REl - 0600045-58.2022.6.21.0076 - Voto Relator(a) - Sessão: 30/01/2025 00:00 a 23:59

VOTO

 

ADMISSIBILIDADE

O recurso é regular, tempestivo e comporta conhecimento.

 

MÉRITO

O MOVIMENTO DEMOCRÁTICO BRASILEIRO (MDB) do Município de Novo Hamburgo recorre da sentença proferida pelo Juízo da 076ª Zona Eleitoral que desaprovou a suas contas anuais, relativas ao exercício financeiro de 2021, com fulcro no art. 45, inc. III, als. “a” e “b”, da Resolução TSE n. 23.604/19, e determinou o recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 625,00, devidamente atualizado, acrescido de multa de 10% incidente sobre o valor a ser recolhido, bem como a suspensão do recebimento de novas quotas do Fundo Partidário pelo prazo de 4 meses.

Conforme parecer técnico conclusivo (ID 45593974), foram apontadas as seguintes irregularidades: 1) recebimento de recursos de fonte vedada no montante de R$ 125,00; 2) recebimento de recursos de origem não identificada, no montante de R$ 300,00; 3) doação registrada no “Demonstrativo de Doações Financeiras Recebidas” sem trânsito pela conta bancária do partido no valor de R$ 200,00; e 4) não comprovação das despesas pagas por meio de cheques expedidos em favor de agência lotérica.

Em relação às três primeiras falhas acima indicadas, cuja soma perfaz o montante de R$ 625,00, tenho que estão devidamente caracterizadas, não tendo os recorrentes apresentado nenhuma documentação ou argumento com o condão de afastá-las. Pelo contrário, asseveraram até mesmo que “o partido, através da atual gestão, irá recolher o montante ao Tesouro Nacional, eis que o total representa 1,39% do total de receitas do Partido em 2021, conforme consta no Parecer Conclusivo”.

Em verdade, o que os recorrentes pretendem é a alteração do julgamento de desaprovação das contas pelo juízo a quo para uma aprovação com ressalvas, sob o argumento de que jurisprudência assentada por esta Corte assim autoriza no caso de falhas em montante inferior a 10% da arrecadação, por aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.

Entretanto, além das irregularidades que ensejaram a determinação de recolhimento da quantia de R$ 625,00 contida na sentença, a prestação de contas apresenta outras falhas de maior vulto e que denotam gravidade.

Vejamos.

Trata-se da não comprovação de uma série de despesas, as quais foram pagas por meio de cheques bancários expedidos em favor da agência lotérica “A Papagaia Ltda.”. Através de consulta ao extrato eletrônico (ID 45593893), constata-se a existência de 116 (cento e dezesseis) lançamentos de débitos cuja contraparte é a referida agência lotérica.

Apesar de instada a apresentar os documentos fiscais relativos às indigitadas despesas, com o fito de possibilitar a análise da pertinência dos gastos, a agremiação quedou-se inerte.

Desta forma, a não apresentação da documentação solicitada pela unidade técnica evidentemente impossibilitou a fiscalização desta Especializada sobre os gastos partidários.

Destaca-se, ainda, que a grande maioria das despesas realizadas pelo partido não foram devidamente comprovadas, conforme trecho da sentença a seguir colacionado:

“Frisa-se ainda, que dos gastos partidários de 2021, somente as despesas bancárias no total de R$ 982,50 (novecentos e oitenta e dois reais e cinquenta centavos) tem destino comprovado, sendo que R$ 48.391,87 (quarenta e oito mil trezentos e noventa e um reais e oitenta e sete centavos) não foram comprovados, restando, assim, inconteste que houve prejuízo à fiscalização sobre as contas em questão.” Grifei

Nessa linha, o bem-lançado parecer da Procuradoria Regional Eleitoral:

“De fato, praticamente todos os débitos da conta bancária ocorreram em contrapartida ao desconto de cheques expedidos em favor de agência lotérica e a grei, apesar de contar com diversas chances, não se desincumbiu do ônus, estabelecido no art. 18 da Resolução TSE nº 23.604/2019, de provar a destinação das despesas via documento fiscal idôneo, situação que indica a falta de interesse em esclarecer ou justificar essa séria incorreção.

Tal conduta configura falha de natureza grave, que macula significativamente a regularidade das contas em apreço, porquanto impede por completo a fiscalização da Justiça Eleitoral a respeito de eventuais desvios na finalidade dos recursos, que devem ser utilizados exclusivamente para manutenção do partido e consecução de seus objetivos e programas.”

Contrapondo os demais argumentos apresentados pelos recorrentes, prossegue o órgão ministerial de forma acertada:

“As demais alegações, acerca da mudança de seus dirigentes, das falhas no SPCA, da inviabilidade da obtenção dos saldos inicial e final da conta bancária, assim como a insignificância do valor das demais irregularidades, não afastam e sequer dizem respeito ao ponto acima referido, sobre o qual, aliás, o partido não teceu qualquer consideração em suas razões finais (Id 45593987) ou recursais.”

De fato, tais alegações não guardam nenhuma pertinência em relação aos gastos não comprovados, falha em relação a qual os recorrentes simplesmente não se manifestaram.

Quanto a este tópico, cabe ressaltar que o Juízo a quo não determinou recolhimento de qualquer quantia ao Tesouro Nacional, bem como que só houve recurso por parte da agremiação, razões pelas quais, com fundamento no princípio da proibição da non reformatio in pejus, essa medida não poderá ser determinada de ofício neste momento processual. Nesse sentido, apresento o precedente:

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2020. VEREADOR. DESAPROVAÇÃO NA ORIGEM. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA. AFASTADA. IRREGULARIDADE: – Omissão de despesa, caracterizando o recebimento de recurso de origem não identificada. INOBSERVÂNCIA DA RESOLUÇÃO TSE Nº 23.607/2019. FALHA QUE COMPROMETE A REGULARIDADE DAS CONTAS. EVENTUAL DETERMINAÇÃO, DE OFÍCIO, DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL DA QUANTIA MENCIONADA CONFIGURARIA REFORMATIO IN PEJUS. INAPLICABILIDADE DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE, RAZOABILIDADE E INSIGNIFICÂNCIA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (TRE-SP - REl: 06008430320206260059 ITU - SP 060084303, Relator: Des. Marcio Kayatt, Data de Julgamento: 14/12/2022, Data de Publicação: DJE - DJE, Tomo 14) Grifei.

Assim, tendo em vista a gravidade das falhas, que não se resumem ao recebimento de recursos de fonte vedada (R$ 125,00), ao recebimento de recursos de origem não identificada (R$ 300,00) e a doação recebida sem trânsito pela conta bancária do partido (R$ 200,00), mas consubstanciam-se também na ausência de comprovação da quase totalidade dos gastos realizados pelo partido, impedindo a fiscalização da Justiça Eleitoral acerca de eventuais desvios na finalidade dos recursos, o desprovimento do recurso é medida que se impõe.

Nesses termos, e na linha de entendimento da douta Procuradoria Regional Eleitoral, deve ser mantida a sentença.

Diante do exposto, VOTO por negar provimento ao recurso.