REl - 0600443-54.2024.6.21.0134 - Voto Relator(a) - Sessão: 22/10/2024 às 14:00

VOTO

O recurso é adequado, tempestivo e comporta conhecimento.

No mérito, a petição inicial narra que a candidata LUCIA ELISABETH COLOMBO SILVEIRA, no dia 16.9.2024, realizou 3 (três) publicações em suas redes sociais, consistentes em propaganda negativa em desfavor da candidatura dos representantes, ora recorridos.

O magistrado a quo julgou parcialmente procedente a representação, afastando a irregularidade em relação a 2 (duas) das postagens realizadas. Contudo, entendeu pela desconformidade do vídeo contendo edições relativamente à entrevista concedida pelo candidato AIRTON ao canal Real News, conforme trecho da sentença a seguir transcrito:

Na petição do ID 124293095, da ação de direito de reposta nº 0600442-69.2024.6.21.0134, que tramita entre as mesmas partes, o autor apresentou link que remete à galeria de anúncios da Meta, onde é possível ouvir e assistir ao vídeo postado pela requerida, de apenas 1 minuto, onde de fato se observam alterações de conteúdo em comparação com o original, disponível em https://www.youtube.com/live/Fr2FbCjkRiU.

Além de distorcer a voz do entrevistador, a edição leva a crer que o entrevistado reconhece ser "ficha suja", bem como a condenação a devolver mais de três milhões de reais em razão de “licitação fraudulenta”.

O conteúdo foi registrado na plataforma Verifact e não foi impugnado.

[…].

Na esteira do parecer ministerial, tem-se que o vídeo editado pode efetivamente sugerir ao eleitor situação distinta da realizada, causando prejuízo à imagem do candidato.

Reconheço, portanto, que neste particular a requerida atentou contra o art. 10, § 1º-A, da Resolução TSE 23.610/2019, eis que uspu de ferramentas tecnológicas para adulterar vídeo destinado a difundir fato falso ou gravemente descontextualizado sobre o representante.

 

De fato, a entrevista com candidato AIRTON JOSE DE SOUZA foi editada de maneira a insinuar que ele concorda ou reconhece o ilícito envolvendo ato de improbidade administrativa, considerando-se “ficha suja”, quando, na realidade, apesar de responder à ação, ele refuta a responsabilidade pelos acontecimentos.

A divulgação do vídeo nas redes sociais da ora recorrente é incontroversa e está disponível em https://www.facebook.com/ads/library/?id=492574980208544.

Apesar de a declaração inicial ser genuína, a manipulação do vídeo de forma a tirá-lo de contexto e dissimular o teor da fala do candidato configura ilícito eleitoral, conforme já decidiu esta Corte em caso análogo:

RECURSO ELEITORAL. ELEIÇÃO 2020. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL ANTECIPADA NEGATIVA. REDE SOCIAL. PROCEDENTE. REJEITADA A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA. VÍDEO. MONTAGEM. REPETIÇÃO DE TRECHOS DESCONTEXTUALIZADOS. CARACTERIZADA A PROPAGANDA NEGATIVA. MULTA. DESPROVIMENTO. 1. Representação eleitoral por propaganda negativa extemporânea, em razão de publicações realizadas em redes sociais que supostamente conclamariam eleitores a não votar em pré-candidato ao cargo de prefeito. 2. Rejeitada a preliminar de ilegitimidade passiva. A prova produzida nos autos é suficiente para atribuir a autoria do conteúdo das postagens ao representado, que reconhece ser membro do coletivo demandado, além de aparentemente incentivar o compartilhamento do conteúdo em outras aplicações de internet. Ainda que o recorrente não seja o único administrador da página que teria veiculado a suposta propaganda eleitoral negativa antecipada, seu nome consta nas imagens que foram veiculadas na petição inicial e se relacionam com a postagem impugnada, fazendo crer que possui estreita relação com a página em questão # União dos Praças da Brigada Militar (UPBMRS). 3. O art. 3º da Resolução TSE n. 23.610/19 que regulamenta a propaganda eleitoral para as eleições de 2020, reproduzindo teor do art. 36-A da Lei n. 9.504/97, possibilita que os pretensos candidatos desenvolvam ações que, embora ocorram antes do prazo legal, não configurem propaganda antecipada. Permitida a menção à pretensa candidatura, a exaltação de qualidades pessoais dos pré-candidatos, o pedido de apoio político, a divulgação das ações políticas desenvolvidas e das que se pretendem desenvolver, desde que não haja pedido explícito de voto. 4. O art. 27, §§ 1º e 2º, da Resolução TSE n. 23.610/19, paralelamente, estabeleceu que a livre manifestação do pensamento somente é passível de limitação quando ofender a honra ou a imagem ou divulgar fatos sabidamente inverídicos sobre candidatos, partidos ou coligações, ainda que antes do início do período da propaganda eleitoral. 5. Na hipótese, o vídeo que acompanhou a inicial representa uma montagem realizada com a fala de pré-candidato, na qual se descontextualiza um trecho de uma entrevista, ressaltando, mediante insistente repetição de trechos com linguajar grosseiro, o descaso com o #voto da brigada#. Embora a manifestação original seja verdadeira, os recortes, a edição e a repetição de pequenos trechos descontextualizados afastam sua veridicidade. 6. Configurada a propaganda extemporânea negativa. Multa já fixada no patamar mínimo previsto no § 3º do art. 36-A da Lei n. 9.504/97, não restando espaço para readequação de valor. Eventual pleito de parcelamento, tendo por motivo as condições econômicas do representado, deverá ser efetivado na correspondente fase de execução. 7. Provimento negado.

(TRE-RS - RE: 060004294 RIO GRANDE - RS, Relator: ROBERTO CARVALHO FRAGA, Data de Julgamento: 15/10/2020, Data de Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 19/10/2020) (Grifei.)

 

Além disso, a alteração do vídeo original da entrevista, com o objetivo de espalhar desinformação sobre o candidato concorrente, constitui também uma clara violação do art. 9º-C da Resolução TSE n. 23.610/19:

 

Art. 9º-C É vedada a utilização, na propaganda eleitoral, qualquer que seja sua forma ou modalidade, de conteúdo fabricado ou manipulado para difundir fatos notoriamente inverídicos ou descontextualizados com potencial para causar danos ao equilíbrio do pleito ou à integridade do processo eleitoral. (Incluído pela Resolução nº 23.732/2024)

 

O TSE assentou que, embora o dispositivo cuide da vedação do anonimato nas publicações feitas na internet, ele também se aplica às hipóteses de veiculação de notícias falsas e desinformação na rede mundial de computadores, destacando-se o seguinte julgado:

ELEIÇÕES 2022. RECURSOS INOMINADOS. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA ELEITORAL IRREGULAR. INTERNET. DESINFORMAÇÃO. FATOS MANIFESTAMENTE INVERÍDICOS. REMOÇÃO DAS PUBLICAÇÕES. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO ART. 57-D DA LEI 9.504/1997. ART. 16 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INAPLICABILIDADE. DESPROVIMENTO. 

1. O art. 57-D da Lei 9.504/1997 não restringe, de forma expressa, qualquer interpretação no sentido de limitar sua incidência aos casos de anonimato, de forma que é possível ajustar a exegese à sua finalidade de preservar a higidez das informações divulgadas na propaganda eleitoral, ou seja, alcançando a tutela de manifestações abusivas por meio da internet - incluindo-se a disseminação de fake news tendentes a vulnerar a honra de candidato adversário - que, longe de se inserirem na livre manifestação de pensamento, constituem evidente transgressão à normalidade do processo eleitoral. Precedente. 

2. O entendimento veiculado na decisão monocrática se mostra passível de aplicação imediata, não se submetendo ao princípio da anualidade, previsto no art. 16 da Constituição Federal, tendo em vista a circunstância de que a interpretação conferida pelo ato decisório recorrido não implica mudança de compreensão a respeito do caráter lícito ou ilícito da conduta, mas sim somente quanto à extensão da sanção aplicada, o que não apresenta repercussão no processo eleitoral nem interfere na igualdade de condições dos candidatos. 

3. Tratando-se de conduta já considerada ilícita pelo ordenamento jurídico, o autor do comportamento ilegal não dispõe de legítima expectativa de não sofrer as sanções legalmente previstas, revelando-se inviável a invocação do princípio da segurança jurídica com a finalidade indevida de se eximir das respectivas penas. 

4. O Plenário do TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, no julgamento do Recurso na Representação 0601754-50, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, analisando a matéria controvertida, estabeleceu diretriz interpretativa a ser adotada para as Eleições 2022, inexistindo decisões colegiadas desta CORTE que, no âmbito do mesmo pleito eleitoral, veiculem conclusão em sentido diverso. 

5. Recurso desprovido.

Recurso em Representação nº060178825, Acórdão, Min. Alexandre de Moraes, Publicação: DJE - Diário de Justiça Eletrônico, 24/04/2024. (Grifei.)

 

Assim, configurada a irregularidade na propaganda, incide a multa imposta à recorrente na sentença, razão pela qual deve ser mantida a sanção aplicada pelo juízo da origem, fixada no patamar mínimo de R$ 5.000,00, nos termos do que dispõe o art. 9º-H da Resolução TSE n. 23.610/19, c/c o art. 57-D, § 2º, da Lei n. 9.504/97.

 

ANTE O EXPOSTO, VOTO pelo desprovimento do recurso.