REl - 0600019-92.2024.6.21.0172 - Voto Relator(a) - Sessão: 06/12/2024 00:00 a 23:59

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, cuida-se de examinar alegada veiculação de propaganda eleitoral irregular negativa e notícias falsas contra os recorrentes, por meio de um perfil anônimo na rede social Facebook, com o nome de “Fhelipe Duarte”.

Os recorrentes defendem que está comprovado que o recorrido foi responsável por criar a página anônima usada para disseminar notícias falsas contra os candidatos, porquanto, no curso do processo, Mateus foi identificado por meio de um número de telefone supostamente vinculado a ele no cadastro do perfil “Fhelipe Duarte” no Facebook.

Entretanto, o recorrido, em autodefesa, nega veementemente a autoria e a existência de qualquer envolvimento com as publicações ou conhecimento delas em relação aos candidatos envolvidos, asseverando que (ID 45746305):

Boa tarde me chamo Mateus Kauã da Silva Ribeiro, venho comunicar que ontem dia 19/09/2024, dei ciência sobre o processo envolvendo dois vereadores da cidade de Novo Hamburgo. Corri no mesmo dia atrás de alguma defesa para o dia 21/09/2024. Não tive uma resposta positiva em relação a alguma defesa gratuita. Pois me informaram que seria impossível conseguir um profissional até o dia 21/09/2024, pois hoje estaria fechada a sede em Porto Alegre. Não tenho condições de contratar uma advogado privado. Não tenho nada a ver com a difamação dos vereadores, pois não tenho ciência e nem argumentos sobre a área da política! Não tenho acesso ao Facebook, nunca ouvi falar e saber da existência dos dois vereadores. Peço que a justiça seja feita, pois estou sendo injustiçado por algo que nunca e nem pensei em fazer.

 

Em circunstâncias similares, a jurisprudência eleitoral entende que deve haver prova robusta e inequívoca de responsabilidade em casos de postagens anônimas nas redes sociais, principalmente quando os elementos de vinculação são indiretos, como o número de telefone.

Nos autos, verificou-se que o recorrido negou categoricamente a autoria e apresentou uma narrativa coerente ao afirmar que desconhece tanto o perfil quanto os candidatos ofendidos.

Ademais, como destacado pelo juízo sentenciante, “não ficou demostrado nos autos, sem qualquer dúvida, que Mateus Kauã da Silva Ribeiro foi o responsável pela criação da página”, bem como que, “atualmente, para cadastrar uma linha pré-paga, basta comprar um chip, inserir no aparelho e digitar o CPF, razão pela qual o muitos CPFs são utilizados indevidamente para a habilitação de linhas telefônicas por terceiros”.

Com efeito, o número de telefone, isoladamente, não é um dado seguro para assegurar a identidade do titular de uma conta em rede social, tendo em vista as diversidade de situações que podem comprometer a confiabilidade da informação, dentre as quais:

a) o uso compartilhado de números de telefone dentro de determinada família ou círculo social;

b) a reutilização de números pelas operadoras de telefonia, após a transferência ou desativação da linha pelos usuários;

c) a facilidade de utilização de números pré-pagos, os quais não exigem rígidas formalidades cadastrais em sua contratação;

d) a frequente clonagem e replicação de números para utilização em fins ilícitos; e

e) o mero registro de dados incorretos ou falsos pelo efetivo responsável pelo perfil anônimo.

Nessa linha de entendimento, destaco o seguinte julgado:

Direito Eleitoral. Representação Eleitoral. Identificação de perfil anônimo em rede social. LGPD. Uso inadequado de PIX para identificação de titular de perfil. Prova insuficiente. Sentença mantida.

[…]. 4. O número de telefone, por si só, não é suficiente para garantir a correta identificação do responsável pelo perfil, considerando a possibilidade de uso compartilhado, reutilização por operadoras e registros falsos ou incompletos. 5. A prova mais adequada para identificar o titular seria a obtenção judicial do endereço de IP, conforme previsto no Marco Civil da Internet e na Resolução TSE nº 23.610/2019, o que não foi adequadamente requerido pela coligação em tempo hábil.

IV. Dispositivo e tese 6. Recurso eleitoral desprovido.Tese de julgamento: "O uso de número de telefone associado à chave PIX não é meio adequado e seguro para identificação de titular de perfil anônimo em redes sociais em processos eleitorais, devendo ser observados os trâmites legais previstos na LGPD e no Marco Civil da Internet para obtenção de dados pessoais."

Dispositivos relevantes citados: Lei nº 13.709/2018 (LGPD), arts. 6º, 7º, I e IX; Lei nº 12.965/2014 (Marco Civil da Internet), arts. 10, 15 e 22; CPC, art. 485, I e IV; Resolução TSE nº 23.610/2019, arts. 37, VIII e 39.

(TRE-PE; RECURSO ELEITORAL n.060030714, Acórdão, Des. Rodrigo Cahu Beltrao, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico do TRE-PE, 25.10.2024.) Grifei.

 

Assim, a ausência de prova concreta e cabal sobre a autoria do perfil “Fhelipe Duarte” impede um juízo condenatório em desfavor do recorrido.

Desse modo, julgo que deve ser mantida em sua integralidade a sentença que determinou a exclusão do perfil anônimo, mas entendeu não comprovada a responsabilidade de Mateus Kauã da Silva Ribeiro sobre as postagens anônimas.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.