REl - 0600591-83.2024.6.21.0031 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/09/2025 00:00 a 16/09/2025 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo. A intimação da sentença ocorreu no DJe em 09.12.2024, e a interposição recursal deu-se na data de 12.12.2024.

Outrossim, encontram-se presentes os demais requisitos hábeis à tramitação do recurso.

Dessarte, conheço do recurso e passo a seu exame de mérito.

 

MÉRITO

Porquanto relatado, o recorrente insurge-se contra sentença que, acompanhando parecer conclusivo, desaprovou suas contas em razão da existência de gasto irregular com pessoal, por contrariedade com o disposto no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Sabe-se, no concernente aos gastos com pessoal, que a comprovação das despesas deve ser realizada por meio de documentação que atenda a requisitos específicos definidos no art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, in verbis:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 26):

§ 12. As despesas com pessoal devem ser detalhadas com a identificação integral das pessoas prestadoras de serviço, dos locais de trabalho, das horas trabalhadas, da especificação das atividades executadas e da justificativa do preço contratado.

Ainda, o art. 60, da Resolução TSE n. 23.607/19 prevê que a comprovação dos gastos eleitorais deve ser realizada por meio de documento fiscal idôneo, contendo a descrição detalhada, podendo ser realizada por meio de recibo nos casos em que a legislação dispense a emissão de documento fiscal, facultado à Justiça Eleitoral exigir a apresentação de elementos probatórios adicionais que comprovem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços:

Art. 60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

§ 1º Além do documento fiscal idôneo, a que se refere o caput, a Justiça Eleitoral poderá admitir, para fins de comprovação de gastos, qualquer meio idôneo de prova, inclusive outros documentos, tais como:

I – contrato;

II – comprovante de entrega de material ou da prestação efetiva do serviço;

III – comprovante bancário de pagamento; ou

IV – Guia de Recolhimento do FGTS, informações do Sistema de Escrituração Digital de Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas (eSocial), da Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais Previdenciários e de Outras Entidades e Fundos (DCTFWeb) e da Escrituração Fiscal Digital de Retenções e Outras Informações Fiscais (EFD-Reinf). (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

§ 2º Quando dispensada a emissão de documento fiscal, na forma da legislação aplicável, a comprovação da despesa pode ser realizada por meio de recibo que contenha a data de emissão, a descrição e o valor da operação ou prestação, a identificação da destinatária ou do destinatário e da(o) emitente pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ, endereço e assinatura da prestadora ou do prestador de serviços.

§ 3º Havendo dúvida sobre a idoneidade do documento ou sobre a execução do objeto, a Justiça Eleitoral poderá exigir a apresentação de elementos probatórios adicionais que comprovem a entrega dos produtos contratados ou a efetiva prestação dos serviços declarados. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024)

Passa-se à análise das falhas reconhecidas em sentença.

Vejam-se os termos do contrato celebrado com os prestadores de serviço de militância, tomando-se como exemplo aquele firmado com Claudia Seigert, visto que todos possuem cláusulas idênticas quanto ao objeto:

Texto, CartaO conteúdo gerado por IA pode estar incorreto.

A sentença, após análise do cartório eleitoral e manifestação do prestador de contas, concluiu que os contratos firmados com Claudia Siegert, Marcela Barbosa dos Santos, Clodomir Behrens de Lima e Jorge Ione Farias apresentaram irregularidades com relação: (i) à não apresentação de recibo de pagamento; (ii)às horas trabalhadas não informadas; e (iii) à justificativa do preço pago não informado.

Inicialmente, quanto ao pagamento, nota-se que foi demonstrado por comprovante juntado aos autos em relação a cada um dos prestadores de serviço, a saber: (i) Claudia Siegert - ID 45856269; (ii) Marcela Barbosa dos Santos – ID 45856238; (iii) Clodomir Behrens de Lima – ID 45856237; (iv) Jorge Ione Farias - ID 45856234 e 45856239; e (iv).

Portanto, afasto a irregularidade quanto ao ponto.

Especificadamente em relação ao elemento horas trabalhadas, exigido pela legislação de regência, ainda que não haja registro individualizado das horas diárias, a fixação de período de 7 horas diárias como base e a previsão de compensação para horas extras são suficientes para afastar qualquer irregularidade quanto à jornada de trabalho.

Também tenho por afastar a mácula apontada, nesse particular.

Por fim, com relação à ausência de justificativa do valor pago a cada prestador de serviço, observa-se discrepância entre os valores pagos para a realização de atividades contratadas idênticas (serviços de militância em geral – tais quais entrega de santinho, adesivos e demais materiais de campanha em casas e ruas, participação em eventos de campanha e outras atividades relacionadas no Município de Montenegro/RS). Conforme os períodos contratados e os valores pagos, podemos extrair: o seguinte quadro:

Prestador

Vigência Contrato

Valor total

Valor/dia

Claudia Siegert

01/10/2024 a 05/10/2024

R$ 425,00

R$ 85,00

Marcela Barbosa dos Santos

23/09/2024 a 05/10/2024

R$ 500,00

R$ 38,46

Jorge Ione Farias

16/09/2024 a 05/10/2024

R$ 1.000,00

R$ 50,00

Clodomir Behrens de Lima

 

23/09/2024 a 05/10/2024

R$ 400,00

R$ 30,76

Dado tal contexto, ressalto que os serviços de mobilização de rua e militância política não possuem tabela específica de preços, além de serem prestados por profissionais liberais, com a prerrogativa de precificarem previamente sua força de trabalho de acordo com os valores praticados na localidade e do transcurso da proximidade da data do pleito, permitindo, portanto, pequenas variações no valor pago individualmente para serviços de militância, a não ensejar, necessariamente, irregularidade no contrato.

Não se pode olvidar, ainda, que o contrato é um acordo de vontades entre as partes, que podem, se houver concordância de ambos e nos limites da legislação específica, transigir sobre as regras que compõem a relação. A se desconsiderar isso, portanto, no caso concreto, não vislumbro irregularidade patente que evidencie burla à legislação ou má-fé na remuneração pactuada, frente às atividades desenvolvidas pelos contratados.

Importante registrar, ainda, que, pela inteligência do § 1º do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19, para a devolução de valores ao erário, exige-se a ausência de comprovação da utilização dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha ou de sua utilização indevida e, no caso dos autos, ocorreu o devido trânsito dos valores supracitados pela conta bancária específica de campanha, configurando o lastro probatório da destinação do recurso público, além de não haver indícios ou provas de malversação dessa verba.

Tal entendimento encontra guarida em precedentes de outros Tribunais Regionais Eleitorais, dos quais destaco recente julgado oriundo do TRE-MG, a título de exemplo:

RECURSO ELEITORAL. DIREITO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. ELEIÇÕES 2024. VEREADOR. CONTAS DESAPROVADAS. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES AO TESOURO NACIONAL. DADO PROVIMENTO AO RECURSO. CONTAS APROVADAS SEM RECOLHIMENTOS. I. CASO EM EXAME Trata–se de Recurso Eleitoral interposto em face da decisão proferida pelo Juízo da 10ª Zona Eleitoral de Alpinópolis/MG, que julgou desaprovadas as contas prestadas pela candidata e determinou o recolhimento do valor de R$1.200,00 (um mil e duzentos reais), nos termos dos artigos 21, § 4º, e 32, caput, da Resolução TSE nº 23 .607/2019. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO A controvérsia tratada nos autos cinge–se a perquirir se deve ser reformada a sentença que julgou desaprovadas as contas da recorrente, em razão da irregularidade detectada. III. RAZÕES DE DECIDIR Da juntada de documentos com o recurso eleitoral Conforme assentado na Jurisprudência desta Corte, é possível o conhecimento de documentos juntados com o recurso, desde que não demandem análise técnica especializada. No caso, os documentos juntados com o recurso eleitoral de IDs 72628342 a 72628350 não demandam análise técnica e são de fácil compreensão e análise. Sendo assim, conheço dos documentos de IDs 72628342 a 72628350. Mérito Irregularidade na prestação de contas Falta de comprovação de justificativa do preço contratado para serviços de militância. Os serviços de militância política não possuem tabela específica de preços, além de serem prestados por profissionais liberais, com a prerrogativa de precificarem sua força de trabalho, de acordo com os valores praticados no mercado. Não há irregularidade na diferença de valores contratuais. Assim, a irregularidade encontra–se sanada, não havendo valor a ser devolvido ao Tesouro Nacional. IV. DISPOSITIVO RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO, para aprovar as contas, decotando–se a obrigação de recolhimento de R$1.200,00 (um mil e duzentos reais) ao Tesouro Nacional. 
(TRE-MG - REl: 06004955620246130010 ALPINÓPOLIS - MG 060049556, Relator.: Des. Antonio Leite De Padua, Data de Julgamento: 27.08.2025, Data de Publicação: DJE 159, data 02.09.2025.) Grifei.

Pelas razões expostas, concluo que a irregularidade se encontra saneada, não havendo valor a ser devolvido ao Tesouro Nacional.

Diante do exposto, VOTO para DAR PROVIMENTO ao recurso interposto por NERI DE MELLO PENA, ao efeito de aprovar as contas relativas às Eleições Municipais de 2024 e afastar a ordem de recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos da fundamentação.