PCE - 0602789-60.2022.6.21.0000 - Voto Relator(a) - Sessão: 04/11/2024 às 14:00

VOTO

Trata-se de analisar os apontamentos técnicos na prestação de contas do DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES (PT) NO RIO GRANDE DO SUL (RS) referente às Eleições Gerais de 2022, consistentes em :

a) R$ 124.154,16 em recursos de origem não identificada, em razão do pagamento de 67 (sessenta e sete) notas fiscais sem trânsito dos recursos na conta de campanha (vide tabelas dos itens 3.1 e 3.2 do parecer conclusivo, ID 45578160; com a retificação da informação técnica do ID 45641245);

b) R$ 13.000,00 recebidos de fonte vedada, provenientes de Carolina Rodrigues de Matos, permissionária de serviços de venda de sorvetes em área pública no Município de Capão da Canoa/RS (item 2 do parecer conclusivo, ID 45578160);

c) aplicação irregular de R$16.115,00 oriundos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), c1) sendo R$ 4.500,00 relativos à locação junto a Predial e Administradora Hotéis Plaza SA sem o detalhamento contratual capaz de aferir as limitações do art. 35, § 6º, da Resolução TSE 23.607/2019 c2) R$ 11.615,00 referentes aos pagamentos efetuados aos prestadores de serviço Gustavo dos Santos Moraes, Gonçalo Rodrigues dos Santos, Geovani Marcius Rodrigues dos Santos, Juliana Bairros Vinade e Gabriel Kummer de Souza, sem os instrumentos contratuais com as informações exigidas pelo art. 35, § 12, da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 4.1 do parecer conclusivo, ID 45578160);

d) aplicação irregular de R$ 10.211,47 provenientes do Fundo Partidário, não destinados à política afirmativa de gênero e de raça, não sendo alcançadas as importâncias de R$ 2.852,23 e de R$ 7.359,24, respectivamente, para a promoção de candidaturas femininas e negras (item 5 do parecer conclusivo, ID 45578160).

Noto que as glosas supra já constavam de exame preliminar e, mesmo após manifestação do prestador de contas sobre esses pontos específicos, remanesceram, conforme recomendação da unidade técnica e opinião da Procuradoria Regional Eleitoral (vide exame preliminar, ID 45487271; defesa, ID 45508544; parecer técnico, ID 45578160; informação retificadora, ID 45641245; e pareceres ministeriais, IDs 45604295 e 45645378).

Passo à análise das irregularidades:

a) Recebimento de recursos de origem não identificada

Apontou-se a emissão de 67 (sessenta e sete) notas fiscais eletrônicas contra o CNPJ da candidatura, no montante total de R$ 124.154,16 (item 3.1, R$ 50.309,95, ID 45578160, p. 5 + item 3.2, R$ 73.844,21, ID 45641245, p. 2):

 

Data

CNPJ

FORNECEDOR

nota fiscal nº

VALOR (R$)

01

14/10/22

08.892.552/0001-63

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS CACHOEIRINHA LTDA

1753398

214,70

02

18/10/22

08.892.552/0001-63

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS CACHOEIRINHA LTDA

1757352

217,61

03

26/10/22

08.892.552/0001-63

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS CACHOEIRINHA LTDA

1694670

219,34

04

19/08/22

41.515.783/0001-23

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS MIRELA LTDA

57117

200,00

05

18/08/22

08.689.190/0001-08

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS PORTO ALEGRE LTDA

567373

100,00

06

18/08/22

08.689.190/0001-08

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS PORTO ALEGRE LTDA

567537

100,00

07

21/08/22

08.689.190/0001-08

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS PORTO ALEGRE LTDA

568354

100,00

08

09/09/22

08.689.190/0001-08

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS PORTO ALEGRE LTDA

574393

200,00

09

04/09/22

08.689.190/0001-08

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS PORTO ALEGRE LTDA

572816

208,03

10

11/09/22

08.070.881/0001-29

ABASTECEDORA DE COMBUSTIVEIS VOLKEN II LTDA

165521

190,34

11

05/08/22

06.061.646/0001-65

ADYL NET ACESSO A INTERNET LTDA

234145

3.490,00

12

04/08/22

46.770.622/0001-08

ALICE SCHMITZ TOLDO 02857512040

202200000000006

1.336,00

13

13/09/22

88.485.008/0001-36

BAR CHOPP 26 LTDA

23207

58,00

14

15/09/22

88.485.008/0001-36

BAR CHOPP 26 LTDA

23227

75,00

15

26/08/22

06.017.127/0001-08

BELLA VENETO COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA

12127

457,00

16

27/08/22

06.017.127/0001-08

BELLA VENETO COMERCIO DE ALIMENTOS LTDA

12204

469,00

17

28/08/22

07.296.563/0001-18

BIANCINI HOTEIS E ADMINISTRACAO DE BENS LTDA.

20224957

2.507,40

18

06/09/22

20.336.114/0001-14

C G BORGES LAVENDERIA

202200000000049

1.750,00

19

27/08/22

93.148.930/0001-78

COLORAMA COMERCIAL LORA DE MATERIAIS AUTOMOTIVOS LTDA

283611

162,03

20

07/09/22

07.516.878/0001-23

COMERCIAL DE COMBUSTIVEIS BRINO LTDA

2534533

200,00

21

01/08/22

05.604.694/0001-90

COMERCIAL DE INFORMATICA PREST SERVICE PONTO COM LTDA

4702

41,90

22

28/08/22

95.425.369/0023-68

COMERCIO DE COMBUSTIVEIS NEVOEIRO LTDA

243284

176,03

23

01/08/22

93.015.006/0019-42

COMPANHIA ZAFFARI COMERCIO E INDUSTRIA

914

79,80

24

18/08/22

93.015.006/0019-42

COMPANHIA ZAFFARI COMERCIO E INDUSTRIA

948

79,80

25

05/09/22

93.015.006/0019-42

COMPANHIA ZAFFARI COMERCIO E INDUSTRIA

4025

79,80

26

03/09/22

61.758.330/0001-35

CONDALL CONSTRUTORA DALL IGNA DOS PAMPAS LTDA.

44056

680,00

27

02/09/22

72.511.538/0001-71

CONFEITARIA PEDOT LTDA

471725

24,80

28

25/10/22

01.403.861/0001-83

COOPERATIVA DE TRABALHO DE COSTUREIRAS UNIDAS VENCEREMOS

761

725,00

29

31/10/22

01.403.861/0001-83

COOPERATIVA DE TRABALHO DE COSTUREIRAS UNIDAS VENCEREMOS

768

841,00

30

19/10/22

01.403.861/0001-83

COOPERATIVA DE TRABALHO DE COSTUREIRAS UNIDAS VENCEREMOS

758

1.250,00

31

29/07/22

02.603.092/0001-20

DANIEL PRIMO PICCINI

2241

3.150,00

32

29/08/22

21.884.273/0001-16

DIEGO LUIS GHELLER 99451182004

42391707

650,00

33

28/08/22

07.045.622/0003-47

DISTRIBUIDORA DE COMBUSTIVEIS SAVAR LTDA

993898

66,02

34

14/10/22

05.498.028/0001-14

EGLX EMPREENDIMENTOS E ALIMENTOS LTDA

2128

1.386,00

35

28/07/22

05.739.290/0001-03

FABIO A. LEDUR

58

3.800,00

36

03/08/22

45.325.265/0001-06

FATIMA ROSELI LACORTE SANSONOVICZ 62859110020

202200000000006

2.500,00

37

04/08/22

03.067.658/0001-09

FGTEC INFORMATICA LTDA

126133

460,00

38

28/08/22

07.328.406/0001-47

J BASSO LTDA

507787

76,00

39

26/08/22

07.328.406/0001-47

J BASSO LTDA

507384

274,80

40

08/09/22

10.616.615/0001-09

J. C. TENEDINI REFEICOES LTDA

72802

38,90

41

20/07/22

32.991.109/0001-24

JULIANA ZOCCHI

202216

500,00

42

12/08/22

07.851.866/0001-55

KLASSGRAF EIRELI

2251

16.300,00

43

20/08/22

02.666.647/0001-82

LANCHERIA DISTRITO LTDA

14968

71,00

44

15/09/22

94.460.052/0001-94

LIVRARIA CERVO LTDA

116760

96,00

45

27/08/22

02.006.317/0001-60

MARCIO VIEIRA BUGS

9694

60,00

46

23/09/22

21.675.062/0001-73

MARIA FUTRIKA BAZAR LTDA

10783

14,94

47

10/09/22

06.309.559/0001-84

POSTO CADORE PILLON LTDA

224828

190,51

48

26/08/22

10.990.509/0001-82

POSTO MACH COMERCIO DE COMBUSTIVEIS LTDA

267464

235,03

49

18/10/22

48.151.779/0001-72

PRINT & JET, INDUSTRIA, COMERCIO E SERVICOS LTDA

43278114

4.900,00

50

06/09/22

87.982.385/0001-18

PROCAL FERRAGENS E TINTAS LTDA

208924

107,80

51

06/09/22

13.793.895/0001-00

R TAUBE POSTO DE COMBUSTIVEIS E CONVENIENCIAS LTDA

117340

223,47

52

28/08/22

88.841.564/0001-06

RESTAURANTE DAS CUCAS LTDA

8171

74,25

53

02/09/22

19.007.866/0001-52

RESTAURANTE DELICIAS DO PRATA LTDA

6286

38,00

54

02/09/22

19.007.866/0001-52

RESTAURANTE DELICIAS DO PRATA LTDA

6287

385,00

55

02/08/22

30.484.830/0001-00

RESTAURANTE MNI LTDA

41937527

21.280,00

56

02/10/22

06.538.428/0001-79

RESTAURANTE VERONESE LTDA

14587

114,00

57

02/09/22

13.810.753/0001-04

RESTAURANTE VITO RIBEIRO LTDA

11741

54,00

58

27/08/22

04.144.661/0010-32

RHRISS COMBUSTIVEIS LTDA - EM RECUPERACAO JUDICIAL

1003920

35,00

59

26/09/22

13.791.433/0001-54

SILVIA RITTER LONGHI

122

45,30

60

11/08/22

07.473.735/0148-08

SIM REDE DE POSTOS LTDA

1364925

140,70

61

02/09/22

07.473.735/0148-08

SIM REDE DE POSTOS LTDA

1418465

194,51

62

14/09/22

02.464.779/0001-21

VP BAR E RESTAURANTE LTDA

11418

81,40

63

28/07/22

92.783.927/0001-63

ZAMPIERON E DALACORTE COMERCIO DE ELETROELETRONICOS LTDA

22038

69,00

64

29/07/22

02.507.787/0001-08

GRAFICA E EDITORA RELAMPAGO LTDA

17056

45.439,95

65

14/07/22

02.507.787/0001-08

GRAFICA E EDITORA RELAMPAGO LTDA

17351

1.160,00

66

19/09/22

02.507.787/0001-08

GRAFICA E EDITORA RELAMPAGO LTDA

17396

1.710,00

67

31/10/22

12.052.646/0001-00

JAIRO DA SILVEIRA JUNIOR

983

2.000,00

TOTAL

 

124.154,16

 

Contudo, não há valores correspondentes a essa transação nas contas de campanha, fator que impossibilita a verificação da origem dos recursos e do seu adimplemento (vide itens 3.1 e 3.2 do parecer conclusivo, ID 45578160; com a retificação da informação técnica do ID 45641245).

A agremiação, ao seu turno, contesta 5 dispêndios listados acima, sinteticamente alegando que: estaria buscando o cancelamento das 3 notas fiscais emitidas pela fornecedora Gráfica e Editora Relâmpago Ltda., pois não teriam sido prestados os serviços (itens 64, 65 e 66, no valor total de R$ 48.309,95); e estaria contido na prestação de contas do exercício financeiro de 2022 do diretório estatual o lançamento dos pagamentos aos fornecedores Livraria Cervo e Jairo da Silveira Júnior, respectivamente, itens 44 e 67, no valor total de R$ 2.096,00, consoante sua resposta aos itens 3.1 e 3.2 do exame técnico preliminar (petição, ID 45508544, p. 6-10).

A despeito dos argumentos defensivos colacionados, a unidade técnica, após minuciosa conferência dos documentos contábeis, fiscais e bancários a requerimento desta Relatora, constatou que o valor de quitação do débito das referidas notas acima relacionadas não transitou em conta bancária registrada nesta prestação de contas e concluiu que “as despesas elencadas na presente informação não possuem registro no SPCA (Prestação de Contas Anual 2022 do Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores – PJe n. 0600199-76.2023.6.21.0000), bem como no SPCE Eleições 2022 (Prestação de Contas Eleitoral do Diretório Estadual do Partido dos Trabalhadores – PJe n. 0602789-60.2022.6.21.0000)” (informação técnica, ID 45641245).

De outro lado, os documentos fiscais, inclusive aqueles relativos aos fornecedores Gráfica e Editora Relâmpago Ltda. (itens 64, 65, 66), Livraria Cervo Ltda. (item 44) e Jairo da Silveira Júnior (item 67), não restaram cancelados junto ao órgão tributário correspondente, conforme exige o art. 59 da Resolução TSE n. 23.607/19, nem há prova de que o prestador de contas tenha realizado esforço para corrigir as notas fiscais junto ao fisco.

Nesse sentido, anoto que esta Corte firmou o entendimento de que, “havendo o registro do gasto nos órgãos fazendários, o ônus de comprovar que a despesa eleitoral não ocorreu ou que ocorreu de forma irregular é do prestador de contas” (TRE-RS, Prestação de Contas Eleitoral n. 0602944-63.2022.6.21.0000, Relatora Desembargadora Eleitoral Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, publicado em sessão em 01.12.2022).

Logo, efetivou-se o pagamento destas 67 faturas acima relacionadas por meio diverso das contas registradas para a campanha, devendo o valor de R$ 124.154,16 ser recolhido ao Tesouro Nacional, por caracterização de recebimento de recursos de origem não identificada, na forma do art. 32, § 1º, incs. IV e VI, § 2º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

b) Recebimento de financiamento de fonte vedada

A partir de base de dados de pessoas físicas permissionárias de serviços públicos, a unidade técnica destaca a irregularidade de duas doações na importância total de R$ 13.000,00 procedentes de Carolina Rodrigues de Matos, comerciante de sorvetes em área pública no Município de Capão da Canoa/RS (item 2 do parecer conclusivo, ID 45578160).

A agremiação, em sua defesa, argumenta que a doação representa apenas 0,29% da arrecadação e que a não haveria clareza no enquadramento da doadora na condição de permissionária de serviço público, solicitando a aplicação de precedente do colendo Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (defesa, ID 45508544):

RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÕES DE 2020. CANDIDATO A VEREADOR. SENTENÇA DE DESAPROVAÇÃO. 1. Atraso na entrega dos relatórios financeiros no prazo de 72 horas, estabelecido pelo artigo 47, inciso I, da Resolução TSE nº 23.607/2019. Montante de R$ 4.010,00 (10,02% do total acumulado da receita). Falha insuficiente para ensejar a desaprovação das contas. Irregularidade afastada. 2. Recebimento direto de recursos de fontes vedadas de arrecadação, detectado mediante a integração do módulo de análise do Sistema de Prestação de Contas Eleitorais (SPCE) e da base de dados da Secretaria da Receita Federal do Brasil com a base de dados de pessoas físicas permissionárias de serviço público, no valor de R$ 2.000,00 (5% do total acumulado da receita). Inteligência dos artigos 24, inciso III, da Lei 9.504/97 e 31, inciso III, da Resolução nº 23.607/2019. A legislação do município de Campinas não deixa claro se a ocupação de solo público para fins de comercialização de jornais e revistas se enquadra no conceito de permissão de serviço público, sendo então razoável o enquadramento como permissão para ocupação de espaço público (calçada), não devendo, assim, a doação eleitoral ser considerada como de pessoa física permissionária de serviço público. Conforme entendimento do C. Tribunal Superior Eleitoral, a interpretação dos artigos supracitados deve ser restritiva. Irregularidade afastada. PROVIMENTO DO RECURSO PARA APROVAR AS CONTAS COM RESSALVAS.

(TRE-SP - REl: 0600441-53.2020.6.26.0274 CAMPINAS - SP 060044153, Relator: Sérgio Nascimento, Data de Julgamento: 28/10/2022, Data de Publicação: 04/11/2022)

Em consulta pública a partir do CPF 003.718.360-50 da doadora Carolina Rodrigues de Matos efetuada no site da Prefeitura Municipal de Capão da Canoa/RS, no dia 08.7.2024, constatei que, conforme alvará de licença de funcionamento, está estabelecida na Avenida Beira Mar, Zona Nova, Quiosque de Sorvete, Praça Chimarrão, Ponto 67 (https://e-gov.betha.com.br/cdweb/03114-441/contribuinte/rel_cndcontribuinte.faces).

Para ocupação desses quiosques municipais a Beira Mar e em praças, o Município, após licitação por concorrência, celebra contrato administrativo precário de “permissão de uso de espaço público a título oneroso”, a exemplo do edital n. 8/23 constante do processo administrativo 985, disponível no portal de transparência de Capão da Canoa (https://transparencia.betha.cloud/#/kH7NvI1KDUXy19mASbGl3A==/consulta/76822/detalhe/88:93:2023_985_93), conforme regulamentação da Lei Municipal 1.629/2001 (https://cmcc.cespro.com.br/visualizarDiploma.php?cdMunicipio=7345&cdDiploma=20011629&NroLei=1.629&Word=0&Word2=).

De outro lado, a venda de sorvetes, mesmo em área pública, não representa serviço público delegado na forma do art. 175 da Constituição Federal, nem da Lei n. 8.987/95.

Acrescento ainda que a venda de sorvetes está reservada à iniciativa privada, sendo vedada a intervenção direta do Estado nessa atividade econômica, pois não se enquadra nas ressalvas previstas no art. 173, caput, da Constituição Federal (imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo).

Nesse sentido, adoto o preciso fundamento iluminado nas razões de decidir desta Colenda Casa nos autos da Prestação de Consta n. 719329: “cabe ressaltar que a Lei n. 9.504/97, no seu art. 24, inc. III, veda a doação por concessionário ou permissionário de serviço público, não abarcando, obviamente, a concessão ou permissão de uso de bem público, institutos jurídicos que não se confundem” (TRE/RS - PC n. 719329, Relatora Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, Publicado em Sessão, 08.12.2010.):

Prestação de contas. Eleições 2010. Parecer conclusivo pela aprovação e pronunciamento ministerial nos autos pela rejeição. Questionada a doação de recursos por supostas entidades de classe: associação de revendas de agroquímicos e entidade oficial representativa de associações de Câmaras Municipais.

1. Licitude da doação em relação à primeira fonte. Embora a Lei n. 9.504/97, no seu art. 24, inciso III, vede doação por concessionário ou permissionário de serviço público, não abarca a concessão ou permissão de uso de bem público. A leitura de norma restritiva de direito - vedação ao exercício de disposição de seu patrimônio - não comporta interpretação extensiva.

2. Caracterizada doação ilícita (art. 15, inciso VI, da Resolução n. 23.217/10) em relação à associação de Câmaras Municipais, cuja receita é composta de recursos públicos (art. 42, § 1º, do Estatuto Social). Desaprovação.

(TRE/RS - Prestação de Contas nº 719329, Relatora Desembargadora Federal Marga Inge Barth Tessler, Publicado em Sessão, 08/12/2010)

Por conseguinte, a proibição art. 24, inc. III, da Lei n. 9.504/97, por se tratar de restrição de direitos, deve ser interpretada restritivamente de maneira a afastar os apontamentos técnico e ministerial de fonte vedada de financiamento de campanha proveniente de doadora, pessoa física, permissionária de uso de bem público (quiosque municipal) para o exercício de atividade da iniciativa privada de venda de sorvetes e deixo de determinar o recolhimento do valor de R$ 13.000,00 aos cofres públicos.

 

c) aplicação irregular do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC)

A unidade técnica realçou a aplicação irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) no montante total de R$ 16.115,00, sendo R$ 4.500,00 gastos com o fornecedor Hotel Plaza e outros R$ 11.615,00 pagos pela contraprestação de serviços de militância (item 4 do parecer conclusivo, ID 45578160).

Sobre o pagamento de R$ 4.500,00 efetuados ao fornecedor Predial e Administradora Hotéis Plaza SA (c1), muito embora a defesa apresente a fatura n. 13.475 e o respectivo comprovante de pagamento, faltam informações complementares - de que se trata de “locação de sala para reunião com cunho eleitoral” - capazes de aferir se os dispêndios se relacionam (ou não) a despesas de natureza pessoal, como determina o art. 35, § 6º, da Resolução TSE n. 23.607/19 (fatura e comprovante de pagamento, ID 45508556; defesa, ID 45508544, p. 10). 

Ademais, nenhuma prova veio aos autos da efetiva realização de atos partidários ou de campanha, tais como por exemplo fotos ou vídeos.

De outro lado (c2), o órgão técnico consignou a inexistência do instrumento contratual - o que impede a verificação de cláusulas essenciais como locais de trabalho, horas trabalhadas, especificação das atividades executadas e justificativa do preço contratado, exigidas por força do § 12 do art. 35 da Resolução TSE n. 23.607/19 - referente à contratação de Gustavo dos Santos Moraes (R$ 4.000,00, ID 45348818 e 45348674), de Gonçalo Rodrigues dos Santos (R$ 2.000,00, ID 45348777), de Geovani Marcius Rodrigues dos Santos (R$ 2.000,00, ID 45348706), de Juliana Bairros Vinade (R$ 2.015,00, ID 45348764 e 45348620) e de Gabriel Kummer de Souza (R$ 1.600,00, ID 45348693 e 45348766), totalizando a importância de R$ 11.615,00 (R$ 4.000,00 + R$ 2.000,00 + R$ 2.000,00 + R$ 2.015,00 + R$ 1.600,00) .

Intimada, a agremiação apresentou, junto aos respectivos comprovantes de transferência bancária, apenas a fatura n. 13.475 do Hotel Plaza e os recibos de pagamento a autônomo (RPA) dos demais fornecedores, sem contudo juntar os correspondentes instrumentos contratuais com as cláusulas exigidas pela contabilidade eleitoral (fatura e comprovante de pagamento, ID 45508556; RPAs e comprovantes de pagamento, ID 45348818, 45348674, 45348777, 45348706, 45348764, 45348620, 45348693 e 45348766).

De fato, do exame dos autos, não verifico cópia dos contratos com os fornecedores Predial e Administradora Hotéis Plaza SA, Gustavo dos Santos Moraes, Gonçalo Rodrigues dos Santos, Geovani Marcius Rodrigues dos Santos, Juliana Bairros Vinade e Gabriel Kummer de Souza, em desatenção às exigências dos arts. 35, §§ 6º; 12; 53, inc. II, al. "c”, e 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19 (item 4.1 do parecer conclusivo, ID 45563141). Tais documentos são imprescindíveis para verificar a vinculação da despesa com a campanha eleitoral e os atos relativos ao pleito.

Portanto, à vista da ausência das informações seguras de que tratam os arts. 35, §§ 6º; 12; 53, inc. II, al. “c”, e 60, caput, da Resolução TSE n. 23.607/19, fator que culmina na impossibilidade de fiscalização e transparência sobre o conteúdo e os requisitos legais dessa prestação de serviço, considera-se irregular a utilização de recursos originados do FEFC na quantia de R$ 16.115,00 (R$ 4.500,00 + R$ 11.615,00, a qual deve ser recolhida ao Tesouro Nacional consoante dispõe o § 1° do art. 79 da Resolução TSE n. 23.607/19.

 

d) destinação de recursos do Fundo Partidário em percentual insuficiente para atender a política afirmativa de gênero e de raça.

Segundo item 5 do parecer técnico, não foram destinados do Fundo Partidário R$ 10.211,47 à política afirmativa de gênero e de raça, não sendo alcançados as importâncias de R$ 2.852,23 e de R$ 7.359,24, respectivamente, para a promoção de candidaturas femininas e de pessoas negras (ID 45578160).

A própria grei, em resposta, admite o repasse menor de valores do Fundo Partidário para cumprimento destas ações afirmativas, comprometendo-se desde logo à correspondente compensação desta omissão (respostas aos itens 5.1 e 5.1.2 do parecer na petição de ID 45508544, p. 11).

Efetivamente, destinou-se às candidaturas femininas e negras recursos do Fundo Partidário aquém dos percentuais mínimos exigidos pela atual jurisprudência (STF: ADI n. 5.617/DF, DJE de 03.10.2018, e ADPF- MC n. 738/DF, DJE de 29.10.2020; e TSE: Consulta n. 0600252-18, DJE de 15.8.2018, e Consulta n. 0600306-47, DJE de 05.10.2020) e pelo art. 19, § 3º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Dessarte, representa-se irregular a aplicação de recursos do Fundo Partidário diante da ausência de financiamento à promoção de candidaturas femininas e de pessoas negras no montante de R$ 10.211,47 o qual deve ser recolhido aos cofres públicos, na forma do art. 19, § 9º, da Resolução TSE n. 23.607/19.

Aliás, essa Casa reafirma a aplicação deste dispositivo nas eleições de 2022 conforme os precedentes abaixo colacionados:

PRESTAÇÃO DE CONTAS. DIRETÓRIO ESTADUAL. PARTIDO POLÍTICO. ELEIÇÕES 2022. ATRASO NOS REPASSES DE RECURSOS ÀS CANDIDATURAS FEMININAS, DE MULHERES NEGRAS E DE HOMENS NEGROS. AUSÊNCIA DE DESTINAÇÃO DO PERCENTUAL MÍNIMO DO FUNDO PARTIDÁRIO ÀS CANDIDATURAS MASCULINAS DE PESSOAS NEGRAS. BAIXO PERCENTUAL. APLICADOS OS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. APROVAÇÃO COM RESSALVAS.

(…)

3. Ausência de destinação do percentual mínimo do Fundo Partidário às candidaturas masculinas de pessoas negras. A agremiação não negou a insuficiência de repasse. O § 9º do art. 19 da Resolução TSE n. 23.607/19 estabelece que o repasse de recursos do Fundo Partidário em desacordo com as regras de distribuição configura aplicação irregular dos recursos públicos. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(...)

5. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE/RS – PCE nº 060279737, Relator Desembargador Voltaire De Lima Moraes, Publicação: DJE, 06/03/2024).

 

PRESTAÇÃO DE CONTAS. ELEIÇÕES 2022. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. PARECER TÉCNICO E DO ÓRGÃO MINISTERIAL PELA DESAPROVAÇÃO DAS CONTAS. RECURSOS DE ORIGEM NÃO IDENTIFICADA - RONI. OMISSÃO DE GASTO. QUITAÇÃO DE VALORES SEM DEMONSTRAÇÃO DE ORIGEM. USO INDEVIDO DE VERBAS DO FUNDO PARTIDÁRIO - FP. APLICAÇÃO IRREGULAR. COTAS DE GÊNERO E COTAS DE CANDIDATURAS DE PESSOAS NEGRAS. AUSÊNCIA DE REPASSE. TRANSFERÊNCIA INTEMPESTIVA. IRREGULARIDADES QUE ULTRAPASSAM OS PARÂMETROS FIXADOS PARA A APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. DETERMINAÇÃO DE RECOLHIMENTO DE VALORES IRREGULARES AO TESOURO NACIONAL. DESAPROVAÇÃO.

(…)

3. Uso indevido de verbas do Fundo Partidário - FP. 3.1. Ausência de repasse para as candidaturas masculinas e femininas de pessoas pretas ou pardas. Inobservância do disposto na art. 19, §§ 3º, 5º, 9º, da Resolução TSE n. 23.607/19 e na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental n. 738/DF. (…)

(…)

5. Desaprovação. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE/RS – PCE n. 0602607-74, Relator Desembargador Eleitoral. Nilton Tavares Da Silva, Publicação: DJE, 28/06/2024)

Desta forma, resta configurada a aplicação irregular de R$ 10.211,47 procedentes do Fundo Partidário, devendo essa importância ser restituída ao erário, na forma do art. 19, §§ 3º, 5º, 8º e 9º, c/c o art. 79, § 1º, todos da Resolução TSE n. 23.607/19.

e) Conclusões

As irregularidades passíveis de ressalva nessa contabilidade, no valor total de R$ 150.480,63 (R$ 124.154,16 + R$ 16.115,00 + R$ 10.211,47), representam 3,36% do total das receitas declaradas na campanha (R$ 4.469.781,75), e enquadram-se no parâmetro (inferior a 10% da arrecadação financeira) fixado, na jurisprudência desta Justiça especializada, de aplicação dos princípios de razoabilidade e de proporcionalidade, para aprovar com ressalvas estas contas na forma do art. 74, inc. II, da Resolução TSE n. 23.607/19 e para afastar a incidência da penalidade de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário prevista no art. 25, parágrafo único, da Lei n. 9.504/97:

PRESTAÇÃO DE CONTAS DE CAMPANHA. ELEIÇÕES 2020. PARTIDO POLÍTICO. DIRETÓRIO ESTADUAL. APLICAÇÃO IRREGULAR DE RECURSOS DO FUNDO ESPECIAL DE FINANCIAMENTO DE CAMPANHA - FEFC. DESPESAS REALIZADAS POR ASSESSOR POLÍTICO. REEMBOLSO PELA AGREMIAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO ART. 44-A, DA LEI N. 9.096/95, POR ANALOGIA. ARTIGO COM APLICAÇÃO CIRCUNSCRITA ÀS PRESTAÇÕES DE CONTAS DE EXERCÍCIO FINANCEIRO. GASTOS DE SERVIÇOS CONTÁBEIS E DE ADVOCACIA. COMPROVADAS AS DESPESAS. POSSIBILIDADE DE ARRECADAÇÃO DE RECURSOS EXCLUSIVAMENTE PARA A QUITAÇÃO DE DESPESAS JÁ CONTRAÍDAS E NÃO PAGAS ATÉ O DIA DO PLEITO, NOS TERMOS DO ART. 33, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.607/19. APLICAÇÃO DE RECURSOS DO FUNDO PARTIDÁRIO. DETERMINADO O RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL. FALHAS NO REPASSE DE QUOTAS DE GÊNERO E ÉTNICAS. EC 117/22. IMPOSSIBILIDADE DE IMPOSIÇÃO DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES AO ERÁRIO. BAIXA REPRESENTATIVIDADE DAS IRREGULARIDADES REMANESCENTES. VIABILIDADE DE APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. APROVAÇÃO COM RESSALVAS. RECOLHIMENTO AO TESOURO NACIONAL.

(...)

7. Possibilidade de aplicação dos postulados da razoabilidade e da proporcionalidade, diante da reduzida representação percentual da falha, na esteira da jurisprudência firmada nesta Corte, uma vez que não compromete o balanço contábil como um todo, circunstância que afasta, igualmente, a sanção de suspensão do recebimento de cotas do Fundo Partidário, restrita aos casos de desaprovação da contabilidade, consoante art. 25, parágrafo único, da Lei n. 9.504/97, porquanto “o apontamento de ressalva não descaracteriza o fato de que a contabilidade foi aprovada, ainda que não integralmente, situação incompatível com a fixação de penalidade” (TRE-RS, PC 0600288-75, Relator: Des. Eleitoral Gerson Fischmann, julgado em 15.6.2020, DJE de 23.6.2020).

8. Aprovação com ressalvas. Recolhimento ao Tesouro Nacional.

(TRE/RS – PCE n. 0600413-72, Relator Desembargador Eleitoral Caetano Cuervo Lo Pumo, Publicação: DJE, 20/03/2023).

Todavia, divirjo da Procuradoria Regional Eleitoral para deixar de determinar o recolhimento ao erário da doação de R$ 13.000,00 efetuada por permissionária de uso de bem público para desenvolver atividade da iniciativa privada.

Ante o exposto, VOTO pela aprovação com ressalvas das contas relativas ao pleito de 2022 apresentadas por DIRETÓRIO ESTADUAL DO PARTIDO DOS TRABALHADORES DO RIO GRANDE DO SUL e pelo recolhimento de R$ 150.480,63 ao Tesouro Nacional, acrescidos de juros e de correção monetária, relativos à aplicação irregular de recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) no valor de R$ 16.115,00, e do Fundo Partidário na importância de R$ 10.211,47, bem como o recebimento de recursos de origem não identificada no montante de R$ 124.154,16.

Com o trânsito em julgado, anotações de estilo e satisfação de obrigações, arquivem-se os autos com baixa na instância pertinente.