REl - 0600399-28.2024.6.21.0007 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/12/2024 00:00 a 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo. A sentença foi publicada no Mural Eletrônico da Justiça Eleitoral em 04.10.2024 e o recurso foi interposto em 05.10.2024. Presentes os demais pressupostos atinentes ao recurso em espécie, conheço do apelo.

 

PRELIMINAR

O recorrente alega, preliminarmente, a ocorrência de cerceamento de defesa, sob argumento de que lhe fora negada dilação probatória, ao fundamento, na sentença, de que a diligência requerida na contestação não interferiria no mérito do pedido objeto da demanda, uma vez que a motivação administrativa para a realização do ato não legitimaria a propaganda tida por irregular.

Adianto que tenho não assistir razão ao recorrente.

Como bem colocado no parecer ministerial, o Superior Tribunal de Justiça possui pacífico entendimento na direção de que o Juiz possui ampla liberdade de analisar a conveniência e necessidade de dilação probatória, podendo indeferir pedidos de produção de prova adicional ou de perícia, quando entender que a prova carreada aos autos é suficiente para o deslinde da causa.

No caso, o recorrido, enquanto representante juntou aos autos documento extraído do Portal da Transparência da Prefeitura Municipal de Bagé (ID 45754308, p. 2), ao intuito de comprovar que os fatos imputados ao ora recorrente se revestiriam de fato sabidamente inverídico.

O recorrente, por sua vez, juntou aos autos, em sua contestação cópia de dois contracheques (ID 45754325 – onde consta o valor total bruto de R$ 48.185,75; e ID 45754326 – onde consta o valor de R$ 25.630,30) de competência 07/2024. O próprio recorrente, na peça de contestação afirma: “evidentemente houve um equívoco no primeiro contracheque divulgado e que foi corrigido, contudo se tratava de uma informação oficial disponível no Portal da Transparência da Prefeitura Municipal de Bagé” (ID 45754324, p. 3).

Ao julgar o mérito da demanda, a Magistrada a quo consignou que:

“em relação ao requerimento para que fosse oficiada a Secretaria Municipal competente para prestar esclarecimentos quanto à alteração do contracheque da candidata da Coligação representante, entendo que a diligência requerida não interfere no mérito do pedido objeto da presente demanda, uma vez que a motivação administrativa para a realização do ato não legitima a propaganda irregular”.

Somo às razões de decidir da Magistrada de piso o fato de que, consultando o Portal da Transparência da Prefeitura Municipal de Bagé < https://transparencia.bage.rs.gov.br/#/> verifica-se que, na área de “folha de pagamento”, consta o contracheque relativo ao mês de julho/2024 com valor bruto de R$ 25.630,30. No mesmo site, na área “despesas do Executivo”, selecionando-se os pagamentos relativos ao período de 01.07.2024 à 13.09.2024 (data da veiculação da propaganda impugnada) consta a realização de um único pagamento a favor de ROBERTA ALMEIDA MERCIO no valor de R$ 25.690,65.

Nesse ponto, cumpre observar que o âmbito de cognição do juízo eleitoral é mais amplo do que o do juízo comum, estando autorizado a fazer uso de fatos públicos e notórios, indícios e presunções, além da prova produzida, de forma que restem preservados o interesse público na lisura do processo eleitoral, nos termos do art. 23 da Lei Complementar n. 64/90:

Art. 23. O Tribunal formará sua convicção pela livre apreciação dos fatos públicos e notórios, dos indícios e presunções e prova produzida, atentando para circunstâncias ou fatos, ainda que não indicados ou alegados pelas partes, mas que preservem o interesse público de lisura eleitoral.

Portanto, na esteira do parecer do Ministério Público Eleitoral, rejeito a preliminar de cerceamento de defesa, suscitada pelo recorrente.

Passo à análise do mérito recursal.

 

MÉRITO

Conforme relatado, LÉLIO NUNES LOPES FILHO interpõe recurso contra decisão que julgou parcialmente procedente representação por propaganda eleitoral irregular em face da veiculação de informações sabidamente inverídicas, proposta pela COLIGAÇÃO BAGÉ PARA TODOS.

A postagem objeto da representação possui o seguinte texto transcrito:

“Robertinha Lara, esse vídeo é pra ti. Tu deve tá com bastante tempo e muito preocupada com a campanha do Mainardi, ao invés de cuidar da tua, inclusive preocupada com o jantar do Mainardi que vai ser feito hoje para receber os empresários de Bagé, mas deixa eu te dizer uma coisa, esse vídeo teu que tá rolando aqui na internet. Aqui falando sobre o assunto, deveria ser com outra preocupação eu acho. Até porque os mesmos empresários que vão participar hoje até porque esse jantar é pra receber eles pra falar sobre o desenvolvimento da região sobre as propostas de futuro. São os mesmos empresários, que vocês castigaram ao longo do tempo, aumentando IPTU, aumentando alvará de licenciamento das empresas, não apostando nas empresas locais. E deixa eu te dizer mais, quem sabe com aquele contracheque que tu recebeu do último mês como CC do Divaldo Lara, aquele de mais de 40 mil, até tu poderia explicar né, como que tu recebeu tanto dinheiro e poderia até pegar um pouco desse dinheiro e comprar um convite pra ir lá hoje, conhecer um pouco mais sobre política saber como funciona uma gestão e também sobre gestão, até eu posso te ensinar um pouco porque eu sou formado em gestão pública, administração. Isso eu posso te ensinar ou o Mainardi, muito mais pela experiência que tem. Tá certo? Fica a dica ai só pra te dizer. Esse jantar é um financiamento coletivo, ao contrário da campanha de vocês que aparece dinheiro de tudo que é lado e a gente não sabe da onde saiu esse dinheiro” Grifei.

A sentença de origem considerou que houve a veiculação de fato sabidamente inverídico pelo recorrente ao fazer afirmações quanto ao contracheque da candidata à época em que houve a disseminação da notícia, não havendo procedência a alegação de trata-se de fato controverso, induzido por eventual erro da Administração Municipal ao publicar o documento, inicialmente.

Tenho que andou bem a sentença.

Conforme já colocado no enfrentamento da preliminar de cerceamento de defesa, verifico que não houve a devida averiguação do conteúdo contido no contracheque quando foi veiculada a propaganda objeto da demanda. Nesse ponto, não procede a alegação de não ser exigível que se verificasse se houve eventual retificação do dado publicado, uma vez que era plenamente verificável à época da postagem não só o valor do contracheque, mas, também, os respectivos valores dispendidos pela Prefeitura.

Logo, tratando-se de incumbência mínima atribuída ao recorrente, observa-se que a publicação traz informações sabidamente inverídicas, nos termos do art. 9º-C, da Resolução TSE 23.610/2019:

Art. 9º-C É vedada a utilização, na propaganda eleitoral, qualquer que seja sua forma ou modalidade, de conteúdo fabricado ou manipulado para difundir fatos notoriamente inverídicos ou descontextualizados com potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

 

Em análise detida dos documentos juntados aos autos e das alegações do recorrente e da Coligação recorrida, concluo que a postagem vai de encontro à verdade fática, visto que no momento de sua publicação, uma simples verificação no Portal da Transparência da Prefeitura de Bagé afastaria qualquer controvérsia quanto ao afirmado.

Dessa forma, restando patente a existência de irregularidade na propaganda objeto da presente representação, a manutenção da procedência é medida que se impõe.

Outrossim, caberia ao caso a incidência de sanção pecuniária, dada a interpretação dada pelo TSE no sentido de ser cabível aplicar-se a multa prevista no art. 57-D, § 2º, da Lei 9.504/97 na hipótese de abuso na liberdade de expressão ocorrido por meio de propaganda veiculada na internet:

Eleições 2022. [...] Representação eleitoral. Candidato a presidente da República. Pretensão de remoção de publicação veiculada no horário eleitoral gratuito na televisão e nas redes sociais. Liminar deferida. Decisão referendada. Fatos manifestamente inverídicos. Aplicação da multa prevista no § 2º do art. 57-D da Lei n. 9.504/1997. Possibilidade. Jurisprudência do tribunal superior eleitoral fixada para as eleições 2022. Alcance do conteúdo veiculado. Cominação de multa. 1. Nos termos da jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral fixada para as Eleições 2022, permanece o interesse na remoção e abstenção de veiculação de propaganda eleitoral irregular depois do término do processo eleitoral, não havendo perda superveniente de objeto no caso.    2. A multa prevista no § 2º do art. 57-D da Lei n. 9.504/1997 incide sobre casos de disseminação de conteúdo sabidamente falso em propaganda eleitoral veiculada na internet, nos termos da jurisprudência deste Tribunal Superior fixada para as eleições de 2022. 3. São critérios objetivos a serem considerados para a fixação da multa, nos termos de recente precedente deste Tribunal Superior: a) a reiteração da propagação de conteúdo sabidamente inverídico; b) o número de seguidores; c) o alcance da veiculação; d) a proximidade do pleito. 4. Recurso provido para julgar procedente a representação, cominando multa aos representados, determinando a remoção do conteúdo veiculado e abstenção de nova veiculação [...] (Ac. de 2.4.2024 no REC-Rp n. 060100448, rel. Min. Cármen Lúcia.) Grifei.

No entanto, a ausência de recurso impugnando o ponto impede o agravamento da situação do recorrente no bojo do seu próprio recurso, em observância ao princípio da non reformatio in pejus.

Nesse passo, tenho que a sentença deve ser mantida nos seus exatos termos.

Ante o exposto, VOTO por REJEITAR a preliminar de cerceamento de defesa suscitada e, no mérito, NEGAR PROVIMENTO ao recurso interposto por LÉLIO NUNES LOPES FILHO.