REl - 0600347-48.2024.6.21.0131 - Voto Relator(a) - Sessão: 12/12/2024 às 14:00

VOTO

Da Admissibilidade

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

Da Ilegitimidade Passiva da Coligação Recorrida

Preliminarmente, reconheço a ilegitimidade da COLIGAÇÃO JUNTOS FAZEMOS MAIS POR SAPIRANGA para figurar no polo passivo de Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE).

As consequências jurídicas dessa espécie de ação são restritas à cassação do registro ou diploma e à sanção de inelegibilidade às pessoas físicas. Assim, é inviável que partido, coligação, federação ou qualquer outra pessoa jurídica integre o polo passivo da demanda, uma vez que não pode sofrer qualquer das consequências próprias desse meio processual.

Com esse posicionamento, colho julgado deste Tribunal:

RECURSOS. ELEIÇÕES 2020. AÇÕES DE INVESTIGAÇÃO JUDICIAL ELEITORAL # AIJE. IMPROCEDENTES. REUNIÃO DE PROCESSOS. JULGAMENTO CONJUNTO. IDENTIDADE PARCIAL ENTRE OS FATOS. CANDIDATURA MAJORITÁRIA. PREFEITO E VICE ELEITOS. PRELIMINAR DEOFÍCIO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA COLIGAÇÃO DEMANDADA. PENALIDADES APLICÁVEIS EXCLUSIVAMENTE A PESSOAS FÍSICAS. MÉRITO. USO DE BENS E SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS EM BENEFÍCIO DOS CANDIDATOS. INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA. CONDUTAS VEDADAS. IN DUBIO PRO SUFRAGIO. EXECUÇÃO DE OBRAS E SERVIÇOS. TRÂMITE REGULAR. DESVIO DE FINALIDADE PÚBLICA NÃO DEMONSTRADA. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL EM PERÍODO VEDADO NÃO CONFIGURADA. CONTEÚDOS DESTINADOS AO ENFRENTAMENTO DA PANDEMIA. BURLA ÀS REGRAS DE ARRECADAÇÃO DERECURSOS E DESPESAS ELEITORAIS NÃO COMPROVADAS. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO E ABUSO DE PODER POLÍTICO E ECONÔMICO NÃO CONFIGURADOS. AUSÊNCIA DE PROVAS ROBUSTAS. GRAVIDADE DOS FATOS NÃO DEMONSTRADA. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS CONDENATÓRIOS.DESPROVIMENTO. […]. Preliminar de ofício: ilegitimidade passiva ad causam da coligação. O Tribunal Superior Eleitoral consolidou orientação de que os partidos políticos e as coligações partidárias não ostentam legitimidade passiva ad causam para asações de investigação judicial eleitoral por uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou de autoridade, ou utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, fundadas no art. 22, caput, da LC n. 64/90, porquanto as penalidades decassação do registro de candidatura ou do diploma e a declaração de inelegibilidade são aplicáveis exclusivamente a pessoas físicas, não abrangendo as pessoas jurídicas. […]. 9. Declarado extintas, de ofício, sem resolução de mérito, por ilegitimidade passiva ad causam, forte no art. 485, inc. VI, do CPC, as AIJEs pertinentes ao REL n. 0600350-16.2020.6.21.0172 e ao REL n. 0600617-85.2020.6.21.0172 ,quanto à coligação representada, relativamente às imputações de abuso de poder político ou de autoridade e de utilização indevida de veículos ou meios de comunicação social, fundadas no art. 22, caput, da LC n. 64/90.10. Provimento negado aos recursos interpostos nos autos dos REL n. 0600350-16.2020.6.21.0172, REL n. 0600617-85.2020.6.21.0172 e REL n. 0600624-77.2020.6.21.0172.

(Recurso Eleitoral n. 060061785, Acórdão, Des. AMADEO HENRIQUE RAMELLA BUTTELLI, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE.) Grifei.

 

Na mesma linha, o Tribunal Superior Eleitoral reconhece “a ilegitimidade das agremiações para figurarem, no polo passivo, em ação de investigação judicial eleitoral, dada a impossibilidade fática de se lhes impor - assim como a qualquer outra pessoa jurídica - as sanções decorrentes da procedência da representação, nos termos do art. 22, XIV, da Lei Complementar 64/90” (Agravo em Recurso Especial Eleitoral n. 060017063, Acórdão, Relator Min. Floriano De Azevedo Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 189, Data 25.09.2023).

Assim, em preliminar, de ofício, reconheço a ilegitimidade passiva da COLIGAÇÃO JUNTOS FAZEMOS MAIS POR SAPIRANGA, em relação à qual julgo extinto o processo, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inc. VI, do CPC.

Do Mérito

No mérito, a coligação recorrente sustenta que CARINA PATRICIA NATH e ROBINSON CALEB DOS SANTOS, respectivamente, Prefeita e Vice-Prefeito de Sapiranga, reeleitos no pleito de 2024, praticaram abuso de poder político e econômico, mediante a utilização de servidores municipais para a realização de promoção eleitoral durante o horário de expediente, configurando uso indevido da máquina pública.

De acordo com a narrativa contida na petição inicial:

(...) no dia 08 de agosto de 2024, às 10h52min, o Jornal NH fez uma publicação no Facebook, com a seguinte manchete “ELEIÇÕES: Conheça os candidatos à Prefeitura de Sapiranga”.

Imediatamente, a publicação passou a receber inúmeros comentários, chamando a atenção os massivos comentários de apoio à atual prefeita e pré-candidata à reeleição, Sra. Carina Nath.

Na realidade, a grande maioria dos referidos comentários foram realizados por servidores públicos municipais, em horário de expediente.

 

De seu turno, o juízo da origem concluiu pela ausência de justa causa, observando que os horários em que ocorreram as manifestações coincidem com o habitual intervalo de expediente, período culturalmente reservado ao descanso e alimentação dos servidores.

Com efeito, depreende-se da prova dos autos que as mensagens de apoio foram curtas e singelas e lançadas por dez servidores públicos municipais, no dia 8 de agosto de 2024, entre 12h23min e 13h34min (ID 45726783, fls. 3 e 4).

Portanto, as mensagens foram postadas em período que usualmente coincide com o horário de almoço dos servidores, não sendo possível presumir que ocorreram durante o expediente normal de trabalho.

As mensagens identificadas foram breves e pouco articuladas, contendo expressões genéricas de apoio, sem profundidade ou detalhamento que pudessem evidenciar uma campanha coordenada ou institucional em favor da candidatura dos recorridos.

Além disso, ainda fossem realizadas durante o horário de expediente, as manifestações não tomariam mais que um minuto de trabalho de cada um servidores, sem qualquer comprometimento significativo de suas atividades funcionais.

Ainda, foram contabilizados apenas dez comentários, o que representa um número reduzido e incapaz de configurar influência relevante sobre o eleitorado.

Não há indícios de que os atos questionados foram praticados sob qualquer coerção ou direcionamento por parte da candidata ou outro agente público, que modo que se presume que foram manifestações espontâneas de apoio político, conforme assegurado pela liberdade de expressão.

Em casos semelhantes, este Tribunal posicionou-se no sentido de que eventuais manifestações pessoais espontâneas sobre a preferência política individual dos servidores, nas redes sociais, ainda que durante o horário de expediente, embora possam configurar infração funcional, não demonstram, por si sós, desvio de função pública em prol da campanha eleitoral capaz de caracterizar ilícito eleitoral, em conformidade com as seguintes ementas:

RECURSOS. REPRESENTAÇÃO. CAPTAÇÃO ILÍCITA DE SUFRÁGIO. CONDUTA VEDADA A AGENTE PÚBLICO. PREFEITO E VICE. ELEIÇÕES 2016. LICITUDE DA GRAVAÇÃO AMBIENTAL. OFERTA DE VANTAGENS EM TROCA DO VOTO. PUBLICIDADE INSTITUCIONAL. VEICULAÇÃO DEPROPAGANDA ELEITORAL EM PÁGINAS PESSOAIS DO FACEBOOK. SERVIDORES PÚBLICOS. REALIZAÇÃO DE ATOS DE CAMPANHA ELEITORAL DURANTE O HORÁRIO DE EXPEDIENTE. DESPROVIMENTO DO RECURSO DOS REPRESENTANTES. PROVIMENTO PARCIAL AO APELO DOS REPRESENTADOS. REDUÇÃO DAMULTA. […]. 3. Condutas vedadas. 3.1. Publicidade institucional. Divulgação, na página oficial da prefeitura, de notícias relativas à reforma de escolas públicas e à compra de novos materiais pedagógicos. A divulgação de publicidade institucional é vedada dentro dos três meses que antecedem a eleição, conforme disposto no art. 73, inc. VI, al. "b", da Lei n. 9.504/97, excepcionando-se apenas os casos de grave e urgente necessidade, assim reconhecidos pela Justiça Eleitoral. O escopo da norma éassegurar a igualdade de oportunidades entre os candidatos, que fica naturalmente prejudicada se um dos concorrentes é beneficiado pela publicidade do ente público que titulariza. Nítido o caráter institucional e eleitoral da publicidade veiculada,informando as providências adotadas pela administração na área de educação, sem retratar qualquer situação de urgente necessidade pública. 3.2. Publicações de propaganda eleitoral em favor dos candidatos à reeleição majoritária realizadas por servidoras municipais, durante o horário de expediente, em suas páginas pessoais do Facebook. A conduta vedada pelo art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97 busca resguardar a isonomia entre os candidatos, impedindo o uso da máquina pública a favor da campanhadaqueles que estão à frente da Administração. Postagens esparsas de propaganda eleitoral realizadas no perfil pessoal de servidores não caracterizam o desvio de função pública que a norma pretende evitar. Eventuais manifestações pessoais sobre a preferência política individual dos servidores, durante o horário de expediente, embora possam ser sancionáveis do ponto de vista funcional, não demonstram desvio de função pública em prol da campanha eleitoral. Ademais, não há evidência de que asmanifestações tenham ocorrido por meio de computadores da prefeitura, nem da existência de orientação superior para que os servidores promovessem a campanha dos representados. Afastado o caráter ilícito da conduta. 3.3. Realização de atos de campanhapor servidores durante o horário normal de expediente. Caracterizada a conduta vedada descrita no art. 73, inc. III, da Lei n. 9.504/97. A circunstância de os representados não estarem no exercício de seus cargos públicos não afasta a suaresponsabilidade. 4. Desprovimento do recurso dos representantes. Provimento parcial ao apelo dos representados. Redução da multa aplicada.

(Recurso Eleitoral n. 55335, Acórdão, Des. Eleitoral GERSON FISCHMANN, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, 01.10.2018.) Grifei.

 

Recurso. Conduta vedada. Art. 73, incs. I e II, da Lei n. 9.504/97. Eleições 2012. Manifestações de apoio político em rede social facebook por servidores municipais, em horário de trabalho e utilizando computadores da prefeitura. Representação julgada parcialmente procedente no juízo monocrático, condenando os servidores à multa e absolvendo os candidatos beneficiados. Não demonstrada a utilização da máquina pública a serviço da campanha dos candidatos representados. Exercício da livre manifestação de pensamento e liberdade política pelos servidores. Eventual ilícito administrativo pelo uso de equipamentos da administração municipal, em horário de trabalho, para divulgação de preferências políticas, deve ser apurado por processo administrativo disciplinar. Não configurada a conduta vedada. Reforma da sentença para afastar a aplicação da multa. Provimento.

(Recurso Eleitoral n. 48872, ACÓRDÃO de 22.10.2013, Relator: Des. Eleitoral LEONARDO TRICOT SALDANHA, Publicação: DEJERS - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-RS, Tomo 198, Data 24.10.2013, Página 5.) Grifei.

 

Assim, as manifestações de apoio político realizadas pelos servidores públicos municipais, sem provas de que agiram sob coação, sob ordens superiores ou com o uso relevante e grave da máquina pública, não configuram a prática de abuso de poder ou condutas vedadas aos agentes públicos.

Para que se configure o abuso de poder no contexto eleitoral, é essencial “que a gravidade dos fatos seja comprovada de forma robusta e segura a partir da verificação do alto grau de reprovabilidade da conduta (aspecto qualitativo) e de sua significativa repercussão a fim de influenciar o equilíbrio da disputa eleitoral (aspecto quantitativo)” (TSE. AREspEl n. 060098479, Relator Min. Floriano De Azevedo Marques, publicado em 31.05.2024).

No caso em tela, as alegações da parte autora limitam-se a presunções e ilações sobre o uso da máquina administrativa, sem que haja prova concreta de que tais atividades foram realizadas em desacordo com as normas aplicáveis, o que implica ausência de justa causa para o prosseguimento da ação.

Assim, na esteira do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral, diante da ausência de provas de que os servidores agiram de forma coordenada ou sob ordens superiores, bem como da inexistência de elementos mínimos que indiquem gravidade capaz de deslegitimar o resultado do pleito, não há justa causa para o prosseguimento da ação.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO, preliminarmente, de ofício, por extinguir o processo sem resolução de mérito em relação à COLIGAÇÃO JUNTOS FAZEMOS MAIS POR SAPIRANGA, por ilegitimidade passiva, com fundamento no art. 485, inc. VI, do CPC, e, no mérito, por negar provimento ao recurso.