REl - 0600311-74.2024.6.21.0076 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/09/2025 00:00 a 16/09/2025 23:59

VOTO

A sentença de desaprovação acolheu integralmente o parecer conclusivo, devido à existência de falhas não sanadas: a) aplicação irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) no valor de R$ 950,00, referentes à contratação de mão de obra sem comprovação adequada do preço e do período de prestação dos serviços, o que inviabilizou a aferição das horas efetivamente trabalhadas por Nicéia, Adriana e Luiz Augusto; e b) sobra de campanha não recolhida ao partido, no valor de R$ 157,14, relativa a créditos remanescentes de pagamento realizado ao Facebook com recursos próprios.

Embora a Procuradoria Regional Eleitoral compreenda que o valor de R$ 950,00 do FEFC está aquém do patamar definido pelo legislador como quantia módica (R$ 1.064,10), consagrado pela jurisprudência como justificador da aposição somente de ressalvas nas contas à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o montante total das irregularidades, na verdade, é superior.

Ao contrário do que entendeu o órgão ministerial, as duas falhas atingem o total de R$ 1.107,14, correspondente a 23,79% dos recursos movimentados na campanha (R$ 4.654,00), o que levou à desaprovação das contas com base no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19.

As razões recursais são insuficientes para a reforma da sentença, pois apenas se alega que o período de trabalho ou o detalhamento das horas prestadas configuraria mera impropriedade formal e que o valor absoluto das irregularidades apuradas (R$ 1.107,14) é módico, não há má-fé ou desvio de finalidade.

Contudo, é devida a desaprovação das contas por falta de observância dos requisitos exigidos pelo art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19: “As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.”

A sentença destacou que, mesmo após oportunizada a apresentação de documentos complementares, não foram juntados comprovantes hábeis a demonstrar a efetiva prestação dos serviços contratados com verbas públicas, o que comprometeu a transparência e a regularidade das contas.

De fato, o documento apresentado não atendeu integralmente ao disposto no § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Essas omissões são relevantes e não se trata de análise de má-fé, e sim de aferição objetiva da correta aplicação de recursos públicos, e as razões recursais não suprem o apontamento, pois a falta de elementos que corroborem a despesa impede a fiscalização e compromete a verificação da destinação dos recursos.

Nessas circunstâncias, a irregularidade justifica o recolhimento de recursos ao Tesouro Nacional, pois prejudicado o controle público e a efetividade da prestação de informações. A propósito, os seguintes precedentes:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO . VEREADOR. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. AFASTADA A IRREGULARIDADE. DESPESAS IRREGULARES COM VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA . REDUZIDO O MONTANTE A SER RECOLHIDO AO TESOURO NACIONAL. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas de candidato ao cargo de vereador e determinou o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional . 2. Recebimento de recursos de origem não identificada. Doação realizada por pessoa física inscrita no programa assistencial do governo federal. Ausente prova de ciência, por parte do candidato, de que o doador é beneficiário de programa assistencial . Inviável impor ao prestador de contas o ônus de devolução do valor ao erário, sob pena de presunção de culpa ou responsabilidade de cunho objetivo. Afastada a irregularidade e a ordem de recolhimento ao erário. 3. Despesas irregulares com verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha FEFC . O art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19 exige o detalhamento da contratação, com a identificação dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço acordado. No entanto, ao consultar os contratos, verifica-se que os documentos omitem os locais, as horas trabalhadas e a justificativa de preço. Ademais, a realização dos pagamentos não foi demonstrada por qualquer meio, fossem cheques nominais cruzados ou transferências bancárias com registro de contraparte, inexistindo prova da efetiva quitação. Mantido dever de recolhimento da quantia irregular. 4 . Parcial provimento. Mantida a desaprovação das contas. Reduzido o montante a ser recolhido ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - Acórdão: 060028951 HULHA NEGRA - RS, Relator.: Des . OYAMA ASSIS BRASIL DE MORAES, Data de Julgamento: 28/09/2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Data 30/09/2022)

 

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2022. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA NÃO ELEITA . DEPUTADA ESTADUAL. AUTOFINANCIAMENTO. OMISSÃO DE DESPESAS. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC . RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. I. CASO EM EXAME 1 .1. Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputada estadual nas Eleições Gerais de 2022, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha. 1.2 . A Secretaria de Auditoria Interna (SAI) apontou irregularidades na comprovação de gastos realizados com recursos públicos oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC). II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO (...) 3.4.1 . Nos termos do art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, os gastos eleitorais devem ser comprovados por documentos fiscais idôneos, contendo todas as informações necessárias, como descrição detalhada dos serviços e identificação completa dos contratados . 3.4.2. O art. 35, § 12, da mesma resolução exige que despesas com pessoal sejam detalhadas quanto às atividades desempenhadas, horas trabalhadas, locais de prestação de serviços e justificativas de preços, com o objetivo de permitir à Justiça Eleitoral aferir a regularidade do gasto. 3.4.3 . No caso, a candidata apresentou suas contas finais instruída tão somente com comprovantes de transferência bancária, os quais, isoladamente, não comprovam a regularidade dos gastos. Inexistência de documentos fiscais, hábeis a demonstrar as aquisições de material de campanha, nem contratos, para evidenciar a higidez das contratações de pessoas físicas para atividades de militância. Dever de recolhimento. 3 .5. O valor total das irregularidades representa 93,17% do montante arrecadado pela candidata, de maneira a inviabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade como meio de atenuar a gravidade das máculas sobre o conjunto contábil, sendo, portanto, mandatória a desaprovação das contas. IV. DISPOSITIVO E TESE 4 .1. Desaprovação. Determinado o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional. Tese de julgamento: “O alto percentual das irregularidades inviabiliza a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para aprovar a prestação de contas com ressalvas, ensejando sua desaprovação .” Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19, arts. 53, inc . I, al. g; 60; 74, inc. III; 79, § 1º; 32, inc. VI . Jurisprudência relevante citada: TSE, REspEl n. 060111308/SE, Rel. Min. Luís Roberto Barroso, decisão monocrática de 30 .08.2019, DJE 03.09.2019; TSE, Prestação de Contas n . 97795, Rel. Min. entity-person">Luís Roberto Barroso, DJE 16.12 .2019.

(TRE-RS - PCE: 06029991420226210000 PORTO ALEGRE - RS 060299914, Relator: Francisco Thomaz Telles, Data de Julgamento: 27/11/2024, Data de Publicação: DJE-340, data 04/12/2024)

 

Mantenho, portanto, o dever de recolhimento ao erário, por descumprimento do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, na forma do art. 79, § 1º, da mesma resolução.

Além disso, conforme consta da sentença, foram efetuados pagamentos ao Facebook no valor total de R$ 1.054,00, porém, foram juntadas aos autos notas fiscais no valor de R$ 896,86 para a comprovação da despesa, apresentando uma diferença de R$ 157,14, consistente em créditos não utilizados, caracterizando-se a sobra de campanha prevista no art. 50, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19.

E como para o último pagamento ao Facebook, no valor de R$ 500,00, efetuado em 1º.10.2024, o candidato utilizou receitas de "Outros Recursos", a sobra em questão deveria ter sido recolhida ao partido.

Conforme referido, as irregularidades de R$ 1.107,14 alcançam 23,79% do total arrecadado de  R$ 4.654,00, extrapolando os parâmetros da jurisprudência das Cortes Eleitorais para aplicação dos princípios de proporcionalidade e de razoabilidade para aprovar as contas com ressalvas: “Em prestação de contas cuja irregularidade envolver valores reduzidos, inferiores a R$ 1.064,10 ou a 10% da arrecadação, é admitida a aprovação com ressalvas, em observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade” (TRE-RS, REl n. 0600724-60.2024.6.21.0085, Relator Desembargador Eleitoral Nilton Tavares da Silva, DJe, 13.02.2025).

Portanto, o recurso merece ser desprovido.

Em face do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.