REl - 0600020-13.2024.6.21.0161 - Voto Relator(a) - Sessão: 23/10/2024 às 14:00

VOTO

O apelo é tempestivo. Ademais, encontram-se presentes todos os demais pressupostos processuais exigíveis para a espécie, de modo que a irresignação está a merecer conhecimento.

No mérito, o SINDICATO DOS MUNICIPÁRIOS DE PORTO ALEGRE insurge-se em relação à condenação pecuniária, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), ao argumento de estar garantida ao Sindicato a realização de crítica política, desde que não haja menção direta e expressa ao pleito eleitoral ou pedido de votos/não-votos a candidatura. Ainda, sustenta que a expressão “Fora Melo” não está associada ao pleito eleitoral, “e diz, sim, com a desaprovação de dado governo”.

No campo normativo e para o regramento do caso posto, a propaganda paga na internet recebe regulamentação no art. 29 da Resolução TSE n 23.610/19:

Art. 29. É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos políticos, federações, coligações, candidatas, candidatos e representantes ( Lei n. 9.504/97, art. 57-C, caput ). (Redação dada pela Resolução n. 23.671/21)

§ 1º É vedada, ainda que gratuitamente, a veiculação de propaganda eleitoral na internet em sítios (Lei nº 9.504/1997, art. 57- C, § 1º, incs. I e II) :

I - de pessoas jurídicas, com ou sem fins lucrativos;

II - oficiais ou hospedados por órgãos ou por entidades da administração pública direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

§ 2º A violação do disposto neste artigo sujeita a(o) responsável pela divulgação da propaganda ou pelo impulsionamento de conteúdos e, quando comprovado seu prévio conhecimento, a pessoa beneficiária, à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais) ou em valor equivalente ao dobro da quantia despendida, se esse cálculo superar o limite máximo da multa (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, § 2º) .

(Grifei.)

Em relação aos fatos, a peça publicitária impugnada fora postada no perfil do Instagram “simpapoa”, inequivocamente pertencente ao SINDICATO DOS MUNICIPÁRIOS DE PORTO ALEGRE, e apresenta imagem de banner.

O artefato em questão recobre a lateral de caminhão de porte médio. Possui imagens da enchente de maio de 2024 e, em letras garrafais, “ESTÁ NA HORA DE RESGATAR NOSSA CIDADE”, “PORTO ALEGRE URGENTE, SERVIÇO PÚBLICO PRESENTE!” e “FORA MELO”, como se verifica:

 

 

Diante de tal moldura fática, a sentença condenatória foi fundamentada nos seguintes termos:

(...)

No caso em exame, foi constatado que, de fato, o Sindicato postou nas redes sociais publicação de “outdoor móvel”, com as frases “Fora Melo” e “Está na hora de resgatar nossa cidade”, expressões que remetem, evidentemente, às próximas eleições municipais, o que é vedado pela legislação eleitoral por tratar-se de pessoa jurídica. Em especial, a expressão "Fora Melo!", no contexto em que o representante Sebastião Melo é o atual Prefeito, e concorre à reeleição, não tem outro objetivo senão o de estimular os destinatários da mensagem a não votar no candidato, ou seja, se caracteriza, claramente, como pedido de não voto, ao contrário do sustentado na resposta, com a devida vênia.

Ainda que o sindicato, no exercício da liberdade que a Constituição Federal lhe assegura, possa, por sua Diretoria, emitir opiniões e críticas de conteúdo político, contrárias ou favoráveis a quaisquer administradores públicos, tal prerrogativa não se estende a atos de propaganda eleitoral, como pedidos de voto ou de não voto.

Isto porque, independente de sua finalidade e da proteção constitucional de que desfruta não perde a natureza de pessoa jurídica e, como tal, está impedido de veicular propaganda eleitoral na internet.

Reiterando os termos da decisão ID 123244783, reitero que é cediço que tanto o pedido de voto quanto o de não voto caracterizam propagando eleitoral, bem como induvidoso que o representado é pessoa jurídica. Assim, o pedido de não voto levado a efeito por pessoa jurídica implica, em princípio, na afronta à vedação imposta pela norma de regência da propaganda eleitoral.

(...)

ISSO POSTO, JULGO PROCEDENTE a Representação, com fundamento no artigo 29, § 1º, inciso I, da Resolução 23.610/2019, ratificando os termos da liminar, e condeno o representado ao pagamento de multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), valor no patamar mínimo previsto, nos termos do artigo 29, 2º, da referida Resolução.

(Grifei.)

Pois bem.

Inicialmente, vale asseverar que a publicação em si mesma consiste em expressa crítica - nas palavras do próprio sindicato recorrente - “denunciando a gestão do prefeito Sebastião Melo pela precarização dos serviços oferecidos à população e pelas péssimas condições de trabalho na Prefeitura” .

Tenho, ademais, por evidente, que discursos de oposição a governos, bem como na defesa de filiados, encontram-se no bojo das legítimas manifestações das organizações sindicais, como o caso do SIMPA. No relativo ao conteúdo, dessarte, tenho que meras críticas governamentais seriam aceitáveis, inclusive salutares ao debate público acerca dos servidores públicos municipais. Contudo, o ente não pode se eximir de atentar à legislação eleitoral, pois a manifestação  objeto da presente análise ingressou, evidentemente, na seara eleitoral em curso, por pessoa jurídica. Ora, encontramo-nos no ápice do período eleitoral, e o recorrente não poderia descurar de tal circunstância.

Tenho, assim. como concretamente evidenciada a divulgação de vídeo com conteúdo de propaganda eleitoral (de cunho negativo) em perfil de pessoa jurídica, com inegável prévio conhecimento, de modo que se impõe o reconhecimento da irregularidade. 

Esse o entendimento do e. TSE e também desta Corte:

ELEIÇÕES 2022. REPRESENTAÇÃO POR PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET. SITE HOSPEDADO NO EXTERIOR. DOMÍNIO REGISTRADO EM NOME DE PESSOA JURÍDICA. CLARA VIOLAÇÃO AOS ART. 57-B E 57-C, §1º, INCISO I, DA LEI Nº 9.504/1997. ILEGALIDADE QUE CONTAMINA AS CONTAS RELACIONADAS EM REDES SOCIAIS. IMPUGNAÇÃO EM ATACADO E POR AMOSTRAGEM DE TODO O CONTEÚDO POSTADO EM SÍTIO DA INTERNET. IMPOSSIBILIDADE. PRETENSÃO INCOMPATÍVEL COM A ATUAÇÃO NECESSARIAMENTE CIRÚRGICA E MINIMALISTA DESTA JUSTIÇA ELEITORAL (ART. 38 DA RES.-TSE 23.610/2019). LIMINAR CONCEDIDA. RETIRADA DO SITE DO AR. MEDIDA LIMINAR REFERENDADA.

1. Revela-se inviável a pretensão de derrubada de todo um site, com base na impugnação, por amostragem, apenas de alguns conteúdos ali postados, pois o minimalismo e a atuação necessariamente cirúrgica que devem nortear a intervenção desta Justiça Eleitoral no livre mercado ideias políticas e eleitorais são incompatíveis com qualquer supressão discursiva em atacado. Art. 38 Res.-TSE 23.610/2019.

2. Vícios de conteúdo, se e quando existentes, devem ser impugnados um a um, objetiva e concretamente, com a indicação da respectiva URL, de sorte a autorizar a intervenção necessariamente pontual e cirúrgica desta Casa. Doutrina. Precedentes.

3. Caso de site em que se veicula conteúdo configurador de propaganda eleitoral, mas cujo domínio está registrado em nome de pessoa jurídica, além de estar hospedado em provedor de serviço no exterior, em destacada ofensa à legislação eleitoral regente. Manifesta ilegalidade.

4. O art. 57-B, I e II da Lei nº 9.504/1997 é claro ao proibir a promoção de qualquer tipo de propaganda eleitoral na Internet, positiva ou negativa, em site hospedado no exterior, o que dificulta o controle por esta Justiça Eleitoral e as devidas responsabilizações, inclusive no que concerne à origem dos recursos financeiros destinados à produção de material publicitário de campanha política. Precedentes.

5. A divulgação de propaganda eleitoral em site cujo domínio esteja registrado em nome de pessoa jurídica enquadra-se na vedação contida no art. 57-C, §1º, inciso I, da Lei nº 9.504/1997. Precedentes.

6. Medida liminar referendada.

(Referendo na Representação nº060099586, Acórdão, Min. Maria Claudia Bucchianeri, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, 26/10/2022.)

 

RECURSO. ELEIÇÕES 2020. REPRESENTAÇÃO. VEICULAÇÃO DE PUBLICIDADE NEGATIVA. INTERNET. FACEBOOK. IMPROCEDÊNCIA. ABUSO DO DIREITO À LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. ART. 27, § 1º, DA RESOLUÇÃO TSE N. 23.610/19. PROPAGANDA ELEITORAL NEGATIVA REALIZADA POR PESSOA JURÍDICA. ART. 57-C, § 1º, INC. I, DA LEI N. 9.504/97. MULTA. PROIBIÇÃO DE NOVA VEICULAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. PROVIMENTO.

1. Insurgência em face de decisão que julgou improcedente a representação por propaganda irregular, com fundamento na ausência de ofensa ao art. 57-C, § 1º, da Lei Eleitoral, por veiculação de publicidade negativa na internet.

2. Embora o debate político mereça ser estimulado, e a intervenção da Justiça Eleitoral deva ser a menor possível, determinados termos e afirmações devem ser evitados, porquanto o exercício da autonomia privada e da liberdade de expressão, como qualquer direito individual, precisa estar em harmonia com outros valores constitucionais, como o direito de imagem, privacidade e dignidade da pessoa humana. O art. 57-D da Lei n. 9.504/97, c/c com os arts. 10 e 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19, assegura o exercício da liberdade de expressão na propaganda eleitoral por meio da internet, regulamentando o afastamento dos excessos. Paralelamente, a Resolução TSE n. 23.610/19 estabeleceu que a livre manifestação do pensamento somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem, ou divulgar fatos sabidamente inverídicos sobre candidatos, partidos ou coligações, ainda que antes do início do período da propaganda eleitoral (art. 27, §§ 1º e 2º).

3. Na hipótese, postagem no Facebook contendo afirmação que busca levar os eleitores a não votarem na candidata, objetivando a não captação de voto para ela, caracteriza propaganda eleitoral negativa. Abuso do direito à livre manifestação do pensamento, ocasionando possível ofensa à honra e à imagem da recorrente, circunstância que ultrapassa o debate político propositivo, não se incluindo no permissivo legal do art. 27, § 1º, da Resolução TSE n. 23.610/19.

4. Veiculação de propaganda eleitoral na internet realizada por pessoa jurídica, em violação ao estabelecido no art. 57-C, § 1º, inc. I, da Lei n. 9.504/97. Fixação de multa atendendo aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

5. Impossibilidade de deferimento do pedido de remoção do conteúdo impugnado, uma vez que o material não se encontra mais disponível. Determinada a proibição do recorrido de veicular novamente a mencionada postagem.

6. Provimento.

(TRE-RS. 0600069-93.2020.6.21.0161. Des. Eleitoral Roberto Carvalho Fraga. Julgado em 23/11/2020, Publicado em sessão.)

 

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO por negar provimento ao recurso.