REl - 0600949-65.2024.6.21.0090 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/01/2025 00:00 a 23:59

VOTO

O recurso é tempestivo. Ademais, cumpre todos os pressupostos recursais relativos à espécie, de modo que está a merecer conhecimento.

Mérito

Em síntese, o juízo a quo julgou improcedente representação por suposta prática irregular de propaganda eleitoral em bem público, ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL contra MAURICIO MACHADO DE ALMEIDA, ao fundamento de que as fotografias anexadas aos autos demonstram uma quantidade insuficiente de material gráfico de campanha, havendo indícios probatórios insatisfatórios para justificar a intervenção desta Especializada.

No campo normativo, a propaganda eleitoral em bens de uso comum está disciplinada na Resolução TSE n. 23.610/19:

Art. 19. Nos bens cujo uso dependa de cessão ou permissão do poder público, ou que a ele pertençam, e nos bens de uso comum, inclusive postes de iluminação pública, sinalização de tráfego, viadutos, passarelas, pontes, paradas de ônibus e outros equipamentos urbanos, é vedada a veiculação de propaganda de qualquer natureza, inclusive pichação, inscrição a tinta e exposição de placas, estandartes, faixas, cavaletes, bonecos e assemelhados (Lei nº 9.504/1997, art. 37, caput) .

§ 1º Quem veicular propaganda em desacordo com o disposto no caput será notificado para, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, removê-la e restaurar o bem, sob pena de multa no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais) a R$ 8.000,00 (oito mil reais), a ser fixada na representação de que trata o art. 96 da Lei nº 9.504/1997 , após oportunidade de defesa (Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 1º , e art. 40-B, parágrafo único) .

§ 2º Bens de uso comum, para fins eleitorais, são os assim definidos pelo Código Civil e também aqueles a que a população em geral tem acesso, tais como cinemas, clubes, lojas, centros comerciais, templos, ginásios, estádios, ainda que de propriedade privada (Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 4º) .

(...)

§ 6º Nas dependências do Poder Legislativo, a veiculação de propaganda eleitoral ficará a critério da Mesa Diretora (Lei nº 9.504/1997, art. 37, § 3º) .

§ 7º O derrame ou a anuência com o derrame de material de propaganda no local de votação ou nas vias próximas, ainda que realizado na véspera da eleição, configura propaganda irregular, sujeitando-se a infratora ou o infrator à multa prevista no § 1º do art. 37 da Lei nº 9.504/1997 , sem prejuízo da apuração do crime previsto no inciso III do § 5º do art. 39 da Lei nº 9.504/1997 .

§ 8º A caracterização da responsabilidade da candidata ou do candidato na hipótese do § 7º deste artigo não depende de prévia notificação, bastando a existência de circunstâncias que revelem a impossibilidade de a pessoa beneficiária não ter tido conhecimento da propaganda.

§ 8º-A Na hipótese de derrame de material de propaganda no local de votação realizado na véspera ou no dia da eleição, a representação por propaganda eleitoral irregular poderá ser ajuizada até 48 (quarenta e oito) horas após a data do pleito. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021)

(…)

 

O Ministério Público Eleitoral atuante perante a 90ª Zona Eleitoral recorre da decisão, sob o argumento de estar configurada a prática ilícita, e sustenta ausência de entendimento jurisprudencial e das balizas de julgamento utilizadas pelo Juízo Eleitoral a amparar o fundamento da sentença.

Adianto, sem razão.

No relativo à moldura fática, impõe-se contextualizar que o órgão ministerial recorrente apresentou petição instruída com Relatório Final Unificado, resultante da vistoria de 30 (trinta) locais de votação, em diligência realizada por equipe própria, coordenada pelo Promotor Eleitoral. O documento apresenta os candidatos dos quais se recolheu material de propaganda nas proximidades de cada local de votação.

E julgo não haver provas suficientes em relação ao recorrido MAURICIO MACHADO DE ALMEIDA.

Explico.

O conjunto probante mostra-se extremamente frágil, consistindo em foto de oito impressos do candidato recorrido, ao chão, sem revelar a localização – se aproximada, ou não, a local de votação. E das outras imagens de rua, não é possível identificar propaganda do candidato em tela, conforme se verifica nas imagens abaixo:

 

Com efeito, em que pese não haver na legislação de regência a previsão de um número mínimo de material impresso apto a configurar o ilícito em comento, é razoável admitir a necessidade de quantidade significativa de material, de modo a impor ao eleitor sua visualização.

Destaco que a primeira imagem apresenta material individualizado do recorrido, contudo, como dito anteriormente, para o fato consubstanciar derrame de santinhos, é necessário que esteja no local de votação ou nas vias próximas, conforme disposição legal, o que a prova não é hábil a demonstrar.

No ponto, impende sublinhar excerto do parecer da d. Procuradoria Regional Eleitoral, em irretocável análise dos fatos comprovados, o qual expressamente adoto como razões de decidir:

Ocorre que, na inicial, além das fotografias que revelam pouquíssimo material do candidato espalhado sobre o chão (ID 45805466 - ps. 2 e 3), não há outros elementos que possibilitem identificar se o escasso material encontrava-se, de fato, em locais de votação ou nas vias próximas, requisito necessário para a configuração da propaganda irregular. Ademais, o Relatório Final Unificado do ID 45805467 tampouco colaciona alguma fotografia que faça a identificação in loco do material gráfico. Desse modo, não deve prosperar a irresignação, uma vez que inexiste prova de que MAURICIO teve alguma responsabilidade sobre o derrame dos santinhos – dada a pequena quantidade encontrada –, bem como de que estes se encontravam em locais de votação ou nas vias próximas.

 

Ademais, relativamente à alegada ausência de lastro jurisprudencial a amparar o entendimento da decisão hostilizada, destaco que sim, o e. TSE evidencia em suas decisões a relevância do quesito quantidade, inclusive na valoração da multa. Exemplificativamente, cito excerto da ementa do Recurso Especial Eleitoral n. 060335921, onde o relator, Min. Jorge Mussi, consignou que a multa de R$ 4.000,00 é proporcional e razoável às circunstâncias fáticas indicadas pela Corte a quo, porquanto aproximadamente 800 santinhos do candidato foram encontrados perto do local de votação, quantidade expressiva que potencializa a influência no voto do eleitor, bem como a poluição visual e ambiental, justificando a pena pecuniária acima do mínimo previsto em lei.

E a valoração do quesito quantidade, para configuração do ilícito, encontra eco igualmente em precedentes de diversos Tribunais Regionais. Exemplifico:

RECURSO ELEITORAL - ELEIÇÕES 2020 - REPRESENTAÇÃO - Propaganda eleitoral irregular - Sentença de procedência com aplicação de multa - Derramamento de “santinhos”; com conteúdo propagandístico em local de votação, as vésperas do pleito - Art. 19, § 7° da Res. TSE n° 23.610/19 - Ausência de provas contundentes para embasar a condenação - Quantidade inexpressiva de material de propaganda eleitoral a ensejar derrame de “santinhos”; - Precedentes - Sentença reformada - Recurso provido.
TRE-SP RECURSO ELEITORAL n. 060097536, Acórdão, Des. Mauricio Fiorito, Publicação: DJE - DJE, 28.10.2021.

 

ELEIÇÕES 2020 - RECURSO - REPRESENTAÇÃO - PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR - DIA DA ELEIÇÃO - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA (ART. 19, § 7º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/2019, C/C O ART. 37, § 1º, DA LEI N. 9.504/1997)."DERRAME DE SANTINHOS" EM VIA PÚBLICA - BOLETIM DE OCORRÊNCIA DE POLICIAL MILITAR COM FOTOS REGISTRANDO A EXISTÊNCIA DE PEQUENA QUANTIDADE DE MATERIAL DE CAMPANHA NAS PROXIMIDADES E NA ENTRADA DE LOCAL DE VOTAÇÃO. PRECEDENTES DESTE TRIBUNAL E DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL QUE PERMITEM QUE AS CIRCUNSTÂNCIAS E PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO REVELEM A INEQUÍVOCA CIÊNCIA DO CANDIDATO - ENUNCIADO TRE-SC N. 25."Na hipótese de propaganda por meio de derramamento de santinhos na madrugada do dia das eleições, a exigência da prévia notificação inserta no art. 37, § 1°, da Lei n° 9.504/97 pode ser mitigada, para garantir a ratio essendi dareferida norma, que é coibir a realização de propaganda eleitoral em bens públicos, a fim de preservá-los, garantindo a isonomia entre os candidatos na disputa eleitoral e evitando influências no voto do eleitor" [TSE. REspe n. 379568, de 26.08.2016,Rel. Min. Luiz Fux - grifei]."É preciso restar demonstrado, com algum grau de segurança, a ciência inequívoca do beneficiário da propaganda eleitoral irregular, o que pode ser inferido a partir da existência de circunstâncias e peculiaridades revelando a impossibilidade de não ter tido conhecimento da conduta , nos exatos termos do parágrafo único ilícita do art. 40-B da Lei n. 9.504/1995."

[TRE-SC. Acórdão n. 35.327, de 22.1.2021, Rel.Juiz Fernando Carioni – Grifei.]

 

ACERVO PROBATÓRIO FRÁGIL E INCONSISTENTE - AUSÊNCIA DE JUNTADA DO MATERIAL IDENTIFICADO NA OCORRÊNCIA - ALEGADO DERRAMAMENTO TÃO SOMENTE NUM LOCAL DE VOTAÇÃO - IMAGENS QUE REVELAM PEQUENA QUANTIDADE DE SANTINHOS - IMPOSSIBILIDADE DESE AFERIR A QUEM PERTENCE A PROPAGANDA - BAIXO NÚMERO DE VOTOS OBTIDOS PELO REPRESENTADO NAS ELEIÇÕES - CARACTERÍSTICAS E CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO QUE NÃO PERMITEM INFERIR A CIÊNCIA INEQUÍVOCA DA PRÁTICA ILÍCITA - PRÉVIO CONHECIMENTO NÃO CONFIGURADO -IMPOSSIBILIDADE DE IMPOR A PENALIDADE PECUNIÁRIA - REFORMA DA SENTENÇA PARA JULGAR IMPROCEDENTE A REPRESENTAÇÃO.

PROVIMENTO DO RECURSO PARA ELIDIR A MULTA APLICADA.

TRE SC RECURSO EM REPRESENTACAO n. 060071835, Acórdão, Des. MARCELO PONS MEIRELLES, Publicação: DJE - Diário de JE, 12.04.2021.

 

ELEIÇÕES 2020. RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO POR PROPAGANDA IRREGULAR. DERRAME DE SANTINHOS. ALEGADA VIOLAÇÃO DA LEI ELEITORAL. IMPROCEDÊNCIA NA ORIGEM. RECURSO. NÃO CONFIGURAÇÃO. PECULIARIDADES DO CASO CONCRETO. QUANTIDADERELATIVAMENTE PEQUENA. AUSÊNCIA DE ASSOCIAÇÃO DOS SANTINHOS AOS RECORRIDOS. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO.

1. Para a imposição de sanção pelo [derrame de santinhos] é necessária a aferição de que o candidato praticou a conduta ou com ela anuiu, sendo inaplicável ao caso a responsabilização na forma objetiva. Adesão ao entendimentosentencial. Precedente.

2. A quantidade relativamente pequena de santinhos jogados na via pública não enseja a caracterização de verdadeiro #derramamento#.

3. Ademais, na espécie, as imagens não permitem fazer qualquer associação dos recorridos aos "santinhos" constantes nos registros visuais trazidos.

4. Recurso conhecido e desprovido.

TRE SE Recurso Eleitoral n. 060101425, Acórdão, Des. Leonardo Souza Santana Almeida, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 23.03.2021.

 

REPRESENTAÇÃO. ELEIÇÕES 2018. PROPAGANDA IRREGULAR. VOO DA MADRUGADA. DERRAMAMENTO DE SANTINHOS. ARTIGO 14, §7º, DA RESOLUÇÃO DO TSE N. 23.551/2017. PARÂMETROS. PRECEDENTES. RESPONSABILIZAÇÃO. CIRCUNSTÂNCIAS. PECULIARIDADES. CASO CONCRETO. PRÉVIA NOTIFICAÇÃO. DISPENSA. NORMA. RATIO ESSENDI. SANÇÃO. QUANTIDADE. QUANTUM. DEFINIÇÃO. VALOR. MULTA. PROCEDÊNCIA. IMPROCEDÊNCIA.

1. A propaganda irregular de "derramamento de santinhos" ou "chuva da madrugada", que pode consistir em jogar, geralmente nas vésperas ou na madrugada do dia do pleito, artefatos propagandísticos em locais de votação ou nas vias próximas com o objetivo de influenciar ilicitamente o eleitor na votação, causa evidente degradação higiênica e estética, e possui a prescrição sancionatória pecuniária no §7º do artigo 14 da Resolução do TSE n. 23.551/2017.

2. O ilícito de "derrame de santinhos" possui características próprias e, desse modo, possui parâmetros mais específicos de responsabilização a fim de resguardar a ratio essendi da norma. A jurisprudência fixou muitos desses parâmetros, entre eles, a desnecessidade de comprovação do conhecimento prévio - aferível pelas circunstâncias do caso - e a prescindibilidade de notificação prévia para a retirada da propaganda.

3. Com a verificação das provas, a aplicação ou não da multa deve ser aferida de acordo com a quantidade de artefatos propagandísticos jogados nos locais previstos na norma, o que é parâmetro também para o valor a ser imposto.

4. Procedência da demanda para aqueles que, no mínimo, foi constatado uma pequena quantidade de santinhos jogados em um lugar. Improcedência da demanda para aqueles que se observou uma quantidade irrelevante ou não se observou propaganda irregular jogada nos locais previstos na norma.

TRE PA Representação n. 060230142, Acórdão, Des. DESEMBARGADORA LUZIA NADJA GUIMARÃES NASCIMENTO, Publicação: DJE - Diário da Justiça Eletrônico, 07.10.2019.

 

ELEIÇÕES 2018. RECURSO ELEITORAL. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDAELEITORAL. DERRAMAMENTO DE SANTINHOS NA VÉSPERA OU NO DIA DASELEIÇÕES. LOCAIS DE VOTAÇÃO. REEXAME DO CONJUNTO PROBATÓRIO. LIVRECONVENCIMENTO MOTIVADO. FOTOS NÃO COMPROVAM O DERRAME DE MATERIAL.AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE RECONHECIDA EM GRAU RECURSAL. RECURSOPROVIDO.

1. Analise do conjunto probatório com base em três premissas. A primeira premissa repousa no fato de que a instrução do feito somente com imagens do lançamento dos santinhos nos locais de votação e vias próximas pode ser, sim, admitida, desde que da imagem se possa identificar que se trata de um local de votação (ou vias próximas) e que os materiais#derramados# pertencem de forma inequívoca ao candidato representado. A segunda premissa é a de que o termo de constatação ou auto circunstanciado não é requisito indispensável, embora sua presença corrobore o acervo probatório, especialmente no que tange aos detalhes da ocorrência, como local da infração e volume do material identificado. A terceira premissa é a de que o termo de constatação ou auto circunstanciado, sozinho, não é prova hábil para caracterizar o ilícito de derramamento de santinhos. In casu reconhecida a terceira premissa e ausência de materialidade.

2. As fotografias juntadas como prova do derrame de material demonstram pequena quantidade de santinhos. As imagens trazidas como prova não são aptas a demonstrar, por si só com nitidez e clareza as irregularidades identificadas pelo Parquet.

3. Não há nos autos elementos suficientes a respaldar as afirmações da exordial, demonstrando-se fragilidade a constatação do ilícito, regulamentado nos arts. 14, § 7º, daRes. TSE n. 23.551/2017 e 37, § 1º, da Lei n. 9.504/97. Ônus da prova que incumbe ao autor, na forma do art. 373, I, do Código de Processo Civil.

4. Reexame do conjunto probatório em sede recursal. Acatada alegação de ausência de materialidade em razão da pequena quantidade de material carreado como prova.

5. RECURSO PROVIDO.

TRE MT Representação n. 60166645, Acórdão, Des. PAULO CÉZAR ALVES SODRÉ, Publicação: DEJE - Diário de Justiça Eletrônico, 25.01.2019.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO por negar provimento ao recurso.