REl - 0600362-45.2024.6.21.0154 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/09/2025 00:00 a 16/09/2025 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso mostra-se tempestivo, visto que a intimação da sentença recorrida foi publicada no DJE em 12.02.2025 e o recurso fora interposto em 17.02.2025.

Mostrando-se adequado e preenchidos os demais pressupostos recursais, conheço do apelo e passo a analisar o mérito do recurso.

 

PRELIMINAR

Antes de adentrar no mérito do recurso, deve-se considerar a admissão dos documentos apresentados após a interposição do recurso eleitoral. Nesse ponto, consigno que, no âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal Regional Eleitoral tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, quando sua simples leitura, primo ictu oculi, possa sanar irregularidades e não haja necessidade de nova análise técnica.

In casu, tem-se por privilegiar o direito de defesa, de forma a prestigiar o julgamento pela retidão no gerenciamento dos recursos empregados no financiamento da campanha, como denota-se das ementas oriundas deste TRE-RS, colacionadas a título exemplificativo:

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. CONHECIDOS OS DOCUMENTOS JUNTADOS NA FASE RECURSAL. DOAÇÃO ESTIMÁVEL DE SERVIÇOS CONTÁBEIS. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE QUITAÇÃO. DIVERGÊNCIA DE VALORES ENVOLVENDO TARIFAS BANCÁRIAS. MERAS IMPROPRIEDADES. REFORMA DA SENTENÇA. AFASTADA A MULTA E A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou prestação de contas de diretório municipal de partido político, referente ao exercício financeiro de 2020, em razão do recebimento de recursos de origem não identificada. Determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, acrescido de multa. 2. Conhecidos os documentos juntados na fase recursal. No âmbito dos processos de prestação de contas de campanha, este Tribunal tem concluído, em casos excepcionais, com respaldo no art. 266, caput, do Código Eleitoral, pela aceitação de novos documentos, acostados com a peça recursal e não submetidos a exame do primeiro grau de jurisdição, ainda que o interessado tenha sido intimado para se manifestar, quando sua simples leitura, ictu primo oculi, pode sanar irregularidades e não há necessidade de nova análise técnica. Na hipótese, juntadas fotografias de cheques, de simples constatação e com aptidão para, em tese, conduzirem ao saneamento das irregularidades. 3. Ausência de comprovação de quitação de despesa. Apresentação de recibo de pagamento para comprovação de doação estimável de serviços contábeis, em desacordo com o prescrito pelo art. 9º da Resolução TSE n. 23.604/19. Entretanto, sendo inequívoco que o serviço doado se origina da atividade laboral da própria doadora e que o valor arbitrado não destoa de outros praticados para trabalhos semelhantes no município de origem, a falha é meramente formal, pois não prejudica a fiscalização sobre os contornos essenciais da doação estimável em questão, sendo suficiente a aposição de ressalvas. Inexistência de fundamento legal para a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional da doação estimável de serviço, fruto do trabalho da doadora, declarada em valor razoável relativamente aos parâmetros do mercado local e não envolvendo recursos públicos ou de origem não identificada. 4. Divergência detectada entre o valor registrado como despesas com tarifas bancárias e o valor realmente apurado em análise. Reduzido montante da falha. Mera impropriedade, ensejadora de ressalvas às contas. 5. Reforma da sentença. As falhas identificadas constituem meras impropriedades, pois, alcançando montante módico, não impediram o exame técnico das contas e não resultam em dano ao erário, possibilitando a aprovação com ressalvas da contabilidade, na esteira de julgados desta Corte e do TSE (TRE–RS – PC 060028875, Relator.: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, Data de Julgamento: 15/06/2020, DJE de 23/06/2020). 6. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a multa e a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional. (TRE-RS - REl: 06000458320216210079 MANOEL VIANA - RS, Relator: Des. CAETANO CUERVO LO PUMO, Data de Julgamento: 31/10/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 202, Data 07/11/2023) Grifei.

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. JUNTADA DE DOCUMENTAÇÃO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. DOCUMENTAÇÃO SIMPLES. DESNECESSIDADE DE NOVA ANÁLISE TÉCNICA. MÉRITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. JUNTADA DE NOTA FISCAL IDÔNEA. DESPESA DEMONSTRADA. AFASTADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PARCIAL PROVIMENTO. 1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas anuais do partido, exercício 2020, em razão de ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional e aplicada multa de 5% do valor irregular. 2. Conhecidos os documentos juntados com o recurso. Conforme pacífica jurisprudência desta Corte, a apresentação de novos documentos com o recurso, sobretudo na classe processual das prestações de contas, não apresenta prejuízo à tramitação do processo quando se trata de documentos simples, capazes de esclarecer, primo ictu oculi, as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. O posicionamento visa, sobretudo, salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha e a celeridade processual e afastar excessivo formalismo. 3. Ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. A nota fiscal indicada é documento idôneo a demonstrar a despesa - a diferença é de ordem insignificante, um centavo, e foi emitida pela mesma empresa cujo pagamento parcial foi acolhido pela sentença. Existência apenas de falhas formais e de comprovações extemporâneas, de forma que as contas devem ser aprovadas com ressalvas. 4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional. (TRE-RS - REl: 06000861020216210060 PELOTAS - RS, Relator: Des. Afif Jorge Simoes Neto, Data de Julgamento: 20/07/2023, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 135, Data: 26/07/2023.) [Grifei]

Por essas razões, conheço dos documentos acostados no ID 45910023 e seguintes, consistentes em sete notas fiscais emitidas por C. Miguel P. Barreto, acompanhadas dos respectivos comprovantes de pagamento, de simples constatação e com aptidão para, em tese, conduzirem ao saneamento, ao menos em parte, das irregularidades apontadas.

Saliento, ainda, que a nota explicativa que acompanhou o presente recurso (ID 45910022) já havia sido juntada aos autos quando da apresentação das contas finais (ID 45909986), motivo pelo qual vai conhecida, igualmente.

 

MÉRITO

A questão central do presente recurso reside na análise da omissão das dimensões do material gráfico no documento fiscal que comprova a despesa eleitoral, a fim de definir se tal falha caracteriza mera irregularidade formal e com isso torna as contas passíveis de aprovação com ressalvas ou se, ao contrário, constitui vício insanável que justifica a desaprovação das contas.

O pleito recursal, portanto, não questiona a materialidade do gasto ou sua compatibilidade com a legislação eleitoral, mas busca exclusivamente a reforma da conclusão de mérito para substituir o juízo de desaprovação pelo de aprovação da prestação de contas.

Pois bem.

A sentença recorrida decidiu a questão nos seguintes termos, a saber:

Cuida-se de apreciar as contas de campanha eleitoral oferecidas por ELIANE DE MELO FAUSTINO, relativas às Eleições Municipais de 2024.

A Unidade Técnica, por ocasião da emissão do parecer conclusivo, ID 126868987, considerou que as notas fiscais de ID 125234394, 125234395, 125234396, 125234397, 125234398, 125234399 e 125234400 não são aptas a comprovar a utilização de recursos públicos em campanha, uma vez que não trazem todas as informações essenciais dispostas no art. 60 da Resolução TSE 23607/2019, que segue:

Art.60. A comprovação dos gastos eleitorais deve ser feita por meio de documento fiscal idôneo emitido em nome das candidatas ou dos candidatos e partidos políticos, sem emendas ou rasuras, devendo conter a data de emissão, a descrição detalhada, o valor da operação e a identificação da (o) emitente e da destinatária ou do destinatário ou das(os) contraentes pelo nome ou razão social, CPF ou CNPJ e endereço.

(...)

§ 8º A comprovação dos gastos eleitorais com material de campanha impresso deve indicar no corpo do documento fiscal as dimensões do material produzido. 

(grifei)

Mesmo com a juntada da Nota Explicativa ID 125234404, os documentos fiscais ainda carecem de dados necessários à sua aceitação como documento comprobatório, de acordo com o artigo supracitado, devendo o gasto total, no valor de R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais), ser considerado irregular e devolvido aos cofres públicos.

As consequências para a não comprovação da utilização dos recursos do FEFC estão previstas no § 1º, do art. 79 da Resolução TSE 23607/2019, que segue:

Art. 79. A aprovação com ressalvas da prestação de contas não obsta que seja determinada a devolução dos recursos recebidos de fonte vedada ou a sua transferência para a conta única do Tesouro Nacional, assim como dos recursos de origem não identificada, na forma prevista nos arts. 31 e 32 desta Resolução.

§ 1º Ausente a comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário (FP) e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou comprovada a utilização indevida, a execução da decisão que julgar as contas, após o seu trânsito em julgado, determinará a devolução do valor correspondente na forma estabelecida pela Resolução TSE n. 23.709/22. (Redação dada pela Resolução nº 23.731/2024). 

Pois bem.

Compulsando-se os autos, entendo que seguir a opinião dos pareceres da Unidade Técnica e do MPE é o que se impõe, no sentido de desaprovação das contas e recolhimento do valor irregular ao Tesouro Nacional, visto que a prestadora de contas realmente deixou de apresentar informações obrigatórias, mesmo que intimada regularmente, e não logrou êxito em comprovar a regularidade da totalidade do uso dos recursos públicos recebidos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, gerando uma inconsistência no valor de  R$ 2.200,00 (dois mil e duzentos reais), situação grave e em desacordo com o artigo 64, §5°, da Resolução TSE n. 23.607/19.

A sentença bem decidiu a questão, já adianto, e não merece qualquer reparo.

As notas fiscais em questão (todas emitidas em 23.09.2024 pelo fornecedor C. Miguel P. Barreto: nota fiscal nº 8, no valor de R$ 200,00 (ID 45909976); Nota fiscal nº 9, no valor de R$ 200,00 (ID 45909977); Nota fiscal nº 10 R$ 200,00 (ID 45909978); Nota fiscal nº 11 R$ 50,00 (ID 45909979); Nota fiscal nº 12 R$ 550,00 (ID 45909980); Nota fiscal nº 14 R$ 500,00 (ID 45909981) e Nota fiscal nº 15 R$ 500,00 (ID 45909982)) indicam apenas de forma genérica os serviços prestados, com a expressão "material de campanha", não sendo possível identificar os serviços efetivamente contratados e executados, em desacordo com o disposto no art. 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Ainda, em que pese a recorrente ter apresentado declaração pelo fornecedor (ID 45910022), o documento não especifica as dimensões do material produzido, mesmo se tratando de material padronizado (“santinhos”), tampouco trata-se de carta de correção ao documento fiscal, sendo tal declaração mera manifestação unilateral, meio imprestável para regularizar a ausência de informações exigidas nas referidas notas fiscais, como prescrito na legislação.

Em resumo, os documentos fiscais juntados aos autos não apresentam a descrição detalhada do serviço, tampouco a especificação das dimensões dos materiais impressos, conforme exigido pelo art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, o que é falha grave e que não pode ser formal, visto que impactou no controle da movimentação financeira de campanha e na transparência da contabilidade da candidata.

Desse modo, impõe-se a manutenção da sentença que reconheceu a irregularidade e determinou o recolhimento da quantia correspondente ao Tesouro Nacional.

Destaca-se, ainda, que a perquirição quanto a boa-fé da recorrente não tem lugar no presente feito. Isso porque a prestação de contas é analisada objetivamente, e, no caso dos autos, não se trata de averiguar a intenção do candidato, mas manifesto e injustificável descumprimento de norma eleitoral objetiva, aplicável a todos os candidatos.

Assevero, ainda, a impossibilidade de adoção de juízo consistente em prestigiar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade no presente recurso, uma vez que a recorrente extrapolou de longe os limites tolerados pela jurisprudência para considerar passível a aprovação de contas com ressalvas, em virtude de quantias apontadas como irregulares, maiores que R$ 1.064,10, pois o somatório de sua impropriedade financeira atinge o montante de R$ 2.200,00, e correspondendo a 55% do total de recursos manejados em campanha.

Isso posto, considerando que a recorrente não conseguiu afastar a irregularidade apontada na sentença recorrida, impõe-se a manutenção do pronunciamento judicial de Primeira Instância que desaprovou suas contas e determinou o recolhimento do valor de R$ 2.200,00 ao Tesouro Nacional.

Ante o exposto, VOTO por NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto por ELIANE DE MELO FAUSTINO, nos termos da fundamentação.