REl - 0600042-78.2024.6.21.0094 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/09/2025 00:00 a 16/09/2025 23:59

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cuida-se de recurso interposto pelo Diretório Municipal do Movimento Democrático Brasileiro – MDB de Frederico Westphalen/RS, contra a sentença do Juízo da 094ª Zona Eleitoral de Frederico Westphalen, que julgou desaprovadas as contas referentes ao exercício de 2023, com base no art. 45, inc. III, al. “a”, da Resolução TSE n. 23.604/19, devido ao recebimento de recursos de fonte vedada (R$ 3.823,00) em razão do ingresso de doação proveniente de contribuições de pessoas físicas não filiadas ao partido político, que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração ou cargo ou emprego público no exercício de 2023. Imposta multa de 20% sobre o valor da irregularidade e suspensão do Fundo Partidário por 1 ano (ID 45960040).

O recorrente alega que os doadores Ricardo Giovenardi e Luiz Antônio Sepp (secretário municipal da saúde e subprefeito, respectivamente) preencheram as fichas de filiação do partido, tendo ocorrido apenas uma falha administrativa na inclusão de seus nomes no sistema FILIA, o que não deve prejudicar a validade da filiação nem caracterizar as doações como fonte vedada. Invoca, ainda, a Súmula 20 do TSE que admite a prova da filiação partidária por outros elementos de convicção, desde que não se trate de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública.

Sem razão.

Quanto à comprovação da filiação partidária por outros meios, refuto qualquer documentação produzida unilateralmente e acompanho a manifestação do Ministério Público no sentido de que “é necessária a apresentação de documentos e provas robustas”, nos exatos termos da Súmula n. 20 do TSE, verbis:

A prova de filiação partidária daquele cujo nome não constou da lista de filiados de que trata o art. 19 da Lei nº 9.096/1995, pode ser realizada por outros elementos de convicção, salvo quando se tratar de documentos produzidos unilateralmente, destituídos de fé pública.

 

Na hipótese, as fichas de filiação apresentadas com o recurso são documentos unilaterais, destituídos de fé pública, inservíveis para demonstrar o vínculo partidário.

Nesse sentido:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO 2020. DIRETÓRIO MUNICIPAL. PARTIDO POLÍTICO. DESAPROVAÇÃO. DOAÇÃO ORIUNDA DE FONTE VEDADA. SERVIDOR OCUPANTE DE CARGO COMISSIONADO SEM FILIAÇÃO A PARTIDO POLÍTICO. COMPROVAÇÃO DA FILIAÇÃO PARTIDÁRIA. INSUFICIÊNCIA. SÚMULA N. 20 DO TSE. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. DOAÇÕES REGISTRADAS COM O CNPJ DO PARTIDO. ALTO PERCENTUAL DAS IRREGULARIDADES. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. PROVIMENTO NEGADO.

1. Insurgência contra sentença que julgou desaprovadas as contas de diretório municipal de partido político, referentes ao exercício de 2020, com base no art. 45, inc. III, al. “b”, da Resolução TSE n. 23.604/19, devido ao recebimento de valores de fonte vedada e utilização de recursos de origem não identificada. Aplicação de multa e determinação de recolhimento de numerário ao Tesouro Nacional.

2. Fonte vedada. Ingresso de doação proveniente de contribuições de pessoas físicas não filiadas ao partido político, que exerceram função ou cargo público de livre nomeação e exoneração ou cargo ou emprego público temporário no exercício de 2020. A percepção, pelo partido político, de recursos oriundos de tais fontes, é expressamente vedada pelo art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95. Inexistência de prova objetiva da filiação dos contribuintes, somente possível mediante certificação no sistema FlLIA. Inviabilidade de prova por meio de documentação produzida unilateralmente, nos termos da Súmula n. 20 do TSE.

3. Recursos de origem não identificada. Recebimento de doações registradas com o CNPJ do próprio partido, quando o procedimento correto seria a transferência de recursos de uma conta bancária para outra. Inviável a alegação de “erro material” por parte dos contribuintes. Embora o partido tenha realizado a juntada de comprovantes, a falta de confiabilidade e de transparência sobre a procedência dos valores não restou afastada, pois o art. 8º, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.604/19 expressamente determina que as doações somente poderão ser realizadas mediante transação bancária na qual o CPF do doador ou do contribuinte seja obrigatoriamente identificado.

4. O desconhecimento da legislação eleitoral pelos contribuintes do partido político não exime este de sua responsabilidade sobre o controle e fiscalização de suas receitas financeiras, cabendo à agremiação partidária, em tais casos, nos termos do art. 14, caput, da Resolução TSE n. 23.604/19, providenciar o recolhimento dos valores de origem não identificada ao Tesouro Nacional, até o último dia útil do mês subsequente à efetivação do crédito, providência que não foi observada.

5. As irregularidades representam 14,64% das receitas declaradas, tornando imperativa a desaprovação das contas e o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional. Manutenção da sentença.

6. Provimento negado.

(REL 0600123-27, julgado em  04.12.2023, Relator; Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira) (grifo nosso)

 

Com efeito, a percepção, pelo partido político, de recursos oriundos de tais fontes, é expressamente vedada pelo art. 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95:

Art. 31. É vedado ao partido receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(…)

V - pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário, ressalvados os filiados a partido político. (Incluído pela Lei nº 13.488, de 2017).  (grifo nosso)

 

Como regra, o partido é proibido de receber, direta ou indiretamente, sob qualquer forma ou pretexto, contribuição ou auxílio pecuniário ou estimável em dinheiro, inclusive através de publicidade de qualquer espécie, procedente de pessoas físicas que exerçam função ou cargo público de livre nomeação e exoneração, ou cargo ou emprego público temporário.

Conforme mencionado, a parte final do inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95 estabelece uma exceção à vedação, e, justamente por se tratar de uma salvaguarda, deve ser interpretada restritivamente, no sentido de “quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação”.

A finalidade da ressalva é possibilitar ao partido o recebimento de contribuições ordinárias dos seus filiados a título de mensalidade, a fim de que a agremiação não se veja desfalcada dessa fonte de custeio pelo fato de o filiado ser alçado a função ou cargo público de livre exoneração ou demissão.

Desse modo, consoante o inc. V do art. 31 da Lei n. 9.096/95, somente é permitida a doação a partido político, por parte de pessoa que exerça função ou cargo público de livre exoneração ou demissão, ou cargo ou emprego público temporário, quando o doador for pessoa filiada ao partido político beneficiário da doação.

Diante da existência de recursos provenientes de fontes vedadas, impõe-se o recolhimento da quantia de R$ 3.823,00  ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 14, § 1º, da Resolução TSE n. 23.604/19.

De outro lado, constato que o valor apontado como falha no exame da contas (R$ 3.823,00) representa 1,89% do total de recursos recebidos (R$ 201.283,17) no exercício de 2023.

Por conseguinte, a irregularidade situa-se dentro dos parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade para formar juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade, qual seja, inferior a 10% da arrecadação financeira, e/ou abaixo de R$ 1.064,10.

Nesse sentido, em caso análogo, o seguinte julgado desta Corte:

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2021. PARTIDO POLÍTICO . DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE FONTE VEDADA. DOAÇÃO DE PESSOA JURÍDICA . IRREGULARIDADE INCONTROVERSA. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. FALHA DE BAIXO PERCENTUAL. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE . MULTA AFASTADA. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO PARCIAL.

 1 . Insurgência contra a sentença que julgou desaprovadas as contas de partido político, relativas ao exercício financeiro de 2021, em virtude de recebimento de recursos de fonte vedada. Determinada a suspensão do direito ao recebimento das quotas do Fundo Partidário por seis meses e o recolhimento ao Tesouro Nacional, acrescido de multa de 5% sobre o montante irregular.

 2. Recebimento de recurso de fonte vedada, na forma do art . 31, inc. V, da Lei n. 9.096/95 . Doação de pessoa jurídica. Irregularidade incontroversa. Determinação de recolhimento, com atualização monetária e com juros de mora, ao Tesouro Nacional, na forma do art. 14, caput, da Resolução TSE n . 23.604/19 e do art. 39, caput, inc. II, da Resolução TSE n . 23.709/22.

3. A irregularidade atende aos parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade para formar o juízo de aprovação com ressalvas da contabilidade (inferior a 10% da arrecadação financeira, valor abaixo de R$ 1 .064,10).

4. Esta colenda Corte, "ao interpretar os arts. 36 e 37, § 3º, da Lei dos Partidos Políticos, posicionou–se no sentido de que não se aplica a suspensão do repasse do Fundo Partidário quando houver aprovação com ressalvas de contas" (TRE – PC–PP n . 060020117, Relator Desembargador Eleitoral Afif Jorge Simoes Neto, Publicação: DJE, Tomo 150, em 17.08.2023; no mesmo sentido: TRE–RS – PCE n. 060019896, Relatora Desembargadora Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak . Publicação: DJE, Tomo 27, em 15.02.2023). Ainda, na aprovação das contas com ressalvas, deve ser afastada também a imposição de multa (nesse sentido: TRE/RS – PC–PP n . 060010417, Relator Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Publicação: DJE, Tomo 148, em 15.08.2023).

5 . Provimento parcial. Aprovação com ressalvas. Afastadas as penalidades de suspensão do Fundo Partidário e de multa. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - REl: 0600021-78.2022.6.21 .0060 ARROIO DO PADRE - RS 060002178, Relator.: Patricia Da Silveira Oliveira, Data de Julgamento: 19.03.2024, Data de Publicação: DJE-56, data 26.03.2024.) (grifos nossos)

 

Nesse diapasão, verificado que a irregularidade se situa dentro dos parâmetros fixados na jurisprudência desta Justiça Especializada de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, impõe-se, no caso, a aprovação das contas com ressalvas, não sendo, ainda, por essa razão, o caso de imposição de multa (nesse sentido: TRE/RS - PC-PP n. 060010417, Relator Desembargador Eleitoral Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Publicação: DJe, Tomo n. 148, em 15.8.2023).

Anoto, por cautela, que esta Corte, "ao interpretar os arts. 36 e 37, § 3º, da Lei dos Partidos Políticos, posicionou-se no sentido de que não se aplica a suspensão do repasse do Fundo Partidário quando houver aprovação com ressalvas de contas" (TRE-RS - PC-PP n. 060020117, Relator Desembargador Eleitoral Afif Jorge Simoes Neto, Publicação: DJe, 17.8.2023; e TRE-RS - PCE n. 060019896, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak. Publicação: DJe, 15.02.2023).

Ante o exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso, para reformar a sentença e APROVAR COM RESSALVAS as contas do Diretório Municipal do Movimento Democrático Brasileiro – MDB de Frederico Westphalen/RS, exercício de 2023, mantendo apenas o recolhimento do valor de R$ 3.823,00 ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.