REl - 0600112-81.2024.6.21.0034 - Voto Relator(a) - Sessão: 21/10/2024 00:00 a 23:59

VOTO

A sentença condenou os recorrentes Marciano Perondi e Coligação Pelotas Voltando A Crescer! ao pagamento de multa individual de R$ 10.000,00, em razão da veiculação de propaganda eleitoral negativa por intermédio da veiculação de anúncios pagos, via impulsionamento de conteúdo de internet de três peças publicitárias nas redes sociais Instagram e Facebook, conforme o disposto no art. 57-C, §2º, da Lei n. 9.504/97, pela violação ao art. 29, § 3º, da Resolução TSE n. 23.610/19.

As propagandas fazem críticas a adversários políticos com o uso de fantoches e bonecos. Transcrevo as razões de decidir da sentença recorrida (ID 45722171):

(…)

O MPE reconhece que o uso de fantoches e bonecos, por si só, não configura violação da legislação eleitoral, mas o conteúdo dos anúncios veiculados promoveu críticas diretas a candidatos adversários, algo vedado no caso de propagandas impulsionadas na internet. A legislação eleitoral exige que o impulsionamento de conteúdo na internet seja utilizado apenas para promover o próprio candidato, não para criticar adversários.

 

O Ministério Público recomenda a aplicação de sanção pecuniária aos representados, conforme previsto na lei, reforçando que o impulsionamento de conteúdo negativo é proibido.

 

Assim, a questão em análise diz respeito à regularidade de propagandas eleitorais impulsionadas nas redes sociais por meio de anúncios pagos que continham conteúdo negativo direcionado a adversários políticos, em especial aos candidatos Fernando Marroni e Fernando Estima. A legislação eleitoral, no artigo 29, §3º, da Resolução TSE nº 23.610/2019, é clara ao determinar que o impulsionamento de propaganda eleitoral deve ser utilizado exclusivamente para promover o próprio candidato ou sua agremiação, sendo vedado o uso de impulsionamento para criticar, atacar ou induzir a ideia de não voto em adversários.

 

No caso em questão, as publicações analisadas veicularam conteúdo de caráter crítico e negativo, o que configura propaganda eleitoral irregular. O uso de fantoches e bonecos, embora não configure violação por si só, foi utilizado em um contexto de desqualificação dos adversários, caracterizando infração à norma eleitoral.

 

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem decidido, reiteradamente, que a crítica política, por mais contundente que seja, deve observar os limites legais, especialmente quando se trata de impulsionamento pago. A jurisprudência citada pelo MPE reforça que o impulsionamento de conteúdo negativo é vedado, e que a sanção aplicável é a multa pecuniária prevista no art. 57-C, §2º, da Lei 9.504/97.

 

Diante dos elementos apresentados nos autos, resta comprovada a prática de propaganda eleitoral irregular pelos representados.

(...)

 

Assiste razão à julgadora ao entender que a propaganda em tela tem natureza negativa, de crítica a opositores, e que o impulsionamento é irregular. A sentença não viola os princípios e as disposições legais invocados no recurso.

O caráter negativo da propaganda foi reconhecido por este Tribunal no julgamento do recurso REl n. 0600102-37.2024.6.21.0034, da relatoria do ilustre Des. Eleitoral Volnei dos Santos Coelho, publicado em sessão em 24.9.2024, cuja ementa cumpre transcrever:

Direito eleitoral. Eleições 2024. Recurso. Representação improcedente. Propaganda eleitoral irregular. Programação televisiva. Uso de fantoches. Alegação de propaganda negativa. Recurso desprovido.

 

I. CASO EM EXAME

 

1.1. Recurso interposto contra sentença que julgou improcedente a representação por propaganda eleitoral irregular veiculada por coligação e seus candidatos à majoritária.

 

1.2. Alegada a ausência de texto obrigatório e de interpretação parcial em LIBRAS, além de uso de fantoches para ridicularizar seus candidatos.

 

1.3. O pedido de concessão de liminar para suspender a divulgação foi indeferido, em razão da ausência de verossimilhança do direito invocado.

 

II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO

 

2.1. Ausência de informações obrigatórias, como falta de legenda e interpretação integral em LIBRAS.

 

2.2. Conteúdo de caráter ofensivo à honra ou à imagem.

 

III. RAZÕES DE DECIDIR

 

3.1. A falta de elemento obrigatório na apresentação da propaganda somente acarretaria sanção de multa caso não tivesse sido atendida a ordem judicial de regularização.

 

3.2. Na espécie, a falta de legenda e de interpretação em LIBRAS foi corrigida pelos recorridos, que apresentaram imagem do vídeo com os elementos devidamente regularizados. Essas correções foram confirmadas tanto no parecer do órgão ministerial atuante na origem quanto na sentença.

 

3.3. A legislação de regência da propaganda eleitoral estabelece limites temporais e éticos a serem observados por candidatos, partidos e eleitores, e confere posição preferencial à liberdade de expressão, a menos que haja ofensa à honra ou à imagem do candidato.

 

3.4. O conteúdo do vídeo não adentra ao campo da ofensa pessoal à imagem dos candidatos. Há alusões críticas, especialmente no que diz respeito a reeleições de antigos candidatos, mas tal argumento é próprio dos discursos de concorrentes que inauguram carreiras políticas. Tom das críticas sem potencial de ofensa à honra ou à imagem.

 

3.5. É entendimento pacífico, desta Corte e do TSE, que a exposição a críticas, ainda que de gosto duvidoso, exageradas, condenáveis, satíricas e humorísticas são abrigadas pelo direito fundamental à liberdade de expressão. Na hipótese, restou reconhecido o legítimo exercício do direito constitucional à liberdade de expressão na seara da crítica a concorrentes no pleito.

 

IV. DISPOSITIVO E TESE

 

4.1. Recurso desprovido.

 

Tese de julgamento: “Regularizada a ausência de elementos obrigatórios na apresentação da propaganda, inexiste sanção. O uso de fantoches em propaganda eleitoral, desde que não ultrapasse os limites da liberdade de expressão e não constitua ofensa à honra, não caracteriza propaganda negativa irregular.”

 

Dispositivos relevantes citados: Resolução TSE n. 23.610/19, arts. 27 e 9º-C.

 

Jurisprudência relevante citada: Representação n. 060108060, TRE-RO; ADI 4.451, rel. Min. Alexandre de Moraes, julgada em 06.10.2015.

 

Conforme consta das razões do voto em questão: “Há, por certo, alusões críticas especialmente no que diz respeito a reeleições de antigos candidatos, mas friso que tal argumento é próprio dos discursos de concorrentes que inauguram carreiras políticas - aliás, uma vez consolidada a nova carreira, é certo que será futuramente exposto, veja só, exatamente à mesma crítica. Relativamente ao tom das críticas, vale dizer que beira o pueril, com várias passagens com falas infantilizadas, visivelmente caricatas, sem o menor potencial de ofensa à honra ou à imagem”.

Considerando que a propaganda foi impulsionada e traz conteúdo negativo a outros candidatos, é manifesto seu caráter irregular. As publicidades apresentam posicionamento pessoal sobre questões políticas e apresentam crítica política contra candidato opositor. A jurisprudência do Tribunal Superior Eleitoral firmou-se no sentido de que “o art. 57- C, § 3º, da Lei das Eleições permite o impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral apenas para a finalidade de ¿promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações'” (Rp. 0601861-36, Rel. Min. EDSON FACHIN, DJe de 07/10/2021).

De acordo com o § 7º-A do art. 28 da Resolução TSE n. 23.610/19: “O impulsionamento de conteúdo em provedor de aplicação de internet somente poderá ser utilizado para promover ou beneficiar candidatura, partido político ou federação que o contrate, sendo vedado o uso do impulsionamento para propaganda negativa”.

O § 3º do art. 29 da Resolução TSE n. 23.610/19 diz que: “O impulsionamento de que trata o caput deste artigo deverá ser contratado diretamente com provedor da aplicação de internet com sede e foro no país, ou de sua filial, sucursal, escritório, estabelecimento ou representante legalmente estabelecida(o) no país e apenas com o fim de promover ou beneficiar candidatas e candidatos ou suas agremiações, vedada a realização de propaganda negativa (Lei nº 9.504/1997, art. 57-C, § 3º)”.

Com esse entendimento:

ELEIÇÕES 2020. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. IMPULSIONAMENTO DE CONTEÚDO SEM INDICAÇÃO DO CPF/CNPJ. ARTS. 57-C DA LEI 9.504/1997 E 29, § 5º, DA RES.-TSE 23.610/2019. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. AUSÊNCIA. MENSAGEM DIVULGADA COM TEOR NEGATIVO EM RELAÇÃO A CANDIDATOS ADVERSÁRIOS. DESCONFORMIDADE COM O ART. 57-C, § 3º, DA LEI 9.504/1997. ILÍCITO CONFIGURADO. MULTA. VALOR. LEGALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. 1. Recorrente que realizou impulsionamento de 3 (três) postagens na rede social facebook, entendendo a Corte Regional configurada propaganda eleitoral irregular, com a consequente imposição de multa, em razão i) da ausência de indicação, de forma clara, do CNPJ do contratante e ii) do conteúdo negativo das publicações em relação a outros candidatos. 2. A Res.-TSE 23.610/2019, que regulamenta o art. 57-C da Lei 9.504/97, exige que o impulsionamento contenha a indicação do CPF ou do CNPJ, bem como a identificação inequívoca de que se trata de propaganda eleitoral, requisitos estes não preenchidos no caso, conforme assentado pela Corte Regional. 3. As exigências previstas na Resolução editada pelo TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL no exercício de sua competência regulamentar não representam inovação na ordem jurídica nem violam o princípio da legalidade, tendo em vista que a imposição de multa pelo descumprimento do art. 29, § 5º, da Res.-TSE 23.610/2019 decorre do próprio art. 57-C, § 2º, da Lei 9.504/97. Precedentes. 4. O contexto fático delimitado nos pronunciamentos das instâncias ordinárias demonstra que as postagens impulsionadas veiculam conteúdo negativo em relação a outros candidatos. A jurisprudência do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL firmou-se no sentido de que "o art. 57- C, § 3º, da Lei das Eleicoes permite o impulsionamento de conteúdo de propaganda eleitoral apenas para a finalidade de ¿promover ou beneficiar candidatos ou suas agremiações'" (Rp. 0601861-36, Rel. Min. EDSON FACHIN, DJe de 7/10/2021). 5. Conduta praticada pelo Recorrente que não se insere na autorização legal para a realização do impulsionamento e, dessa forma, caracteriza propaganda eleitoral irregular, ensejando a aplicação de multa, nos termos do § 2º do art. 57-C da Lei 9.504/1997. 6. O valor da multa foi estabelecido de forma fundamentada, a partir das circunstâncias concretas do caso, revelando-se inviável sua redução. 7. Recurso Especial desprovido.

 

(TSE - AREspEl: 060016180 FORTALEZA - CE, Relator: Min. Alexandre de Moraes, Data de Julgamento: 26/05/2022, Data de Publicação: 02/08/2022)

 

De acordo com o art. 57-C, da Lei n. 9.504/97: “É vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes”. Seu § 2° prevê que: “A violação do disposto neste artigo sujeita o responsável pela divulgação da propaganda e, quando comprovado seu prévio conhecimento, o beneficiário à multa no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a R$ 30.000,00 (trinta mil reais)”.

Quanto à penalidade fixada, tendo em conta que para o primeiro impulsionamento foi gasto o valor de R$ 1,5 a 2 mil reais, para o segundo a quantia de R$ 700,00 a 799,00, e para o terceiro o montante de 100,00 a 199,00, e ainda que tenha sido alto o número de visualizações, entendo adequado, razoável e proporcional a penalidade fixada na sentença, no patamar individual de R$ 10.000,00 para cada representado, valor que se mostra suficiente ao caráter punitivo e educativo da penalidade.

Assim, a sanção aplicada na sentença não comporta majoração.

A multa deve ser quitada de forma individual. É assentado o entendimento de que o pagamento de multa aplicada em representação por propaganda eleitoral é sempre individual, independentemente de ser propaganda eleitoral antecipada ou irregular. O TSE já decidiu que, existindo mais de um responsável pela propaganda irregular, a pena de multa deve ser aplicada individualmente, e não de forma solidária. (AgR-REspe - 6881/2013; e ED -AgR-Respe 27887/2007). A propósito:

RECURSOS. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA NEGATIVA. CRÍTICAS DE CUNHO ELEITORAL. MATÉRIA JORNALÍSTICA. FACEBOOK. PÁGINA PESSOAL. JORNAL IMPRESSO. REPRODUZIDO VIRTUALMENTE NA INTERNET. PROIBIÇÃO DE DIVULGAÇÃO DE FATOS SABIDAMENTE INVERÍDICOS. TEORIA DA CAUSA MADURA. APLICAÇÃO DE PENA PECUNIÁRIA. POSSIBILIDADE. PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DO REPRESENTANTE. DESPROVIMENTO DO APELO DOS REPRESENTADOS. 1. A divulgação de propaganda eleitoral na internet está disciplinada no art. 36, § 3º, c/c o art. 57-A da Lei n. 9.504/97, e regulamentada pelo § 4º do art. 2º, c/c o art. 27, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.610/19, e art. 11, incs. I e II, da Resolução TSE n. 23.624/20. 2. O Tribunal Superior Eleitoral definiu que a propaganda antecipada negativa não se limita ao pedido de #não voto#, estabelecendo que #configuram propaganda eleitoral antecipada negativa críticas que desbordam os limites da liberdade de informação, em contexto indissociável da disputa eleitoral do pleito vindouro# (TSE, ac. de 10.02.2011 no AgR- REspe n. 3967112, rel. Min. Arnaldo Versiani) e que #a divulgação de fatos que levem o eleitor a não votar em determinada pessoa, provável candidato, pode ser considerada propaganda eleitoral antecipada, negativa# (TSE, ac. de 23.10.2002 no REspe n. 20073, rel. Min. Fernando Neves). (…)

Fixação no patamar mínimo legal para cada um dos representados. Pacífico o entendimento de que o pagamento de multa aplicada em representação por propaganda eleitoral é sempre individual, independentemente de ser propaganda eleitoral antecipada ou irregular. 8. Provimento parcial ao recurso do representante. Desprovimento do apelo dos representados.

(TRE-RS - RE: 060005753 BENTO GONÇALVES - RS, Relator: RAFAEL DA CÁS MAFFINI, Data de Julgamento: 05/10/2020, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 06/10/2020)

 

Com esses fundamentos, bem se vê que inexiste condenação em duplicidade, é descabido o pedido de condenação solidária ou subsidiária, e a sentença não viola o princípio da unicidade da sanção ou o conceito de responsabilidade solidária ou subsidiária.

DIANTE DO EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento dos recursos.