REl - 0600249-84.2024.6.21.0027 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/09/2025 00:00 a 19/09/2025 23:59

VOTO

O recurso é tempestivo, pois interposto dentro do tríduo legal, e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.

No mérito, as contas da recorrente foram desaprovadas, com a determinação do recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 3.230,00, em virtude da omissão do registro integral dos seus gastos financeiros de campanha.

As contas finais apresentadas pela candidata não registram nenhuma arrecadação ou gasto de campanha, estando “zeradas” (ID 45937305), embora os extratos bancários e as notas fiscais eletrônicas revelassem a realização de movimentação financeira de campanha.

Embora intimada para complementar suas informações contábeis, a candidata somente ofereceu contas retificadoras e documentos adicionais após o parecer conclusivo da unidade técnica.

Diante disso, o juízo a quo considerou as contas retificadoras apresentadas após o parecer conclusivo como “extemporânea e inválida”, apontando que “está preclusa a oportunidade de juntada de manifestações nas quais a parte já foi intimada”.

Em suas razões, a recorrente sustenta que o atraso na entrega dos documentos decorreu de falha da profissional contábil contratada e que é possível a avaliação das contas retificadoras oferecidas em 28.2.2025, ainda antes da decisão final de mérito.

A tese recursal em tela foi recentemente apreciada pelo Tribunal no julgamento do REl n. 0600248-02, na sessão virtual de 28 e 29.8.2025, em caso bastante análogo, também procedente do Município de Júlio de Castilhos, assim ementado:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. não conhecimento de documentos juntados antes da sentença. nulidade. retorno dos autos à origem. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1.1. Recurso eleitoral interposto por candidato a vereador contra sentença que desaprovou suas contas de campanha nas Eleições de 2024 e determinou o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional, em razão de divergências entre os extratos bancários e a prestação de contas apresentada. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 2.1. Apurar eventual erro do juízo de primeiro grau por deixar de apreciar documentos que já integravam os autos antes do julgamento. III. RAZÕES DE DECIDIR 3.1. Reconhecimento da nulidade da sentença. O prestador apresentou documentos antes da sentença, que deveriam ter sido encaminhados para exame técnico. Determinação de retorno dos autos à origem para que seja proferida nova decisão, com a análise da prestação de contas retificadora. IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1. Recurso provido. Nulidade da sentença. Tese de julgamento: “Viola o contraditório e a ampla defesa o não conhecimento de documentos, juntados antes da sentença, capazes de esclarecer irregularidades apontadas pela análise técnica em prestação de contas.” Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts. 53, inc. I, al. "g" e inc. II, al. "a"; 71, incs. I e II. Jurisprudência relevante citada: TSE; AgR-AI n. 0602773-81, Rel. Min. Sérgio Banhos, julgado em 24.9.2020; TRE-RS; RE n. 0600430-50/Tapes, Rel. Des. Amadeo Henrique Ramella Butelli, DJe 10.3.2022. (REl n. 0600248-02.2024.6.21.0027, Relator: Des. Federal Leandro Paulsen, julgado em 29.8.2025)

 

Nessa ocasião, o Pleno deste Corte entendeu, por unanimidade, que os documentos apresentados antes da sentença deveriam ter sido encaminhados para exame técnico, ante a inexistência de indícios de má-fé ou de retardamento intencional do processo, como forma de privilegiar a fiscalização sobre a efetiva aplicação dos recursos de campanha.

Nessa linha, adoto o judicioso voto proferido pela Desembargadora Eleitoral Caroline Agostini Veiga naquele julgamento, perfeitamente aplicável à hipótese em análise:

É incontroverso que a prestação de contas retificadora foi apresentada em 28/02/2025, portanto, antes da sentença (proferida em 14/03/2025). Assim, não procede a conclusão de que os documentos não podem ser conhecidos na decisão para o julgamento do mérito das contas, pois a jurisprudência aceita o conhecimento de documentos complexos e o reexame das contas quando a juntada ocorre antes da sentença, em primeira instância.

Entendo que viola a ampla defesa o não conhecimento dos documentos juntados antes da sentença, pois a jurisprudência, a partir da interpretação dada ao art. 266 do Código Eleitoral, mitiga os efeitos da preclusão para autorizar até mesmo a juntada de novos documentos em fase recursal, apenas indeferindo, na instância superior, a reabertura da instrução:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS APROVADA COM RESSALVAS . CONHECIDOS OS NOVOS DOCUMENTOS JUNTADOS NA FASE RECURSAL. AFASTADA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I . CASO EM EXAME (...) Conhecidos os novos documentos juntados após a sentença, por serem simples, capazes de suprir a omissão sem a necessidade de realização de diligências ou de exames complementares. Aceitação com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral e na jurisprudência deste Tribunal . 3.2. Os novos documentos fiscais preenchem os requisitos exigidos pela Resolução TSE n. 23.607/19, contendo as dimensões dos materiais de campanha produzidos, o que sana integralmente a única irregularidade que embasou a ressalva na prestação de contas e afasta a determinação de recolhimento de quantias ao erário. 3.3. Afastado o comando de recolhimento ao Tesouro Nacional. Mantida a ressalva nas contas, devido à impropriedade formal referente à intempestividade da regularização do apontamento, na linha do entendimento deste Tribunal para o pleito de 2024. IV. DISPOSITIVO E TESE 4.1 . Recurso parcialmente provido. Afastada a determinação de recolhimento ao erário. Mantida a aprovação das contas com ressalvas. Tese de julgamento: "A apresentação de documento em sede recursal pode sanear irregularidade remanescente em prestação de contas de campanha, afastando ordem de recolhimento ao erário, mantendo a ressalva pelo atraso na correção ." Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, art. 60, § 8º . Jurisprudência relevante citada: TRE-RS, RE n. 0600539-72.2020.6 .21.0049, rel. Des. Caetano Cuervo Lo Pumo; TRE-RS, RE n . 0601134-53.2020.6.21 .0055, rel. Des. Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle.

(TRE-RS - REl: 06002652720246210063 BOM JESUS - RS 060026527, Relator.: Mario Crespo Brum, Data de Julgamento: 21/02/2025, Data de Publicação: DJE-37, data 26/02/2025)

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. VEREADOR . ELEIÇÕES 2016. CONTABILIDADE RETIFICADORA APRESENTADA NO MESMO DIA QUE O RECURSO. POSSIBILIDADE DE ACATAMENTO. DIVERGÊNCIA ENTRE DOAÇÕES ESTIMADAS EM DINHEIRO E AS REGISTRADAS COMO DOAÇÃO . FALHA SANADA. INTERESSE PÚBLICO NA TRANSPARÊNCIA DA CONTABILIDADE. IRREGULARIDADE INFERIOR AO PATAMAR CONSIDERADO COMO DE PEQUENO VALOR. ART 18 DA RESOLUÇÃO TSE N . 23.463/15. PROVIMENTO. APROVAÇÃO . (...) 2. A apresentação de novos documentos com o recurso não acarreta prejuízo à tramitação do processo quando se tratar de documentos simples, capazes de esclarecer de plano as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. Na espécie, foi apresentada prestação de contas retificadora no mesmo dia em que prolatada a sentença, sanando a mácula apontada. Ademais, a falha perfaz quantia inferior ao patamar estabelecido pela norma eleitoral como sendo de pequeno valor, na exegese do art. 18 da Resolução TSE n. 23 .463/15. Provimento. Aprovação das contas.

(TRE-RS - RE: 0000497-26 .2016.6.21.0142 CANDIOTA - RS 49726, Relator.: JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Data de Julgamento: 28/02/2018, Data de Publicação: DEJERS-34, data 02/03/2018)

Assim, uma vez que os documentos foram juntados antes da sentença, deveriam ter sido conhecidos.

Considero que o exame da prestação de contas deve observar a finalidade do processo de contas, que é viabilizar a fiscalização da arrecadação e aplicação de recursos, e que, no caso em tela, os documentos retificadores foram apresentados antes da decisão e são de simples conhecimento. Ademais, demonstrou-se boa-fé porque há comprovantes de envio de toda a documentação pelo candidato à contadora ainda em setembro/outubro de 2024.

A falha, portanto, decorreu de desídia profissional, não sendo razoável imputar ao prestador a pecha de má-fé.

Assim, considero que a sentença incorreu em error in procedendo, por deixar de apreciar documentos que já integravam os autos antes do julgamento, violando o contraditório e a ampla defesa (art. 5º, inc. LV, CF), impondo-se a anulação, a fim de que o juízo de origem reexamine as contas considerando a prestação retificadora e os documentos apresentados.

 

Com efeito, como o prestador apresentou contas retificadoras e novos documentos antes da sentença, não havendo maiores prejuízos à marcha processual ou indicativos de má-fé da candidata, a sentença deve ser anulada, com o retorno dos autos à origem para análise técnica de todos os elementos disponíveis nos autos da prestação de contas.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo provimento do recurso, a fim de anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para análise técnica da prestação de contas retificadora apresentada, com posterior prolação de nova sentença.