;

[...]

§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei n° 11.300, de 2006)

Dessa forma, a discussão sobre a essencialidade dos serviços ou a objetividade da conduta torna-se secundária quando o julgado reconhece, primeiramente, que os atos administrativos estavam amparados por ressalvas legais.

A alegação de que os cargos em comissão foram desvirtuados para funções técnicas e de que não houve comprovação do preenchimento dos requisitos para o programa "Frentes de Trabalho" foi devidamente considerada. Contudo, o colegiado entendeu que, diante da documentação apresentada pelos embargados (decretos de nomeação e a lei instituidora de tal programa), caberia à parte autora o ônus de demonstrar de forma inequívoca a fraude e o propósito eleitoreiro, o que não ocorreu. O acórdão consignou que "não restou suficientemente demonstrada que tais situações possuíssem o condão de moldar-se à prática de conduta vedada ou abusiva".

Por outro lado, sustenta igualmente a embargante que o acórdão teria se omitido em enfrentar a irregularidade das distribuições de cestas básicas e materiais de construção.

Também neste ponto não lhe assiste razão.

O voto condutor consignou que a distribuição de bens ocorreu no âmbito de programa social instituído pela Lei Municipal n. 2.213/21, com execução orçamentária anterior ao ano eleitoral, circunstância que enquadra a hipótese na ressalva legal do art. 73, § 10, da Lei n. 9.504/97, acima transcrito.

A fragilidade da documentação comprobatória do recebimento dos bens pelos beneficiários, com a eventual ausência de assinatura ou detalhamento em recibos de entrega, foi reconhecida na sentença de primeiro grau como insuficiente para descaracterizar a vinculação do ato a programa social previamente instituído, restando expressamente referida no acórdão embargado, destacando-se, a propósito, o parecer do eminente Procurador Eleitoral, segundo o qual, “essa constatação não significa que tenha havido indiscriminada distribuição de bens e, o que poderia configurar captação ilícita de sufrágio”.

Dessa forma, saliente-se, a matéria foi efetivamente analisada, inexistindo omissão acerca do tópico.

Outro fundamento do acórdão embargado foi a ausência de robustez probatória para a configuração do abuso de poder político ou econômico, onde ficou ressaltado que a gravidade é requisito indispensável, nos termos do art. 22, inc. XVI, da Lei Complementar n. 64/90.

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

(...)

XVI - para a configuração do ato abusivo, não será considerada a potencialidade de o fato alterar o resultado da eleição, mas apenas a gravidade das circunstâncias que o caracterizam.

O ponto central da decisão deste Tribunal Regional Eleitoral não foi a negação da ilicitude em tese, mas o reconhecimento de que a embargante não produziu prova robusta do desvio de finalidade ou da burla às exceções legais, assim não havendo omissão, mas sim valoração jurídica diversa daquela pretendida pela embargante.

A conclusão pela inexistência de conduta vedada ou de ato abusivo foi devidamente fundamentada, amparada em legislação e documentos constantes dos autos.

Ademais, porquanto reconhecido pela própria parte embargante, o fato de o acórdão não ter mencionado, um a um, todos os precedentes jurisprudenciais por ela citados não configura omissão. O julgador não está obrigado a rebater cada argumento ou julgado invocado, bastando que exponha de forma coerente e fundamentada as razões de seu convencimento, o que foi devidamente realizado. A adoção de linha de entendimento diversa daquela defendida pela parte representa a própria rejeição de sua tese, e não uma falha no julgado.

Nesse sentido, a exigência de fundamentação não impõe ao tribunal o acatamento das alegações de interesse do embargante, sendo incabível considerar omisso o julgado que não acolheu a interpretação defendida pela parte, de modo que a não aceitação das alegações do embargante não caracteriza omissão, desde que a decisão esteja devidamente fundamentada.

Nessa senda, exemplificativamente, colhe-se da jurisprudência do TSE:

ELEIÇÕES 2020. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO INTERNO. SUPOSTAS PREMISSAS FÁTICAS EQUIVOCADAS E OMISSÕES. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS. PRETENSÃO DE REJULGAMENTO DO FEITO. EMBARGOS REJEITADOS. 1. Os embargos de declaração constituem modalidade recursal de integração e objetivam esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material, consoante estabelece o art. 275 do Código Eleitoral, com redação dada pelo art. 1.067 do Código de Processo Civil. 2. Nos termos da jurisprudência desta Corte, é admitido invocar, como erro material, a adoção de premissa equivocada em julgamento, visando a fundamentar o cabimento de embargos de declaração. 3. Não houve omissões quanto ao ponto suscitado nos embargos de declaração – matéria constitucional referente a suposta ofensa ao art. 5º, II, IV, IX, LIV, XXXVI, XXXIX e XLV, art. 16 e ao art. 220, § 1º –, porquanto se utilizou como fundamento no aresto embargado a incidência do Verbete Sumular nº 26 do Tribunal Superior Eleitoral, ficando, por conseguinte, impedida a análise das pretensões de fundo. 4. Os embargantes argumentam que foram adotadas premissas fáticas equivocadas no aresto embargado ao assentar a incidência dos óbices sumulares nºs 26, 30 e 72 do Tribunal Superior Eleitoral. 5. Os presentes embargos de declaração objetivam tão somente promover novo julgamento do recurso, providência inviável em âmbito aclaratório, consoante a jurisprudência desta Corte Superior. 6. O mero inconformismo da parte com a decisão contrária a seus interesses não enseja a oposição de embargos de declaração, os quais pressupõem a existência de falha passível de ser sanada na via eleita, de cognição estreita e vinculada, e não à revisitação de matéria apreciada pelo órgão julgador, conforme pretendido pelos embargantes. 7. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE - AREspEl: 060447464 SÃO PAULO - SP, Relator.: Min. Raul Araujo Filho, Data de Julgamento: 18.05.2023, Data de Publicação: 29/05/2023)

Outrossim, ainda na senda da jurisprudência do TSE, tem-se que o intuito de prequestionamento, por si só, não justifica o acolhimento dos embargos de declaração se não houver vício a ser sanado, conforme reiterado entendimento daquele sodalício, tal qual se verifica na ementa abaixo transcrita:

ELEIÇÕES 2020. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. REGISTRO DE CANDIDATURA. PREFEITO. SUBSTITUIÇÃO DE CANDIDATURA. DEMORA NO JULGAMENTO. ART. 13, § 3º, DA LEI Nº 9.504/97. PRAZO. OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA. INDEFERIMENTO DO REGISTRO. INEXISTÊNCIA DE OMISSÃO. INVIABILIDADE DE ACOLHIMENTO DO RECURSO PARA SIMPLES PREQUESTIONAMENTO. REJEIÇÃO. 1. Inocorrência das baldas que ensejariam, nos termos dos arts. 275 do Código Eleitoral e 1.022 do Código de Processo Civil, o acolhimento dos embargos de declaração. 2. A leitura do acórdão evidencia a desnecessidade de integração, porquanto esta Corte apresentou fundamentação clara e coerente, inexistindo omissões a serem sanadas. Revela–se, em verdade, o nítido intuito de rediscutir matéria devidamente apreciada, sendo cediço, contudo, que os embargos de declaração não se prestam a tal fim. 3. Diante da não demonstração de vícios no acórdão, impõe–se a rejeição dos embargos de declaração, sendo inviável acolhê–los para simples prequestionamento. 4. Embargos de declaração rejeitados.

(TSE - REspEl: 06007372720206130213 DIVISA ALEGRE - MG 060073727, Relator.: Min. Carlos Horbach, Data de Julgamento: 08.09.2022, Data de Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônico, Tomo 183)

De tal modo, volvendo ao caso em exame, impende anotar que o acórdão embargado, ao contrário do que alega a coligação embargante, enfrentou de forma clara e suficiente toda a matéria devolvida a este Tribunal, expondo os fundamentos que levaram à manutenção da sentença de improcedência da AIJE proposta pela COLIGAÇÃO INOVA CATUÍPE.

Sublinhe-se, o julgado ora embargado concluiu que as contratações se enquadravam nas exceções legais do art. 73, inc. V, al. "a", da Lei n. 9.504/97 (cargos em comissão) e do § 10 do mesmo artigo (programas sociais autorizados em lei e com execução orçamentária no exercício anterior).

No acórdão em questão, fundamentou-se, ainda, a ausência de prova robusta da gravidade dos fatos e do desvio de finalidade, requisitos indispensáveis para a configuração do abuso de poder e da captação ilícita de sufrágio.

No ponto, a propósito, registro que a jurisprudência desta Justiça Especializada é firme no sentido de que a análise sobre o enquadramento de contratações em programas sociais legalmente instituídos é matéria de mérito, e não de vício sanável em embargos de declaração, tal qual se depreende do precedente deste TRE-RS que abaixo colaciono:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. DUPLA OPOSIÇÃO. ELEIÇÕES 2020. RECURSO. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. PARCIAL PROVIMENTO. ALEGADA OBSCURIDADE, OMISSÃO, CONTRADIÇÃO E ERRO MATERIAL NO ACÓRDÃO. AUSENTE VÍCIO A SER SANADO. DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA. REJEIÇÃO DE AMBOS OS ACLARATÓRIOS. 1. Oposições contra acórdão que rejeitou a preliminar de nulidade por cerceamento de defesa; conheceu como preliminar e acolheu a alegação de inovação para o fim de não considerar os fatos narrados após o ajuizamento da petição inicial; e, no mérito, deu provimento parcial ao recurso para condenar os recorridos ao pagamento de multa, pela prática da conduta vedada prevista no art. 73, inc. IV, da Lei n. 9.504/97, relativa ao uso promocional em favor de candidatos, da distribuição gratuita de edredom. 2. Embargos opostos pela coligação e partidos. Indeferida a alegação de ofensa ao princípio da não surpresa, disposto no art. 10 do Código de Processo Civil. Na espécie, as teses referidas nos declaratórios foram expressamente consideradas no acórdão. Ademais, ao longo das razões de convencimento, o acórdão apresenta os fundamentos, claros e coesos para a conclusão pela ausência de gravidade dos fatos, os quais em nada se relacionam com o indeferimento da prova testemunhal. No mesmo sentido, descabida a alegada omissão quanto à aplicação de precedentes desta Corte e do TSE. O dever de fundamentar a distinção ou a superação de precedente, previsto no art. 489, § 1º, inc. VI, do CPC, abarca exclusivamente os precedentes obrigatórios, na forma do art. 927 do CPC. A exigência não alcança os julgados meramente persuasivos, os quais prescindem de fundamentação específica, não havendo indicação, pelos embargantes, da existência de qualquer precedente obrigatório. 3. Embargos opostos pelos candidatos. Evidenciada insurgência contra a justiça da decisão, reprisando argumentos suficientemente enfrentados pelo acórdão. Inexistência de erro material ou omissão. 4. A ausência de quaisquer dos vícios previstos no art. 1.022 do CPC impõe a rejeição de ambos os embargos declaratórios. Circunstância que não implica, por si só, o reconhecimento de caráter protelatório, pois não se evidenciam as hipóteses do art. 80 do CPC e do § 6º do art. 275 do Código Eleitoral. 5. Rejeição.

(TRE-RS - REL: 060048510 DILERMANDO DE AGUIAR - RS, Relator.: GERSON FISCHMANN, Data de Julgamento: 10.03.2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 16.03.2022.)

Portanto, à luz dos elementos constantes dos embargos sob exame, gize-se, não há omissão. O que existe é uma divergência da embargante quanto à valoração da prova e à conclusão jurídica adotada pelo Tribunal, o que caracteriza nítida tentativa de rediscussão do mérito.

Assim, em suma, o que se extrai das razões da embargante é uma clara pretensão de rediscutir o mérito da decisão por via transversa efetivamente em um novo julgamento da causa, a fim de que esta Corte reavalie o conjunto probatório e adote a tese jurídica mais favorável à recorrente, finalidade para a qual a via dos embargos declaratórios é manifestamente inadequada.

Inexistindo, todavia, as omissões apontadas, tampouco ocorrendo contradição, obscuridade ou erro material hábeis a justificar o acolhimento do recurso oposto pela COLIGAÇÃO INOVA CATUÍPE, resta inviável a modificação do julgado por esta via.

Ante o exposto, VOTO por REJEITAR os embargos de declaração opostos por COLIGAÇÃO INOVA CATUÍPE, nos termos da fundamentação.