RecCrimEleit - 0600127-35.2021.6.21.0073 - Voto Relator(a) - Sessão: 24/10/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é tempestivo e atende aos demais pressupostos recursais atinentes à espécie, de modo que está a merecer conhecimento.

No caso dos autos, a matéria controversa restringe-se à valoração da prova dos autos, relativa à comprovação da prática, de parte de EMÍLIO DORÍLIO LEITE, do tipo penal previsto no art. 39, § 5º, da Lei n. 9.504/97.

Transcrevo o dispositivo em questão:

(...)

5º Constituem crimes, no dia da eleição, puníveis com detenção, de seis meses a um ano, com a alternativa de prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período, e multa no valor de cinco mil a quinze mil UFIR:

(...)

IV - a publicação de novos conteúdos ou o impulsionamento de conteúdos nas aplicações de internet de que trata o art. 57-B desta Lei, podendo ser mantidos em funcionamento as aplicações e os conteúdos publicados anteriormente.

 

Inicialmente, a d. Promotoria Eleitoral atuante na 073ª Zona, em resumo, atribuiu a EMILÍO a prática delituosa nos seguintes termos, constantes na petição inicial:

(...)

A toda evidência, não poderia o candidato, no dia da eleição, impulsionar ou manter impulsionado conteúdo de propaganda eleitoral, sob pena de incorrer no artigo 39, §5º, IV, da Lei 9504/1997.

Nessa linha, aqueles que, ainda que em data anterior, contrataram impulsionamento para o dia da eleição, ou para período que abrangesse o dia da eleição, mesmo que iniciado anteriormente, praticaram o citado delito.

Não se pode admitir que a contratação realizada antes do dia 15 de novembro de 2021 para impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral naquela data, ou iniciado nos dias anteriores e mantido ativo até o dia da eleição inclusive, seja considerada lícita, pois se estaria chancelando evidente burla ao sistema eleitoral posto, tratando-se, em outras palavras, de premeditação do ilícito, e não de uma excludente. Conforme demonstra a documentação anexa, EMILIO DORILIO LEITE, candidato a vereador, impulsionou propaganda eleitoral no dia da eleição de 2020, primeiro turno.

 

O Juízo da Origem, contudo, considerou a moldura fática insuficiente para a construção de um juízo de condenação, de forma que absolveu EMÍLIO DORÍLIO LEITE:

No caso dos autos, de acordo com a inicial acusatória, o requerido contratou um impulsionamento junto ao Facebook de conotação eleitoral e que permaneceu ativo no dia 16 de novembro de 2015, ou seja, durante o pleito e após.

O acusado admite a contratação do impulsionamento, assim como o conteúdo do eleitoral dele, relativamente ao pleito de 2020 para o cargo de vereador.

Ocorre que a prova constante nos autos não permite concluir minimamente que o fato imputado ao acusado se deu nos termos como narrados na denúncia. Não há indícios com o grau de suficiência mínimo para a condenação do autor.

Passo à análise detalhada da prova.

Inicialmente, quanto as testemunhas, foram ouvidas a Promotora Carla Lara Adami da Silva, que atou na promotoria eleitoral na data do pleito, bem como o Oficial André Silva Alves, que atuou nas apurações de denúncias de impulsionamento ilegal de propaganda eleitoral

A testemunha Carla Lara Adami da Silva referiu que naquela eleição surgiram denúncias de propaganda irregular e impulsionamento. Num primeiro momento foram analisadas as denúncias e foi feito um levantamento de material de campanha no Facebook na data da eleição. Na época essa pesquisa era feita com facilidade na biblioteca do Facebook, e a própria depoente fez a pesquisa, embora os dados tenham sido extraídos posteriormente pelos Oficiais da promotoria. Foi feita uma triagem para certificar qual candidato havia feito o impulsionamento, com base nos dados dos candidatos do TRE. O oficial André fez as diligências nos perfis em que foi constatado impulsionamento. Não sabe explicar o motivo das divergências entre o que constava na época da diligência e o que consta atualmente. As diligências não contaram com a participação Facebook, pois foram feitas por acesso direto na biblioteca, de acesso ao público. Estima que em torno de 10% dos candidatos praticaram essa conduta, não se tratando de caso isolado. Recorda, sem sombra de dúvida, que na época constatou o impulsionamento tanto da rede quanto na biblioteca, mas não sabe porque essa informação é diferente hoje.

André Silva Alves disse que realizou uma série de diligências sobre propaganda no Facebook. Fez diligências de coleta de prints de telas de páginas de propaganda, por determinação da Promotora Carla Adami, e já tinha uma relação das candidaturas que tinham denúncia e que tinham "coberto o dia da eleição". A sua certidão retrata o que foi constatado na época; não sabe o motivo da mudança das informações na biblioteca do Facebook. Teve vista do conteúdo dos links colacionados na denúncia e confirmou ter realizado as diligências. A data da certidão coincide com a data da extração dos dados junto ao Facebook. A certidão abrangeu apenas as propagandas que alcançaram a data da eleição. Cumpriu a determinação solicitada pela promotora Carla. Não houve oficiamento prévio ao Facebook, apenas extraídos dados da biblioteca. Não soube dizer se o link da denúncia é o mesmo da certidão.

O réu, por sua vez, disse que o impulsionamento foi feito até o dia 14 e que tem conhecimento da legislação. Não foi o réu que fez o cadastro, foi contratada uma pessoa pelo partido para fazer isso, mas não sabe quem é. Tem conhecimento de que outros candidatos tiveram o mesmo problema. Não entrou em contato com o Facebook após ter ciência dos fatos. O dinheiro investido nos impulsionamentos foi declarado na prestação de contas. Não recorda do teor das propagandas, embora confirme que tenha feito vídeos. O candidato a prefeito era o delegado Heliomar.

A fim de comprovar os fatos alegados na denúncia, o Ministério Público valeu-se de "prints" de tela do Facebook, produzidos no procedimento investigatório criminal 00890.000.980/2020 e que foram retirados do site da referida aplicação de internet, no campo "dados por trás do anúncio". Neles consta a expressão "inativo", bem como as referências de datas "09 de Nov 2020 - 16 de Nov de 2020" (ID704747020165830), "12 de Nov 2020 - 16 de Nov 2020" (ID 657481058462066) e "11 de Nov - 16 de Nov de 2020" (ID 767023820812699). Assim, com base nessas referências de datas, entende o autor que a publicação se estendeu até a data do pleito municipal de 2020 e no dia seguinte.

Ocorre que o acusado, em sua defesa, sustenta que a informação que consta atualmente nos links da denúncia, oriundos da mesma aplicação de internet, refere que essas publicações perduraram até no máximo 14 de novembro de 2020, data anterior ao pleito. O próprio Ministério Público admite a divergência de informações.

De se destacar que a imputação fática feita na denúncia é de que o impulsionamento é indevido uma vez que estava ativo na data do pleito.

Na medida em que as informações constantes nos autos a respeito do lapso temporal desses anúncios são divergentes, embora provenientes da mesma aplicação de internet, mas em sentido contrário ao da denúncia, a conclusão é no sentido de que o acervo probatório não é minimamente seguro no sentido da prática da infração penal imputada.

Não se trata de pôr em dúvida as diligências feitas pela promotoria, mas apenas de reconhecer que, em havendo dúvida, o julgamento deve ser favorável ao réu.

Desse modo, diante do exíguo conjunto probatório acerca dos fatos narrados na denúncia a absolvição do réu é medida que se impõe.

 

Considero a sentença irretocável, antecipo, com a devida vênia ao posicionamento exarado pela d. Procuradoria Regional Eleitoral.

Ressalto, por importante, que não se está a menosprezar a força probatória das certidões exaradas pelo servidor do respeitável Ministério Público Eleitoral, ou do vivenciado pela d. Promotora Eleitoral atuante perante a 073ª Zona Eleitoral - como aliás também referido pelo juízo a quo.

De forma alguma.

É que, alinhado ao Juízo de Origem, entendo que se mostraram absolutamente frágeis as informações prestadas pela plataforma social Facebook.

Quer pela oscilação dos dados que fornece, quer porque não há, a rigor, uma responsabilização específica em relação ao que informa - uma chave criptografada ou um QR Code, por exemplo - fato é que houve o fornecimento de informações não apenas desencontradas, mas opostas.

Sabe-se, no caso posto, que EMÍLIO de fato contratou o impulsionamento - mas escapa dos autos o seu grau de ingerência em relação ao manejo das datas de publicação, por exemplo.

De todo modo, tenho que não há, nos autos, acervo probatório suficiente para a emissão de um juízo condenatório. A dúvida no relativo à data de encerramento do impulsionamento de propaganda eleitoral na Internet há de militar em prol do recorrido.

Em matéria criminal, exige-se certeza. Na dúvida, impõe-se a absolvição. É o caso.

 

Diante do exposto, VOTO para NEGAR PROVIMENTO ao recurso criminal interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ELEITORAL, nos termos da fundamentação.