REl - 0600353-02.2024.6.21.0084 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/12/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo.

A sentença não merece reparos.

Com efeito, a recorrente propôs representação contra PROGRESSISTAS DE TAPES, LUIZ CARLOS COUTINHO GARCEZ, JOÃO PAULO ZIULKOSKI, FABIANO ANDRÉ DUMMER, CLEBER LUIS MORALES LAQUIMAN e MARCUS VINICIUS VIGOLO, porque teriam utilizado horário livre, em sessão da Câmara de Vereadores, nos dias 02.9.2024 e 09.9.2024, para realizar campanha eleitoral em prol do atual prefeito, fazendo comparações com o governo anterior.

Contudo, como bem concluiu a sentença, não houve a extrapolação dos limites da atividade parlamentar (ID 45719434):

O art. 22 da LC n° 64/90, exige, para recebimento e processamento de ações que visam apurar abuso de poder, a apresentação de fatos concretos, acompanhado de indícios mínimos que apontem para a ocorrência de condutas aptas, em tese, a configurar alguma das modalidades de abuso. Na ausência desses elementos mínimos, a petição inicial deve ser indeferida, in verbis:

Art. 22. Qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público Eleitoral poderá representar à Justiça Eleitoral, diretamente ao Corregedor-Geral ou Regional, relatando fatos e indicando provas, indícios e circunstâncias e pedir abertura de investigação judicial para apurar uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, em benefício de candidato ou de partido político, obedecido o seguinte rito:

(...)

c) indeferirá desde logo a inicial, quando não for caso de representação ou lhe faltar algum requisito desta lei complementar;

Da análise dos fatos narrados, consubstanciados em manifestações dos vereadores representados nos dias 02.09.2024 e 09.09.2024, em sessão legislativa da Câmara de Vereadores de Tapes/RS, entendo que, da forma como narrado e nos minutos indicados na exordial, foram proferidos discursos políticos compatíveis, em tese, com a atividade parlamentar, em um contexto de debate político sobre vertentes ideológicas, não havendo indícios de abusos que desdobrem a atividade típica e liberdade de manifestação a justificar o processamento da presente demanda.

No caso em tela, o conteúdo apresentado está no limite do exercício regular da liberdade de manifestação, em contexto parlamentar, sob o manto da imunidade constitucional (art. 29, VIII da Constituição Federal), que embora não constitua garantia absoluta, necessita de elementos concretos que permitam verificar, ainda que minimante, que eventuais discursos tenham excedido os limites da atividade parlamentar.

Outrossim, a Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso IV, assegura a todos a liberdade de expressão, vedando o anonimato, o que inclui o direito de criticar e expressar opiniões, especialmente em contexto eleitoral.

Importante ressaltar que a crítica política, ainda que contundente, faz parte do ambiente democrático e da livre manifestação do pensamento, principalmente durante o período eleitoral, onde o debate de ideias é incentivado para a plena informação do eleitorado.

No caso, não foi apresentado nenhum indício ou circunstância que possa interpretado como abuso de poder político e/ou violação ao previsto no art. 73, inciso II da Lei 9.504/97. A manifestação dos representados, nos minutos indicados pelo representante, nas sessões realizada nos dias 02.09.2024 e 09.09.2024, ainda que crítica, está protegida pela liberdade de expressão e não extrapola a típica atividade parlamentar.

Por fim, apesar de o representante alegar que os representados teriam realizado reuniões e eventos de campanha durante o horário em que deveriam estar exercendo suas funções legislativas, não foi carreado aos autos nenhum elemento probatório nesse sentido, tratando-se de narrativa vazia e desprovida de qualquer respaldo probatório mínimo.

Destarte, ante a ausência de elementos mínimos que demonstrem a prática de conduta abusiva, resta configurada a inépcia da inicial por falta de justa causa para processamento do feito.

Diante do exposto, INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL, nos termos do art. 330, III, do Código de Processo Civil c/c art. 22, I, “c” da LC 64/90.

Intime-se o Ministério Público Eleitoral, através de Sistema PJE, e o representante, através de publicação no Diário da Justiça Eletrônico - DJE, dispensada a intimação dos representados, já que não angularizada a relação processual.

 

E, vindo a inicial desprovida de elementos mínimos que demonstrassem a conduta ilícita dos ora recorridos, o corolário lógico-jurídico era o indeferimento inicial, exatamente a providência adotada pelo magistrado a quo.

Sobre o uso da Tribuna e a propositura da AIJE, assim se manifestou a Procuradoria Regional Eleitoral (ID 45739445):

Pois bem, a AIJE tem como uma de suas causas de pedir o abuso de poder político (art. 22, caput, da Lei nº 64/90), o qual “configura-se quando o agente público, valendo-se de sua condição funcional e em manifesto desvio de finalidade, compromete a igualdade da disputa e a legitimidade do pleito em benefício de sua candidatura ou de terceiros” (RO nº 172365/ DF – j. 07.12.2017 – DJe 27.02.2018).

Importante ressaltar, no entanto, que a AIJE exige a existência de gravidade no fato, ou seja, um alto desvalor da conduta somado a um impacto no equilíbrio da eleição. Esse é o entendimento do e. TSE:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL. ABUSO DO PODER POLÍTICO E ECONÔMICO. CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO. CONFIGURAÇÃO. SANÇÕES PECUNIÁRIAS. INEXISTÊNCIA DE GRAVIDADE DAS CONDUTAS. ABUSO DO PODER ECONÔMICO E POLÍTICO NÃO CONFIGURADO. INCIDÊNCIA DOS VERBETES SUMULARES 24 E 30 DO TSE. NÃO PROVIMENTO.

[...]

10. O Tribunal Superior Eleitoral exige, para a caracterização do abuso de poder, que a gravidade dos fatos seja comprovada de forma robusta e segura a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta(aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo). Nesse sentido: AIJE 0600814–85, rel. Min. Benedito Gonçalves, DJE de 2.8.2023; REspEl 0600840–72, rel. Min. Floriano de Azevedo Marques,DJE de 2.2.2024; e AIJE 0601779–05, rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJE de 11.3.2021.

(TSE. AREspEl nº 060098479, Relator Min. Floriano De Azevedo Marques, publicado em 31/05/2024 - g. n.)

Pois bem, o primeiro vídeo teve até o momento 339 visualizações,1 seis curtidas e 15 comentários; o segundo , 358 visualizações, 11 curtidas e 16 comentários. Salienta-se também que os vídeos têm mais de uma hora de duração, abordando diversos temas, e que, pelo menos para quem acessa a rede social sem login, nenhum dos comentários disponíveis fazem referências ao objeto deste processo.

Assim, fica constatada a notória falta de significativa repercussão do fato, requisito essencial para a configuração do abuso do poder político, de modo que não deve prosperar a irresignação.

 

Ante o exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.