REl - 0600471-69.2024.6.21.0086 - Voto Relator(a) - Sessão: 27/11/2024 00:00 a 23:59

VOTO

A Coligação Juntos por Três Passos, Nader Ali Umar e Jorge Leandro Dickel recorrem da condenação ao pagamento de multa, de forma individual, no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por divulgação de fatos sabidamente inverídicos em postagens veiculadas nos seus perfis de Instagram, consistentes na publicação da seguinte afirmação: “O processo, de nº 0600392-90.2024.6.21.0086, associa o perfil da ‘Fábrica de Memes’ a coligação Um Novo Tempo do candidato a prefeito Arlei Luis Tomazzoni, e Rodrigo Alencar Bohn Glinke, candidato a vice-prefeito municipal” (ID 45739187).

Reproduzo a imagem de uma das postagens veiculadas, colacionada à petição inicial (ID 45739121, p.2):

 

Cumpre contextualizar o momento em que realizadas as postagens questionadas.

Conforme consta da sentença, a recorrente, Coligação Juntos Por Três Passos, ajuizou contra a recorrida, Coligação Um Novo Tempo, os candidatos Arlei Luis Tomazzoni e Rodrigo Alencar Bohn Glinke, e os perfis de Instagram e Facebook “Fábrica De Memes”, administrados por Charles Moises Muller, a representação por propaganda eleitoral irregular Rp 0600392-90.2024.6.21.0086. Na inicial, afirmaram que as páginas de Facebook e de Instagram “Fábrica de Memes” estavam veiculando propaganda eleitoral negativa, difamatória, e divulgando fatos sabidamente inverídicos de forma anônima, contra os candidatos a prefeito e vice-prefeito de Três Passos, respectivamente, Nader Ali Umar Jorge Leandro Dickel, em violação ao art. 5°, inc. V, CF; art. 57-D, da Lei das Eleições; art. 9°-D, art. 23, § 2°, e art. 27, § 1°, todos da Resolução TSE n. 23.610/19.

Naquele processo a Coligação Juntos Por Três Passos apontou que “(…) os candidatos a majoritária da coligação representada são cientes do conteúdo da página, inclusive sendo ela ‘seguida’ pelo candidato a prefeito”. Os candidatos em questão são Arlei Luis Tomazzoni, e Rodrigo Alencar Bohn Glinke.

Após o ajuizamento da referida representação, a Juíza da 86ª Zona Eleitoral, em decisão liminar, reconheceu o caráter ofensivo das postagens quanto à imagem dos candidatos a prefeito e vice-prefeito Nader Ali Umar e Jorge Leandro Dickel, e concedeu tutela de urgência para determinar a suspensão dos perfis de redes sociais “Fábrica de Memes”, bem como a notificação da empresa META para que fornecesse os dados de autoria do conteúdo.

A seguir, os recorrentes publicaram as postagens noticiando que o processo ajuizado pela Coligação Juntos Por Três Passos associava o perfil da “Fábrica de Memes” à Coligação Um Novo Tempo e aos candidatos a prefeito e vice Arlei Luis Tomazzoni e Rodrigo Alencar Bohn Glinke, respectivamente.

Devido a tais postagens, foi ajuizada a presente representação por propaganda eleitoral irregular, na qual a Coligação Um Novo Tempo afirma que ela e os candidatos Arlei Luis Tomazzoni e Rodrigo Alencar Bohn Glinke não são administradores dos perfis de redes sociais “Fábrica de Memes”, e que os recorrentes publicaram postagem inverídica “dando a entender que o perfil ‘Fábrica de Memes’ está associado a Coligação Um Novo Tempo, sendo beneficiados com a propaganda irregular e ilegal que vem sendo feita em desfavor da coligação”.

O pedido condenatório foi julgado procedente.

O fato sabidamente inverídico, segundo a sentença, reside na circunstância de “que, no momento da divulgação da associação do perfil ‘Fábrica de Memes’ aos representantes, ainda não havia sido proferida decisão definitiva sobre o caso”.

A seu turno, os recorrentes asseveram que “não houve menção de que a liminar teria feito a associação entre os candidatos e o perfil ilegal, mas sim de que havia uma associação feita no processo de nº 0600392-90.2024.0086 com os candidatos aqui representantes, já que seguiam e curtiam a página ilegal”.

Assiste razão aos recorrentes.

Analisado o contexto em que realizadas as publicações e a literalidade do conteúdo das postagens, verifica-se que em momento algum os recorrentes afirmaram a existência de decisão associando o perfil anônimo à recorrida e seus candidatos.

Foi tão somente referido que o processo ajuizado pela Coligação Juntos Por Três Passos contra a Coligação Um Novo Tempo, os candidatos Arlei Luis Tomazzoni e Rodrigo Alencar Bohn Glinke, e os perfis “Fábrica De Memes”, contém essa associação. E esse vínculo é fato verdadeiro, verídico. Efetivamente foi efetuado pela coligação em sua petição inicial, ao indicá-los como partes, no polo passivo da representação.

O verbo utilizado nas publicações é “associar”, o qual representa o termo técnico utilizado pelo sistema Processo Judicial Eletrônico (PJe) para indicar as partes no polo passivo das ações eleitorais. O ato de “associar” ocorre quanto o procurador da parte autora, no caso, da Coligação Juntos Por Três Passos, adiciona o nome da parte demandada no processo eletrônico, durante o ajuizamento e distribuição de sua petição inicial. O procedimento consta do manual do PJe para advogados (http://www.justicaeleitoral.jus.br/arquivos/tse-manual-para-advogados-pje - p. 13):

Ademais, a representação Rp n. 0600392-90.2024.6.21.0086 não tramitou em segredo de justiça, tendo sido indeferido naqueles autos o pedido de tramitação em sigilo. Assim, qualquer interessado poderia confrontar a publicação realizada pelos recorrentes com a simples consulta ao processo judicial eletrônico, verificar que, nos termos da inicial, o nome dos candidatos e da recorrida estavam realmente associados ao processo e aos perfis “Fábrica de Memes”, bem como observar que a decisão liminar, publicada em mural eletrônico, não realizou juízo de valor sobre as postagens.

As postagens afirmam que a associação consta do processo, e não de uma decisão judicial, e nos termos fixados pelo Tribunal Superior Eleitoral: “A mensagem, para ser qualificada como sabidamente inverídica, deve conter inverdade flagrante que não apresente controvérsias” (TSE, Rp n. 367516, Relator Ministro Henrique Neves da Silva, publicado em sessão, 26.10.2010).

Em simples consulta aos autos da representação Rp n. 0600392-90.2024.6.21.0086, verifica-se que na inicial foi afirmado que os candidatos Arlei Luis Tomazzoni e Rodrigo Alencar Bohn Glinke têm conhecimento sobre as postagens veiculadas nos perfis “Fábrica de Memes”. Foram associados ao processo eletrônico, como partes, o perfil “Fábrica de Memes”, a Coligação Um Novo Tempo, Arlei Luis Tmazzoni, Rodrigo Alencar Bohn Glinke e Charles Moises Muller, após ter sido informado pelo provedor de conteúdo que este é o administrador do perfil “Fábrica de Memes”.

Portanto, é verdadeira a afirmação de que “O processo, de nº 0600392-90.2024.6.21.0086, associa o perfil da ‘Fábrica de Memes’ a coligação Um Novo Tempo do candidato a prefeito Arlei Luis Tomazzoni, e Rodrigo Alencar Bohn Glinke, candidato a vice-prefeito municipal”.

Em nenhum momento os recorrentes afirmaram que a Juíza Eleitoral, uma decisão judicial ou a Justiça Eleitoral efetuou a associação da coligação e seus candidatos aos perfis “Fábrica de Memes”. A alegação da recorrida no sentido de que a frase contida nas postagens dá a entender ter havido um pronunciamento judicial afirmando a existência de uma associação efetiva é resultado de sua interpretação subjetiva e não conduz à condenação.

Ressalto que a interpretação a ser observada sobre a propaganda eleitoral deve ser restritiva, com a intervenção mínima desta Justiça Especializada sobre a liberdade de expressão e livre manifestação do pensamento. Saliento, a esse respeito, que a própria recorrida e seus candidatos dispõem de espaços próprios de propaganda capazes de refutar as publicidades inquinadas, na esteira da jurisprudência deste Tribunal:

RECURSO. ELEIÇÃO 2020. REPRESENTAÇÃO. DIREITO DE RESPOSTA. PROPAGANDA ELEITORAL. RÁDIO. IMPROCEDENTE. INFORMAÇÃO SABIDAMENTE INVERÍDICA PERCEPTÍVEL DE PLANO. INOCORRÊNCIA. DESPROVIMENTO. 1. Recurso interposto contra sentença que julgou improcedente pedido de direito de resposta em razão de afirmações divulgadas no programa eleitoral obrigatório veiculado no rádio. 2. O art. 58 da Lei n. 9.504/97 dispõe que, a partir da escolha em convenção, é assegurado o direito de resposta aos candidatos, partidos ou coligações atingidos por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica. 3. Apenas a afirmação sabidamente inverídica, ou seja, a deliberada distorção da verdade sobre fatos incontroversos, dará ensejo à concessão do direito de resposta, para permitir da forma mais ampla possível o embate de ideias e opiniões entre os candidatos. 4. Na hipótese, a mensagem impugnada não traz informação sabidamente inverídica, devendo a propaganda ser rebatida por meios próprios pelo recorrido, uma vez que se recomenda a intervenção mínima do Judiciário nas manifestações e críticas próprias do embate político, sob pena de se tolher substancialmente o conteúdo da liberdade de expressão. 5. A jurisprudência segue a mesma compreensão, conforme se verifica pelas conclusões a que chegou o TSE sobre o tema em diversos julgados: ‘o fato sabidamente inverídico a que se refere o art. 58 da Lei n. 9.504/97, para fins de concessão de direito de resposta, é aquele que não demanda investigação, ou seja, deve ser perceptível de plano’. 6. Desprovimento.

(TRE-RS - REL: 060051408 CANOAS - RS, Relator Desembargador Eleitoral Roberto Carvalho Fraga, Data de Julgamento: 23.11.2020, Publicado em Sessão, 24.11.2020, grifei e sublinhei.)

 

Dessa forma, divirjo das conclusões do parecer da Procuradoria Regional Eleitoral no sentido de houve vinculação da publicação a uma suposta decisão liminar.

Concluo que o recurso comporta provimento, pois a sentença merece reforma para o fim de ser julgada improcedente a representação e afastadas as condenações impostas aos recorrentes.

Ante o exposto, VOTO pelo provimento do recurso, para reformar a sentença e julgar improcedente a presente representação, afastando as penalidades impostas aos recorrentes.