REl - 0600349-75.2024.6.21.0015 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/11/2024 às 14:00

VOTO

1. Admissibilidade

O apelo é tempestivo e, presentes os demais pressupostos, merece conhecimento.

2. Pedido de desentranhamento de documentos

Inicialmente, destaco que, em contrarrazões, o recorrido aponta a intempestividade dos documentos que acompanham o recurso, pugnando pelo seu desentranhamento, quais sejam: (i) acórdão do processo n. 70081996803 (CNJ n. 0171589-89.2019.8.21.7000), TJ-RS, no qual Alexandre Goellner foi condenado por improbidade administrativa; (ii) certidão de composição do Diretório do Partido Progressista no Município de Carazinho; (iii) folder da campanha do vereador Adilson.

Em resumo: o acórdão refere-se a processo já apontado em fase de contestação; a certidão é documento próprio desta Justiça Especializada, e a propaganda do vereador fora reproduzida na peça inicial pelos próprios representantes ora recorridos. Cuida-se, em suma, de elementos probatórios que, de uma forma ou de outra, já compunham os autos. Nitidamente, foram apresentados apenas de modo a destacar situações já comprovadas nesta demanda. 

Ademais, em nada alteram o deslinde do feito, como se verá.

Assim, indefiro o pedido de desentranhamento.

3. Mérito

O recurso interposto pelos representados KELY OLIVEIRA FIORESE e GIULIANO CECCONELLO busca afastar as penalidades impostas na sentença, em razão de encaminhamento de dois vídeos cuja autoria deixou de ser registrada, via WhatsApp. O primeiro vídeo referente à escolha de Rudi Brombilla como coordenador de campanha do candidato a prefeito João Pedro Albuquerque de Azevedo; o segundo, relativo à atuação do candidato a vereador, Adilson Angst, na campanha em favor de partido diferente daquele pelo qual concorre.

Destaco tratar-se de manifestações de eleitores.

Transcrevo a legislação de regência aplicável ao caso:

Resolução 23.610

Art. 27. É permitida a propaganda eleitoral na internet a partir do dia 16 de agosto do ano da eleição.

§ 1º A livre manifestação do pensamento de pessoa eleitora identificada ou identificável na internet somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem de candidatas, candidatos, partidos, federações ou coligações, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos, observado o disposto no art. 9º-A desta Resolução.

 

Art. 30. É livre a manifestação do pensamento, vedado o anonimato durante a campanha eleitoral, por meio da internet, assegurado o direito de resposta, nos termos dos arts. 58, § 3º, IV, alíneas a, b e c , e 58-A da Lei nº 9.504/1997 , e por outros meios de comunicação interpessoal mediante mensagem eletrônica e mensagem instantânea. § 1º A violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais). § 1º-A A multa prevista no § 1º deste artigo não poderá ser aplicada ao provedor de aplicação de internet. (Incluído pela Resolução nº 23.671/2021) § 2º Sem prejuízo das sanções civis e criminais aplicáveis à(ao) responsável, a Justiça Eleitoral poderá determinar, por solicitação da(o) ofendida(o), a retirada de publicações que contenham agressões ou ataques a candidatas e candidatos em sítios da internet, inclusive redes sociais.

À análise individualizada das peças encaminhadas por meio do aplicativo dos recorrentes.

3.1 Primeiro vídeo

Descrevo.

Com a sequência de fotos onde aparecem Rudi Brombilla, coordenador de campanha, e o candidato a prefeitura pelo PSDB (ainda, terceiras pessoas estranhas ao presente processo), ouve-se o narrador, conforme transcrito abaixo das imagens:



 


 

Mais três milhões de prejuízo.

A “curva de rio” que é a campanha de João Pedro.

Este é o Rudi Brombilla, coordenador de campanha, o cara que só faz falcatrua e causou um prejuízo de quase três milhões no residencial Andaluz prejudicando centenas de famílias carazinhenses.

Será que ele vai ser o Secretário de Habitação?

Um novo tempo pra que? Pra voltar a roubalheira?

Os representantes, ora recorridos, defendem que o vídeo encaminha acusações “de corrupção e roubo, quando trazem dados descontextualizados e falaciosos e induzem o eleitor com um infeliz trocadilho do nome da coligação (Um novo tempo para voltar a roubalheira?)”, e, ainda, “a montagem que está sendo compartilhada não possui identificação da autoria de quem fez”.

No ponto, a sentença assim se pronuncia:

Resta, quanto ao vídeo 1, a verificação da legitimidade do uso das expressões “falcatrua” e “roubalheira”, especialmente no âmbito de um cartaz (“curva do rio”) divulgado pelo vídeo, bem como pelo locutor.

A resposta é negativa, isto é, não há legitimidade no uso de tais expressões, nem mesmo em um debate político. A afirmação não é solipsista, criada pela preferência estética ou moral deste julgador. Para a afirmação, baseia-se em precedentes do Tribunal Superior Eleitoral que consideraram que a utilização dessas expressões não se enquadra no exercício do direito de crítica.

(...)

Com efeito, da análise do conteúdo, verifica-se ter havido efetiva veiculação de ofensa à honra do candidato e da coligação representante. Ao atribuir ao candidato à prefeitura, pelo PSDB, João Pedro Albuquerque de Azevedo, e a Rudi Brombilla, coordenador de campanha, suposições baseadas em condenação derivada do processo n. 70081996803 (CNJ n. 0171589-89.2019.8.21.7000), julgado pelo TJ-RS, cujas partes não se identificam com aquelas que compõem o presente feito, há a prática vedada pelo § 1º do art. 27 da Resolução TSE n. 23.610/19.

Além disso, conforme aponta jurisprudência do e. TSE (e desta Casa) os termos utilizados ultrapassam o limite conferido a manifestações de opinião, abrigados pela liberdade de expressão:

AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL EXTEMPORÂNEA NEGATIVA. ARTS. 36 E 36-A DA LEI 9.504/97. VÍDEO. TWITTER. OFENSA. HONRA. PRÉ-CANDIDATO. CONFIGURAÇÃO. NEGATIVA DE PROVIMENTO.

1. No decisum monocrático, manteve-se aresto unânime do TRE/SP em que se impôs multa de R$ 5.000,00 à agravante, candidata ao cargo de prefeito de São Paulo/SP nas Eleições 2020, por prática de propaganda extemporânea negativa (arts. 36, § 3º, e 36-A da Lei n. 9.504/97).

2. De acordo com o entendimento desta Corte, a configuração de propaganda eleitoral extemporânea negativa pressupõe pedido explícito de não voto ou, ainda, ato que macule a honra ou a imagem de pré-candidato ou divulgue fato sabidamente inverídico em seu desfavor.

3. No caso, extrai-se da moldura fática do aresto do TRE/SP que a agravante publicou vídeo em sua conta no Twitter, destacando-se passagem na qual assevera que seu adversário político nas Eleições 2020 "é um [...] mentiroso nato, gangster. [...] Esquerda quer roubalheira, é isso que você quer né?".

4. Na linha do parecer ministerial, configurou-se ofensa à honra de pré-candidato, não se limitando a mensagem à mera veiculação de críticas ácidas.

5. Agravo interno a que se nega provimento. (Agravo Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº060001836, Acórdão, Min. Benedito Gonçalves, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 25/05/2022).

(Grifei.)

 

Direito eleitoral. Eleição 2024. Recurso. Representação procedente. Propaganda eleitoral antecipada negativa. Ofensa à honra. Desinformação. Direito de resposta. Recurso desprovido.

I. CASO EM EXAME

1.1. Interposição contra sentença que julgou procedente representação, determinando direito de resposta ao atual prefeito e candidato à reeleição, em razão de vídeo veiculado nas redes sociais do recorrente imputando ao recorrido práticas de corrupção e compra de cestas básicas com sobrepreço.
1.2. A sentença condenou o recorrente a publicar um vídeo de resposta nas redes sociais, conforme art. 32, inc. IV, al. "d", da Resolução TSE n. 23.608/19.

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

2.1. Configuração de propaganda eleitoral antecipada negativa.

2.2. Direito de resposta, conforme previsto no art. 58 da Lei n. 9.504/97.

III. RAZÕES DE DECIDIR

3.1. Para a caracterização de propaganda eleitoral negativa, são necessários pedido de não voto, ato abusivo que desqualifique o candidato, maculando sua honra ou imagem e ato sabidamente inverídico.

3.2. Já a propaganda extemporânea ou antecipada é toda aquela em que o teor da mensagem contenha pedido explícito de voto, ou que veicule conteúdo eleitoral em local vedado ou por meio, forma ou instrumento proscrito no período de campanha, não se limitando ao mero uso da expressão; vote em, mas também pelo uso de termos e expressões (palavras mágicas) que tenham como objetivo a transmissão do mesmo conteúdo.

3.3. Para a concessão de direito de resposta, a publicação necessariamente deve veicular fatos contendo inverdade flagrante que não apresente controvérsias, de modo a consistir em inverdade manifesta, inadmissível no âmbito do debate político. No caso dos autos, a publicação nas redes sociais com acusação de corrupção e roubo de cestas básicas, sem provas, incorre na previsão de direito de resposta do art. 58, § 1º, inc. IV, da Lei n. 9.504/97.

3.4. As alegações de roubo de cestas básicas e corrupção extrapolaram a crítica política e a mera propaganda negativa regular, uma vez que elencam fatos criminosos graves, sem comprovação, atraindo a vedação do art. 243, inc. IX, do Código Eleitoral. A sentença recorrida não merece reforma, pois está em consonância com a jurisprudência eleitoral e com a legislação vigente.

IV. DISPOSITIVO E TESE

4.1. Recurso desprovido.

Tese de julgamento: cusações de fatos criminosos graves, sem provas, veiculadas em redes sociais, configuram propaganda eleitoral antecipada negativa, autorizando a concessão de direito de resposta.”

Dispositivos relevantes citados: Lei n. 9.504/97, art. 58; Código Eleitoral, art. 243, inc. IX.

Jurisprudência relevante citada: TSE, Ac. Rp n. 143175, rel. Min. Admar Gonzaga; TSE, Ac. Rp n. 1298, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito
RECURSO ELEITORAL n. 060025364, Acórdão, Des. Francisco Thomaz Telles, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 24.9.2024.

(Grifei.)

3.2 Segundo vídeo

A segunda mensagem veicula vídeo com imputação de que Adilson Angst, do partido PODEMOS, “seria um infiltrado”, pois participa de atos de campanha em apoio ao candidato do PSDB João Pedro. O vídeo reproduz evento da campanha do candidato João Pedro, no qual registra a presença de Adilson.

Em contrarrazões, alega o recorrido que, “diferentemente do posicionamento do Promotor em seu Parecer, não pode o candidato apoiar quem quiser, pois a infidelidade partidária interfere não apenas na eleição, mas na própria titularidade dos mandatos eletivos”.

Com efeito, o tema abordado nas mensagens concernentes ao apoio a candidato de agremiação, ou coligação diversa daquela do candidato apoiador, não merece a atenção desta Justiça Especializada, por ser questão eminentemente da esfera das agremiações.

A posição encontra reflexo em outros Regionais, conforme segue:

AÇÃO DE JUSTIFICAÇÃO DE DESFILIAÇÃO PARTIDÁRIA COM PEDIDO DE PERDA DE CARGO ELETIVO. ALEGAÇÃO DE INFIDELIDADE PARTIDÁRIA COM BASE EM APOIO POLÍTICO DADO A CANDIDATOS FILIADOS A PARTIDOS DIVERSOS DAQUELE NA QUAL O MANDATÁRIO É FILIADO. SUPOSTA VIOLAÇÃO AO REGRAMENTO PREVISTO NA RESOLUÇÃO TSE Nº 22.610/2007.PRELIMINAR - DA AUSÊNCIA DE LEGITIMIDADE PASSIVA (DE OFÍCIO) DE LEGITIMIDADE ATIVA E DE INTERESSE DE AGIR (ARGUIDA PELA PROCURADORIA REGIONAL ELEITORAL)

Informação prestada pelo autor, em petição inicial, de que o requerido se encontra filiado ao partido pela qual foi eleito, nas eleições de 2020. Considerou-se ser necessária a desfiliação, para atrair a atuação da Justiça Eleitoral. Ilegitimidade passiva configurada. Não procede a alegação de infidelidade partidária, baseada apenas em apoio dado a candidatos filiados a outras agremiações. Ainda que o mandatário tivesse sido expulso do partido, não incidiria, no caso, as normas da Resolução TSE nº 22.610/2007. Questão interna corporis. Precedente. Alegações também baseadas na ausência de desfiliação do requerido. Considerou-se corretos os apontamentos feitos pela Procuradoria Regional Eleitoral, com a seguinte ressalva, acerca da ilegitimidade ativa: o autor não é legítimo pela ausência de comprovação de ser ele o primeiro suplente. Precedente. Aplicado, ao caso, a norma prevista no art. 485, inciso VI, § 3º, do CPC.PROCESSO EXTINTO, SEM JULGAMENTO DO MÉRITO.

(TRE-MG - AJDesCargEle: 06001055320236130000 UBERLÂNDIA - MG 060010553, Relator: Des. Marcelo Paulo Salgado, Data de Julgamento: 21/06/2023)

 

Recurso. Representação. Propaganda irregular. Eleições de 2024. Improcedência. Apoio a candidato adversário. Rede Social. Questão interna corporis. Desprovimento. 1. Deve ser mantida a sentença que julga improcedente a representação por propaganda irregular a regra legal proibitiva de apoio a candidato adversário, contida no art. 54, § 1º, da Lei nº 9.504/97, restringe–se à propaganda eleitoral no rádio e na televisão. 2. Caso em que tolher a manifestação de apoio de um candidato de um partido a outro candidato de partido adversário fora da hipótese legal compreenderia uma censura que atentaria contra a liberdade de expressão, sobretudo porque é regra de hermenêutica que as normas proibitivas devem ser interpretadas restritivamente. 3. Recurso a que se nega provimento.

(TRE-BA - REl: 06002291820246050196 CAPELA DO ALTO ALEGRE - BA 060022918, Relator: Maízia Seal Carvalho, Data de Julgamento: 30/09/2024, Data de Publicação: PSESS-1658, data 30/09/2024)

A análise cabe, aliás, aos próprios eleitores, inclusive emanando críticas que entenderem pertinentes, contudo, sem ferir a legislação de regência, como se viu no caso. Nessa questão, me reporto às considerações oferecidas em parecer pelo Ministério Público com atuação na origem, por percuciente:

Os representados compartilharam vídeos, nos quais afirma que o candidato "pinto pequeno", da própria coligação dos representados, é um "baita bagaceira", pelo fato de frequentar ato político do adversário e que se trata da "esquerda fazendo as falcatruas".

As expressões utilizadas atacam a honra e a imagem do candidato que frequentou o ato político da oposição, bem como atacam a honra e a imagem de todos os candidatos de "esquerda", dizendo que fazem "falcatruas".

A defesa sustenta que o candidato a vereador estaria a apoiar o candidato da oposição e não o da situação. Pois bem, cabe ao candidato apoiar quem ele quiser, e eventual infração ao estatuto do partido político deve ser resolvido no âmbito interno do partido ou da coligação, com os meios jurídicos adequados, mas jamais ofender com expressões injuriosas e grosserias na propaganda eleitoral.

Ou seja, a informação de apoio é incontroversa, contudo os rótulos de "baita bagaceira" e "esquerda fazendo as falcatruas" atingem a honra e a imagem do candidato e do agrupamento político, merecendo reprimenda desta Especializada.

4. Multa

Os recorrentes argumentam que as normas fundamentadoras da punição não se aplicam ao caso dos autos, pois ao repassar os vídeos o fizeram de forma identificada. Sustentam, ainda, que a aplicação da sanção de uma forma mais ampla à prevista viola o princípio da legalidade.

Os argumentos não lhes socorrem.

Por certo, os perfis de WhatsApp não eram anônimos, e tampouco fora questionada qualquer veracidade.

Contudo, sublinho que a multa é imposta ao "responsável pela divulgação da propaganda", no caso, vídeos, sobre os quais fora ocultado o produtor original.

Aqui, o anonimato é incontroverso. Não se desconhece o fato de que o aplicativo Whatsapp utilizado para compartilhar os vídeos em tela é, de regra, ferramenta restrita a grupos de conhecidos, sem alcance geral. 

Ocorre que, em casos onde são repassados vídeos cuja origem é desconhecida, anônima, como se afigura o dos presentes autos, impõe-se o reconhecimento da irregularidade, na esteira da jurisprudência do TSE e desta Corte:

ELEIÇÕES 2016. PLEITO SUPLEMENTAR. WHATSAPP. GRUPOS DO APLICATIVO. MENSAGENS OFENSIVAS. CANDIDATO AO CARGO DE PREFEITO. DISSEMINAÇÃO DE CONTEÚDO APÓCRIFO. ART. 57 –D, CAPUT E § 2º, DA LEI 9.504 /97. INFRAÇÃO. ANONIMATO CONFIGURADO. RECURSOS PROVIDOS. RESTABELECIMENTO. SENTENÇA. MULTA. INCIDÊNCIA.SÍNTESE DO CASO

(...)

2. O objeto da representação consistiu na divulgação de mensagens transmitidas no dia 4 de novembro de 2019, via aplicativo WhatsApp, contendo vídeos apócrifos com ofensas dirigidas ao candidato ao cargo de prefeito de Ceará–Mirim/RN, associando–o a casos de corrupção na eleição suplementar que se avizinhava na localidade .

3. A maioria da Corte Regional Eleitoral decidiu que, embora o autor da edição dos vídeos fosse desconhecido, os responsáveis por sua divulgação estavam, desde o início, plenamente identificados nos autos, de maneira, pois, a descaracterizar a vedação legal e a multa prevista pelo art. 57 –D, § 2º, da Lei 9.504 /97 .

4. Os recorrentes sustentam que incide a multa prevista no § 2º do art. 57 –D da Lei 9.504 /97, porquanto o anonimato deve ser aferido em relação à autoria da mensagem veiculada, e não somente em relação ao usuário que a retransmite.

ANÁLISE DOS RECURSOS ESPECIAIS

5. O art. 57 –D da Lei das Eleicoes assegura a livre manifestação do pensamento, mas veda o anonimato durante a campanha eleitoral, por intermédio da rede mundial de computadores – internet – e por outros meios de comunicação interpessoal por meio de mensagem eletrônica. Por sua vez, o § 2º do mesmo dispositivo estabelece que "a violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais)".

6. A interpretação do art. 57 –D da Lei 9.504 /97, quanto ao anonimato e à responsabilidade pela divulgação de propaganda eleitoral irregular, deve levar em conta as práticas usuais, o alcance da mensagem de acordo com o meio em que for veiculada, a repercussão da conduta no âmbito eleitoral e a finalidade da norma que visa coibir o abuso praticado na internet e nos aplicativos de transmissão de mensagens instantâneas.

7. A norma visa coibir a disseminação de conteúdos apócrifos, o que se verifica especialmente em aplicativos de mensagens instantâneas, cada vez mais utilizados pelo público em geral, inclusive para a republicação de informações falsas e sem autoria conhecida – as chamadas Fake News –, situação que tem repercutido significativamente no contexto das campanhas eleitorais.

8. A proliferação de mensagens falsas na internet tem alcançado grande repercussão na esfera eleitoral e consiste em tema que tem gerado acirradas discussões, diante da dificuldade de controle desses conteúdos, haja vista a facilidade de acesso a qualquer tipo de informação na rede mundial de computadores e, sobretudo, em aplicativos de transmissão de mensagens eletrônicas, através dos quais é possível o compartilhamento imediato do conteúdo, geralmente sem nenhum tipo de averiguação prévia quanto à origem e à veracidade da informação.

9. O art. 38, § 3º, da Res.–TSE 23.610 – resolução que trata da propaganda eleitoral no pleito de 2020 e cujo teor reproduz a Res.–TSE 23.551 (alusiva ao pleito de 2018), dispositivo que pode ser considerado para contribuir à solução do caso concreto alusivo à Eleição suplementar de 2016 – estabelece, quanto aos conteúdos divulgados na internet, que "a publicação somente será considerada anônima caso não seja possível a identificação dos usuários" após a adoção das providências previstas nos arts. 10 e 22 da Lei 12.965 /2014 ( Marco Civil da Internet )".

10. A identificação de que trata o § 3º do art. 38 da Res.–TSE 23.610 não deve incidir em face dos casos de divulgação de mensagens instantâneas por meio do WhatsApp ou de aplicativo similar, diante do efeito viralizante que a espécie de aplicativo proporciona, situação que praticamente inviabiliza a adoção das providências a que a norma se refere para a identificação do autor original da informação.

11. A sanção prevista no § 2º do art. 57 –D da Lei 9.504 /97, que prevê o pagamento de multa ao responsável pela divulgação da propaganda anônima, deve ser imposta a todos os usuários que divulgarem conteúdos sem a identificação do autor da mensagem original, interpretação que confere maior eficácia à norma em comento, uma vez que, na descrição legal, não consta a delimitação do conceito de anonimato para fins da sua incidência.

12. A interpretação mais consentânea com a finalidade do preceito descrito no art. 57 –D da Lei 9.504 /97, que é a de coibir a divulgação de conteúdos sem a identificação da autoria, é no sentido de que o anonimato deve ser verificado em relação à origem da mensagem veiculada, e não somente quanto ao usuário que a republica ou replica seu teor.

13. No caso em exame, a retransmissão de mensagens ofensivas a candidatos por usuários identificados nos grupos do WhatsApp, sem a necessária informação quanto à origem e à autoria do conteúdo, violou o disposto no art. 57 –D da Lei 9.504 /97, implicando a incidência da multa prevista no § 2º, segundo o qual"a violação do disposto neste artigo sujeitará o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais)".

CONCLUSÃO

Recursos especiais providos, a fim de reformar o acórdão regional, para restabelecer a sentença que julgou procedente a representação eleitoral e aplicou aos representados multa individual no valor de R$ 5.000,00, em face da contrariedade ao art. 57 –D e aos §§ 2º e 3º da Lei 9.504 /97.

(TSE - REspEl: 06000243320196200006 CEARÁ-MIRIM - RN 060002433, Relator: Min. Sergio Silveira Banhos, Data de Julgamento: 17/02/2022, Data de Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, Tomo 36)

 

RECURSO ELEITORAL E RECURSO ADESIVO. ELEIÇÕES 2020. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA. REDES SOCIAIS. WHATSAPP. AFASTADA A PRELIMINAR DE INTEMPESTIVIDADE. OFENSA À HONRA DE CANDIDATO. DETERMINADA A EXCLUSÃO DO VÍDEO. ANONIMATO. INEXISTÊNCIA. MULTA DO ART. 57-D DA LEI N. 9.504/97. INAPLICABILIDADE. PROVIMENTO PARCIAL. RECURSO ADESIVO DESPROVIDO.

1. Recurso eleitoral e recurso adesivo interpostos em face de sentença que julgou procedente representação por propaganda eleitoral irregular. Aplicação de multa.

2. Afastada a preliminar de intempestividade. Observado o prazo de 1 dia previsto no art. 22, caput, da Resolução TSE n. 23.608/19.

3. Demonstrada a veiculação de ofensa à honra do representante, mediante afirmações que atingem a sua conduta como agente político, com a utilização de montagens de modo a degradar a sua imagem. Sendo manifesta a ofensa, adequada a determinação de que o próprio representado realizasse a exclusão do vídeo.

4. O aplicativo WhatsApp, utilizado para compartilhar o vídeo em questão, envolve, no mais das vezes, ambiente particular, sem alcance geral, ficando restrito aos grupos de conhecidos. Entretanto, em circunstâncias extremas, como no presente caso, a análise da irregularidade não pode escapar da Justiça Eleitoral.

5. A conduta narrada nos autos não atrai a penalidade prevista no art. 30, caput e § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19, que regulamenta o art. 57-D, caput e § 2º, da Lei n. 9.504/97, pois tal sanção é especificamente prevista para a hipótese de anonimato, a qual não se verifica na espécie.

6. Provimento parcial ao recurso principal para que seja afastada a pena de multa fixada na sentença, por ausência de previsão legal, restando desprovido o recurso adesivo.

Recurso Eleitoral n. 060017372, Acórdão, Des. GERSON FISCHMANN, Publicação: PJE - Processo Judicial Eletrônico-PJE, null. 

A título de desfecho, friso que a multa se encontra em seu patamar mínimo legal. Não merece provimento o recurso interposto, impondo-se a manutenção integral da sentença.

Diante do exposto, VOTO pelo desprovimento do recurso.