REl - 0600354-31.2024.6.21.0134 - Voto Relator(a) - Sessão: 15/09/2025 00:00 a 16/09/2025 23:59

VOTO

Inicialmente, observo que na petição do recurso constou como recorrente “FABIANO RODRIGUES PEREIRA”.

Entretanto, como os documentos encontram-se em nome de MARLENE DE SOUZA TAMAGNO e das razões nele contidas é possível inferir se tratar de fato de irresignação da candidata Marlene, tenho por considerar mero erro material e, em nome da ampla defesa, conhecê-lo.

Cuida-se de examinar recurso em face da sentença proferida pela 134ª ZONA ELEITORAL DE CANOAS/RS, que julgou desaprovadas as contas, com fulcro no art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, com determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional do valor de R$ 3.959,00, em razão de os recursos próprios aplicados em campanha terem superado o valor do patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura (art. 15, inc. I c.c art. 25, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19) (ID 45932038).

Ressalto, de início, que a recorrente apresentou novos documentos com o recurso (ID 45932044 e 45932045).

A jurisprudência desta Corte admite a juntada de documentos em sede recursal, especialmente no âmbito das prestações de contas, quando se trata de elementos probatórios simples, aptos a esclarecer de forma imediata as irregularidades apontadas, sem necessidade de reexame técnico ou diligências adicionais. Esse entendimento busca resguardar o interesse público na transparência da contabilidade eleitoral, garantir a celeridade processual e evitar formalismos excessivos, conforme revela o seguinte julgado desta Corte:

 

RECURSO. PRESTAÇÃO DE CONTAS. EXERCÍCIO FINANCEIRO DE 2020. PARTIDO POLÍTICO . DIRETÓRIO MUNICIPAL. DESAPROVAÇÃO. JUNTADA DE DOCUMENTAÇÃO NA FASE RECURSAL. POSSIBILIDADE. DOCUMENTAÇÃO SIMPLES. DESNECESSIDADE DE NOVA ANÁLISE TÉCNICA. MÉRITO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE GASTOS COM RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA – FEFC . JUNTADA DE NOTA FISCAL IDÔNEA. DESPESA DEMONSTRADA. AFASTADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS . PARCIAL PROVIMENTO.

1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas anuais do partido, exercício 2020, em razão de ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. Determinado o recolhimento ao Tesouro Nacional e aplicada multa de 5% do valor irregular . 2. Conhecidos os documentos juntados com o recurso. Conforme pacífica jurisprudência desta Corte, a apresentação de novos documentos com o recurso, sobretudo na classe processual das prestações de contas, não apresenta prejuízo à tramitação do processo quando se trata de documentos simples, capazes de esclarecer, primo ictu oculi, as irregularidades apontadas, sem a necessidade de nova análise técnica ou diligências complementares. O posicionamento visa, sobretudo, salvaguardar o interesse público na transparência da contabilidade de campanha e a celeridade processual e afastar excessivo formalismo.

3. Ausência de comprovação de gastos com recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC. A nota fiscal indicada é documento idôneo a demonstrar a despesa – a diferença é de ordem insignificante, um centavo, e foi emitida pela mesma empresa cujo pagamento parcial foi acolhido pela sentença. Existência apenas de falhas formais e de comprovações extemporâneas, de forma que as contas devem ser aprovadas com ressalvas . 4. Parcial provimento. Aprovação com ressalvas. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional .

(TRE-RS - REl: 0600086-10.2021.6.21 .0060 PELOTAS - RS 060008610, Relator.: Afif Jorge Simoes Neto, Data de Julgamento: 20/07/2023, Data de Publicação: DJE-135, data 26/07/2023) (grifo nosso)

 

Assim, conheço dos documentos de ID 45932044 e 45932045.

Antes de examinar a irregularidade objeto do recurso, (recebimento de recursos de R$ 3.959,00),  consigno que a recorrente não demonstrou irresignação quanto a outras duas falhas apontadas no parecer conclusivo (ID 45932031):

 

2. Confronto de informações prévias

 

2.1 Foi identificada a seguinte omissão relativa à despesa constante da prestação de contas em exame, não sendo localizado o documento comprobatório da prestação de serviço e a identificação do pagamento no extrato conta banco:

 

Data: 30/08/2024 – CNPJ: 09.194.186/0001-31 – Fornecedor: Digital Brasil Confecções Ltda. – Nota Fiscal 663 Valor R$ 1.715,00

 

2.2 Foi identificada a seguinte omissão relativa à origem da despesa, lançada no extrato conta banco Ag. 2663, CC 349178, pagamento realizado em 12/09/2024 – CPF: 034.205.570-43, Roger Montanha de Moura Alcantara – Valor de R$ 1.710,00.

 

          

Aliás, a recorrente nem se manifestou delas após o exame das contas, mesmo intimada para fazê-lo (ID 45932033).

Dessa forma, tenho que operada a preclusão em relação a tais falhas, ou seja, ausência de documento comprobatório da prestação de serviço constante da Nota Fiscal 663, no valor de R$ 1.715,00, e omissão de despesa lançada no extrato bancário paga a Roger Montanha de Moura Alcantara, no valor de R$ R$ 1.710,00.

Passo a examinar a única insurgência do recurso.

A sentença a quo acolheu o Parecer Conclusivo do examinador, considerando o seguinte apontamento (ID 45932038):

 

1. RECEBIMENTO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA (ART. 32 DA RESOLUÇÃO TSE N° 23.607/2019) 

1.1. Os recursos próprios aplicados em campanha superam o valor do patrimônio declarado por ocasião do registro de candidatura, situação que deve ser esclarecida junto ao candidato, podendo revelar indícios de recursos de origem não identificada (art. 15, I c.c art. 25, §2º, da Resolução TSE nº 23.607/2019) 

 

Conclusão

Finalizada a análise técnica das contas, o total das irregularidades foi de R$ 3.959,00 e representa 100% do montante de recursos recebidos (R$ 3.959,00). Assim, como resultado deste Parecer Conclusivo, recomenda-se a desaprovação das contas, em conformidade com a Resolução TSE n. 23.607/2019. 

 

 

Em sede de recurso, a recorrente sustenta que quando do registro de sua candidatura era exatamente essa sua situação patrimonial, ou seja, ausente bem ou recurso próprio (R$ 0,00). Alega, porém, que na condição de aposentada, contraiu empréstimo pessoal para adimplir com as despesas de campanha e junta documentos.

Pois bem.

A Resolução TSE n. 23.607/19, em  seu art. 32, § 1º, elenca as hipóteses caracterizadoras de recursos como de origem não identificada, litteris:

 

Art. 32. Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatas ou candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU).

§ 1º Caracterizam o recurso como de origem não identificada:

I - a falta ou a identificação incorreta da doadora ou do doador;

II - a falta de identificação da doadora ou do doador originária(o) nas doações financeiras recebidas de outras candidatas ou de outros candidatos ou partidos políticos;

III - a informação de número de inscrição inválida no CPF da doadora ou do doador pessoa física ou no CNPJ quando a doadora ou o doador for candidata ou candidato ou partido político;

IV - as doações recebidas em desacordo com o disposto no art. 21, § 1º, desta Resolução quando impossibilitada a devolução à doadora ou ao doador;

V - as doações recebidas sem a identificação do número de inscrição no CPF/CNPJ no extrato eletrônico ou em documento bancário;

VI - os recursos financeiros que não provenham das contas específicas de que tratam os arts. 8º e 9º desta Resolução;

VII - doações recebidas de pessoas físicas com situação cadastral na Secretaria da Receita Federal do Brasil que impossibilitem a identificação da origem real da doadora ou do doador; e/ou

VIII - recursos utilizados para quitação de empréstimos cuja origem não seja comprovada.

 

Na espécie, tenho que não restou demonstrada a origem dos recursos gastos em campanha.

Com efeito, o empréstimo pessoal foi firmado pela candidata somente em 06.01.2025 (ID 45932044), enquanto as despesas ocorreram muito antes dessa data, nos meses de agosto, setembro e outubro de 2024 (ID 45931960).

Dessa forma, tenho que  há manifesta incongruência entre o quanto sustentado pela recorrente e o que exsurge da documentação apresentada.

Nessa linha, a jurisprudência tem relevado a irregularidade, quando demonstrado, por outros meios, que o candidato poderia ter obtido o recurso em função de sua atividade laborativa:

 

RECURSO ELEITORAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2020. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS NÃO DECLARADOS POR OCASIÃO DO REGISTRO DE CANDIDATURA . RECEITA ORIUNDA DE ATIVIDADE PROFISSIONAL DO PRESTADOR DE CONTAS. SENTENÇA REFORMADA. CONTAS APROVADAS. RECURSO PROVIDO .

1. A ausência de declaração de patrimônio (rendimentos) não afasta a possibilidade de utilização de recursos próprios na campanha eleitoral, desde que reste comprovada a origem dos seus rendimentos, com vista a atestar já integrarem o patrimônio do candidato, em período anterior ao pedido de registro de candidatura, nos termos do art. 25, § 2º, da Resolução TSE nº 23.607/2019 . 1.1. No caso dos autos, além de se tratar de valor modesto, foram demonstradas a origem e a disponibilidade dos recursos financeiros próprios, as quais, seguramente confirmam a procedência lícita dos recursos e a sua não caracterização como fonte vedada, assim como prevê o art. 32, da Resolução TSE nº 23 .607/2019. 2. Recurso a que se dá provimento.

 

(TRE-SE - RE: 06007601520206110023 NOVA CANAÃ DO NORTE - MT 28555, Relator.: Des . BRUNO D'OLIVEIRA MARQUES, Data de Julgamento: 06/05/2021, Data de Publicação: DEJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 3416, Data 12/05/2021, Página 12-13) (grifo nosso)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATO . VEREADOR. DESAPROVAÇÃO. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. UTILIZAÇÃO DE RECURSOS PRÓPRIOS ACIMA DO MONTANTE DECLARADO NO REGISTRO DE CANDIDATURA . SANADAS AS IRREGULARIDADES. AFASTADA A DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. PROVIMENTO . 1. Insurgência contra sentença que desaprovou as contas da candidata ao cargo de vereadora, nas eleições de 2020, e determinou o recolhimento da quantia irregular ao Tesouro Nacional. 2. Recebimento de recurso de origem não identificada em infringência ao disposto no art . 32, §§ 1º e 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19. Aplicação na campanha de recursos próprios acima do declarado por ocasião do registro de candidatura . Demonstrada a utilização de recursos próprios advindos da profissão de professora. A jurisprudência é assente no sentido de que a utilização de recursos financeiros próprios em campanha em montante superior ao patrimônio declarado no registro de candidatura não é motivo suficiente para desaprovar as contas, quando compatível com a realidade financeira de candidato e com a ocupação por ele exercida. 3. Provimento . Aprovação com ressalvas. Afastada a determinação de recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS - REl: 0600711-26.2020 .6.21.0045 SANTO ÂNGELO - RS 060071126, Relator.: Luis Alberto Dazevedo Aurvalle, Data de Julgamento: 01/02/2023, Data de Publicação: DJE-24, data 10/02/2023) (grifo nosso)

 

Entretanto, a fonte apontada do recurso (empréstimo pessoal de ID 45932044) não confere fidedignidade à alegação, pois posterior às despesas realizadas.

E, da mesma forma, os proventos de aposentadoria (R$ 1.518,00 - ID 459322045) não são compatíveis com a movimentação financeira de R$ 3.959,00.

Em relação às omissões sobre as quais a Recorrente não se manifestou, deixo de determinar o recolhimento do total de R$ 3.425,00 pois já se encontra tal importância abrangida pela falha de recebimento de recurso de origem não identificada e, ademais, não restou determinado na sentença.

No entanto, esse aspecto se soma à gravidade das falhas pois quase a totalidade das despesas (86,51%) do quanto recebido (R$ 3.959,00) foi utilizado para despesas irregulares.

Por último, consigno que a irregularidade atingiu 100% dos recursos arrecadados em espécie, outro aspecto que merece ser sopesado quanto à gravidade da falha e ao juízo de reprovação das contas.

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo conhecimento e desprovimento do recurso, ao efeito de manter a desaprovação das contas de MARLENE DE SOUZA TAMAGNO, relativas ao pleito de 2024 e a determinação de recolhimento de R$ 3.959,00, com fulcro no art. 74, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19.