REl - 0600269-54.2024.6.21.0034 - Voto Relator(a) - Sessão: 05/02/2025 às 14:00

VOTO

O recurso interposto é regular, adequado e tempestivo, e preenche todos os pressupostos relativos à espécie, de modo que merece conhecimento.

Recebo a renúncia da procuradora THIRZÁ CENTENO PEREIRA ZANETTI, nos termos do § 2º do art. 112 do Código de Processo Civil, tendo em vista a existência de outros procuradores outorgados.

No mérito, DANILO ANTUNES RIZZO insurge-se contra a sentença que julgou procedente a representação por propaganda eleitoral irregular ajuizada pela COLIGAÇÃO NOVA FRENTE POPULAR por suposta propaganda eleitoral negativa veiculada na rede social Facebook do representado e, acolhendo embargos de declaração, aplicou multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) ao recorrente.

A decisão atacada entendeu, em síntese, que "as provas constantes dos autos, corroboradas pelo parecer ministerial, demonstram que as publicações impugnadas contêm afirmações sem fundamento e ofensivas, que distorcem informações sobre a trajetória pessoal do candidato com o claro intuito de prejudicar sua imagem".

No campo normativo, a propaganda eleitoral está disciplinada na Lei n. 9.504/97, regulamentada pela Resolução TSE n. 23.610/19. Reproduzo as disposições pertinentes:

Art. 27. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57- A) . ( Vide, para as Eleições de 2020, art. 11, inciso II, da Resolução nº 23.624/2020 )

§ 1º A livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos, observado o disposto no art. 9º-A desta Resolução. (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

O recorrente defende a licitude da propaganda e a inaplicabilidade da multa.

Sem razão.

A postagem apresenta o seguinte conteúdo:

Veja-se que a propaganda, além de noticiar acidente ocorrido há quase 40 (quarenta) anos,  imputa a Fernando Marroni, candidato a Prefeito de Pelotas nas Eleições 2024, a condição de estar “bêbado e chapado” por ocasião do trágico evento.

Nitidamente difamatório e ofensivo, portanto. Ainda que o fato do atropelamento tenha ocorrido, forma incontroversa, não se encontra informação de que o candidato tenha sido criminalmente responsabilizado nas circunstâncias da divulgação objeto de exame - de modo que a divulgação incorreu em vedação legal, aliás de ser considerada como sabidamente inverídica. 

Conforme bem asseverado pelo Ministério Público Eleitoral da origem, "trata-se (...) de leviana disseminação de notícia que nenhuma relação tem com o debate político-eleitoral".

Dito de outro modo, cuida-se aqui de manifestação grave, que desborda do direito de liberdade de expressão - o debate é político, e ainda que a atuação da Justiça Eleitoral em relação a conteúdos divulgados na internet deva ser realizada com a menor interferência possível no debate democrático, nos termos do art. 38 da Resolução TSE n. 23.610/19, esta Especializada não pode se omitir em enfrentar os excessos realizados por candidatos ou apoiadores em nome da liberdade de expressão, entre eles, a propagação de mensagens difamatórias, caluniosas, injuriosas ou inverídicas, como no caso em tela.

Sobre a incidência de sanção pecuniária, defende o recorrente que a base legal indicada na sentença para aplicação da multa, qual seja, art. 30, §1º, da Resolução TSE n. 23.610/19, está limitada a infrações relacionadas à propaganda anônima, não sendo admissível ao presente caso.

A interpretação dada pelo recorrente difere - em muito - daquela pacificada nas decisões desta Corte, aliás, alinhada à posição do e. Tribunal Superior Eleitoral, pela qual se admite aplicar a referida multa, igualmente prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97, na hipótese de abuso na liberdade de expressão realizada por meio de propaganda veiculada na internet.

Exemplificativamente:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2024. RECURSO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET. DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÃO SABIDAMENTE INVERÍDICA. INCIDÊNCIA DA MULTA. RECURSO DESPROVIDO.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso interposto contra sentença que julgou parcialmente procedente representação por propaganda eleitoral irregular, condenando a recorrente ao pagamento de multa, com fundamento no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97, pela veiculação, em redes sociais, de propaganda contendo informações sabidamente inverídicas e descontextualizadas.

II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO

2.1. Determinar se a propaganda eleitoral veiculada configura desinformação ao sugerir, de forma inverídica, a existência de processos criminais em tramitação contra candidato.

2.2. Verificar a legitimidade da aplicação da multa prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97, em casos de propaganda irregular na internet.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. A expressão constante da postagem impugnada faz referência a processos judiciais que realmente existiram, sugerindo que ainda estão em tramitação, quando, na verdade, estão extintos, sendo que o arquivamento desses processos é informação notória e devidamente comprovada.

3.2. A interpretação dada pelo TSE é no sentido de ser cabível aplicar-se a multa prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97 na hipótese de abuso na liberdade de expressão ocorrida por meio de propaganda veiculada na internet, como no caso. Assim, legítima a aplicação de multa por disseminação de conteúdo sabidamente falso.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso desprovido.

Teses de julgamento: “1. A veiculação de propaganda eleitoral na internet, com uso de informações sabidamente inverídicas, que sugiram falsamente a existência de processos judiciais extintos, caracteriza prática de desinformação e configura irregularidade, nos termos da legislação eleitoral. 2. É legítima a aplicação de multa pela realização de propaganda eleitoral veiculada na internet mediante disseminação de conteúdo sabidamente falso.”

Dispositivos relevantes citados: Lei n. 9.504/97, art. 57-D, § 2º; Resolução TSE n. 23.610/19, art. 9º-A.

Jurisprudência relevante citada: TSE, Rp: n. 060130762, Rel. Min. Maria Claudia Bucchianeri, DJE 14/10/2022. TSE, Rp: n. 060175450, Rel. Min. Alexandre de Moraes, DJE 28/03/2023. TSE, REC-Rp: n. 060100448, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJE 02/04/2024.

(TRE-RS - 0600425-26.2024.6.21.0007, Relator: Des. Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Data de Julgamento: 28/11/2024, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 149) (grifo nosso)

 

ELEIÇÕES 2022. RECURSO INOMINADO. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET. DESINFORMAÇÃO. FATOS MANIFESTAMENTE INVERÍDICOS E DISCURSO DE ÓDIO. REMOÇÃO DAS PUBLICAÇÕES. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 57–D DA LEI 9.504/1997. POSSIBILIDADE. FIXAÇÃO EM PATAMAR MÁXIMO. ALCANCE DO CONTEÚDO VEICULADO. DESPROVIMENTO.

1. O art. 57–D da Lei 9.504/1997 não restringe, de forma expressa, qualquer interpretação no sentido de limitar sua incidência aos casos de anonimato, de forma que é possível ajustar a exegese à sua finalidade de preservar a higidez das informações divulgadas na propaganda eleitoral, ou seja, alcançando a tutela de manifestações abusivas por meio da internet – incluindo–se a disseminação de fake news tendentes a vulnerar a honra de candidato adversário – que, longe de se inserirem na livre manifestação de pensamento, constituem evidente transgressão à normalidade do processo eleitoral.

2. Descabe a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade para diminuir o valor da penalidade aplicada, uma vez que o critério utilizado para a sua fixação foi o substancial alcance do conteúdo veiculado, o que potencializou sobremaneira o efeito nocivo da propagação da fake news.

3. Recurso Inominado desprovido.

(TSE – Rp: 06017545020226000000 BRASÍLIA - DF 060175450, Relator: Min. Alexandre de Moraes, Data de Julgamento: 28/03/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 149) (grifo nosso)

Em resumo: a manifestação não vem coberta pelo exercício de direito de liberdade de expressão; utiliza um trágico evento para atribuir pechas pessoais caluniosas e difamatórias a candidato e, portanto, merece sancionamento - como irretocavelmente realizado pelo Juízo de Origem.

DIANTE O EXPOSTO, VOTO para negar provimento ao recurso.