PCE - 0602912-58.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 16/12/2024 00:00 a 23:59

VOTO

Trata-se da prestação de contas apresentada por ANDERSON BRAGA DORNELES, candidato não eleito ao cargo de deputado federal, relativamente à movimentação de recursos nas Eleições de 2022.

Passo, então, a analisar as irregularidades indicadas pelo órgão técnico, bem como pela própria relatoria do feito no curso da instrução processual.

 

1) Das Dívidas de Campanha Sem a Documentação Necessária

A unidade técnica apontou a existência de dívidas de campanha assumidas pelo Diretório Estadual do Avante sem que tenha sido apresentada a manifestação do diretório nacional do partido a respeito, conforme relatado no seguinte trecho (ID 45493817):

1.1 Não foram apresentadas as seguintes peças obrigatórias que devem integrar a prestação de contas (art. 53 da Resolução TSE nº 23.607/2019):

- Autorização do órgão nacional de direção partidária, na hipótese de assunção de dívida pelo partido político, acordo expressamente formalizado, bem como cronograma de pagamento e quitação.

O candidato e o Avante/RS peticionaram nos IDs 45478729 a 45478731, declarando a assunção da dívida por parte do diretório estadual. Apresentaram, ainda, anuência dos credores e cronograma de pagamento. No entanto, não foi apresentada a manifestação do diretório nacional a respeito da dívida.

 

O órgão técnico não indicou o montante das dívidas de campanha e entendeu tratar-se a falha de mera impropriedade, a qual não afetou a identificação da origem das receitas e destinação das despesas, comprovadas pela movimentação bancária.

Contudo, no ponto, tenho que razão assiste à Procuradoria Regional Eleitoral, no sentido de considerar irregular a quantia de R$ 1.173.955,58, relativa ao total das dívidas assumidas pela campanha e não pagas, registradas como tais na prestação de contas, consoante demonstrativo “Relatório de Despesas Efetuadas e Não Pagas”, acostado sob ID 45338820.

O § 3º do art. 33 da Resolução TSE n. 23.607/19 é expresso ao estabelecer a necessidade de autorização do órgão nacional para assunção da dívida pelo órgão partidário da respectiva circunscrição:

Art. 33. Partidos políticos e candidatas ou candidatos podem arrecadar recursos e contrair obrigações até o dia da eleição.

§ 1º Após o prazo fixado no caput, é permitida a arrecadação de recursos exclusivamente para a quitação de despesas já contraídas e não pagas até o dia da eleição, as quais deverão estar integralmente quitadas até o prazo de entrega da prestação de contas à Justiça Eleitoral.

§ 2º Eventuais débitos de campanha não quitados até a data fixada para a apresentação da prestação de contas podem ser assumidos pelo partido político (Lei nº 9.504/1997, art. 29, § 3º ; e Código Civil, art. 299) .

§ 3º A assunção da dívida de campanha somente é possível por decisão do órgão nacional de direção partidária, com apresentação, no ato da prestação de contas final, de:

I - acordo expressamente formalizado, no qual deverão constar a origem e o valor da obrigação assumida, os dados e a anuência da pessoa credora;

II - cronograma de pagamento e quitação que não ultrapasse o prazo fixado para a prestação de contas da eleição subsequente para o mesmo cargo;

III - indicação da fonte dos recursos que serão utilizados para a quitação do débito assumido.

(Grifei.)

 

Desse modo, ante a ausência de requisito essencial para a assunção da dívida de campanha pelo órgão partidário, qual seja, a indispensável autorização do órgão nacional do partido, resta caracterizada a irregularidade no importe de R$ 1.173.955,58.

Apesar da irregularidade, não deve ser comandado o recolhimento de valores ao Tesouro Nacional.

De acordo com o entendimento assentado na jurisprudência, as dívidas de campanha consistem em categoria com regulamentação específica, que não prevê o recolhimento de valores em caso de infringência, restringindo-se o art. 34 da Resolução TSE n. 23.607/19 a estabelecer a possibilidade de desaprovação das contas:

Nesse sentido, destaco recente julgado do TSE:

ELEIÇÕES 2018. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CARGO DE DEPUTADO FEDERAL. PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. DESAPROVAÇÃO NA INSTÂNCIA DE ORIGEM. REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE PRESENTES. AGRAVO PROVIDO. DÍVIDA DE CAMPANHA. ASSUNÇÃO PELO PARTIDO. IRREGULARIDADE NO PROCEDIMENTO. EQUIPARAÇÃO A RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE RESPALDO NORMATIVO. PRECEDENTE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.1. Hipótese em que o TRE/SP, por unanimidade, desaprovou as contas de campanha de candidata ao cargo de deputado federal nas eleições de 2018, devido à existência de dívida de campanha assumida pelo partido, mas cujo procedimento estava em desacordo com o previsto no art. 35, § 3º, da Res.–TSE nº 23.553/2017.2. Agravo conhecido e provido, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade do recurso especial. 3.Não há "[...] respaldo normativo para determinar o recolhimento de dívida de campanha ao Tesouro Nacional como se de recursos de origem não identificada se tratasse" (REspEl nº 0601205–46/MS, rel. designado Min. Luís Roberto Barroso, julgado em 8.2.2022, DJe de 30.3.2022). 4. Recurso especial parcialmente provido tão somente para afastar a determinação de devolução de R$ 4.048,00 ao Tesouro Nacional, mantida a desaprovação das contas.

(AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL ELEITORAL n. 060851176, Acórdão, Relator: Min. Mauro Campbell Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 175, Data 09.09.2022.) (Grifei.)

 

Com essas considerações, reconheço a irregularidade em questão, na quantia de R$ 1.173.955,58, porém julgo incabível a determinação de recolhimento de valores ao Tesouro Nacional, ante a ausência de previsão normativa expressa, na linha do posicionamento do TSE.

 

2) Do Recebimento de Recursos de Origem Não Identificada (RONI)

A unidade técnica constatou a existência de diversas despesas realizadas pelo candidato, no montante de R$ 305.282,96, para as quais houve emissão de notas fiscais eletrônicas em favor do CNPJ de campanha, mas que foram omitidas em sua prestação de contas, em violação ao art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19, discriminadas na tabela do item 3.1 do parecer conclusivo (ID 45493817, fls. 3 a 6).

A existência dos documentos fiscais contra o número de CNPJ do candidato, ausentes provas do efetivo cancelamento, retificação ou estorno, tem o condão de caracterizar a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. “g”, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Nessa linha, o TSE entende que “gastos não declarados que tenham sido informados por fornecedores por meio do Sistema de Registro de Informações Voluntárias, e/ou constem de notas fiscais oriundas das Secretarias das Fazendas Estaduais e Municipais, (...) constituem omissão de despesas” (TSE; Prestação de Contas n. 97795, Acórdão, Relator Min. Luís Roberto Barroso, DJE, Tomo 241, Data 16.12.2019, p. 73).

Além disso, as despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação dos gastos de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal da prestadora de contas, caracterizando o recurso como de origem não identificada.

Nesse sentido, cito o seguinte precedente desta Corte:

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. PRESTAÇÃO DE CONTAS. CANDIDATA. VEREADORA. OMISSÃO DE GASTOS ELEITORAIS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. SAQUE ELETRÔNICO DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. CONFIABILIDADE CONTÁBIL. MACULADA. RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. RECOLHIMENTO DOS VALORES AO TESOURO NACIONAL. VALOR NOMINAL DAS IRREGULARIDADES. DIMINUTO. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. REDUÇÃO DO MONTANTE A SER RECOLHIDO. PROVIMENTO PARCIAL. (...). 2. Detectadas 07 (sete) notas fiscais emitidas contra o CNPJ de campanha, sem que os recursos para quitação da despesa tenham transitado pelas contas bancárias da candidata, indicando omissão de gasto eleitoral. Os gastos não contabilizados afrontam o art. 53, inc. I, als. “g” e “i”, da Resolução TSE n. 23.607/19. Nesse trilhar, a Corte Superior entende que a omissão em tela viola as regras de regência e macula a confiabilidade do ajuste contábil. 3. As despesas não declaradas implicam, igualmente, sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação da dívida de campanha, cujo trânsito ocorreu de modo paralelo à contabilidade formal da candidata, caracterizando o recurso como de origem não identificada, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19. (...).

(TRE-RS - RE: 06006545520206210094 IRAÍ/RS 060065455, Relator: DES. ELEITORAL FRANCISCO JOSÉ MOESCH, Data de Julgamento: 03/02/2022.) (Grifei.)

 

A despeito das oportunidades concedidas no curso da instrução, o candidato não procedeu à retificação das contas e não encartou documentos capazes de sanear ou esclarecer o rol de gastos omitidos de suas contas.

Assim, está caracterizada a irregularidade, e a quantia de R$ 305.282,96 deve ser recolhida ao Tesouro Nacional, na forma prescrita pelo art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

3) Da Comprovação dos Gastos com Recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha – FEFC.

No item 4.1.1 do parecer conclusivo, o órgão técnico relacionou diversas despesas pagas com recursos do FEFC contrariando os arts. 35, 53, inc. II, al. “c”, e 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, assim especificadas (ID 45493817):

Detalhamento da inconsistência observada na tabela

A – A documentação apresentada não possui descrição detalhada da operação, sendo necessária a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados e ou documento adicional de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço, em conformidade com art. 60 da Resolução TSE 23.607/2019.

B - Não foi apresentado documento fiscal comprovando a despesa, em conformidade ao art.53, II e de forma a comprovar os art. 35 e 60 da Resolução TSE 23.607/2019. (nota fiscal ou contrato, conforme o caso)

C – Foi verificada a existência de duplicidade de contratos e pagamentos;

 

As falhas correlacionadas à letra “A” dizem respeito à ausência de descrição detalhada da operação, “sendo necessária a descrição qualitativa e quantitativa dos serviços prestados e ou documento adicional de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço, em conformidade com art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19.”

De fato, as notas fiscais expedidas pelos fornecedores discriminam seus respectivos objetos de modo genérico e impreciso, considerando que a nota fiscal emitida pelo fornecedor PANDORGA TECH LTDA. (ID 45338922), no valor de R$ 50.000,00, limita-se a descrever "Estratégia Digital, social media e tráfego pago. Consultoria de Marketing Digital", ao passo que a nota fiscal emitida pelo fornecedor LB. EDIÇÃO DE JORNAIS LTDA. (ID 45338942), no valor de R$ 22.500,00, cinge-se a descrever “produção de conteúdo, conceito e narrativa para campanha eleitoral”.

Esta Corte tem entendimento consolidado pela necessidade de comprovação dos dispêndios com recursos públicos, por meio de documento fiscal emitido pelo respectivo fornecedor, com descrição detalhada do serviço ou material, sob pena de configuração de irregularidade na aplicação de verbas públicas, consoante ilustra o seguinte julgado:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. PARECER TÉCNICO PELA DESAPROVAÇÃO. USO DE RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. APLICAÇÃO DE VALORES NA CAMPANHA QUE SUPERARAM O MONTANTE DO PATRIMÔNIO DECLARADO. EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS QUE COMPROVAM A CAPACIDADE DE AUTOFINANCIAMENTO. IRREGULARIDADE AFASTADA. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS PROCEDENTES DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA EFETIVA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. DEVER DE RECOLHIMENTO AO ERÁRIO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

1. Prestação de contas apresentada por candidato ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

[...].

3. Aplicação irregular de recursos procedentes do Fundo Especial de Financiamento de campanha - FEFC. Ausência na nota fiscal dos pormenores da operação “edição de estatística e de outras informações para divulgação na internet”, de forma a comprovar a prestação efetiva do serviço, em conformidade com art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19. Sobre o tema, esta Corte tem entendimento consolidado pela necessidade de comprovação dos dispêndios com recursos do FEFC por meio de documento fiscal emitido pelo respectivo fornecedor, com descrição detalhada do serviço ou material, sob pena de configuração de irregularidade na aplicação de verbas públicas. Recolhimento ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

4. O vício representa 2,32% do total auferido em campanha, devendo a contabilidade ser aprovada com ressalvas, na esteira do entendimento desta Corte, mediante aplicação dos princípios da proporcionalidade e razoabilidade.

5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(PCE n. 0603224-34, Acórdão, Des. Eleitoral Fernanda Ajnhorn, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 22.02.2024.) (Grifei.)

 

No julgamento da PCE n. 0602839-86.2022.6.21.0000, ocorrido em 28.9.2023, sob a relatoria do Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, envolvendo as contas de campanha de candidata ao cargo de deputada estadual no pleito de 2022, o Tribunal também avaliou despesa com a empresa PANDORGA TECH LTDA., em que foi igualmente apresentada nota fiscal constando descrição de serviços genérica: "Estratégia Digital para Campanha Eleitoral". Entretanto, a Corte afastou a irregularidade, uma vez que a candidata, “após o Parecer Conclusivo, juntou aos autos uma declaração de serviços prestados (ID 45543540), onde se pode vislumbrar o necessário detalhamento”, providência não adotada no caso que ora se analisa.

De fato, cumpriria ao prestador de contas sanear a falha por meio de contratos, amostras ou relatórios de serviços prestados, minudenciando as atividades, prazos e recursos contemplados pelo objeto da contratação, o que, porém, não ocorreu na hipótese.

Portanto, incompletas e insuficientes as informações de que trata o art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19, impõe-se o reconhecimento da irregularidade e a determinação do recolhimento da quantia correspondente ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Relativamente às despesas assinaladas com a letra “B”, o órgão técnico apontou a falta ou insuficiência da comprovação de gastos em relação a uma despesa com publicidade por materiais impressos, bem como a diversos contratos de pessoal para prestação de serviços de militância e mobilização de rua, nos termos do art. 60, c/c o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Apesar de o prestador de contas não ter juntado a documentação comprobatória referente a DANIEL PRIMO PICCINI, a nota fiscal n. 2367, emitida em 02.9.2022, sob o nome empresarial de SHOW DAS BANDEIRAS LTDA. - ME, CNPJ n. 02.603.092/0001-20, referente à aquisição de bandeiras de tamanhos 90x1,40 e 1,40x2, no valor total de R$ 8.350,00, encontra-se disponível no Sistema de Divulgação de Contas Eleitorais (https://divulgacandcontas.tse.jus.br/divulga/#/candidato/SUL/RS/2040602022/210001620441/2022/RS/nfes), merecendo ser afastada a irregularidade, em linha com o entendimento da Procuradoria Regional Eleitoral.

Por outro lado, as demais despesas indicadas com a letra “B” dizem respeito à contratação de pessoal para atividades de militância ou mobilização de rua, no montante de R$ 13.600,00, em relação às quais não foram apresentados os respectivos contratos de prestação de serviços.

Com efeito, as despesas com as 8 (oito) pessoas físicas assinaladas pelo órgão técnico não foram comprovadas adequadamente através de contratos ou documentos fiscais, não satisfazendo, portanto, as exigências do art. 53, inc. II, al. “c”, c/c o art. 60, ambos da Resolução TSE n. 23.607/19.

A falha representa, ainda, descumprimento do art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19, o qual preceitua que a comprovação dos gastos com pessoal deve detalhar os locais de trabalho, as horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado.

No caso em exame, o candidato instruiu a comprovação das referidas despesas tão somente com comprovantes de transferência bancária e/ou recibos de pagamentos, os quais, isoladamente, não têm aptidão para demonstrar a regularidade das contratações de pessoal, notadamente ante o uso de recursos públicos, na esteira da jurisprudência deste Tribunal:

ESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO NÃO ELEITO. DEPUTADO FEDERAL. ARRECADAÇÃO E DISPÊNDIO DE RECURSOS DE CAMPANHA. UTILIZAÇÃO IRREGULAR DE VERBAS DO FUNDO ESPECIAL DO FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS FISCAIS COMPROBATÓRIOS DE GASTOS COM FORNECEDOR. FALHAS NOS COMPROVANTES DE GASTOS COM PESSOAL. MILITÂNCIA. DOCUMENTO FISCAL SEM A DESCRIÇÃO ADEQUADA DO OBJETO CONTRATUAL. FALHAS PARCIALMENTE SANADAS. IRREGULARIDADES QUE REPRESENTAM ELEVADO VALOR E PERCENTUAL. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidato não eleito ao cargo de deputado federal, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições gerais de 2022.

   2. Aplicação irregular de verbas do Fundo Especial de Financiamento de Campanha - FEFC. [...]. 2.2. Falhas nos comprovantes de gastos com pessoal. Inconsistências referentes a atividades de militância e mobilização de rua. Pagamento bancário ao fornecedor dos serviços, mediante PIX, cuja chave é o número de CPF do beneficiário. Documento bancário sem o registro de quaisquer informações adicionais atinentes ao fato gerador do pagamento. Ainda que o art. 60, § 1º, da Resolução n. 23.607/19 admita “qualquer meio idôneo de prova” dos gastos, o mero comprovante bancário de pagamento, sem informações adicionais, não basta para comprovar dispêndio com pessoal, máxime quando o pagamento é efetuado com verbas públicas. Configurada a irregularidade no emprego de recursos do FEFC, impondo o recolhimento dos valores aos cofres públicos. [...].

3. A soma das falhas não superadas corresponde a 45,8% da receita total declarada pelo candidato, impondo-se a reprovação das contas, em razão do elevado valor manejado irregularmente.

4. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS; PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060292035, Acórdão, Des. Eleitoral CAETANO CUERVO LO PUMO, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 07.08.2023.) (Grifei.)

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATA. DEPUTADA ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSO ORIUNDO DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. ATIVIDADE DE MILITÂNCIA E MOBILIZAÇÃO DE RUA. AUSÊNCIA DE DOCUMENTOS COMPROBATÓRIOS. IRREGULARIDADES DE NATUREZA GRAVE. ALTA REPRESENTATIVIDADE DA FALHA. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

1. Prestação de contas apresentada por candidata não eleita ao cargo de deputada estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos relativos às eleições gerais de 2022.

2. Existência de despesas contratadas, indicadas como “atividades de militância e mobilização de rua”, pagas com recursos de origem pública, sem a devida comprovação. Para além disso, os documentos estão incompletos, de modo que não satisfazem as exigências do art. 60, c/c o art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19. Logo, a contratação não restou devidamente comprovada.

[...].

5. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE-RS; PRESTAÇÃO DE CONTAS ELEITORAIS n. 060328237, Acórdão, Des. Luiz Mello Guimaraes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 05.02.2024.) (Grifei.)

 

Assim, impõe-se o reconhecimento das irregularidades na comprovação dos gastos com recursos oriundo do FEFC, devendo o montante de R$ 13.600,00 ser recolhido ao Tesouro Nacional.

A unidade técnica realizou, ainda, um apontamento indicado com a letra “C”, relativo à duplicidade de contratos e pagamentos à fornecedora IARA MACHADO MARTINS.

Compulsando os autos, verifica-se que o mesmo contrato foi juntado em duplicidade pelo prestador de contas, sob IDs 45338927 e 45339110, sendo que a despesa também foi registrada de forma duplicada no SPCE, com idênticos dados, conforme consta no relatório de despesas efetuadas (ID 45338823, págs. 3 e 7-8).

Contudo, os extratos bancários acostados demonstram a realização de apenas um pagamento de R$ 2.000,00 à fornecedora, ocorrido no dia 09.9.2022 (ID 45339153, pág. 10).

Do contexto exposto, é possível inferir que houve um erro na contabilização da despesa, lançada duas vezes, embora tenha havido um único pagamento. Assim, bastaria que o candidato promovesse a exclusão de um dos registros, por meio de retificação das contas, a fim de superar a falha e equalizar o gasto documentado com o débito existente em suas contas de campanha.

Trata-se, portanto, de equívoco formal, que, embora não saneado, não envolveu a malversação de recursos públicos, tampouco autoriza a presunção de uso de recursos de origem não identificada, sendo suficiente que as contas sejam ressalvadas quanto ao ponto.

Portanto, os valores a serem recolhidos ao Tesouro Nacional, com fundamento no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19, alcançam R$ 86.100,00 (R$ 96.450,00 – R$ 8.350,00 – R$ 2.000,00).

4) Dos Créditos Não Utilizados com o Facebook Ltda. para Impulsionamento de Conteúdo

No item 4.1.2 do parecer conclusivo, a examinadora de contas apontou a existência de valores pagos ao Facebook Ltda. com recursos do FEFC, mas sem a efetiva contraprestação de serviços, consoante o seguinte excerto (ID 45493817):

4.1.2 Foram identificados pagamentos para DLOCAL BRASIL INSTITUICAO DE PAGAMENTO S.A., CNPJ n. 25.021.356/0001-32, no valor total de R$ 61.735,00, referentes ao processamento de pagamentos para a empresa FACEBOOK SERVICOS ONLINE DO BRASIL LTDA, CNPJ n. 13.347.016/0001-17, por prestação de serviços de impulsionamento de conteúdo na internet.

Finalizada a prestação de serviços, o Facebook emitiu as notas fiscais números 51614031 e 50241357, no valor total de R$ 56.901,12, restando pendente o valor de R$ 4.833,88, que deveria ter sido recolhido ao Tesouro Nacional como sobra financeira de campanha de recursos do FEFC, conforme disposto no art. 35, § 2º:

[…].

O candidato não apresentou esclarecimentos e/ou comprovantes que alterem as falhas anteriormente apontadas.

 

Portanto, o candidato encerrou sua campanha com créditos não utilizados no Facebook, no valor de R$ 4.833,88, oriundos de recursos do FEFC, os quais deveriam ter sido devolvidos pela empresa fornecedora, caso não houvesse a contraprestação de serviços, e, então, restituídos ao Tesouro Nacional, consoante prevê o art. 35, § 2º, inc. I, da Resolução TSE n. 23.607/19:

Art. 35. São gastos eleitorais, sujeitos ao registro e aos limites fixados nesta Resolução:

[...].

§ 2º Os gastos de impulsionamento a que se refere o inciso XII deste artigo são aqueles efetivamente prestados, devendo eventuais créditos contratados e não utilizados até o final da campanha serem transferidos como sobras de campanha:

I - ao Tesouro Nacional, na hipótese de pagamento com recursos do FEFC;

 

No curso da instrução, embora intimado, o candidato nada manifestou sobre o apontamento.

Portanto, não tendo sido promovida a transferência dos créditos contratados e não utilizados, na forma estabelecida pela legislação de regência, até a apresentação final das contas, está caracterizada a irregularidade.

Assim, deve ser glosado tal gasto, no importe de R$ 4.833,88, impondo-se o recolhimento da quantia aos cofres públicos, com esteio no art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

5) Da Despesa com o Fornecedor LAMAISON COMÉRCIO DE PRODUTOS DE SAÚDE LTDA.

Por derradeiro, tem-se o gasto no valor de R$ 100.000,00, referente à nota fiscal emitida por LAMAISON COMÉRCIO DE PRODUTOS DE SAÚDE LTDA., em que, no campo “Discriminação do(s) serviço(s)”, consta anotação inespecífica: “REFERENTE A SERVIÇOS PRESTADOS” (ID 45338911).

Considerando que o art. 60 da Resolução TSE n. 23.607/19 prevê a necessidade de que o documento fiscal contenha descrição detalhada do produto ou serviço contratado, o então relator determinou a intimação do prestador de contas para manifestação, inclusive sobre a relação do fornecedor com a prestação de serviços afetos à campanha eleitoral.

Apesar do prazo concedido para manifestação acerca da indigitada despesa, o candidato quedou-se inerte.

Desse modo, são cabíveis as mesmas considerações anteriormente tecidas quanto às notas fiscais emitidas pelos fornecedores PANDORGA TECH LTDA. e LB. EDIÇÃO DE JORNAIS LTDA., porquanto absolutamente insuficiente a descrição dos serviços prestados.

Com efeito, a nota fiscal emitida pelo fornecedor LAMAISON COMÉRCIO DE PRODUTOS DE SAÚDE LTDA. não apresenta mínima descrição dos serviços prestados ou produtos adquiridos, impossibilitando atestar a regularidade do gasto.

Para além disso, o ramo de atividade do fornecedor, consistente no “comércio de produtos de saúde”, não tem subsunção imediata a nenhuma das hipóteses de gastos eleitorais permitidos nas campanhas, nos termos elencados pelo art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19.

Giza-se que ao prestador de contas foi oportunizada a manifestação acerca da falha, mas esse não apresentou nenhum esclarecimento a respeito, nem acostou documentação complementar para esclarecer o efetivo objeto do gasto.

Desse modo, impõe-se o reconhecimento da irregularidade no valor de R$ 100.000,00 e a determinação do recolhimento da quantia correspondente ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

Do Julgamento das Contas

O valor total das irregularidades apuradas nos autos alcança R$ 1.670.172,42 (item 1:R$ 1.173.955,58 + item 2: R$ 305.282,96 + item 3: R$ 86.100,00 + item 4: R$ 4.833,88 + item 5: R$ 100.000,00), que representa 198,37% do montante arrecadado (R$ 841.946,16), de maneira a inviabilizar a aplicação dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade como meio de atenuar a gravidade das máculas sobre o conjunto contábil, sendo, portanto, impositiva a desaprovação das contas.

Ainda, deve ser comandado ao prestador de contas o recolhimento do montante total de R$ 496.216,84 ao Tesouro Nacional, dos quais a quantia de R$ 305.282,96 refere-se ao uso de recursos de origem não identificada (art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19) e o montante de R$ 190.933,88 envolve a ausência de comprovação dos gastos com recursos do FEFC (art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19).

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pela desaprovação das contas de ANDERSON BRAGA DORNELES, nos termos do art. 74, inc. III, da Resolução TSE n. 23.607/19, e pela determinação do recolhimento de R$ 496.216,84 ao Tesouro Nacional, nos seguintes termos: a) R$ 305.282,96 por utilização de recursos de origem não identificada; e b) R$ 190.933,88 em razão da ausência de comprovação dos gastos com recursos do FEFC.