REl - 0600601-27.2020.6.21.0142 - Voto Relator(a) - Sessão: 07/11/2024 às 19:00

VOTO

Conforme observa-se do exame dos autos, neste feito houve prolação de sentença de julgamento das contas como não prestadas, porque os candidatos não atenderam à intimação para que apresentassem a mídia eletrônica com a documentação contábil gerada pelo Sistema de Prestação de Contas de Campanha Eleitoral (SPCE). Em vez desse procedimento, enviaram um e-mail (ID 44964040).

A sentença foi anulada para que as contas fossem examinadas por acórdão deste Tribunal, que deu provimento ao recurso interposto (ID 44964077), determinando a reabertura da instrução e a análise das contas (ID 45399670).

O feito baixou à origem, e as contas foram examinadas, sobrevindo a juntada de parecer de exame o qual apontou uma série de irregularidades e falta de juntada de peças essenciais, omissão de receitas e gastos eleitorais, divergências entre os dados dos fornecedores constantes da prestação de contas e as informações constantes da base de dados da Secretaria da Receita Federal do Brasil, localização de notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais não declarados, caracterizadoras de recebimento de recursos de origem não identificada (ID 45640709).

Os candidatos foram intimados para sanar as falhas, requereram dilação de prazo (ID 45640719) e depois manifestaram-se no seguinte sentido: “Tendo em vista o teor do acórdão constante do ID. 113151416 que declarou nulidade do feito a partir da decisão do ID. 44964041 e determinou o retorno dos autos à origem, requer a análise dos documentos juntados pelo prestador de contas, a fim de dar prosseguimento ao regular processamento das contas” (ID 45640725).

Os prestadores não apresentaram documento algum para corrigir as irregularidades constatadas no parecer de exame das contas que foi juntado aos autos.

A seguir, as contas foram submetidas a parecer conclusivo, o qual manteve o apontamento das falhas anteriormente constatadas, assim descritas: a) falta de juntada de peças essenciais; b) omissão de receitas e gastos eleitorais com combustíveis, sem registro de cessão ou locação de veículos, carro de som ou geradores de energia, no montante de R$ 900,00 oriundos de recursos procedentes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC); c) divergência entre os dados de fornecedor constantes da prestação de contas e as informações constantes da base de dados da Secretaria da Receita Federal do Brasil; d) localização de notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais não declarados, caracterizadoras de recebimento de recursos de origem não identificada, no total de R$ 2.512,60 (ID 45640879).

Intimados os prestadores tão somente apresentaram extratos bancários e afirmaram, sem juntada de novos documentos ou retificação das contas, que: “já houve o envio das despesas por meio das mídias eletrônicas enviadas por e-mail (ID. 102325424), razão pela qual não merece prosperar tal irregularidade”.

Em manifesta desconsideração do fato de que o processo de prestação de contas é judicial e deve ser julgado com a prova juntada aos autos, produzida pelo próprio prestador, e do dever dos candidatos de apresentar à Justiça Eleitoral sua completa escrituração contábil, os prestadores, ao longo de toda a instrução processual, limitaram-se a afirmar: “toda a documentação pertinente para a análise e apreciação das contas foram enviados pelo prestador de contas através da mídia eletrônica” (ID 45640886).

O exame técnico não foi limitado. Os prestadores é que não forneceram justificativa alguma nem apresentaram documentos nos autos para sanar as falhas, as quais são graves e não se tratam de equívocos meramente formais.

A boa-fé não afasta o dever de apresentar documentos para justificar os gastos, e os autos revelam má aplicação de recursos públicos do FEFC.

Veja-se que os recorrentes não apresentaram, nos autos, nenhuma prova para sanar as irregularidades constatadas, razão pela qual sobreveio a juntada de novo parecer conclusivo indicando a desaprovação das contas (ID 45640895).

A seguir, os prestadores afirmaram que as falhas constatadas são meramente formais e postularam a aprovação das contas (ID 45640903). Sobreveio a juntada de novo parecer conclusivo mantendo a análise técnica já realizada (ID 45640908).

Novamente os candidatos manifestaram-se, insistindo no pedido de aprovação das contas, e o feito foi sentenciado com base na acolhida do parecer conclusivo, restando as contas desaprovadas. A decisão condenou os recorrentes ao recolhimento do montante de R$ 4.796,82 por irregularidades na comprovação de recursos procedentes do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).

A sentença foi clara, está bem fundamentada, enfrentou todos os argumentos apresentados ao longo da instrução, os quais se limitaram a afirmar que a prova sobre a movimentação financeira foi fornecida em mídia eletrônica, e em nenhum momento houve negativa de prestação jurisdicional ou violação aos arts. 93, inc. IX, da CF, c/c o art. 489, § 1º, inc. IV, do CPC.

Contudo, verifica-se ter havido equívoco na soma aritmética contida na decisão recorrida, pois os valores que devem ser efetivamente recolhidos são somente os relativos à falta de comprovação da aplicação de recursos do FEFC relativos aos gastos com combustíveis de R$ 900,00 - diante da falta de juntada, nos autos, de provas de cessão ou locação de veículos, carro de som ou geradores de energia - e os que se referem às notas fiscais emitidas contra o CNPJ da candidatura, localizadas a partir dos dados fornecidos pelas secretarias fazendárias, que não foram declaradas e totalizam R$ 2.512,60, conforme tabelas contidas na sentença e todos os pareceres técnicos juntados durante a tramitação:

 

Conforme art. 79, § 1º, da Resolução TSE n. 23.607/19: “Ausente a comprovação da utilização dos recursos do Fundo Partidário (FP) e/ou do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) ou comprovada a utilização indevida, a execução da decisão que julgar as contas, após o seu trânsito em julgado, determinará a devolução do valor correspondente na forma estabelecida pela Res.-TSE n. 23.709/22”.

Efetivamente, não foi esclarecido, nos autos do processo, apesar das diversas intimações, por qual motivo houve despesas com combustíveis, se os candidatos não declaram uso de veículos na campanha.

Além disso, foram emitidas notas fiscais não declaradas nas contas, cujos valores utilizados para pagamento não transitaram pelas contas de campanha. De acordo com o art. 32 da Resolução TSE n. 23.607/19: “Os recursos de origem não identificada não podem ser utilizados por partidos políticos e candidatas ou candidatos e devem ser transferidos ao Tesouro Nacional por meio de Guia de Recolhimento da União (GRU)”.

O total a ser recolhido ao erário é de R$ 3.412,60 (R$ 900,00+R$ 2.512,60), e essa quantia representa 45,35% do total da arrecadação (R$ 7.524,25), não se revelando razoável, adequado e proporcional o juízo de aprovação das contas, uma vez que o valor é superior a 10% da receita e é mais elevado do que o patamar de R$ 1.064,10 para o qual o TSE dispensa contabilização (art. 43, da Resolução TSE n. 236.607/19). Com esse entendimento:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. CANDIDATO. DEPUTADO ESTADUAL. OMISSÃO DE DESPESAS. RECURSO DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA. ALTA REPRESENTATIVIDADE DA FALHA. ALTO VALOR ABSOLUTO. INVIABILIDADE DE APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO. 1. Prestação de contas de candidato não eleito ao cargo de deputado estadual, referente à arrecadação e ao dispêndio de recursos de campanha nas eleições de 2022. 2. Persistência de glosas referentes a despesas que deixaram ser arroladas na prestação de contas, localizadas mediante procedimento de circularização e/ou informações voluntárias de campanha e/ou confronto com notas fiscais eletrônicas de gastos eleitorais. A existência dessas despesas caracterizaria o recebimento e a utilização de recursos de origem não identificada para custeio desses gastos. 3. Documentos e esclarecimentos prestados inaptos para indicar a origem dos recursos que teriam sido utilizados para custear as despesas relacionadas à campanha eleitoral do candidato. Caracterizada a omissão de registro de despesas, infringindo o disposto no art. 53, inc. I, al. g, da Resolução TSE n. 23.607/19, que impõe que a prestação de contas deva ser composta das informações relativas a todos os gastos eleitorais, devidamente especificados. 4. As despesas resultantes das notas fiscais omitidas implicam sonegação de informações a respeito dos valores empregados para a quitação do gasto de campanha, cujo trânsito ocorreu de forma paralela à contabilidade formal do candidato, caracterizando os recursos como de origem não identificada, cujo montante deve ser recolhido ao Tesouro Nacional, nos termos do art. 32, caput e inc. VI, da Resolução TSE n. 23.607/19. 5. O valor da irregularidade atinge 10,64% da arrecadação. Tanto esse percentual quanto o valor absoluto da irregularidade impedem a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, impondo o juízo de reprovação das contas. 6. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

 

(TRE-RS - PCE: 0602238-80.2022.6.21.0000 PORTO ALEGRE - RS 060223880, Relator: Luiz Mello Guimaraes, Data de Julgamento: 24/01/2024, Data de Publicação: DJE-15, data 26/01/2024)

 

Com esses fundamentos, entendo que o recurso comporta provimento parcial para que seja mantida a desaprovação das contas e reduzido o valor a ser recolhido ao erário para R$ 3.412,60.

 

Diante do exposto, VOTO pelo provimento parcial do recurso para reduzir o valor a ser recolhido ao Tesouro Nacional de R$ 4.796,82 para R$ 3.412,60, sendo R$ 900,00 relativos à irregularidade na comprovação da aplicação de recursos do FEFC e R$ 2.512,60 referentes ao recebimento de recursos de origem não identificada, mantida a desaprovação das contas.