REl - 0600343-85.2024.6.21.0074 - Voto Relator(a) - Sessão: 18/09/2025 00:00 a 19/09/2025 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, trata-se de recurso eleitoral interposto por LUCIA HELENA DE MELLO, candidata ao cargo de vereadora no Município de Alvorada/RS nas Eleições Municipais de 2024, contra a sentença que julgou desaprovadas suas contas de campanha e determinou o recolhimento da quantia de R$ 4.004,98 ao Tesouro Nacional. 

Passo, assim, ao exame das falhas apontadas na sentença recorrida.

1. Dos Contratos com Pessoal para Serviços de Militância

Consta dos autos que a candidata firmou dois contratos de prestação de serviços com pessoas físicas, voltados à atividade de militância durante o período eleitoral, envolvendo o montante de R$ 4.000,00.

O primeiro pacto foi celebrado com Rodrigo dos Santos Moletta, em 21 de setembro de 2024, no valor de R$ 2.500,00 (ID 45929560). A segunda contratação, datada de 21 de agosto de 2024, está firmada com Priscila Pereira da Silva, pela quantia de R$ 1.500,00 (ID 45929561).

Na origem, a sentença recorrida, na análise dos documentos comprobatórios, apontou:

No caso, não houve o detalhamento previsto na norma, ainda que tenham sido apresentados os contratos. Carecem, principalmente, dos locais de trabalho, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado. Não houve, também, a apresentação do intervalo de datas da prestação do serviço, fazendo com que não seja possível a contabilização das respectivas horas.

 

Com efeito, os instrumentos anexados limitam-se a declarações genéricas, desprovidas de informações essenciais. Nos documentos, não constam elementos suficientes para se depreender a descrição detalhada das atividades executadas, o período de vigência do contrato e a justificativa para a fixação dos valores pactuados.

Ambos os instrumentos contratuais preveem como objeto a mera “prestação de serviços remunerados”, sem nenhuma especificação sobre o tipo de atividade. Cabe ressaltar que a candidata não contabilizou a contratação ou a arrecadação estimável de material de campanha (IDs 45929553 e 45929542), o que prejudica a presunção de que os contratados foram direcionados à usual tarefa de distribuição de folhetos ou santinhos.

Em realidade, as únicas despesas de campanha registradas nas contas consistem na contratação de Priscila e Rodrigo, aos quais foi paga a integralidade da arrecadação de campanha, ou seja, R$ 4.000,00 advindos do FEFC, inexistindo quaisquer outros gastos que pudessem ser considerados acessórios às atividades eventualmente desempenhadas pelos contratados.

Além disso, os ajustes contratuais estipulam a vigência “da data de sua ratificação até 15/11/2024”. Trata-se de cláusula absolutamente incongruente com supostos serviços de cabos eleitorais ou de militância, pois dilata os efeitos do pacto para mais de um mês além da data do primeiro turno das eleições de 2024 (6.10.2024).

A questão adquire especial relevo diante da discrepância entre os valores pagos entre os diferentes contratados: Rodrigo, contratado em 21.09.2024, recebeu R$ 2.500,00, ao passo que Priscila, contratada um mês antes (21.8.2024), recebeu R$ 1.500,00. Logo, Rodrigo auferiu R$ 1.000,00 a mais que Priscila, o que representa um incremento de 66% em relação à remuneração de sua colega, embora tenha trabalhado um mês a menos.

Não há justificativa documental para esse desajuste, tampouco há indicação de carga horária diferenciada ou objeto de trabalho distinto. Essa assimetria, somada à falta de outras informações idôneas acerca do período de vigência e ações exercidas, tornam os documentos frágeis e inidôneos para a comprovação dos gastos com recursos públicos.

Tais omissões traduzem descumprimento direto dos art. 35, § 12, e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, que exigem, de forma expressa, a descrição pormenorizada das atividades executadas, dos locais de trabalho, da carga horária e da justificativa do preço contratado, bem como a comprovação por documentos idôneos.

Destarte, as falhas constatadas não se limitam a meras impropriedades formais, mas constituem irregularidades materiais de vulto, no montante de R$ 4.000,00, que correspondem à integralidade dos recursos do FEFC.

De seu turno, a recorrente não logrou trazer argumentos ou provas capazes de infirmar as conclusões tecidas na sentença, limitando-se a reafirmar que os contratos atendem à legislação eleitoral.

Assim, está configurada a irregularidade na comprovação das contratações de pessoas físicas pelo candidato, impondo-se a manutenção da sentença que determinou o recolhimento integral da quantia de R$ 4.000,00 ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

2. Da Omissão de Receitas e de Gastos Eleitorais

O parecer conclusivo da unidade técnica (ID 45929582) apontou a ocorrência de omissão de gasto eleitoral, em confronto entre as informações constantes da prestação de contas e aquelas extraídas da base de dados da Justiça Eleitoral, mediante cruzamento de notas fiscais eletrônicas.

Conforme registrado, foi identificada a despesa realizada junto ao fornecedor BELLER COMÉRCIO DE PAPÉIS LTDA. (CNPJ n. 05.563.868/0014-38), consubstanciada na Nota Fiscal n. 201120, emitida em 10.9.2024, no valor de R$ 4,98, a qual não constou da contabilidade apresentada pela candidata.

Nessa linha, o TSE entende que “gastos não declarados que tenham sido informados por fornecedores por meio do Sistema de Registro de Informações Voluntárias, e/ou constem de notas fiscais oriundas das Secretarias das Fazendas Estaduais e Municipais, (...) constituem omissão de despesas” (TSE; Prestação de Contas n. 97795, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, DJe, Tomo n. 241, Data 16.12.2019, p. 73).

Além disso, as despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do candidato, caracterizando o recurso como de origem não identificada.

Nesse sentido, cito o seguinte precedente desta Corte:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. VEREADORA. OMISSÃO DE GASTOS ELEITORAIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. SAQUE ELETRÔNICO DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. CONFIABILIDADE CONTÁBIL. MACULADA. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. RECOLHIMENTO DOS VALORES AO TESOURO NACIONAL. VALOR NOMINAL DAS IRREGULARIDADES. DIMINUTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO. PROVIMENTO PARCIAL. (...). 2. Detectadas 07 (sete) notas fiscais emitidas contra o CNPJ de campanha, sem que os recursos para quitação da despesa tenham transitado pelas contas bancárias da candidata, indicando omissão de gasto eleitoral. Os gastos não contabilizados afrontam o art. 53, inc. I, als. “g” e “i”, da Resolução TSE n. 23.607/19. Nesse trilhar, a Corte Superior entende que a omissão em tela viola as regras de regência e macula a confiabilidade do ajuste contábil. 3. As despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação da dívida de campanha, cujo trânsito ocorreu de modo paralelo à contabilidade formal da candidata, caracterizando o recurso como de origem não identificada, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19. (...).

(TRE-RS - RE: 06006545520206210094 IRAÍ/RS 060065455, Relator: DES. ELEITORAL FRANCISCO JOSÉ MOESCH, Data de Julgamento: 03.02.2022). Grifei.

 

Desse modo, restou caracterizada a irregularidade, devendo o valor de R$ 4,98 ser recolhido ao Tesouro Nacional, na forma prescrita pelo art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19, nos termos da bem-lançada sentença.

Conclusão

As irregularidades verificadas somam R$ 4.004,98 (R$ 4.000,00 relativos às contratações de militância e R$ 4,98 concernentes a recursos de origem não identificada – RONI), correspondendo a 100,12% das receitas declaradas (R$ 4.000,00).

Diante da expressividade e da natureza das falhas, não há espaço para a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade com vistas à aprovação das contas com ressalvas.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.