REl - 0600524-38.2024.6.21.0090 - Voto Relator(a) - Sessão: 08/11/2024 00:00 a 23:59

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo, visto que intimado o recorrente em 11.9.2024, o recurso fora interposto em 12.9.2024 e merece conhecimento por atender aos demais pressupostos relativos à espécie.

PRELIMINAR

O caso em tela possui as mesmas partes, objeto e causa de pedir do processo REl 0600521-83.2024.6.21.0090, de relatoria do Excelentíssimo Desembargador Eleitoral Volnei dos Santos Coelho, visto tratar os presentes autos de reedição do material impugnado naquela representação.

Naquele feito, foi suscitada, de ofício, a preliminar prejudicial de mérito e reconhecida a desobediência ao art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 23.608/19, ao efeito de indeferir a petição inicial e declarar nulo todo o processo, desde a apresentação da petição inicial; mantendo-se apenas a exclusão dos links postados na rede social Facebook, afastando-se o dever de oferecer direito de resposta e dando-se parcial provimento ao recurso, para o fim de afastar a multa aplicada pela prática de propaganda antecipada negativa, nos termos da fundamentação. O acórdão restou assim ementado:

Direito eleitoral. Eleição 2024. Recurso. Propaganda eleitoral irregular. Direito de resposta. Cumulação de pedidos. Impossibilidade. Indeferimento da petição inicial. Nulidade processual. Multa afastada. Recurso parcialmente provido.

I. CASO EM EXAME

1.1. Recurso interposto contra sentença que julgou procedente representação por propaganda eleitoral antecipada negativa, cumulada com pedido de direito de resposta.

1.2. A sentença confirmou a tutela de urgência para retirada de publicações no Facebook e determinou a veiculação de direito de resposta, além de impor multa.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. A validade da cumulação dos pedidos de propaganda irregular e direito de resposta, à luz da Resolução TSE n. 23.608/19.

2.2. A aplicação de multa por propaganda antecipada negativa, considerando as alegações do recorrente.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. A Resolução TSE n. 23.608/19, art. 4º, veda expressamente a cumulação de pedido de direito de resposta com a aplicação de multa por propaganda irregular, estabelecendo a obrigatoriedade de indeferimento da petição inicial em tais casos.

3.2. As demandas de direito eleitoral veiculam, para além dos interesses das partes, questões de ordem pública, tais como a manutenção da isonomia entre os candidatos, a liberdade de expressão lato sensu e a higidez do debate democrático, de modo que incumbe ao magistrado, no caso esta Corte, decretar de ofício a mácula que fere a demanda.

3.3. Ainda que tenha gerado efeitos no mundo dos fatos, retirada de links do Facebook e a irreversível divulgação de vídeo com direito de resposta, a sentença é nula – aliás, é nulo todo o processo antecedente, devendo tal nulidade retroceder até a ocasião da apresentação da petição inicial, que deve ser indeferida.

3.4. O provimento do recurso será, assim, parcial, apenas para afastar do mundo dos fatos o efeito da sentença ainda passível de modificação, qual seja, a aplicação de multa.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso parcialmente provido. Nulidade do processo decretada desde a apresentação da petição inicial, mantendo-se apenas a remoção das postagens no Facebook e afastando-se o direito de resposta e a multa imposta.

4.2. De ofício, indeferir a petição inicial, por desobediência ao art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 23.608/19, e declarar nulo todo o processo desde a apresentação da petição inicial, mantida apenas a exclusão dos links postados no Facebook, afastando-se o dever de oferecer direito de resposta, e dar parcial provimento ao recurso, para fins de afastar a multa aplicada pela prática de propaganda antecipada negativa, nos termos da fundamentação.

Tese de julgamento: "É incabível a cumulação de pedidos de direito de resposta e de aplicação de multa por propaganda eleitoral irregular, conforme o art. 4º da Resolução TSE n. 23.608/19, acarretando o indeferimento da petição inicial."

Dispositivos relevantes citados: Lei n. 9.504/97, arts. 36, 58 e 96; Resolução TSE n. 23.608/19, art. 4º.

Jurisprudência relevante citada: TRE-SE, RE 06006131620206110014, Rel. Des. Gilberto Lopes Bussiki, julgado em 11/11/2021, DEJE 18/11/2021.

Vejo que a solução ao presente recurso deve ser nos exatos termos já decidido por esta Corte no precedente citado.

Há de se ressaltar que a representação por propaganda eleitoral irregular possui rito diverso do pedido de direito de resposta: enquanto o primeiro está previsto no art. 96 da Lei 9.504/97, o segundo está contido nos arts. 58 e 58-A da Lei das Eleições. Dessa forma, há entre ambos incompatibilidade processual intransponível, nos termos do art. 327, inc. III, do Código de Processo Civil.

Nesse sentido, há previsão expressa na Resolução TSE n. 23.608/19, art. 4º, caput, proibindo-se a cumulação de pedidos, sob pena de indeferimento da petição inicial:

Art. 4º É incabível a cumulação de pedido de direito de resposta com pedido de aplicação de multa por propaganda eleitoral irregular, ainda que diga respeito aos mesmos fatos, sob pena de indeferimento da petição inicial.

Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo não impede a análise de pedido de suspensão, remoção ou proibição de nova divulgação da propaganda apontada como irregular.

Ou seja, o texto é expresso na proibição, com efeitos bem claros no caso de seu descumprimento, de modo que não se vê necessidade de maiores detalhamentos.

Como muito bem citado pelo douto Desembargador Eleitoral Volnei dos Santos Coelho na representação anteriormente submetida a este Colegiado, este feito padece das mesmas atecnias processuais, onde dever-se-ia ter sido indeferida a petição inicial, havendo, apenas, espaço para intervenção do Magistrado a quo em sede de exercício de poder de polícia para determinar a exclusão de conteúdo das manifestações do recorrente de seu perfil no Facebook.

Ainda que tenha gerado efeitos no mundo dos fatos com a retirada do conteúdo da rede social Facebook, todo o processo padece de nulidade, uma vez que a petição inicial deveria ter sido indeferida.

Mesmo que se flexibilizasse tal prescrição normativa, em prol da primazia do mérito, ao entendimento de que se deveria extinguir a demanda no tocante à aplicação de multa e manter-se o pedido de direito de resposta, lembro que nesse tocante é pacífico o entendimento de que a atuação da Justiça Eleitoral está adstrita ao período eleitoral, não existindo interesse de agir na análise de direito de resposta por suposta ofensa veiculada quando já finalizado o período eleitoral.

Assim, de acordo com a jurisprudência desta Corte e do Tribunal Superior Eleitoral, após o resultado das eleições e o consequente encerramento dos atos de campanha e do pleito eleitoral, não mais persiste interesse jurídico quanto ao direito de resposta por suposta ofensa proclamada na internet. Vide:

ELEIÇÕES 2018. REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. PROPAGANDA IRREGULAR. FAKE NEWS. REMOÇÃO DE CONTEÚDO. DIREITO DE RESPOSTA. PERDA DO INTERESSE DE AGIR. APLICAÇÃO DE MULTA. ART. 57–D, § 2º da Lei 9.504/97. PEDIDO LIMINAR. INDEFERIMENTO. RECURSO INOMINADO. PREJUDICADO. SÍNTESE DO CASO.

1. Trata–se de representação ajuizada pela Coligação O Povo Feliz de Novo em face de Google Brasil Internet Ltda., Twitter Brasil Rede de Informação Ltda., Facebook Serviços Online do Brasil Ltda., Prime Comunicação Digital Ltda. – ME – e em desfavor da pessoa responsável pelos blogs Deus Acima de Todos e Presidente Bolsonaro, com pedido liminar, pleiteando a remoção de postagens realizadas em redes sociais na internet com conteúdos supostamente inverídicos e ofensivos, assim como a concessão de direito de resposta e a imposição de multa ao responsável por divulgação da propaganda eleitoral irregular, com base nos arts. 57–D, § 2º, e 58 da Lei 9.504/97.

(...)

4. De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior: “uma vez encerrado o processo eleitoral, com a diplomação dos eleitos, cessa a razão de ser da medida limitadora à liberdade de expressão, consubstanciada na determinação de retirada de propaganda eleitoral tida por irregular, ante o descompasso entre essa decisão judicial e o fim colimado (tutela imediata das eleições). Eventual ofensa à honra, sem repercussão eleitoral, deve ser apurada pelos meios próprios perante a Justiça Comum” (REspe 529–56, rel. Min. Admar Gonzaga, DJE de 20.3.2018).

(...)

6. Já tendo sido proclamado o resultado das eleições, portanto, encerrados os atos de campanha e o pleito eleitoral, não haveria igualmente interesse de agir na concessão do direito por suposta ofensa veiculada na internet. (Representação nº 060169771, Acórdão, Relator(a) Min. Sergio Silveira Banhos, Publicação: DJE - Diário da justiça eletrônica, Tomo 229, Data 10/11/2020, Página 0) (Grifei.)

Portanto, ao reconhecer a nulidade de toda a instrução processual, pois incabível a demanda nos moldes propostos, a solução possível é dar parcial provimento ao recurso para apenas afastar do mundo dos fatos o efeito da sentença ainda passível de modificação, qual seja, a aplicação de multa imputada por propaganda irregular.

Diante do exposto, VOTO para, de ofício, indeferir a petição inicial da COLIGAÇÃO PRA GUAÍBA SEGUIR EM FRENTE, por desobediência ao art. 4º, caput, da Resolução TSE n. 23.608/19, e declarar nulo todo o processo, desde a apresentação da petição inicial, mantida apenas a exclusão dos links postados no Facebook, afastando-se o dever de oferecer direito de resposta, e dar PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de ALESSANDRO DOS SANTOS ALVES, para fins de afastar a multa aplicada pela prática de propaganda negativa, nos termos da fundamentação.