REl - 0600040-43.2024.6.21.0051 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/12/2024 00:00 a 23:59

VOTO

O recurso interposto é regular, adequado e tempestivo, e por atender todos os pressupostos processuais relativos à espécie é que está a comportar conhecimento.

No mérito, GEISON DIONÍSIO DE FREITAS insurge-se contra a sentença que julgou procedente a representação por propaganda eleitoral irregular, consistente em suposta divulgação de vídeo com conteúdo negativo impulsionado na rede social Instagram, ajuizada por HELIOMAR ATHAYDES FRANCO. A decisão hostilizada aplicou multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) ao recorrente.

Em síntese, GEISON alega o não direcionamento das críticas políticas ao recorrido HELIOMAR, e sim para quaisquer vereadores e candidatos a prefeito, em situação que, conforme alega, seria admitida pelo Tribunal Superior Eleitoral. Aduz que a magistrada não possuiria isonomia em suas decisões sobre casos idênticos e indica processo de número 0600051- 72.2024.6.21.0051 como referência para tal afirmação. Invoca os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade no concernente à aplicação da multa.

No campo normativo, a propaganda eleitoral, inclusive a vedação à propaganda impulsionada negativa, está disciplinada na Lei n. 9.504/97, regulamentada pela Resolução TSE n. 23.610/19, da qual reproduzo as disposições pertinentes:

Art. 27. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição (Lei nº 9.504/1997, art. 57- A) . ( Vide, para as Eleições de 2020, art. 11, inciso II, da Resolução nº 23.624/2020 )

§ 1º A livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos, observado o disposto no art. 9º-A desta Resolução. (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

(...)

Art. 27-A. O provedor de aplicação que preste serviço de impulsionamento de conteúdos político-eleitorais, inclusive sob a forma de priorização de resultado de busca, deverá: (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

(...)

§ 1º Para os fins desse artigo, caracteriza conteúdo político-eleitoral, independente da classificação feita pela plataforma, aquele que versar sobre eleições, partidos políticos, federações e coligações, cargos eletivos, pessoas detentoras de cargos eletivos, pessoas candidatas, propostas de governo, projetos de lei, exercício do direito ao voto e de outros direitos políticos ou matérias relacionadas ao processo eleitoral. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

(...)

Art. 28. A propaganda eleitoral na internet poderá ser realizada nas seguintes formas (Lei nº 9.504/1997, art. 57-B, I a IV) :

I - em sítio da candidata ou do candidato, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de aplicação de internet estabelecido no país;

II - em sítio do partido político, da federação ou da coligação, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral e hospedado, direta ou indiretamente, em provedor de aplicação de internet estabelecido no país; (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

III - por meio de mensagem eletrônica para endereços cadastrados gratuitamente pela candidata ou pelo candidato, pelo partido político, pela federação ou pela coligação desde que presente uma das hipóteses legais que autorizam o tratamento de dados pessoais, nos termos dos arts. 7º e 11 da Lei nº 13.709/2018 ; (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

IV - por meio de blogs, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e aplicações de internet assemelhadas, dentre as quais aplicativos de mensagens instantâneas, cujo conteúdo seja gerado ou editado por: (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

a) candidatas, candidatos, partidos políticos, federações ou coligações, desde que não contratem disparos em massa de conteúdo nos termos do art. 34 desta Resolução ( Lei nº 9.504/1997, art. 57-J ); ou (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

b) pessoa natural, vedada: (Redação dada pela Resolução nº 23.732/2024)

1. a contratação de impulsionamento e de disparo em massa de conteúdo nos termos do art. 34 desta Resolução (Lei nº 9.504/1997, art. 57-J); (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

(...)

§ 1º Os endereços eletrônicos das aplicações de que trata este artigo, incluídos os canais publicamente acessíveis em aplicativos de mensagens, fóruns online e plataformas digitais, salvo aqueles de iniciativa de pessoa natural, deverão ser comunicados à Justiça Eleitoral impreterivelmente: (Redação dada pela Resolução nº 23.732/2024)

(...)

§ 5º A violação do disposto neste artigo sujeita a usuária ou o usuário responsável pelo conteúdo e, quando comprovado seu prévio conhecimento, a pessoa beneficiária, à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) ou em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa (Lei nº 9.504/1997, art. 57-B, § 5º) .

§ 6º A manifestação espontânea na internet de pessoas naturais em matéria político-eleitoral, mesmo que sob a forma de elogio ou crítica a candidata, candidato, partido político, federação ou coligação, não será considerada propaganda eleitoral na forma do inciso IV do caput deste artigo, desde que observados os limites estabelecidos no § 1º do art. 27 desta Resolução. (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

(...)

§ 7º Para os fins desta Resolução, inclui-se entre as formas de impulsionamento de conteúdo a priorização paga de conteúdos resultantes de aplicações de busca na internet (Lei nº 9.504/1997, art. 26, § 2º) .

§ 7º-A. O impulsionamento de conteúdo em provedor de aplicação de internet somente poderá ser utilizado para promover ou beneficiar candidatura, partido político ou federação que o contrate, sendo vedado o uso do impulsionamento para propaganda negativa. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

§ 7º-B. É vedada a priorização paga de conteúdos em aplicações de busca na internet que: (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

I - promova propaganda negativa; (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

II - utilize como palavra-chave nome, sigla, alcunha ou apelido de partido, federação, coligação, candidata ou candidato adversário, mesmo com a finalidade de promover propaganda positiva do responsável pelo impulsionamento; (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

III – ou difunda dados falsos, notícias fraudulentas ou fatos notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados, ainda que benéficas à usuária ou a usuário responsável pelo impulsionamento. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

(...)


Art. 29. É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos políticos, federações, coligações, candidatas, candidatos e representantes (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, caput ). (Redação dada pela Resolução nº 23.671/2021)

§ 1º É vedada, ainda que gratuitamente, a veiculação de propaganda eleitoral na internet em sítios (Lei nº 9.504/1997, art. 57- C, § 1º, I e II) :

I - de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos;

II - oficiais ou hospedados por órgãos ou por entidades da administração pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

§ 2º A violação do disposto neste artigo sujeita a(o) responsável pela divulgação da propaganda ou pelo impulsionamento de conteúdos e, quando comprovado seu prévio conhecimento, a pessoa beneficiária, à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) ou em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, § 2º) .

§ 3º O impulsionamento de que trata o caput deste artigo deverá ser contratado diretamente com provedor da aplicação de internet com sede e foro no país, ou de sua filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecida(o) no país e apenas com o fim de promover ou beneficiar candidatas e candidatos ou suas agremiações, vedada a realização de propaganda negativa (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, § 3º).

(Grifei.)

 

Ou seja, a legislação admite a propaganda eleitoral na internet, vedadas (i) a ofensa à honra ou à imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, e (ii) a divulgação de fatos sabidamente inverídicos, em sítio da candidata ou do candidato, com endereço eletrônico comunicado à Justiça Eleitoral.

Friso que o impulsionamento de conteúdo, em provedor de aplicação de internet, somente poderá ser utilizado para promover ou beneficiar candidatura, partido político ou federação, sendo vedado o uso do impulsionamento para propaganda negativa de adversários.

À análise pormenorizada do caso dos autos.

Contextualizo: o vídeo impugnado teria sido produzido em resposta a postagem ocorrida na véspera, com e seguinte texto:

Apenas duas bombas funcionando e 4 espaços vazios. GESTÃO É PREVENÇÃO e RESPONSABILIDADE. Quando a chuva chegar, a casa de bombas precisa estar funcionando plenamente, para que não ocorram mais tragédias, mas esse governo não antecipa os problemas e depois quem paga é o povo!

 

Segue, agora, o teor da propaganda impugnada:

Estamos em tempo seco, meu galo.

Quero falar contigo bem rapidinho. To chegando aqui na minha plenária, a gente tá com mobilização hoje, mas eu eu vi um troço ridículo agora, no celular (...).

Vi um vereador da cidade, que nunca botou os pés numa casa de bombas – se tivesse trabalhado os quatro anos como um político deveria fazer conheceria o sistema, mas é que não adianta, não aparece (é como em copa de mundo, a cada quatro anos), com o candidato a prefeito que conhece menos ainda. Mas esse não conhece...tenho certeza que chegou lá na João Correia com GPS - falando sobre o funcionamento das bombas.

Deixa eu falar pros dois, pro vereador e pro candidato a prefeito:

Estamos em tempo seco, meu galo. E é assim que se faz manutenção. Não se faz manutenção durante temporal. Se tivesse acompanhado o trabalho da maior autarquia da cidade conheceria, mas não conhece porque não trabalhou e, agora, fazendo a politicagem, aquela mais barata, dessa galera que se diz o novo mas tá fazendo aquele tomá lá dá cá mais antigo que a gente vê.

Tá tentando fazer politicagem com a desgraça, com a dor das pessoas. Indo num lugar atingido. Indo num lugar onde a enchente machucou todo mundo, fazendo a politicagem mais suja e mais barata (...)

 

Evidenciado, desde já, o caráter de crítica. Mesmo o recorrente indica que o comentário se tratou de crítica indireta, a qualquer dos vereadores ou candidato a prefeito.

Ou seja, destaco que o teor da crítica, em si, não poderia ser considerado reprovável - diga-se expressamente, o conteúdo da fala do recorrente encontra-se nos limites aceitos, de fato, pela jurisprudência do TSE no embate político: crítica dura, ácida, irônica. Quanto ao presente ponto, não há irregularidade.

Ocorre, contudo, que as publicações foram postadas em páginas da internet e impulsionadas, o que pode ser confirmado na Biblioteca de anúncios da Plataforma Meta.

Contra tal situação - incontroversa - o recorrente sequer se insurge.

Ou seja, a aplicação da sanção pecuniária impunha-se, no que andou bem a sentença. Trata-se de efeito objetivo da desobediência aos termos legais. 

Por outro lado, o recorrente pugna pela redução da multa ao patamar mínimo, pleito que merece acolhimento, no que lhe assiste alguma razão. Este Tribunal, em linha com o e. TSE, reserva a aplicação de multas em valores acima do mínimo legal para casos em que, por exemplo, está configurada a reincidência:

ELEIÇÕES 2022. REPRESENTAÇÃO. CANDIDATO A PRESIDENTE DA REPÚBLICA. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET. FACEBOOK. VÍDEO. IMPULSIONAMENTO. CARÁTER NEGATIVO. INOBSERVÂNCIA DAS EXIGÊNCIAS DO ART. 29, § 5º, DA RES.-TSE 23.610. PROCEDÊNCIA. MULTA. APLICAÇÃO. ACIMA DO PATAMAR MÍNIMO. REITERAÇÃO DA CONDUTA. GRAVIDADE. REPERCUSSÃO. ART. 57-C, § 2º, DA LEI 9.504/97.

SÍNTESE DO CASO 1. Trata-se de representação ajuizada pela Coligação Pelo Bem do Brasil e Jair Messias Bolsonaro em desfavor da Coligação Brasil da Esperança e Luiz Inácio Lula da Silva, sob a alegação de que foi veiculada propaganda eleitoral negativa, alusiva às Eleições de 2022, mediante impulsionamento eletrônico na página do Facebook do representado contra o candidato representante, propagando mensagem inverídica e ofensiva à sua honra e imagem, além de não terem sido observados os requisitos formais para a publicação, em infração aos arts. 57-C, § 3º, da Lei 9.504/97 e 29, § 3º e 5º, da Res.-TSE 23.610.

ANÁLISE DA REPRESENTAÇÃO VEDAÇÃO AO IMPULSIONAMENTO E CONTEÚDO NEGATIVO NA INTERNET. ART. 57-C DA LEI 9.504/97

2. De acordo com o art. 57-C da Lei 9.504/97, o impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral na internet somente é permitido para a finalidade de promover ou beneficiar candidatos e suas agremiações, sendo vedado esse tipo de propaganda com o intuito de criticar, prejudicar ou induzir a ideia de não voto a candidato adversário.

3. A partir da análise do conteúdo do vídeo publicado, verifica-se que, embora se refira à reprodução de trechos de pronunciamentos do então candidato Jair Messias Bolsonaro, o caráter negativo pode ser extraído das falas das pessoas entrevistadas, que foram incluídas de forma intercalada no vídeo como forma de crítica às falas do aludido candidato, além do texto de descrição das postagens, que denotam repúdio e combate ao adversário político.

INOBSERVÂNCIA DAS EXIGÊNCIAS PREVISTAS NO ART. 29, § 5º, DA RES.-TSE 23.610 4. Os representados não observaram a exigência de que todo impulsionamento deverá conter, de forma clara e legível, o número de inscrição no CNPJ ou CPF da pessoa responsável, além da indicação "propaganda eleitoral", pois a publicação impugnada apenas indicou o endereço eletrônico oficial da campanha junto ao termo "inscreva-se", evidenciando a sua irregularidade.

FIXAÇÃO DE MULTA. ART. 57-C, § 2º, DA LEI 9.504/97

5. O impulsionamento de conteúdo negativo na internet, bem como a inobservância das exigências previstas no art. 29, § 5º, da Res.-TSE 23.610 ensejam a imposição da multa prevista no art. 57-C, § 2º, da Lei 9.504/97.

6. A reiteração da conduta ilícita pelos representados revela a maior gravidade e repercussão da infração, o que justifica a majoração da multa acima do mínimo legal, nos termos do art. 124 da Res.-TSE 23.610.

7. Na espécie, é proporcional e razoável a fixação da multa acima do seu patamar mínimo, no valor de R$ 10.000,00, tendo em vista a reiteração da conduta ilícita, o baixo valor da contratação, o curto período de impulsionamento, a quantidade de pessoas estimadas para receber o conteúdo irregular, além da irregularidade formal constatada na publicação.

CONCLUSÃO

Representação julgada procedente.

Representação nº060147212, Acórdão, Min. Floriano De Azevedo Marques, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 13/05/2024.

 

Ademais, como já apontado, o teor da mensagem não constitui ofensa à honra ou falseamento nítido da verdade, de modo que, em conclusão, resta configurada apenas a veiculação de propaganda negativa impulsionada, mediante críticas.

Julgo que a conduta deve ser reprimida por meio de multa proporcional, no caso o mínimo legal, R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Diante o exposto, VOTO pelo parcial provimento do recurso de GEISON DIONISIO DE FREITAS, apenas para reduzir a multa aplicada na sentença ao mínimo legal, R$ 5.000,00 (cinco mil reais).