REl - 0600359-48.2024.6.21.0071 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/09/2025 00:00 a 16/09/2025 23:59

VOTO

O recurso é tempestivo e tem presentes os demais pressupostos de admissibilidade, de forma que merece conhecimento.

Preliminar de ofício. Documentos juntados pouco antes da sentença.

Inicialmente, destaco que o recorrente ingressou documentos ao processo no primeiro grau de jurisdição após o parecer conclusivo, em momento anterior à sentença - rigorosamente no mesmo dia. A documentação não fora examinada tecnicamente ou considerada na sentença. Sequer o recebimento - ou não recebimento - aos autos, dos documentos, fora objeto de análise.

A situação é excepcional, portanto. Resta consabido que a irresignação transfere ao grau recursal a análise da questão, em razão do efeito devolutivo; sob outro aspecto, este Tribunal, na classe processual sob exame, aceita a juntada de documentos até mesmo em fase recursal, desde que sejam documentos simples, capazes de esclarecer as irregularidades apontadas sem a necessidade de diligências complementares. A medida visa, sobretudo, salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha e a celeridade processual, conforme precedentes deste Regional.

De todo modo, como adiante se verá, antecipo que julgo desnecessário o exame dos referidos documentos.

Mérito. 

No mérito, RONALDO ANTONIO MICHELOTTI recorre da sentença que desaprovou suas contas de candidato a vereador de Gravataí, nas Eleições 2024, e determinou o recolhimento de R$ 12.950,90 (doze mil, novecentos e cinquenta reais e noventa centavos) ao Tesouro Nacional.

A sentença apontou irregularidades relativas à (i) omissão de notas fiscais concernentes à impulsionamento; (ii) ao excesso de autofinanciamento, e (iii) à ausência de comprovação de gastos eleitorais.

O recorrente se insurgiu apenas quanto ao terceiro ponto, conforme segue:

Contudo o presente recurso busca esclarecer os apontamentos do parecer técnico e a reforma da sentença para aprovação com ressalvas, uma vez que, mesmo que a petiçao tenha sido realizada de forma intempestiva, apos o parecer técnico, mas antes da senteça ser proferida, e conforme se verifica em anexo a petiçao encontra-se todos os documentos objeto de apontamento que gerou a irregulariedade. 03. Logo antes de julgado o processo o recorrente anexou os documentos que comprovam as despesas, bem como contratos, recibos, notas fiscais e extrato bancário, sanando os apontamentos realizados no parecer técnico do item 3.1, devendo portanto ser dado provimento ao recurso para que neste item específico seja reformada a sentença, seja declarado regular o item apontado, na sua totalidade de R$ 8.050,00. 04. Os documentos apresentados extemporaneamente em processo de prestaçao de contas após o parecer técnico, embora inócuo para neutralizar o impacto na regulariedade das contas decorrentes das falhas constatadas, devem ser consideradas para fins de ajuste no montante a ser devolvido ao Erário, na medida em que ostentem aptidao para comprovar a regularidade substancial das despesas glosadas, com a provaçao das contas com ressalvas e ajustar o montante a ser devolvido ao Tesouro Nacional, evitando o enriquecimento ilícito da uniao.

O candidato abriu as contas específicas para recebimento de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC e Fundo Partidário, além da conta Outros Recursos, e registro que não recebeu qualquer tipo de verba pública -  contudo, operou em equívoco ao depositar recursos privados na Conta n. 354112, da agência n. 4337, do Banco do Brasil, nominada Fundo Especial de Financiamento de Campanha - a qual deveria ter como objeto somente valores, obviamente, do FEFC.

Tais recursos consistem, na realidade, em verbas de autofinanciamento, total de R$ 11.449,00, e R$ 375,00 oriundos de doação de LUIS FERNANDO HRYMALAK PINTO por meio de transferência interbancária (isto é, origem identificada).

De tais recursos é que foram pagas despesas sobre as quais não teria havido comprovação, a ensejar uma ordem de recolhimento no valor de R$ 8.050,00.

Ademais, há determinação para recolher valores devido a irregularidades atinentes à ausência de notas de impulsionamento, R$ 158,19, e R$ 4.742,71, por excesso de autofinanciamento. Friso que, em relação a essas, não há irresignação recursal.

À análise.

A Resolução TSE n. 23.607/19 prevê a obrigatoriedade de recolher valores nas seguintes hipóteses: (i) excesso de autofinanciamento; (ii) sobras de verbas do FEFC; (iii) repasse irregular de recursos do FEFC; (iv) repasse irregular de recursos do Fundo Partidário; (v) recebimento de recursos de origem não identificada; (vi) recebimento de recursos de fonte vedada; e (vii) sobras de campanha, nos termos dos dispositivos seguintes:

 Art. 6º Gastar recursos além dos limites estabelecidos sujeita as(os) responsáveis ao pagamento de multa no valor equivalente a 100% (cem por cento) da quantia que exceder o limite estabelecido, a qual deverá ser recolhida no prazo de cinco dias úteis contados da intimação da decisão judicial, podendo as(os) responsáveis responderem, ainda, por abuso do poder econômico, na forma do art. 22 da Lei Complementar nº 64/1990 , sem prejuízo de outras sanções cabíveis (Lei nº 9.504/1997, art. 18-B) .

Art. 17

§ 3º Os recursos provenientes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) que não forem utilizados nas campanhas eleitorais deverão ser devolvidos ao Tesouro Nacional, integralmente, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU), no momento da apresentação da respectiva prestação de contas.

§ 9º Na hipótese de repasse de recursos do FEFC em desacordo com as regras dispostas neste artigo, configura-se a aplicação irregular dos recursos, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidata ou candidato que realizou o repasse tido por irregular, respondendo solidariamente pela devolução a pessoa recebedora, na medida dos recursos que houver utilizado.

Art. 19

§ 9º Na hipótese de repasse de recursos do Fundo Partidário em desacordo com as regras dispostas neste artigo, configura-se a aplicação irregular dos recursos, devendo o valor repassado irregularmente ser recolhido ao Tesouro Nacional pelo órgão ou candidata ou candidato que realizou o repasse tido por irregular, respondendo solidariamente pela devolução a pessoa recebedora, na medida dos recursos que houver utilizado.

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatas ou candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

Art. 31. É vedado a partido político e a candidata ou candidato receber, direta ou indiretamente, doação em dinheiro ou estimável em dinheiro, inclusive por meio de publicidade de qualquer espécie, procedente de:

(...)

§ 4º Na impossibilidade de devolução dos recursos à pessoa doadora, a prestadora ou o prestador de contas deve providenciar imediatamente a transferência dos recursos recebidos ao Tesouro Nacional, por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

Art. 50

§ 1º As sobras de campanhas eleitorais devem ser transferidas ao órgão partidário, na circunscrição do pleito, conforme a origem dos recursos e a filiação partidária da candidata ou do candidato, até a data prevista para a apresentação das contas à Justiça Eleitoral.

Ou seja, a ausência de comprovação de gastos com recursos privados, desde que não constituam fonte vedada ou origem não identificada, não podem ensejar ordem de recolhimento, como determinado pelo Juízo sentenciante, de modo que julgo por afastar a ordem de recolhimento do valor de R$ 8.050,00, relativos a irregularidades na comprovação de gastos com recursos próprios.

CONCLUSÃO

As irregularidades remanescentes somam a importância de R$ 4.900,00, equivalente a 42,79% do total de recursos recebidos (R$ 11,449,00), constituem percentual alto e valor nominal superior ao patamar considerado módico (R$ 1.064,10), conforme a jurisprudência. Torna-se inadmissível, portanto, a aplicação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, para a construção de um juízo de aprovação com ressalvas.

Diante do exposto, VOTO para dar parcial provimento ao recurso, manter a desaprovação das contas e reduzir a ordem de recolhimento, ao Tesouro Nacional, ao valor de R$ 4.900,00.