REl - 0600520-58.2024.6.21.0071 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/09/2025 00:00 a 16/09/2025 23:59

VOTO

1. Admissibilidade.

O recurso é tempestivo e, presentes os demais pressupostos de admissibilidade, merece conhecimento.

2. Documentos juntados ao recurso.

O recorrente acostou documentação em fase recursal.

Conforme pacífica jurisprudência deste Tribunal, a apresentação de novos documentos com o recurso, sobretudo na classe processual das prestações de contas, não apresenta prejuízo à tramitação do processo quando se trata de documentos simples capazes de esclarecer, primo ictu oculi, as irregularidades apontadas sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. O posicionamento visa, sobretudo, salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha, buscar celeridade processual e afastar excessivo formalismo. Assim, entendo possível a juntada dos novos documentos com o recurso.

3. Mérito.

No mérito, FABIANA DE LOURDES PEREIRA DOS SANTOS recorre contra a sentença que aprovou com ressalvas a prestação de contas referente ao cargo de vereadora no Município de Gravataí. A decisão hostilizada determinou o recolhimento de R$ 349,00 (trezentos e quarenta e nove reais) ao erário.

Duas são as irregularidades apontadas na sentença, as quais passo a examinar.

3.1. Recebimento de doação irregular.

Foi identificada a informação de recebimento de doação estimada em dinheiro, oriunda do Diretório Municipal do PRTB de Gravataí, na quantia de R$ 110,00 (cento e dez reais), sobre a qual a sentença afirmou não haver a declaração correspondente nas contas da agremiação.

No entanto, verifico que o processo n. 0600506-74.2024.6.21.0071, Prestação de Contas do PARTIDO RENOVADOR TRABALHISTA BRASILEIRO de Gravataí, apresenta nota explicativa no ID 127072118, na qual discrimina os candidatos beneficiários de doação da grei; entre eles, a prestadora deste feito, com doação estimada no valor de R$ 110,00. As referidas contas foram julgadas aprovadas, atribuindo regularidade a doação em questão.

Afasto a irregularidade.

3.2. Omissão de despesa.

Foi identificada, por meio das informações constantes da base de dados da Justiça Eleitoral (circularização e/ou informações voluntárias de campanha e/ou confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais), a omissão relativa à despesa verificada na Nota Fiscal n. 57013536, emitida por MARCIO OLIVEIRA, no valor de R$ 239,00.

A recorrente, em equívoco, afirma que a sentença teria considerado omissão de despesa no valor de R$ 349,00, cuja nota fiscal apresentada restou ilegível. Esclareço que a despesa relativa à Nota Fiscal nº 57013536, apontada como não informada, detém o valor de R$ R$ 239,00, como referido.

Ao exame.

A prestadora junta, ao recurso, a Nota Fiscal n. 57758483 (ID 45974267), no valor de R$ 1.855,00, emitida por MARCIO OLIVEIRA, contra o CNPJ do PARTIDO RENOVADOR TRABALHISTA BRASILEIRO GRAVATAI, e diz em nota explicativa (ID 45974268), in verbis:

 A empresa NOVA IMPRESSÃO COMUNICADO VISUAL CNPJ: 40.840.222/0001-37 foi contratada para a confecção de camiseta e bandeiras por equívoco emitiu a Nota fiscal no CNPJ da candidata, mas o correto era para ser emitido a Nota Fiscal no CNPJ do partido municipal. Ao ser identificado o erro a empresa NOVA IMPRESSÃO COMUNICADO VISUAL a empresa substituiu a nota e emitiu a Nota Fiscal correta para o partido, sendo que o pagamento na Conta 0808 Agência: 602596805 foi efetuado por Partido a conforme comprovado e documentos anexados (...)

(Grifei.)

Destaco a disparidade dos valores constituintes das notas omitida (R$ 239,00) e alegadamente substitutiva (R$ 1.855,00), e sublinho que, em caso de nota fiscal indevidamente emitida, exige-se a prova de cancelamento, a teor do § 6º do art. 92 da Resolução TSE n. 23.607/19:

Na situação de eventual cancelamento de notas fiscais eletrônicas após sua regular informação como válidas pelos órgãos fazendários à Justiça Eleitoral, a prestadora ou o prestador deverá apresentar a comprovação de cancelamento, junto com esclarecimentos firmados pela fornecedora ou pelo fornecedor.

Ou seja, insuficiente a declaração da candidata, que carece de respaldo pelo cancelamento da primeira nota fiscal. Este o entendimento deste Tribunal, espelhado em recente julgamento de relatoria da Desa. Maria De Lourdes Galvão Braccini De Gonzalez:

DIREITO ELEITORAL. ELEIÇÕES 2024. RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO. DESAPROVAÇÃO. EMISSÃO DE NOTA FISCAL CONTRA O CNPJ DE CAMPANHA. OMISSÃO DE GASTO. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. RECURSO DESPROVIDO.

   I. CASO EM EXAME

   1.1. Recurso interposto por candidato ao cargo de vereador contra sentença que desaprovou suas contas, relativas às Eleições de 2024, e determinou o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, diante da constatação de despesa não registrada e custeada com recursos de origem não identificada.

  1.2. O recorrente sustentou que a nota fiscal questionada foi emitida indevidamente pela empresa fornecedora, sem que houvesse prestação de serviço ou entrega de produto, tendo a empresa reconhecido o equívoco e informado que perdeu o prazo para cancelamento.

 

   II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

   2.1. Há duas questões em discussão: (i) saber se a emissão de nota fiscal contra o CNPJ de campanha, sem cancelamento ou retificação junto ao fisco, presume a existência de gasto eleitoral; (ii) saber se a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade autoriza a aprovação com ressalvas das contas em razão do valor da irregularidade.

  III. RAZÕES DE DECIDIR

  3.1. A jurisprudência do TSE estabelece que a emissão de nota fiscal em nome do CNPJ de campanha presume a existência de despesa eleitoral, cabendo ao prestador comprovar seu cancelamento ou justificar objetivamente a regularidade do gasto.

  3.2. A despesa não declarada implica, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da candidata, caracterizando os recursos como de origem não identificada.

  3.3. A simples declaração unilateral do fornecedor sobre o suposto equívoco na emissão não afasta a irregularidade, especialmente se não acompanhada de estorno, cancelamento ou comunicação formal à Receita Estadual.

  3.4. A omissão do gasto e a não declaração da fonte de custeio caracterizaram a utilização de recursos de origem não identificada, nos termos do art. 32, inc. VI, e art. 53, inc. I, al. "g", da Resolução TSE n. 23.607/19. Recolhimento da quantia impugnada ao Tesouro Nacional.

  3.5. Manutenção da sentença. O valor da irregularidade representa mais de 95% do total arrecadado na campanha, sendo inaplicáveis os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, pois não se trata de valor ínfimo ou de pequena monta.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso desprovido.

  Tese de julgamento: “A emissão de nota fiscal em nome do CNPJ de campanha eleitoral presume a existência de despesa correspondente, sendo indispensável o cancelamento formal ou justificativa objetiva de sua emissão para afastar a irregularidade, especialmente quando o valor representa parcela significativa da arrecadação declarada, hipótese que afasta a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade para mitigar o juízo de desaprovação”.

  Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.607/19: art. 32, caput e inc. VI; art. 53, inc. I, al. “g”.

  Jurisprudência relevante citada: TSE, AgR no REspe n. 0603520-94/PR, Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, DJE 07.5.2025; TRE-RS, PC n. 060277309, Rel. Des. Caetano Cuervo Lo Pumo, PSESS 06.12.2022; TRE-RS, RE n. 06006545520206210094, Rel. Des. Francisco José Moesch, 03.02.2022; TSE, AgR no REspe n. 060542160/SP, Rel. Min. Edson Fachin, DJE 17.3.2021.

 RECURSO ELEITORAL nº060019883, Acórdão, Relator(a) Des. Maria De Lourdes Galvao Braccini De Gonzalez, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 17/07/2025.

Logo, não estão atendidos os ditames legais para a comprovação do gasto.

De outra senda, a recorrente argumenta que a jurisprudência eleitoral é firme no sentido de que irregularidades de pequena monta, que não comprometam a confiabilidade das contas, não devem ensejar ressalvas, mas sim sua plena aprovação. Cita julgado do estado do Rio de Janeiro.

Sublinho que o Tribunal Eleitoral do Rio Grande do Sul tem posicionamento diverso daquele invocado pela recorrente, com entendimento fixado no sentido de  ser possível a aprovação com ressalvas das contas de campanha quando a irregularidade, embora relativa a recurso de origem não identificada, envolva valor inferior ao parâmetro de R$ 1.064,10, conforme jurisprudência consolidada e aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (REl n. 0600525-22, de relatoria da Desa. Eleitoral Caroline Agostini Veiga. DJE - de 27/06/2025) – no precedente, a irregularidade alcançara o valor de R$ 400,00 (representativo de 0,49% da arrecadação).

Diante do exposto, VOTO para dar parcial provimento ao recurso de FABIANA DE LOURDES PEREIRA DOS SANTOS, ao efeito de manter a aprovação das contas com ressalvas e reduzir o valor de recolhimento para R$ 239,00 (duzentos e trinta e nove reais).