REl - 0600356-57.2024.6.21.0083 - Voto Relator(a) - Sessão: 09/12/2024 00:00 a 23:59

VOTO

Inicialmente, consigno que a preliminar arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral relaciona-se à nulidade parcial da sentença, relativa à coercibilidade da decisão recorrida, que determinou a concessão de resposta, fixando astreintes, em contrariedade ao § 8º do art. 58 da Lei das Eleições:

Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.

(...)

§ 8º O não-cumprimento integral ou em parte da decisão que conceder a resposta sujeitará o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR, duplicada em caso de reiteração de conduta, sem prejuízo do disposto no art. 347 da Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.

 

Isso porque a sentença fixou o prazo de 24 horas, a contar da intimação da decisão, para que a coligação recorrente cumpra integralmente a determinação de veicular a resposta, sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) em caso de descumprimento.

Contudo, impõe, antes do exame da alegação de nulidade, a análise do pedido recursal de que seja a propaganda declarada regular.

Assim, relego a análise da preliminar para o julgamento do mérito.

No mérito, na presente representação eleitoral com pedido de direito de resposta, formulada pela Coligação Somos Todos Sarandi em face da Coligação Sarandi Pode Mais e do candidato Pablo Luiz Alievi Mari, foi reconhecida a prática de propaganda eleitoral difamatória e caluniosa veiculada por Pablo Luiz Alievi Mari em entrevista à Rádio Minuano.

A degravação da propaganda consta da inicial:

Buenas meu povo, hoje eu estou aqui pra falar um assunto com vocês muito sério, e quando agente fala agente prova, nós não estamos aqui pra atacar ninguém, mas para trazer a verdade porque a população sarandiense tem que saber o que está acontecendo. A partir de uma auditoria interna, que nós fizemos na Câmara de Vereadores, nós temos aqui a prova de que esse governo que ai está, deliberadamente fraudou as filas das vagas de creche e deixou muitas mães e muitas famílias para trás, para beneficiar alguns por interesse próprio. Aqui a central de vagas que é publicada no site, mostrando a relação de todas as pessoas inscritas e que estão aguardando uma vaga, nesta mão eu tenho a relação das matrículas das escolas, com as datas que os alunos ingressaram. Este documento eu não vou mostrar pra vocês nesse momento, mas se a oposição quiser eu posso levar no debate e mostrar ao vivo as provas do que eles fizeram, porque pra vocês ter uma noção comunidade, na escola Padre Agostinho Sopelsa, as pessoas algumas crianças estavam na 17ª posição da central de vagas foram matriculadas no dia 15 de maio, uma criança que estava na 14ª posição entrou no mês 5 de junho deixando pra trás várias outras crianças e não é uma ou duas, são dezenas de crianças que eles passaram para frente, deixando você para trás. Uma criança que estava na 48ª posição praticamente no fim da fila, eles deram uma vaga na escola Dona Rute no dia 3 de junho, assim como outras crianças que estavam na 21ª, 20ª e 26ª posição, praticamente todas as creches do município teve em algum momento, uma vaga de creche fraudada. Temos também na escola de educação infantil Vó Adélia uma criança que estava na 32ª sendo matriculada no dia 17 de maio e uma criança que estava na 47ª posição fim de fila ganhando uma vaga dia 20 de maio, quarenta e seis famílias foram deixadas de lado, quarenta e seis mães que estão aguardando uma vaga pra poder retornar ao seu trabalho ficaram pra trás por politicagem. Esta lei, é uma lei que tem que ser cumprida, a lei de que é por ordem de inscrição que ganha as vagas, e aqui está as provas.

Eu podia passar aqui mostrando todos os casos, um por um, mas eu sei que vocês acreditam em mim, e é pra nós terminar com essa politicagem, com esse sistema da velha política que eu estou aqui candidato a prefeito e a partir de 2025, nós vamos governar com transparência e seriedade porque o povo de Sarandi merece mais, o povo de Sarandi merece transparência e pode mais com Pablo e Cardoso com o 44. Contem comigo para sempre fazer justiça porque é para isso que eu entrei na política.

 

Do exame do conteúdo da fala, verifica-se que o vídeo divulgado pela coligação recorrente apresenta alegações de fraude relacionadas ao preenchimento de vagas em creches, imputando práticas desonestas à administração municipal e ao candidato adversário. O conteúdo extrapola o direito à livre manifestação do pensamento, divulga ofensas pessoais, configurando a extrapolação do direito à liberdade de expressão para atingir a honra e imagem do candidato adversário.

Os recorrentes alegam que o vídeo não menciona diretamente o candidato Reinaldo Nicola e que as críticas foram direcionadas à Administração Pública de forma genérica. No entanto, a análise do conteúdo revela que as acusações de fraude nas filas de creche, embora não mencionem nominalmente o candidato, são claramente direcionadas à gestão atual da qual Reinaldo Nicola faz parte. A imputação de práticas ilícitas à administração municipal, sem provas concretas, afeta diretamente a imagem e a honra dos candidatos da coligação autora, configurando, assim, a necessidade de direito de resposta.

A defesa argumenta que as críticas feitas pelo candidato Pablo Luiz Alievi Mari estão protegidas pela liberdade de expressão e pelo direito de crítica política. Contudo, conforme entendeu a magistrada na sentença, a liberdade de expressão não é absoluta e encontra limites quando se trata da divulgação de informações falsas e caluniosas que podem prejudicar a honra e a imagem de indivíduos.

Ademais, jurisprudência citada pela defesa, embora relevante, não se aplica ao caso em questão, pois aqui há a veiculação de fatos sabidamente inverídicos e ofensivos, que ultrapassam o mero exercício da crítica política, sendo desnecessário o pedido explícito de não voto.

Assim, é devido o direito de resposta, merecendo ser mantida a sentença.

Quanto à nulidade da decisão devido à fixação de astreintes, previstas no art. 536, § 1°, do CPC, verifica-se que assiste razão à Procuradoria Regional Eleitoral ao apontar contrariedade ao § 8º do art. 58 da Lei das Eleições, segundo o qual o descumprimento da decisão sujeita o infrator ao pagamento de multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR, duplicada em caso de reiteração de conduta, sem prejuízo do disposto no art. 347 da Lei n. 4.737, de 15 de julho de 1965 - Código Eleitoral.

Assim, a sentença deve ser reformada nesse ponto, pois indevida a fixação de astreintes.

No que se refere à arguição de nulidade dos atos posteriores à sentença, assiste razão à Procuradoria Regional Eleitoral, pois na Justiça Eleitoral as obrigações de fazer e de não fazer são reguladas pela Resolução TSE n. 23.709/22, que dispõe sobre a necessidade de adoção do rito disposto no CPC para o cumprimento de sentença.

No caso em tela, após ser afirmado o descumprimento do exercício da resposta, a magistrada de primeira instância fixou multa sem ouvir a parte recorrente e, quando da sua manifestação informando o cumprimento da sentença, não houve pronunciamento judicial.

Desse modo, a preliminar arguida pela Procuradoria Regional Eleitoral deve ser acolhida em parte para que seja afastada a fixação de astreintes da sentença, sem prejuízo da aplicação do disposto no § 8º do art. 58 da Lei das Eleições, em caso de descumprimento da ordem de veiculação da resposta, a qual deve ser verificada em sede de cumprimento de sentença, de acordo com o procedimento previsto na legislação processual civil comum.

Por esses fundamentos, restam anulados os atos decisórios posteriores à sentença que aplicaram as astreintes aos recorrentes (pena de multa diária de R$ 5.000,00, em caso de descumprimento).

Como consequência, em virtude do julgamento importar em situação mais benéfica aos recorrentes, tem-se o parcial provimento do recurso.

ANTE O EXPOSTO, acolho em parte a matéria preliminar e VOTO pelo provimento parcial do recurso para manter a sentença de procedência do pedido de direito de resposta, afastar a fixação de astreintes, sem prejuízo da aplicação do disposto no § 8º do art. 58 da Lei das Eleições, em caso de demonstração de descumprimento da ordem de veiculação da resposta, a qual deve ser verificada em sede de cumprimento de sentença, de acordo com o procedimento previsto na legislação processual civil comum, e declaro nulos os atos decisórios posteriores à sentença que efetivamente cominaram as astreintes aos recorrentes.