REl - 0600021-89.2024.6.21.0163 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/11/2024 às 14:00

VOTO

ADMISSIBILIDADE

O recurso é tempestivo, visto que a publicação da sentença se deu no dia 30.09.24 e o recurso foi interposto no dia seguinte, 1º.10.24. Presentes os demais requisitos autorizativos do recurso, o apelo merece conhecimento e passo à análise do mérito.

 

PRELIMINAR

Inicialmente, cumpre referir que não merece acolhimento a preliminar de inépcia recursal suscitada pelo recorrido. Tenho que a parte recorrente atacou diretamente o principal fundamento da sentença de improcedência da representação e, ainda que a petição recursal eventualmente padeça de certa atecnia jurídica, como afirma o recorrido, isso não conduz ao reconhecimento de sua inépcia, dada a ampla devolutividade dos recursos eleitorais.

 

MÉRITO

No mérito, a propaganda eleitoral em testilha trata, em resumo, de uma série de conteúdos impulsionados na rede social Facebook. As postagens impugnadas possuem o seguinte conteúdo:

1) URL: https://www.facebook.com/ads/library/?active_status=active&ad_type=all&country=BR&id=1219427725925513&media_type=all&search_type=page&view_all_page_id=398496556670944

Transcrição: “Quem assistiu o debate de ontem, percebeu que o atual Prefeito MENTE sobre a realidade do Município”

“Despreparado para o debate e um DESCONTROLE EMOCIONAL de quem sabe que vai perder as eleições municipais.”

 

2) URL: https://www.facebook.com/ads/library/?active_status=active&ad_type=all&country=BR&id=3036576539813538&media_type=all&search_type=page&view_all_page_id=398496556670944

Transcrição: “VENDENDO ILUSÕES: O atual Prefeito está dizendo que está tudo bem! Para você, que mora em Rio Grande, está tudo bem?!”

 

3) URL: https://www.facebook.com/ads/library/?active_status=active&ad_type=all&country=BR&id=1280360453128668&media_type=all&search_type=page&view_all_page_id=398496556670944

Transcrição: “Sabes por que o turismo em Rio Grande é um fracasso? Precário? Assistam esse vídeo e avaliem como o nosso Prefeito trata essa fonte de empregos.”

 

4) URL: https://www.facebook.com/ads/library/?active_status=active&ad_type=all&country=BR&id=1701464884021972&media_type=all&search_type=page&view_all_page_id=398496556670944

Transcrição: “O nosso atual prefeito em sua campanha diz: “a mudança tem que seguir!”.

Nós cidadãos riograndinos, questionamos: “que mudanças, prefeito?”

Nossa cidade está um CAOS exatamente pelo continuismo seu e do PT.

Se tu, assim como eu, está indignado com a estagnação do nosso Rio Grande vote no #NOVO, vote #Renato”

 

Ressalto que houve, de parte do representante, a indicação da URL específica pela qual foram veiculadas as publicações, atendendo-se ao disposto no art. 17, inc. III e § 2º, da Resolução TSE n. 23.608/19.

Observa-se, ainda, que a postagem guarda conformidade com o § 5º do mesmo art. 29 da Resolução TSE n. 23.610/19 e, ademais, a autoria é certa e incontroversa, pois reconhecida pelo recorrido por ocasião da contestação.

A controvérsia recursal, portanto, limita-se a verificar a prática de propaganda eleitoral negativa, em desacordo com o art. 29, § 3º, da Resolução TSE n. 23.610/19, que veda o impulsionamento de propaganda eleitoral negativa na internet, verbis:

Art. 29. É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos políticos, coligações e candidatos e seus representantes (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, caput).

[...].

§ 3º O impulsionamento de que trata o caput deste artigo deverá ser contratado diretamente com provedor da aplicação de internet com sede e foro no país, ou de sua filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecido no país e apenas com o fim de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações, vedada a realização de propaganda negativa (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, § 3º). Grifei.

 

Na doutrina, Edson de Resende Castro clarifica a questão:

(…) esse impulso só poderá repercutir anúncios, postagens, comentários, etc, para ‘promover ou beneficiar candidatos ou partidos’ e coligações, nunca para difundir críticas ou conteúdos que prejudiquem a imagem ou o desempenho eleitoral de adversários (Curso de Direito Eleitoral. 9. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2018. p. 336).

 

Portanto, resta claro que de acordo com a legislação vigente, o impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral na internet só pode ter o fim de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações, não podendo, portanto, ser utilizado negativamente para criticar outro candidato.

É nítido que o objetivo do legislador ao permitir o impulsionamento das propagandas na internet, potencializando sobremaneira o seu alcance, foi de promover uma propaganda eleitoral propositiva, assegurando-se aos partidos e coligações a possibilidade de divulgação de suas ideias e propostas a um número maior de eleitores em um curto espaço de tempo, promovendo e beneficiando seus candidatos ou agremiações.

Em síntese, a propaganda patrocinada (impulsionada) apenas é permitida para fins de promoção ou benefício próprio, sendo vedada a crítica, ainda que lícita, em prejuízo dos adversários.

In casu, não há como afirmar que as postagens guardam relação com o exercício de crítica política, que, mesmo ácida e contundente, é protegida pela liberdade de expressão.

As falas divulgadas não foram exclusivamente propositivas ou focadas nas qualidades do candidato recorrido ou, ainda, de críticas à Administração Pública, uma vez que mencionou diretamente a candidatura do recorrido e as circunstâncias de seu desempenho em debate eleitoral.

Em realidade, a autorização de impulsionamento ocorre “apenas com o fim de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações”, sendo suficiente a referência crítica ou em demérito do concorrente para a infringência da norma.

Nesse sentido, elenco os seguintes julgados do colendo Tribunal Superior Eleitoral:

AGRAVO REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2018. REPRESENTAÇÃO. GOVERNADOR. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. INTERNET. ART. 57–C, § 3º, DA LEI 9.504/97. POSTAGENS. FACEBOOK. IMPULSIONAMENTO. DESPROVIMENTO.1. O art. 57–C, caput, e § 3º, da Lei 9.504/97 permite o impulsionamento de conteúdo na internet, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações, candidatos e seus representantes, com a finalidade de promover candidaturas. Precedentes.2. No caso, de acordo com a Corte local, "as publicações não trouxeram de forma propositiva a imagem dos agravantes e o pedido de votos, ao contrário, através da associação de imagens e legendas, buscaram incutir no eleitor a ideia de 'não voto' no candidato agravado", o que, portanto, foge da regra prevista nos referidos dispositivos.3. As limitações impostas à propaganda eleitoral não afetam os direitos constitucionais de livre manifestação do pensamento e de liberdade de informação. Precedentes.4. Agravo regimental desprovido. (Recurso Especial Eleitoral nº 060337225, Acórdão, Relator(a) Min. Luis Felipe Salomão, Publicação: DJE - Diário de justiça eletrônico, Tomo 56, Data 23/03/2020) Grifei.

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2018. REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. CANDIDATO A DEPUTADO FEDERAL. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO. REDE SOCIAL. TEOR NEGATIVO. INFRAÇÃO. ART. 57–C DA LEI 9.504/97. DECISÃO REGIONAL. PROCEDÊNCIA. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRESSUPOSTOS ESPECÍFICOS. NÃO ATENDIMENTO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. IMPOSSIBILIDADE.

1. "Não cabe a aplicação do princípio da fungibilidade para receber recurso como recurso especial se inexistem os requisitos específicos previstos no art. 276, inciso I, alíneas a e b, do Código Eleitoral, quais sejam: a demonstração de dissenso jurisprudencial entre dois ou mais tribunais eleitorais ou a violação expressa à Constituição ou à lei federal" (AgR–AI 114–95, rel. Min. Gilmar Mendes, DJE de 28.5.2015).

2. A Corte de origem reconheceu a realização de propaganda eleitoral em rede social, por impulsionamento negativo, em desacordo ao § 3º do art. 57–C da Lei 9.504/97, julgando procedente representação eleitoral, com a imposição de multa a candidato ao cargo de deputado federal.

3. Conforme preconiza o § 3º do art. 57–C da Lei 9.504/97, o impulsionamento de conteúdo tem o escopo exclusivo de promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações, já tendo o Tribunal assentado, nas Eleições de 2018, a impossibilidade de contratação desse serviço para tecer críticas a adversários (RP 0601596–34, rel. Min. Sérgio Banhos, PSESS em 27.11.2018).

4. Tratando–se de modalidade excepcional de propaganda no âmbito da internet e segundo as premissas da decisão regional, a propaganda não teve o condão apenas de discutir a questão alusiva à formação de coligações, mediante promoção de ideia ínsita à campanha, tanto que fez uso de nomes de candidatos e de legenda, o que arrima a conclusão da decisão regional quanto ao indevido conteúdo ofensivo do impulsionamento.

5. Além do desvirtuamento em si da finalidade específica do impulsionamento, para se reconhecer que não teriam sido difundidos fatos inverídicos ou ofensivos, seria exigível novo exame do contexto fático–probatório, vedado nesta instância especial, a teor do verbete sumular 24 desta Corte Superior.

Agravo regimental a que se nega provimento. (AI - Agravo Regimental em Agravo de Instrumento nº 060290349 - RECIFE – PE. Acórdão de 20.08.2019. Relator Min. Sergio Silveira Banhos. DJE 20.09.2019.) Grifei.

 

Por tal fundamento, entendo que o recurso merece provimento, para aplicar a pena de multa no mínimo legal, R$ 5.000,00 (cinco mil reais), forte no art. 57-C, § 2º, da Lei n. 9.504/97, ao recorrido RENATO JULIANO LIMA, tendo em vista que a propaganda eleitoral veiculada desobedeceu ao art. 57-C, § 3º, da Lei n. 9.504/97, não havendo notícia de que se trate de reincidência.

Diante do exposto, VOTO por DAR PROVIMENTO ao recurso de FABIO DE OLIVEIRA BRANCO, para aplicar pena de multa no valor de R$ 5.000,00 a RENATO JULIANO LIMA, por prática de propaganda eleitoral irregular, conforme o art. 57-C, §§ 2º e 3º, da Lei n. 9.504/97.